Acórdão nº 10421/15.9T8VNG.P2.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 11 de Maio de 2023

Magistrado ResponsávelCATARINA SERRA
Data da Resolução11 de Maio de 2023
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

ACORDAM NO SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA I. RELATÓRIO Recorrentes: AA, BB e CC Recorrido: DD 1.

AA, BB e CC vieram interpor processo especial de declaração de morte presumida relativa ao seu marido e pai, respectivamente, DD.

Procedeu-se às legais citações e publicações, não tendo sido deduzida qualquer contestação.

Produzida a prova, em 15.09.1999, veio a ser proferida sentença, transitada em julgado, que declarou a morte presumida de DD.

  1. DD, identificando-se como réu nestes autos, nos quais foi declarada a sua morte presumida, por requerimento de 1.12.2015, veio requerer que fosse declarada sem efeito aquela declaração de morte presumida.

    Juntou cópias de “cedula de identidad” e passaporte emitidos pela República Bolivariana da Venezuela.

  2. Devidamente notificadas, AA, BB e CC alegaram não reconhecer o subscritor do requerimento em causa como o réu, requerendo a sua notificação para demonstrar a sua identidade.

  3. Em 20.01.2016 o requerente apresentou requerimento alegando factualidade diversa com vista a provar a sua identidade, juntando documentos e requerendo a produção de meios de prova.

  4. Em 9.02.2016 as requeridas apresentaram requerimento em que impugnaram motivadamente os factos e os documentos apresentados pelo requerente, negando que seja o seu marido e pai, respectivamente.

  5. Foi proferido despacho, em 5.02.2016, que ordenou a tomada de declarações ao requerente, antes da sua partida para a Venezuela e a realização de perícia ao ADN destinada a determinar o parentesco entre o requerente e as pretensas filhas, como produção antecipada de prova nos termos dos artigos 419.º e 420.º do CPC.

    Notificado esse despacho às partes não foi objecto de recurso.

  6. Conforme informação do Instituto de Medicina Legal de 3.05.2017, as pretensas filhas do requerente não compareceram em duas datas previamente agendadas.

  7. No requerimento das requeridas de 18.01.2017, estas expressamente declaram no seu artigo 12.º que não estão disponíveis a realizar a recolha de material genético na presença do requerente.

  8. Em complemento do despacho de 5.02.2016, a Exma. Senhora Juíza proferiu despacho em 3.07.2017, determinando que o IML providenciasse pela recolha de material genético em dias e horas separadas para requerente e requeridas, tendo solicitado designação de nova data para a diligência e ordenado a notificação dos mandatários e das partes, devendo as requeridas ser advertidas de que a nova falta levaria teria as devidas consequências legais.

    Também este despacho foi notificado às partes e dele não foi interposto recurso.

  9. Foi designada data para as colheitas de amostras biológicas às requeridas filhas, em 18.09.2017, pelas 9h00, tendo estas sido notificadas por carta com prova de depósito, e faltaram.

  10. Por requerimento de 19.09.2017, as aludidas requeridas vieram justificar as faltas por doença.

  11. O IML informou nos autos, em 25.9.2017, que foi realizada colheita de amostras biológicas ao requerente em 14.09.2017, que ficaram em arquivo.

  12. Foi designada nova data para as colheitas de amostras biológicas às requeridas filhas, em 9.11.2017, pelas 9h00, tendo estas sido notificadas por cartas com prova de depósito, e faltaram.

  13. Por requerimento de 23.11.2017, as aludidas requeridas vieram justificar as faltas por terem realizado uma viagem de cariz profissional a ....

  14. Em 19.01.2018 a Exma. Senhora Juíza proferiu despacho julgando injustificada a falta daquelas requeridas a esta última data da perícia ordenada e tendo-as condenado em multa de 2,5 UCs a cada uma. Determinou ainda que o IML designasse nova data para a diligência e ordenou a notificação dos mandatários e das partes, devendo as requeridas ser advertidas de que a nova falta seria entendida como estando elas, propositadamente, a inviabilizar a realização da perícia, com a consequente inversão do ónus da prova, nos termos do artigo 344.º, n.º 2, do CC.

    Também este despacho foi notificado às partes e dele não foi interposto recurso.

  15. Foi designada nova data para as colheitas de amostras biológicas às requeridas filhas, em 5.03.2018, pelas 9h00, tendo estas sido notificadas por cartas com prova de depósito, e faltaram, sem justificação alguma.

  16. Teve lugar a instrução dos autos, com a audição do requerente em declarações de parte, em acta de 16.02.2016 e junção de cópias do documento de identidade e passaporte cujos originais foram exibidas à Exma. Senhora Juíza.

  17. Face à informação de fls. 221, frustrou-se a prova por meio de comparação entre as impressões digitais do requerente e as que constavam de pedidos de documento de identificação apresentados junto do registo civil.

  18. Foram inquiridas testemunhas e, por fim, em 11.10.2018, foi proferida sentença.

    Na fundamentação da sentença pode ler-se: “Assim, ao não comparecerem sucessivamente no INML para recolha do necessário material biológico (apesar de notificadas para o efeito – sendo para tal exaustivas as diligências do tribunal – muito para além do que seria imposto pelos arts. 247º/1 e 249º/2, do Código de Processo Civil), culposamente tornaram impossível a produção da pretendida prova.

    Advertidas de que a manterem tal comportamento tal implicaria a inversão do ónus da prova, ao abrigo do preceituado no art. 344º/2, do CCivil, as requeridas voltaram a faltar à data pelo INML indicada para recolha de material biológico.

    Assim, invertendo-se o ónus da prova, teriam que ser estas a provar que o justificante não era E….Ora nenhuma prova fizeram nesse sentido.

    Aliás a única prova a este respeito feita nos autos, consistiu na inquirição das testemunhas arroladas pelo justificante, conhecidos, familiares e amigos dos tempos de juventude de E… que, com maior ou menor objectividade e/ou fundamentação, asseguraram de forma firme e convicta reconhecerem no justificante como o seu conhecido/familiar/amigo.

    Sendo que o mais que consta de tal factualidade resulta da justificação aqui deduzida. Os ponto 5 e 6 resultam do inventário apenso (…)”.

    E o dispositivo da sentença é o seguinte: “a) Declara-se que DD se encontra vivo, com a consequente cessação dos efeitos atinentes à sua declaração de morte presumida; b) Determina-se que lhe seja restituído o seu património, no estado em que se encontrar, com o preço dos bens alienados ou com os bens diretamente sub-rogados e bem assim com o preço dos alienados, quando no título de aquisição se declare expressamente a proveniência do dinheiro.” 20.

    Desta sentença interpuseram recurso as autoras/requeridas, vindo a mesma a ser anulada por Acórdão do Tribunal da Relação do Porto de 9.05.2019, que determinou a solicitação de informações às autoridades da República da Venezuela.

    Neste Acórdão escreveu-se: “É fundamental para a prova da referida identidade saber se o indivíduo a quem foi atribuída a “cédula de identidade” E-10...40, e se apresentou nos serviços de registo civil da Venezuela, em ... .04.1978 e em ... .02.1985, a declarar o nascimento das filhas dele e da esposa, como natural de Portugal, domiciliado na ...

    de …, Caracas, tem a mesma filiação do indivíduo com o mesmo nome e data de nascimento, que se apresentou agora, em 20.01.2016 a formular o pedido de devolução de bens, cidadão venezuelano, portador da “cédula de identidade” número V 14...49, emitida em 16.04.2015 e passaporte da Venezuela, emitido em .../.../2015, onde consta, como local de nascimento, Lisboa.

    Tal poderia ter ocorrido através de processo de naturalização.

    Não pode esta Relação ordenar a realização dessa prova, que deve ser obtida pelo tribunal a quo por via de informação da Embaixada da República Bolivariana da Venezuela em Lisboa ou por via de carta rogatória em pedido dirigido ao SAIME- Servicio Administrativo de Identificación, Migración y Estranjeria do Gobierno Bolivariano de Venezuela.

    Assim, ao abrigo do disposto nos artºs 888º, nº3 e 662º, nº2, al.

    b), NCPC, ordena-se a produção daquele meio de prova e termos subsequentes, para a prova dos referidos factos que foram impugnados, anulando-se, em conformidade a sentença proferida.

    1. DECISÃO Nestes termos, ACORDAM os juízes nesta Relação em anular a decisão recorrida nos termos que antecedem e, sem prejuízo da consideração dos factos já fixados como provados neste acórdão, ordena-se a realização do apontado meio de prova e decisão posterior”.

  19. Tendo os autos baixado ao Tribunal de 1.ª instância, foi solicitada a informação pretendida, tendo, por resposta datada de 14.04.2021, a Embaixada da República Bolivariana da Venezuela em Portugal referido: “Venho por este meio (...) informar que nos registos existentes neste consulado Geral correspondente a DD, não se encontram identificados os nomes do pai e da mãe (...)” (cfr. referência Citius ...19).

  20. Foi de seguida proferida sentença, datada de 28.06.2021, em que pode ler-se, designadamente, o seguinte: “No que se refere aos factos dados como não provados, seguiu-se aqui o caminho fixado pelo Tribunal da Relação do Porto, que expressamente afastou a possibilidade de inversão do ónus de prova, tendo determinado que era ao requerente que cabia a prova da sua identidade, como sendo o ausente.

    Não tendo havido resposta integral ao solicitado pelo Tribunal – para além daquela junta pela Embaixada da República da Venezuela, em 13 de Abril, que nada permite aferir quanto à identidade em causa – importa concluir que o requerente não logrou demonstrar os factos relacionados com a sua identidade, cabendo a si o ónus de prova (…).

    Pelo exposto julgo o pedido improcedente, mantendo a decisão que considerou verificada a morte presumida de DD nascido em ...-02-1955, em ..., Vila Nova de Gaia, sendo filho de EE e de FF”.

  21. Inconformado, o requerente, DD, interpôs recurso de apelação.

  22. Em 11.10.2022 proferiu o Tribunal da Relação do Porto um Acórdão de cujo dispositivo consta: “Pelo exposto e em conclusão acordam os Juízes que compõem este Tribunal da Relação do Porto, em julgar procedente o recurso, alterando-se a matéria de facto em conformidade com o supra decidido e em consequência: 1)...

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