Acórdão nº 630/20.4T8PVZ.P1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 27 de Abril de 2023

Magistrado ResponsávelFÁTIMA GOMES
Data da Resolução27 de Abril de 2023
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam no Supremo Tribunal de Justiça I. Relatório 1.

AA instaurou a presente ação declarativa de condenação, com forma de processo comum, contra BB, CC, DD e EE, pedindo a condenação dos quatro Réus a: «a) ver declarado que, decidido que está, com autoridade de caso julgado nas doutas decisões de 09.11.2015 e no douto acórdão 322/14...., de 27.10.2016, que os bens nos valores descritos acima em nos artigos 8.º e 11 são doações feitas por FF ao R. BB no montante de € 69.240,88; que os valores descritos acima nos artigos 10.º e 12.º são doações feitas por FF aos RR BB e DD no montante de € 92.700,00; e que o valor descrito no artigo 18.º é uma doação feita por FF aos quatro Réus, na proporção de 62.500,00 para o 1ª e 2ª RR e 62.500,00 para o 3º e 4ª RR, a.1) – ver, agora declarado, que se trata de doações puras, no valor global de € 286.940,88 (duzentos e oitenta e seis mil novecentos e quarenta euros e oitenta e oito cêntimos), não oneradas com quaisquer encargos, a.2) – assim devendo ser consideradas para efeito da determinação do quinhão legitimário da aqui A. na herança aberta por óbito do doador das mesmas, como já peticionado pela A. no inventário que correu termos no Tribunal Judicial da Comarca do Porto Este, Juízo Cível ..., sob o número 322/14.3... (anteriormente com o n.º 1...4/1999 do ... Juizo do Tribunal Judicial da Comarca de Amarante), em que A. e RR foram partes para o efeito de aí, em partilha adicional – artº 1129, nº 1 do C.P.C. ser declarado que as doações de que foram beneficiários excedem em € 136.772,94, aquele quinhão legitimário; e b) verem operada, a consequente redução das doações, tendo em conta a antiguidade das mesmas, e, em consequência, serem os réus condenados a entregar à A. a quantia de € 136.772,94 (cento e trinta e seis mil setecentos e setenta e dois euro e noventa e quatro cêntimos e noventa e quatro cêntimos); c) mais se requer que, por se terem recusado a fazer imputar na herança as doações acima, quando citados para o inventário como donatários, sejam os réus condenados a pagar os respetivos juros de mora à taxa legal desde a citação para a presente ação e até integral e efetivo pagamento, sobre o valor acima em dívida de € 136.772,94 (cento e trinta e seis mil setecentos e setenta a dois euros e noventa e quatro cêntimos) ou aquele que se vier a determinar como sendo o de redução».

2.

Citados, os RR. ofereceram contestação, na qual, por excepção, invocaram a caducidade do direito à acção e a ilegitimidade passiva das RR. CC e EE, tendo passado depois a impugnar parcialmente os factos alegados na petição inicial, a não verificação de caso julgado que possa suportar o pedido da al. a), defendendo, por mais fundamentos invocados, a improcedência da acção.

3.

Frustrou-se uma tentativa de conciliação.

4.

Teve lugar audiência prévia, na qual o tribunal: - Fixou o valor processual da causa em € 423.713,82.

- Julgou verificada a existência de nulidade decorrente de erro na forma de processo quanto aos pedidos formulados nas alíneas b) e c) da petição inicial e, em consequência, absolveu os RR. da instância, quanto aos referidos pedidos.

- Julgou improcedentes as invocadas exceções da caducidade da ação e da ilegitimidade das RR.

- Identificou o objeto do litígio como sendo decidir a reclamação apresentada por BB e DD contra a relação de bens apresentada pela cabeça-de-casal no processo de inventário n.º 322/14.3..., que foi instaurado na sequência do óbito de FF.

- Enunciaram-se os seguintes temas de prova: 1º- Circunstâncias em que foram efetuadas as doações invocadas nos art.ºs 8º a 13º da petição inicial; 2ª- Utilização das referidas doações, nos termos alegados no art.º 18º da petição inicial; 3º- Circunstâncias em que foi efetuada a doação invocada nos art.ºs 1º a 23º da petição inicial.

- Pronunciou-se sobre os meios de prova.

5.

Na 1ª instância o objecto do litígio foi delimitado: “Constitui objeto do litígio – na sequência da reclamação dirigida por BB e DD contra a relação de bens apresentada pela cabeça-de-casal no processo de inventário n.º 322/14.3..., instaurado na sequência do óbito de FF; tendo presente o decidido no douto Acórdão do Tribunal da Relação do Porto de 27-10-2016, proferido no âmbito do processo de inventário n.º 322/14.3..., no qual se determinou «a remessa dos interessados para os meios comuns, a fim de aí, após mais profunda indagação dos factos controvertidos, ser decidido o incidente de reclamação contra a relação de bens»; bem como o alegado na petição inicial que deu origem ao presente processo e a decisão já proferida na audiência prévia, pela qual se julgou verificada a nulidade decorrente de erro na forma de processo quanto aos pedidos formulados nas alíneas b) e c) da petição inicial e, em consequência, foram os Réus absolvidos da instância, quanto aos referidos pedidos – decidir se as verbas 5, 6, 8, 9 e 11 da relação de bens apresentada no âmbito do processo de inventário n.º 322/14.3... deverão ou não ser mantidas.

A questão essencial decidenda é a seguinte: apurar se as verbas 5, 6, 8, 9 e 11 da relação de bens correspondem a doações realizadas por FF a favor de BB e DD.” 6.

Teve lugar a audiência final, em duas sessões, após a qual foi proferida sentença que culminou com o seguinte dispositivo, ipsis verbis: «Pelo exposto, julga-se parcialmente procedente a ação e, em consequência: III. a) Determina-se que a verba 6 seja mantida na relação de bens e que a verba 9 seja mantida na relação de bens, mas com a seguinte redação: Verba 9 – A quantia de € 17.422,89 (dezassete mil, quatrocentos e vinte e dois euros e oitenta e nove cêntimos), relativa a um depósito a prazo, depositada na conta n.º ...68, domiciliada no Banco Português de Investimento, S.

A., Balcão ..., doada por FF a BB e DD, e por estes aceite; III .b) Determina-se que as verbas 5, 8 e 11 sejam excluídas da relação de bens.

Condenam-se Autora e Réus a pagar as custas, na proporção do respetivo decaimento (art.

527.º do Código de Processo Civil).

» 7.

Inconformada, recorreu a A., para o Tribunal da Relação, que conheceu do recurso de apelação e delimitou o seu objecto às questões: 1. Nulidade processual por omissão e pronúncia; 2. Erro de julgamento na decisão proferida em matéria de facto; 3. Violação da autoridade do caso julgado; 4. Violação das regras do ónus da prova (verba nº 11); 5. Caraterísticas da doação da verba nº 11 e o dever da sua relacionação, assim como a posição das RR. mulheres relativamente à questão da verba nº 11 da relação de bens.

8.

O Tribunal da Relação deu a seguinte resposta a essas questões: 1.

Nulidade processual por omissão e pronúncia – procedente, porque: “Ao não se ter pronunciado sobre as caraterísticas das doações, designadamente se eram doações puras, modais ou mesmo remuneratórias, o tribunal a quo cometeu nulidade da sentença por omissão de pronúncia” 2.

Erro de julgamento na decisão proferida em matéria de facto – procedente, porque: “Este facto, essencialmente, dado como não provado pelo tribunal recorrido, deve transitar para os factos provados, nos seguintes termos: 20-A) FF não visou receber nem recebeu de BB nem de DD, nem dos respetivos cônjuges, qualquer valor, por causa do contrato de «CESSÃO DA POSIÇÃO CONTRATUAL COM COMODATO», designadamente a quantia de € 125.000,00 a que se refere a respetiva cláusula terceira.

Elimina-se o ponto 25 da matéria dada como não provada.” 3.

Violação da autoridade do caso julgado – não ocorreu, porque: “É essa precisamente a decisão da Relação no acórdão de 27.10.2016 ao ordenar a remessa para os meios comuns para que se conheça dos factos controvertido e se decida o incidente de reclamação contra a relação de bens apresentada pelos requeridos apelantes, ou seja, a totalidade da matéria controvertida no âmbito do incidente da reclamação de bens.

Andou bem o tribunal recorrido em conhecer das doações, afirmando ou negando a sua existência e alterando a relação e bens.” 4.

Violação das regras do ónus da prova (verba nº 11) – procedente, porque: “Aqui chegados, será de concluir que a A. cabeça-de-casal, desde logo atenta essa sua qualidade, tem o ónus de provar que determinados bens foram doados pelo inventariado aos RR., e estes, feita a prova das doações, têm o ónus de alegar e demonstrar os factos que os favorecem, designadamente, factos de onde se possa extrair que as doações de que foram donatários não devem ser objeto de redução por inoficiosidade, ou, mais concretamente, que foram doações modais, por exemplo.

A única matéria de facto objeto de impugnação foi o ponto 25 dado como não provado, que passou a ser um facto provado.

Os RR. não só não provaram que o FF recebeu dos RR. um valor relacionado com...

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