Acórdão nº 374/22.2T8LRA.C1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 27 de Abril de 2023

Magistrado ResponsávelANA PAULA LOBO
Data da Resolução27 de Abril de 2023
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Recorrentes: Francisco Neves Costa, réu.

Recorrida: PARUPS, S.A., autora.

* Acordam na 2ª secção cível do Supremo Tribunal de Justiça I – Relatório Na acção declarativa sob a forma de processo comum, a autora formulou contra o réu os seguintes pedidos de condenação:

  1. A reconhecer o direito de propriedade da A. sobre o imóvel e, consequentemente, entregar imediatamente, livre de pessoas e bens e em bom estado de conservação; b) A pagar à A. a quantia de 15.500,00€, respeitante a ocupação indevida que causou esse prejuízo à A., acrescido de juros de mora à taxa legal.

    Por sentença proferida pelo Juiz ... do Juízo Central Cível ... do Tribunal Judicial da Comarca de Leiria veio o réu a ser absolvido da instância com fundamento em excepção de caso julgado relativamente ao processo n.º 4192/17...., do Juízo Central Cível ..., Juiz ....

    Em recurso de apelação interposto pela autora o Tribunal da Relação de Coimbra, por acórdão proferido em 22 de Novembro de 2022 veio aquela anterior decisão a ser revogada por não verificação da excepção de caso julgado.

    O réu pede revista deste acórdão com a apresentação de alegações que terminam com a seguintes conclusões: 1.

    Autora/Recorrida intentou a presente ação declarativa contra o Réu/Recorrente, tendo este apresentado a sua Contestação, alegando o que acima se transcreveu, tendo sido proferida decisão judicial que, julgando procedente a exceção do caso julgado, absolveu o Réu/Recorrente da instância; 2.

    A Autora/Recorrida interpôs recurso para a 2.ª instância, concluindo pela procedência do recurso, tendo o mesmo sido julgado procedente, determinando-se a revogação da decisão recorrida, pese embora o Tribunal da Relação entender simultaneamente que “na presente situação foi inicialmente proposta uma ação pela Autora contra o Réu em que se formularam exatamente os mesmos pedidos deduzidos na presente ação – reconhecimento do direito de propriedade e indemnização pela ocupação do prédio, alicerçados em causa de pedir idêntica”; 3.

    I - Objeto do Recurso: Vem o presente recurso interposto do douto Acórdão, proferido pelo Tribunal da Relação de Coimbra, que julgou procedente o recurso interposto pela Autora/Recorrida, tendo alterado a decisão de 1.ª instância, a qual julgara totalmente procedente a invocada exceção de caso julgado, absolvendo da instância, em consequência, o Réu/Recorrente; 4.

    II – Questão prévia – admissibilidade do recurso: Encontram cumpridos os critérios da alçada e da sucumbência que admitem a interposição do presente recurso de revista, nos termos previstos nos artigos 671.º, n.os 1 e 3 CPC, visto que o Acórdão recorrido não vem confirmar a decisão da1.ª instância, mas antes alterá-la no sentido supratranscrito, nos termos decisórios aí expressos e que aqui se dão por integralmente por reproduzidos para os devidos efeitos legais, inexistindo dupla conforme, devendo o presente recurso ser admitido, o que se requer, com todas as consequências legais daí resultantes; 5.

    III – Motivação: Estão verificados os requisitos de que depende a repetição da causa, desde logo, no que diz respeito à identidade de sujeitos, é incontroverso que existe identidade de sujeitos, como reconhecido por ambas as partes; 6.

    No que tange à identidade de pedido, não obstante o valor pedido a título de indemnização não coincidir, também é certo que o pedido não tem de ser exatamente igual em ambas as ações. Basta que sejam idênticos; 7.

    Há identidade de pedido quando se verifica coincidência da tutela jurisdicional reclamada e do conteúdo e objeto do direito impetrado, não devendo o pedido ser entendido na pura literalidade em que se declara o petitório, mas com o alcance que decorre da respetiva conjugação como os fundamentos da pretensão arrogada, por forma a compreender o modo específico da pretendida tutela jurídica, pois a identidade dos pedidos é perspetivada em função da posição das partes quanto à relação material: existe tal identidade sempre que ocorra coincidência nos efeitos jurídicos pretendidos, do ponto de vista da tutela jurisdicional reclamada e do conteúdo e objeto do direito reclamado, sem que seja de exigir uma adequação integral das pretensões, nem sequer do ponto de vista quantitativo; 8.

    Ocorre identidade de pedido quando o efeito prático-jurídico pretendido pelo autor em ambas as ações é substancialmente o mesmo, e é precisamente o que ocorre nos presentes autos; 9.

    Quanto à identidade da causa de pedir: a causa de pedir consiste na alegação da relação material de onde o autor faz derivar o correspondente direito e, sendo a causa de pedir um facto jurídico concreto, simples ou complexo, do qual emerge a pretensão deduzida, haverá que procurá-la na questão fundamental levantada nas duas ações; 10.

    Não é apenas a conclusão ou dispositivo da sentença que tem força de caso julgado, aceitando-se como mais equilibrado um critério eclético, que, sem tornar extensiva a eficácia do caso julgado a todos os motivos objetivos da sentença, reconhece, todavia, essa autoridade à decisão daquelas questões preliminares que forem antecedente lógico indispensável à emissão da parte dispositiva do julgado, em homenagem à economia processual, ao prestígio das instituições judiciárias quanto à coerência das decisões que proferem e, finalmente, à estabilidade e certeza das relações jurídicas e assim se tem entendido, de forma consistente, na jurisprudência do Supremo Tribunal de Justiça: 11.

    Há identidade de causa de pedir quando a pretensão deduzida nas duas demandas procede do mesmo facto jurídico, entendendo-se a causa de pedir como o próprio facto jurídico genético do direito, donde se deverá atender a todos os factos invocados que forem injuntivos da decisão, correspondendo, pois, à alegação de todos os factos constitutivos do direito e relevantes no quadro das soluções de direito plausíveis a que o tribunal deva atender, independentemente da coloração jurídica dada, sendo que a causa de pedir deve ser preenchida com os factos essenciais causantes do efeito jurídico pretendido” e não há dúvidas de que a pretensão deduzida nas duas ações em causa procede do mesmo facto jurídico; 12.

    Considerando a matéria factual em causa em ambas as ações e o que foi decidido, os factos jurídicos em causa dizem respeito precisamente à mesma matéria de facto e de direito, sendo os factos nucleares idênticos e as normas jurídicas aplicáveis exatamente as mesmas; 13.

    Em ambas as ações, por se tratar de reivindicação, a causa de pedir é complexa, a Autora/Recorrida alega ser titular do direito de propriedade com fundamento em presunção do registo predial a seu favor e na aquisição derivada, bem como na ocupação indevida do Réu/Recorrente, existindo, deste modo, identidade de causa de pedir; 14.

    O Acórdão recorrido entendeu que não existe identidade de causa de pedir porque considera que o período temporal da ocupação por parte do Réu/Recorrente é distinto em ambas as ações. Porém, é claro como a água que a questão do diferente período temporal apenas foi mencionada em sede do articulado de resposta apresentado pela Autora/Recorrida, pois, na sua Petição Inicial (que é o articulado relevante para aferir a causa de pedir) não foi devidamente alegado um período temporal diferente da outra ação; 15.

    Pela Autora/Recorrida não foi formulado, na petição inicial, e nos termos legalmente previstos, o pedido nos termos agora pretendidos pela mesma, mais precisamente no que diz respeito ao período temporal, bem sabendo o que se encontra estabelecido no n.º 3, do artigo 581.º do CPC; 16.

    É o pedido que circunscreve o âmbito da decisão final, uma vez que é ele que desenha o círculo dentro do qual o tribunal se tem de mover para dar solução ao conflito de interesses que é chamado...

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