Acórdão nº 167/22.7T8AMR.G2 de Tribunal da Relação de Guimarães, 27 de Abril de 2023
Magistrado Responsável | RAQUEL REGO |
Data da Resolução | 27 de Abril de 2023 |
Emissor | Tribunal da Relação de Guimarães |
ACÓRDÃO NO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE GUIMARÃES PROCESSO 167/22.7T8AMR.G2 Relatora: Raquel Rego 1º Adjunto: Jorge Teixeira 2ª Adjunta: Maria Amália Santos I – RELATÓRIO E..., UNIPESSOAL, L.DA, sociedade comercial por quotas, com sede na Rua – ... – ..., propôs a presente ação declarativa comum contra G..., S.A., pedindo que seja a Ré condenada a pagar à Autora a quantia de €11.567, 44 (onze mil, quinhentos e sessenta e sete euros e quarenta e quatro cêntimos), acrescida dos juros que, à taxa legal, desde a citação até efetivo e integral pagamento.
A quantia é relativa a indemnização resultante de um sinistro que teve como causa a inexistência de uma “tampa de esgoto” na rua da cintura, em ... (sentido ... – ...).
Invoca que só a omissão, consubstanciada numa conduta grosseira, negligente e transgressional do Município ..., foi causa única e adequada à deflagração do acidente dos autos, já que, deveria ter diligenciado por tapar o buraco do saneamento e/ou sinalizar devidamente o mesmo, o que, desde logo, não fez.
A ré contestou dizendo que, na versão da autora, o aludido Município terá violado o seu dever de conservação e manutenção de uma via pública, que estava sob o seu domínio, o que terá gerado danos num veículo.
Sendo o Município ... um ente público e achando-se em causa o pagamento à autora de uma indemnização que será devida por causa de ato praticado pelo Município, é de concluir que o presente litígio se prende com a realização de tarefas de interesse público, emergindo de uma relação jurídico administrativa.
Assim, conclui, face ao que se estatui no artº 1º, nº 1 e 4.º n.º 1, f) do ETAF, a causa pertence à jurisdição administrativa e ocorre incompetência da incompetência material do tribunal.
No conhecimento desta excepção, o tribunal a quo proferiu a seguinte decisão: « A competência em razão da matéria, enquanto pressuposto processual, é aferida pelo objeto do processo, o qual é conformado pela pretensão do autor, que, assim, delimita o “thema decidendum”.
E distribui-se por diferentes espécies de Tribunais, situados no mesmo plano horizontal, sem nenhuma relação de hierarquia, subordinação ou dependência entre eles.
Desta sorte, a competência afere-se pela estrutura da relação jurídica que se discute, nos termos em que é proposta pelo autor, considerando o pedido do autor e a causa de pedir em que o mesmo se baseia.
De acordo com o disposto no artigo 64.º do Código de Processo Civil são da competência dos Tribunais Judiciais as causas que não sejam atribuídas a outra ordem jurisdicional.
E, nos termos do disposto no artigo 211.º, n.º 1 da Constituição da República Portuguesa (CRP), os Tribunais Judiciais são os tribunais comuns em matéria cível e criminal e exercem jurisdição em todas as áreas não atribuídas a outras ordens judiciais.
Por sua vez, o artigo 212.º, n.º 3 da CRP, prescreve que compete aos Tribunais Administrativos e Fiscais o julgamento das ações e recursos contenciosos que tenham por objeto dirimir litígios emergentes das relações jurídicas administrativas e fiscais.
No caso em apreço, o autor reclama da ré seguradora o pagamento de uma indemnização resultante de um sinistro que teve como causa alegada a inexistência de uma “tampa de esgoto” na rua da cintura, em ... (sentido ... – ...).
Com efeito, conforme alega, “o condutor do veículo da Autora ainda tentou desviar-se, mas sem qualquer sucesso, sendo que, a roda traseira direita do seu veículo caiu num buraco do saneamento, em virtude de não ter a respetiva tampa e o mesmo não estar sinalizado; tendo provocado, no veículo da Autora, os danos constantes do relatório de peritagem e que ascenderam ao valor de €577, 43, …” Ora, a este respeito o artigo 4.º, n.º 1, alíneas g) e h) do ETAF dispõe que compete aos tribunais da jurisdição administrativa responsabilidade extracontratual das pessoas coletivas de direito público …”.
Dito isto, e sabendo-se que é da competência da edilidade a responsabilidade pela manutenção do sistema de esgoto da ..., facilmente se concluir que o presente litígio só pode ocorrer nos tribunais de jurisdição administrativa.- cfr. neste sentido douto Ac. do V.T.R.G. datado de 25-09-2012, disponível in http://www.dgsi.pt/jtrg.nsf/86c25a698e4e7cb7802579ec004d3832/e5be933578e9253a80257a98005157fa?OpenDocument.; e douto Ac. do V.T.R.G., datado de 19-05-2011, disponível in http://www.dgsi.pt/jtrg.nsf/-/158816D37395C8D2802578B7003AECD3.
Assim, em face do exposto, julga-se procedente a exceção de incompetência absoluta deste Tribunal, em razão da matéria, para a apreciação do litígio e, em consequência, absolve-se a ré da instância - cfr. art.ºs 96.º, al. a), 98.º, 99.º, 278.º, n.º 1 al. a) e 577.º, n.º 1, al. a, do C.P.C.».
Inconformada, a autora interpôs o presente recurso, onde conclui nos seguintes termos: 1. Vem o presente recurso de apelação do(a) douto(a) espacho/sentença proferido(a) em 23/01/2023 nos autos supra, que entendeu, mais uma vez e com os mesmos fundamentos, julgar procedente a exceção de incompetência absoluta do Juízo Local Cível ..., em razão da matéria, para apreciação do litígio e, em consequência, absolver a Ré da instância, com a fundamentação aí expressa (e que já havia sido utilizada no douto despacho/sentença proferido(a) em 13/09/2022, o qual foi objeto do recurso datado de 27/09/2022) e que supra reproduzimos.
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E, mais uma vez, não se conforma, a ora Recorrente, com tal decisão que, considera ser incongruente, contraditória, infundamentada e, acima de tudo, ilegal, salvo o devido respeito, entendendo que foram violadas as seguintes disposições legais: (1) artigos 4.º, n.º 1, alíneas g) e h) do Estatuto dos Tribunais Administrativos e Fiscais, artigos 64.º e 615.º, n.º 1, alínea c) do Código de Processo Civil, artigos 211.º, n.º 1 e 212.º, n.º 3 da Constituição da República Portuguesa.
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De facto, a própria decisão recorrida fundamenta desde logo a sua decisão na premissa que “A competência em razão da matéria, enquanto pressuposto processual, é aferida pelo objeto do processo, o qual é conformado pela pretensão do autor, que, assim, delimita o “thema decidendum”, acrescentando que, “Desta sorte, a competência afere-se pela estrutura da relação jurídica que se discute, nos termos em que é proposta pelo autor, considerando o pedido do autor e a causa de pedir em que o mesmo se baseia.” 4. E, apesar...
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