Acórdão nº 82/19.1T9ORQ.E1 de Tribunal da Relação de Évora, 18 de Abril de 2023

Magistrado ResponsávelANA BACELAR
Data da Resolução18 de Abril de 2023
EmissorTribunal da Relação de Évora

Acordam, em conferência, na 2.ª Subsecção Criminal do Tribunal da Relação do Évora I.

RELATÓRIO No processo comum n.º 82/19.1T9ORQ do Juízo Central Cível e Criminal ... [...] da Comarca ..., o Ministério Público acusou 1.

AA, solteiro, vendedor, nascido a .../.../1986, na freguesia ... do concelho ..., filho de BB e de CC, residente na Rua ..., em ..., ..., pela prática

  1. Em autoria matéria e na forma consumada, de - um crime de furto qualificado, previsto e punido pelo artigo 204.º, n.º 1, alínea e) e n.º 2, alínea a), por referência aos artigos 202.º, alínea b) e 203.º, n.º 1, todos do Código Penal; - um crime de burla informática, previsto e punido pelo artigo 221.º, n.º 1 e n.º 5, alínea a), do Código Penal; - um crime de falsidade informática, previsto e punido pelo artigo 3.º, n.ºs 1, 2 e 3 da Lei n.º 109/2009, de 15 de setembro.

  2. em coautoria material e na forma consumada, de um crime de falsificação ou contrafação de documentos, previsto e punido pelo artigo 256.º, n.º 1, alínea d) e n.º 3, do Código Penal.

    1. CC, casado, operário fabril, nascido a .../.../1968, na freguesia ... do concelho ..., filho de DD e de EE, residente na Rua ..., em ..., ..., pela prática, em coautoria material e na forma consumada, de um crime de falsificação ou contrafação de documentos, previsto e punido pelo artigo 256.º, n.º 1, alínea d) e n.º 3, do Código Penal.

    A Santa Casa da Misericórdia ... pediu a condenação do Arguido AA a pagar-lhe a quantia de € 49 920,69 (quarenta e nove mil novecentos e vinte euros e sessenta e nove cêntimos), a título de indemnização por danos patrimoniais que afirma ter suportado, acrescida de juros de mora vencidos, no montante de € 4 890,86 (quatro mil oitocentos e noventa euros e oitenta e seis cêntimos), e vincendos até efetivo e integral pagamento.

    O Arguido CC apresentou contestação escrita, onde invoca não ter praticado os factos que sustentam a acusação e oferece o merecimento dos autos.

    O Arguido CC apresentou contestação escrita, onde invoca padecer de problema de adição ao jogo, que constitui a géneses dos factos descritos na acusação e que o obriga a tratamento psiquiátrico.

    Alega, ainda, ter providenciado pela exclusão de acesso a salas de jogo reais e virtuais.

    Que se encontra a pagar a dívida à Santa Casa de Misericórdia ....

    Que é delinquente primário. E que tem inserção familiar, profissional e social.

    Realizado o julgamento, perante Tribunal Coletivo, por acórdão proferido e depositado a 14 de dezembro de 2022, foi decidido: «

  3. Julgar a acusação parcialmente procedente e, em consequência: - Absolver o arguido AA da prática de um crime de falsidade informática, p. e p. pelo art. 3.º n.º 2 da Lei do Cibercrime; - Absolver o arguido AA da prática de um crime de falsificação de documento agravada, p. e p. pelos arts. 256.º n.º 3 do Cód.Penal; - Absolver o arguido CC da prática de um crime de falsificação de documento agravada, p. e p. pelos arts. 256.º n.º 1 al. d) e n.º 3 do Cód.Penal; b) Condenar o arguido AA pela prática, como autor material, de: · um crime de furto qualificado, p. e p. pelo art. 204.º n.º 2 al. b) do C. Penal da pena de 4 (quatro) anos e 6 (seis) meses de prisão; · um crime de burla qualificada, p. e p. pelo art. 221.º n.º 1 e n.º 5 al. a) do C. Penal na pena de 2 (dois) anos e 6 (seis) meses de prisão; · um crime de falsidade informática, p. e p. pelo art. 3.º n.ºs 1 e 3 da Lei do Cibercrime, na pena de 1 (um) ano de prisão; · um crime de falsificação de documento, p. e p. pelo art. 256.º n.º 1 d) do Cód.Penal, na pena de 1 (um) ano e 6 (seis) meses de prisão.

  4. Em cúmulo jurídico de penas, condenar o arguido AA na pena única de 7 (sete) anos de prisão.

  5. Condenar o arguido AA nas custas devidas a título criminal, fixando-se a taxa de justiça em 2 UC`s.

  6. Julgar parcialmente procedente o pedido de indemnização civil e, em consequência, condenar o demandado a pagar à demandante Santa Casa da Misericórdia ... a quantia de 22.375,27€ (vinte e dois mil, trezentos e setenta e cinco euros e vinte sete cêntimos), acrescida de juros de mora à taxa legal, contados desde a data da notificação para contestar até integral pagamento; f) Condenar o demandado e a demandante nas custas do enxerto cível na proporção do respetivo decaimento.» Inconformado com tal decisão, o Arguido dela interpôs recurso, extraindo da respetiva motivação as seguintes conclusões [transcrição]: «I - O Recorrente foi condenado, pela prática, em autoria material, um crime de furto qualificado, p. e p. pelo art. 204.º n.º 2 al. b) do C. Penal da pena de 4 (quatro) anos e 6 (seis) meses de prisão, de um crime de burla qualificada, p. e p. pelo art. 221.º n.º 1 e n.º 5 al. a) do C. Penal na pena de 2 (dois) anos e 6 (seis) meses de prisão; um crime de falsidade informática, p. e p. pelo art. 3.º nº.s 1 e 3 da Lei do Cibercrime, na pena de 1 (um) ano de prisão; um crime de falsificação de documento, p. e p. pelo art. 256.º nº. 1 d) do Cód.Penal, na pena de 1 (um) ano e 6 (seis) meses de prisão, e em cúmulo jurídico na pena única de 7 (sete) anos de prisão, com a qual não se conforma por excessiva, desadequada, desproporcional e injusta.

    II - O recorrente insurge-se ainda por erradamente o acórdão ter dado como provado o ponto 61 dos factos provados, quando teria que ter sido dado como provado que o recorrente mostrou arrependimento.

    III - O recorrente prestou declarações confessórias em audiência de julgamento, participou proactivamente com a Policia Judiciária na investigação IV - Praticou diversos atos para tentar ressarcir os danos causados, até onde lhe era possível.

    V - Ao dar como provado os pontos 29, 30, 31, 33, 34, 35, 36, 38 e 39, conjugando com o facto de o arguido não ter qualquer tipo de antecedentes criminais, não ter praticado quaisquer crime após os factos, estar inserido social, familiar e profissionalmente bem inserido, eram razões bastantes para ser aplicada uma atenuação especial da pena.

    VI - Decorre igualmente que interiorizou de forma evidente o desvalor da sua conduta e realizou o perigo que representa a adição ao jogo pelo que se encontra a ser acompanhado por médico psiquiatra.

    VII - O Tribunal a quo deveria ainda ter considerado também por provado que “Não se apurou que o arguido tenha tido qualquer lucro com o dinheiro indevidamente apropriado à Santa Casa da Misericórdia para além do aplicado em apostas de jogo.” VIII - Inexiste nos autos qualquer elemento de prova que faça com que se possa concluir que o arguido tenha tido qualquer lucro pessoal do dinheiro resultante das apostas, para além das quantias que aplicava de imediato em novas apostas online.

    IX - Todos os atos ilícitos que o recorrente praticou ocorreram exclusivamente pela adição ao jogo, tratando-se de uma circunstância exógena.

    X - Sendo uma disposição das coisas que ele não domina, não sendo tanto uma circunstância facilitadora mas, mais propriamente, incentivadora da prática ilícitos em causa e que determina consequentemente a uma diminuição especial da culpa do agente, a qual não foi valorada em sede de Acórdão, quando deveria ter sido.

    XI - As penas parcelares são ainda extremamente excessivas e gravosas.

    XII - Desde logo, os valores em causa furtados, nunca ultrapassaram em cada situação a quantia de 369,03 euros.

    XIII - Foram precisos três anos para que a Santa Casa da Misericórdia considerasse como criminalmente relevante a conduta que o recorrente vinha a adotar com o dinheiro desta.

    XIV - O recorrente imediatamente assumiu as suas responsabilidades e encetou diligencias para proceder à reparação dos danos causados até onde lhe era possível.

    XV - Reconhece-se naturalmente que a soma dos valores apurados ao longo de três anos atingem um valor consideravelmente elevado, mas humildemente se entende que o grau de ilicitude é médio-baixo tendo em conta os valores que eram subtraídos de cada vez, que eram próximos de valores diminutos por um lado, como por outro a pessoa coletiva a quem foi subtraído essas quantias monetárias não passou por intermédio dessas condutas dificuldades financeiras ou de subsistência...

    XVI - A este propósito, conforme relatório de contas da Santa Casa da Misericórdia, em https://www.scml.pt/, o património ativo desta, fixava-se no ano de 2019 no valor de € 888.029.088,00 (oitocentos e oitenta e oito milhões vinte e nove mil e oitenta e oito euros).

    XVII - Deverá proceder-se à correta alteração da classificação do dolo direto para eventual, como atenuação do grau de conduta do recorrente, a valorar na fixação das penas parcelares, e da pena a fixar em cúmulo.

    XVIII - É manifestamente notório que o recorrente agiu somente por impulso da doença, e conformava-se com o resultado previsto como possível no momento das suas condutas, já que por um lado nunca negou a factualidade imputada, assumiu prontamente aquando do seu despedimento a sua responsabilidade e a própria natureza dos crimes, nomeadamente burla informática, falsidade informática, falsificação de documento, e furto de quantias monetárias constantes em documentos contabilísticos, é manifestamente notório à luz da experiencia comum que mais cedo ou mais tarde iria ser apanhado pela entidade patronal.

    XIX - O recorrente também não se conforma não ter sido valorado pela decisão recorrida o facto das necessidades de prevenção geral não se sobreponham sobre as necessidades de prevenção especial serem diminutas.

    XX - O Tribunal a quo deveria ter considerado como proporcional, justa e adequada a condenação nas penas parcelares da seguinte forma: XXI - pena não superior a três anos e seis meses de prisão relativamente ao crime de furto qualificado; XXII - pena de multa relativamente ao crime de burla informática; XXIII - pena de multa relativamente ao crime de falsidade informática; XXIV - pena de multa relativamente ao crime de falsificação de documento.

    XXV - Em cúmulo jurídico não deveria ser aplicada uma pena de prisão superior a 5 anos de prisão.

    XXVI - Pena essa, por existir um juízo de prognose favorável...

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