Acórdão nº 0957/14.4BEAVR de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 11 de Maio de 2023

Magistrado ResponsávelSUZANA TAVARES DA SILVA
Data da Resolução11 de Maio de 2023
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Acordam na Secção do Contencioso Administrativo do Supremo Tribunal Administrativo: I – Relatório 1 – AA e BB, ambos com os sinais dos autos, propuseram, no Tribunal Administrativo e Fiscal de Aveiro (TAF de Aveiro), acção administrativa comum, contra a E. P. – Estradas de Portugal, S.A.

, o InIR - Instituto de Infra-estruturas Rodoviárias I.P.

, a B..., SA, a A..., ACE e foi ainda admitida a intervenção da C..., S.A.

, todos igualmente com os sinais dos autos; acção na qual foi formulado o seguinte pedido: «[…] Nestes termos e nos mais de direito cujo douto suprimento de V. Exa. se pede, devem os R.R. ser condenados a pagar aos A.A., a título de indemnização, por danos patrimoniais sofridos a importância global de 70.000,00€ (Setenta mil euros), e por danos não patrimoniais sofridos a importância de 10.000,00€ (Dez mil euros), no montante global de 80.000,00€ (Oitenta mil euros) a que deverão acrescer os juros legais, a contar da citação, até integral e efectivo pagamento […]».

2 – Por sentença de 25.03.2022 foi a acção julgada improcedente e os RR absolvidos do pedido.

3 – Inconformados, os AA. recorreram para o TCA Norte, que, por acórdão de 28.10.2022, negou provimento ao recurso.

4 – Desta última decisão foi interposto recurso de revista para este STA, o qual foi admitido por acórdão de 23.02.2023.

5 – Os Recorrentes formularam alegações que concluíram da seguinte forma: «[…] 1. O presente recurso é interposto nos termos do artigo 672.º do CPC, aplicável aos presentes autos.

  1. O Douto acórdão recorrido encontra-se em contradição com o Douto acórdão do STA proferido no processo 01303/13.1 em 07/04/2022, disponível em dgsi.pt, que aqui se elege como Acórdão-Fundamento.

  2. Os acórdãos em causa tratam da mesma questão de direito: o direito à indemnização pelo sacrifício resultante de empreitadas e o obras públicas e foram proferidos no domínio da mesma legislação: Lei 67/2007 de 31/12.

  3. Verificam-se os requisitos de admissibilidade do recurso previstos nas alíneas a) b) e c) do artigo 672.º do CPC.

  4. O Douto acórdão recorrido violou o disposto nos artigos 2.º e 16.º do RRCEE.

  5. O Douto acórdão recorrido fez errada subsunção dos factos provados ao direito, ao decidir que os mesmos não constituem danos especiais e anormais.

  6. Dos factos dados como provados resulta forçosamente que os AA sofreram danos especiais, porquanto tais danos não foram impostos à sociedade em geral, mas tão só às pessoas cujos prédios de habitação se localizam junto à autoestrada é só eles sofreram e sofrem os efeitos da mesma.

  7. Os AA sofreram prejuízos anormais, porquanto os danos sofridos vão para além do que é expectável uma vez que tiveram que suportar os ruídos decorrentes da construção e agora da exploração da autoestrada, que aumentou e irá aumentar exponencialmente.

  8. Encontram-se verificados os requisitos exigidos pelo n.º 2 do artigo 762.º do CPC.

  9. A apreciação da questão é claramente necessária para uma melhor aplicação do direito, porquanto a mesma tem vindo a ser objecto de diferentes decisões judiciais em casos similares, como o dos presentes autos, sendo assim, necessário estabelecer uma melhor uniformização nas decisões, sob pena de manifesta violação do direito constitucional de igualdade previsto no artigo 13.º da CRP.

  10. Os interesses são de particular relevância social, porquanto a questão se prende com a obtenção de uma justiça cada vez mais respeitadora dos direitos dos cidadãos em situações idênticas, de forma a que a sociedade entenda as decisões judiciais. Ademais a questão em análise está cada vez mais presente, face ao desenvolvimento na área dos transportes e equipamentos do domínio público.

  11. Os acórdãos em análise são idênticos quanto ao pedido e causa de pedir, sendo os mesmos referentes a pedidos de indemnização por força da construção e exploração da A-32, em locais próximos. Os factos provados são idênticos e as decisões são contraditórias.

    Nestes termos e nos mais de direito, cujo douto suprimento de V. E.cias Srs. Juízes Conselheiros se pede, deve o presente recurso ser admitido, e a final ser julgado procedente por provado com as legais consequências, e ser proferido Douto Acórdão que condene os recorridos a indemnizar os Autores nos termos peticionados, assim se fazendo inteira e sã JUSTIÇA […]».

    6 - A A..., ACE, contra-alegou, rematando da seguinte forma: «[…] 13. O presente recurso é interposto pelos Autores, ora Recorrentes, ao abrigo da alínea c) do n.º 1 do artigo 672.º do CPC, por existir uma alegada contradição entre o Acórdão Recorrido e o Acórdão desse STA de 07.04.2022.

  12. Sucede que a admissibilidade do presente recurso não pode ser aferida no âmbito do artigo 672.º do CPC, havendo que fazer essa análise à luz do disposto no CPTA, no quadro do qual se afigura que a decisão sub judice é irrecorrível.

  13. Nos termos do n.º 1 do artigo 150.º do CPTA, só pode haver recurso de revista de decisões proferidas em segunda instância pelo TCA quando esteja em causa a apreciação de uma questão que, pela sua relevância jurídica ou social, se revista de importância fundamental ou quando a admissão do recurso seja claramente necessária para uma melhor aplicação do direito.

  14. Segundo os Recorrentes, a pretensa oposição de julgados consubstanciaria razão para que a admissão do recurso fosse necessária para melhor aplicação do direito e para que estivesse em causa questão de particular relevância social.

  15. Contudo, não só não se verifica qualquer oposição de julgados, como tal circunstância só poderia ser causa de recurso extraordinário para uniformização de jurisprudência, devendo o recurso ser liminarmente rejeitado, por falta de verificação dos pressupostos legais para o efeito.

    Se assim não se entender, sempre se dirá que, 18. Nos termos do n.º 2 do artigo 150.º do CPTA, a revista só pode ter como fundamento a violação de lei substantiva ou processual.

  16. Os Recorrentes vêm alegar a violação do disposto nos artigos 2.º e 16.º do RRCEE, porque, na sua perspetiva, estariam verificados os pressupostos de que depende o direito à indemnização pelo sacrifício, em suposta consonância com o douto Acórdão de 07.04.2022, por terem sofrido danos especiais e anormais.

  17. Todavia, não está de forma alguma demonstrado que os Recorrentes sofreram danos especiais e anormais, razão pela qual não lhes assiste o direito de serem indemnizados pelo sacrifício ou a qualquer outro título.

  18. Quanto a alegados danos patrimoniais, os Autores, ora Recorrentes, não provaram que o seu imóvel tenha sofrido qualquer desvalorização em face da construção da A...2.

  19. Quanto a alegados danos não patrimoniais, a lei remete para o tribunal o encargo de apreciar se o prejuízo concretamente alegado (e provado) merece a tutela do direito, sendo irrelevantes os pequenos incómodos ou contrariedades, desgostos ou sofrimentos que resultem de uma sensibilidade exagerada ou anómala.

  20. O dano não patrimonial deve ser aferido de modo objetivo, a partir de valorações ético-culturais aceites pela comunidade, num dado momento histórico, atendendo ao circunstancialismo do caso concreto, e não a partir das perceções subjetivas do lesado.

  21. In casu, os Recorrentes não lograram demonstrar quaisquer danos que não devam considerar-se normais na vida em sociedade ou que tenham gravidade suficiente a ponto de merecerem a tutela do direito e de lhes conferir direito a indemnização.

  22. Com efeito, os factos provados pelos Autores, ora Recorrentes, não se revelam adequados a provocar os «incómodos, arrelias e perturbações na (…) vivência diária [dos mesmos], designadamente, stress e insónias».

  23. Afigura-se que os factos provados não têm qualquer gravidade intrínseca própria e que o estado de stress e insónias dos Recorrentes resultam antes das suas expectativas quanto à imodificabilidade das condições existentes nas imediações da sua habitação e/ou uma especial sensibilidade que possam ter relativamente aos efeitos do trânsito rodoviário – as quais são insuscetíveis de tutela jurídica.

  24. Estão, por isso, em causa prejuízos normais inerentes aos riscos normais da vida em sociedade.

  25. Os Recorrentes também não lograram demonstrar ter sofrido quaisquer incómodos que lhes tenham sido particularmente impostos, por comparação com os demais cidadãos, razão pela qual não suportaram qualquer dano especial.

  26. Termos em que se impõe reconhecer que o Acórdão Recorrido não viola, de forma alguma, os artigos 2.º e 16.º do RRCEE, devendo o presente recurso improceder em conformidade.

    Refira-se ainda que, 30. No caso do Acórdão Recorrido, a autoestrada «dista 72 (setenta e dois) metros do tardoz dos anexos e limite do terreno do prédio dos autores» e «100 (cem) metros da traseira do corpo principal da moradia».

  27. No caso do Acórdão de 07.04.2022, o prédio do autor ficou «a uma distância de (…) 2 metros da zona de estrada ao logradouro e 10 metros da zona de estrada ao edifício de habitação».

  28. No caso do Acórdão Recorrido, não ficou provado que, por força da construção da autoestrada, o prédio dos Autores tenha sofrido qualquer desvalorização (24); 33. No caso do Acórdão de 07.04.2022, ficou provado que, após a construção e entrada em funcionamento da autoestrada, o prédio do aí autor sofreu uma desvalorização de 13% – correspondente a € 86.059,38.

  29. Assim, contrariamente à situação dos autos, no caso do Acórdão de 07.04.2022, estão em causa danos especiais, porque não impostos à generalidade das pessoas, bem como danos anormais, correspondentes à perda de 13% do valor do imóvel e aos efeitos nocivos resultantes de uma tão escassa e incomum proximidade entre o imóvel e a autoestrada.

  30. Também não é de todo verdade que o local a que se refere o Acórdão Recorrido e o Acórdão de 07.04.2022 sejam próximos e, por isso, semelhantes.

  31. Termos em que não há qualquer identidade, nem de danos, nem de circunstâncias, entre os casos do Acórdão de 07.04.2022 e do Acórdão Recorrido, pelo que a decisão a quo também não padece de qualquer violação do princípio da igualdade.

  32. Por...

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