Acórdão nº 223/23 de Tribunal Constitucional (Port, 20 de Abril de 2023

Magistrado ResponsávelCons. Lino Rodrigues Ribeiro
Data da Resolução20 de Abril de 2023
EmissorTribunal Constitucional (Port

ACÓRDÃO Nº 223/2023

Processo n.º 1062/22

3.ª Secção

Relator: Conselheiro Lino Rodrigues Ribeiro

Acordam, em conferência, na 3.ª Secção do Tribunal Constitucional

I – Relatório

1. Nos presentes autos, vindos do Supremo Tribunal de Justiça, em que é reclamante A. e reclamado o Ministério Público, o primeiro interpôs, ao abrigo do disposto no artigo 70.º, n.º 1, alínea b), da LTC, recurso de constitucionalidade do despacho ali proferido no dia 6 de outubro de 2022 que, ao abrigo do disposto fundamentalmente no artigo 400.º, n.º 1, alínea c), do Código de Processo Penal, indeferiu a reclamação do despacho de 6 de setembro de 2022, proferido no Tribunal da Relação de Guimarães, que, por seu turno, indeferiu a interposição de recurso do acórdão do mesmo Tribunal de 6 de junho de 2022.

2. O arguido interpôs recurso de constitucionalidade tendo como objeto a «interpretação normativa concatenada entre os artigos 400.º, n.º 1, al. e), 43.º, n.º 1, al. b) e 414.º, n.º 2, todos do CPP, face aos artigos 32.º, n.º 1, in fine, e 20.º, n.º 4, da CRP».

3. Proferiu-se então no tribunal recorrido, no dia 17 de outubro de 2022, despacho que não admitiu o recurso, nos seguintes termos:

«Na decisão que indeferiu a reclamação não foi aplicada a norma adjetiva penal que o recorrente pretende extrair da leitura conjugada dos artigos 400.º nº 1, alínea e), 432.º n.º 1, alínea b) e 414.º n.º 2, do CPP.

Aplicou-se unicamente a norma extraída do disposto nos artigos 432º, n.º 1, alínea b) e 400.º n.º 1, alínea c), do CPP.

O que é suficiente para a não admissão do vertente recurso.

Com efeito, a não aplicação das citadas normas na decisão impugnada, inviabiliza qualquer julgamento sobre elas por parte do Tribunal Constitucional, porquanto os recursos de constitucionalidade desempenham uma função instrumental. Daí o Tribunal Constitucional só poder conhecer de uma questão de constitucionalidade quando ela exerce influência no julgamento da causa, o que não se verifica na situação dos autos.

Decisão:

Pelo que, de conformidade com o disposto e em obediência ao estabelecido nos artigos 72º n.º 2 e 76º n.ºs 1 e 2 da Lei n.º 28/82 citada, decide-se não admitir o recurso interposto pelo reclamante para o Tribunal Constitucional.»

4. O recorrente veio então reclamar desse despacho para a conferência no Tribunal Constitucional, o que fez, fundamentalmente, nos seguintes termos:

«A., notificado do despacho (com referência 11167310) que não admitiu o recurso (interposto para o Venerando Tribunal Constitucional); e, em discordância com tal decisão; vem (da mesma), ao abrigo do artigo 76º nº 4 da LTC, apresentar - e, dirigida à Conferência a que alude o nº 3 do artigo 78º, da mencionada Lei 28/82 -

RECLAMAÇÃO

nos termos e seguintes fundamentos:

A. Introito

1. Salvo todo o imenso respeito - que é muito - o arguido/recorrente entende estarem reunidos TODOS os requisitos para ser admitido o recurso impetrado nestes autos; e, dirigido ao Tribunal Constitucional.

2. Com efeito, segundo o nosso humilde entendimento, o STJ não entendeu o requerimento de interposição de recurso formulado pelo arguido (obviamente, por culpa nossa, porque não soubemos usar as expressões no seu melhor sentido e enganamo-nos na indicação da alínea do artigo 400º nº 1 do CPP: onde queríamos dizer al c), afirmamos al e) - erro de escrita, para cujo regime invocámos o artigo 249º do Código Civil).

3. O recorrente não usou a palavra "norma" com sinónimo de "artigo" e "alínea" especifica do Código.

4. O recorrente quando utilizou a palavra "norma" fê-lo no sentido de "regra de conduta"; seja ela proveniente do artigo "X", alínea "Z"; ou do artigo "Y" alínea"w".

5. Isto é, para o recorrente, não importará (tanto) o artigo específico do código; ou, a alínea concreta.

6. Ao invés, a questão relevante (para o recorrente...e, para o recurso, conforme infra se justificará) será a "regra de conduta"(ou norma) - necessariamente, geral e abstrata - adotada pelo tribunal (o STJ) na interpretação jurídica; e, pela qual implicou a sua aplicação ao caso concreto, através do raciocínio de subsunção.

7. Será, pois, esta a temática da presente reclamação; na medida em que, o STJ não ajuizou a questão decidenda segundo a melhor doutrina preconizada pelo Tribunal Constitucional.

B. Sobre os requisitos (em abstrato) de admissibilidade dos recursos para o Tribunal Constitucional, no âmbito da fiscalização concreta sucessiva da constitucionalidade

8. Segundo o estatuído no art. 75º-A, nº 2 da L.T.C., impende, sobre o recorrente o dever de indicar "a norma ou o princípio constitucional violado; assim como, a "peça processual em que foi suscitada a questão da inconstitucionalidade"; e, claro está, dever-se-á indicar a "norma cuja inconstitucionalidade haja sido suscitada durante o processo" (artigo 70º nº 1, al.b) da LTC.

9. Reparemos que, o legislador utiliza -sempre-a palavra "norma"... e, não "artigo" ou "alínea" do Diploma Legal.

10. A peça processual na qual foi suscitada a inconstitucionalidade normativa, é a reclamação impetrada para o Presidente do Supremo Tribunal de Justiça, ao abrigo do art. 405º do CPP, na qual se defendeu o direito de recorrer para o Supremo, pelo menos num grau, nos termos do art. 32º, n.º 1, in fine, da CRP.

11. Tal reclamação foi impetrada, no TRG e dirigida ao STJ; e, sobre a mesma recaiu despacho, datado de 06/10/2022.

12. A norma considerada inconstitucional (na perspetiva do recorrente) é a aplicação, ao caso concreto, da interpretação normativa concatenada entre os art. 400º nº 1, al. e), 432º nº 1, al. b) e 414.º nº 2, todos do CPP, face os arts. 32º, n.º 1, in fine, e 20º, n.º 4 da CRP.

NOTA: onde se escreveu alínea e); dever-se-ia ter escrito alínea c) (trata-se de um erro de escrita, nos termos do artigo 249º do Código Civil, para cujo regime se remete).

13. No que tange às normas violadas ou Princípios Jurídicos Constitucionais desrespeitados, os recorrentes invocaram na mencionada peça processual, a violação dos princípios e normas abaixo discriminados.

B. Da verificação dos requisitos de admissibilidade (“check-list”)

14. Perante o exposto, o recorrente (no seu humilde saber jurídico) entende que o seu requerimento de interposição do recurso obedece - e respeita - TODOS os requisitos de admissibilidade do recurso, sem exceção.

15. Com efeito, (i) a peça processual na qual foi suscitada a inconstitucionalidade normativa, foi a reclamação impetrada do TRG, para o Presidente do Supremo Tribunal de Justiça, ao abrigo do art. 405º do CPP; na qual se defendeu o direito de recorrer para o Supremo, pelo menos num grau, nos termos do art. 32º, n.º 1, in fine, da CRP.

16. Tal reclamação foi impetrada, no TRG e dirigida ao STJ; e, sobre a mesma recaiu despacho, datado de 06/10/2022.

17. A (ii) norma considerada inconstitucional (na perspetiva do recorrente) é a aplicação, ao caso concreto, da interpretação normativa concatenada entre os art. 400º, nº 1, al. c (agora devidamente corrigido - artigo 249º CC), 432º nº 1, al. b) e 414 nº 2, todos do CPP, face os arts. 32º, n.º 1, in fine, e 20º, n.º 4 da CRP.

18. No que tange (iii) às normas violadas ou Princípios Jurídicos Constitucionais desrespeitados, o recorrente invocou, na mencionada peça processual, a violação dos seguintes princípios ou normas:

a) Art. 20º da C.R.P., na medida em que a todos é assegurado o acesso ao Direito e aos Tribunais, para a defesa dos seus direitos, mediante processo equitativo; bem como, o artigo 6º nº 1 da CEDH.

b) Violação do art. 32º, nº 1 da C.R.P., segundo o qual o processo criminal assegura todas as garantias de defesa, incluindo o recurso (em pelo menos um grau), na circunstância - na perspetiva dos arguidos - deveria ser admitido o recurso do TRG para o STJ.

19. Está, portanto, verificado o "triplo crivo" dos requisitos de admissibilidade do recurso para o Tribunal Constitucional [vide, supra (i), (ii) e (iii)1],

20. Não entendemos, assim, a razão do despacho, aqui sob sindicância, segundo qual se decidiu "não admitir o recurso interposto pelo reclamante para o tribunal Constitucional"!...

21. Pois, segundo a humilde perspetiva do recorrente, TODOS os requisitos foram observados, na tramitação processual e fundamentação apresentada.

22. Acresce que, (conforme se salientou) é do conhecimento do arguido/recorrente, a doutrina do Acórdão 421/2001 do T.C., nº 5, segundo o qual, "uma questão de constitucionalidade normativa só se pode considerar suscitada de modo processualmente adequado quando (i) o recorrente identifica a norma que considera inconstitucional, indica (ii) o princípio ou norma constitucional que considera violadas e (iii) apresenta uma fundamentação, ainda que sucinta, da inconstitucionalidade arguida. Não se considera assim suscitada uma questão de constitucionalidade normativa quando o recorrente se limita a afirmar, em abstrato, que uma dada interpretação é inconstitucional, sem indicar a norma que enferma desse vício, ou quando imputa a inconstitucionalidade e uma decisão ou um ato administrativo."

23. No caso concreto, o arguido/recorrente indicou (como escalpelizamos supra): a) a peça processual onde suscitou as questões de inconstitucionalidade normativa; b) a norma do Código Processo Penal que se revela inconstitucional; c) bem como, os princípios constitucionais que - segundo a sua ótica - se encontram violados.

24. O recorrente aduziu no requerimento de interposição do recurso argumentação perfunctória; bem como, fundamentação sucinta das inconstitucionalidades verificadas

25. Concretamente, o recorrente argumentou que verifica-se "in casu" a preterição do direito ao...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT