Acórdão nº 564/20.2T8ANS-B.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 28 de Julho de 2023

Magistrado ResponsávelFONTE RAMOS
Data da Resolução28 de Julho de 2023
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

Relator: Fonte Ramos 1.º Adjunto: Alberto Ruço 2.º Adjunto: Vítor Amaral Acordam no Tribunal da Relação de Coimbra: I. Em 20.02.2020, AA (na qualidade de Administrador do Condomínio do Prédio Urbano correspondente ao Lote .../A da Urbanização ..., ...) instaurou, na Comarca ... (Juízo de Execução), ação executiva para pagamento de quantia certa contra BB, pretendendo obter o pagamento da quantia de € 29 259,97, correspondente ao objeto da condenação na sentença dada à execução.

No decurso da execução e na sequência de requerimento do exequente de 09.9.2022 e da resposta do executado de 22.9.2022, a Mm.ª Juíza do Tribunal a quo proferiu o seguinte despacho (de 12.10.2022): «(...) Efetuadas pesquisas nas bases de dados, verifiquei que o Executado é titular de vários prédios (frações) e não apenas da Fração ... do prédio descrito na ... CRP ... sob o n.º ...64 (bens próprios), nem da fração ... do prédio descrito na CRP ... sob o n.º ...34 (bem comum).

Pelo que, ainda que a AT esteja impedida de prosseguir a execução quanto ao imóvel que constitui casa de morada de família, não está impedida de fazer prosseguir a execução com a venda dos demais prédios penhorados nessa execução fiscal, incluindo, assim, da fração ... do prédio descrito na CRP ... sob o n.º ...34.

O mesmo se diga quanto ao Exequente.

De facto, não sendo esta uma execução hipotecária e existindo outros bens na titularidade do Executado, impõe-se que prossigam as diligências de execução quanto a tais bens ou, em alternativa, que o Exequente impulsione a execução fiscal no que tange aos demais prédios que, necessariamente, não poderão constituir casa de morada de família.

Inexistindo bens próprios do Executado, deverá a execução prosseguir contra bens comuns do casal composto pelo Executado.

De referir, por fim, que o nosso sistema jurídico não prevê a penhora de meações conjugais, quando entre o executado e o seu cônjuge vigore um regime de comunhão conjugal que abranja os bens visados. Neste pressuposto e considerando que cada um dos cônjuges é proprietário da totalidade da coisa (em comunhão conjugal), haverá sempre que penhorar o bem alvo da medida na sua totalidade (e não uma sua quota ou meação sobre ele) e, ulteriormente, vendê-lo no âmbito do processo judicial em causa.

» Inconformado, o exequente apelou formulando as seguintes conclusões: 1ª - O despacho recorrido indefere o peticionado pelo Recorrente quanto à reversão de sustação referente ao imóvel que configura habitação própria permanente do Executado e em consequência, não ordenou, nos termos e para os efeitos do artigo 786º do Código de Processo Civil (CPC), a Citação da Autoridade Tributária para, querendo, reclamar nos presentes autos os seus créditos que detém sobre o Executado.

2ª - No dia 12.10.2021, foi o Exequente notificado pela Exma. Sra. Agente de Execução (AE), nos termos e para os efeitos do n.º 2 do art.º 794º do CPC, da decisão de sustação elaborada nos presentes autos, para, querendo, no prazo de 15 dias reclamar os seus créditos no processo de execução fiscal n.º ...86 e apensos, do Serviço de Finanças ....

3ª - Nos presentes autos, entre outros, havia sido penhorada a Fração autónoma designada pela letra ..., do prédio Urbano inscrito na respetiva matriz predial com o artigo ...18 e descrito na 1ª Conservatória do Registo Predial (CRP) de ..., sob o n.º ...64 ..., casa de morada de família do Executado, a qual já se encontrava penhorada à ordem do supra mencionado processo de execução fiscal e seus apensos.

4ª - Em 05.11.2021, veio o supra mencionado serviço de Finanças devolver a aludida peça processual, com o argumento que “(…) uma vez que, não tendo sido aberto concurso de credores, é a reclamação de créditos intempestiva”, invocando o art.º 240º, n.º 3 do CPPT.

5ª - Tratando-se de casa de morada de família do Executado, a Autoridade Tributária (AT), por força do 244º, n.º 2 do CPPT, na redação conferida pela Lei n.º 13/2016, de 23.5, não pode proceder à “venda de imóvel destinado exclusivamente a habitação própria e permanente do devedor ou do seu agregado familiar, quando o mesmo esteja efetivamente afeto a esse fim.” 6ª - Na sequência do posicionamento adotado pela AT, veio o Recorrente dirigir aos Autos requerimento, em 22.11.2021, por via do qual requeria que o Tribunal ordenasse “…reverter a decisão de sustação referente ao bem melhor identificado no artigo 2 do presente Requerimento, e em consequência, se digne ordenar, nos termos e para os efeitos do artigo 786º do Código de Processo Civil, a Citação da Autoridade Tributária para, querendo, reclamar nos presentes autos os seus créditos que detém sobre o Executado”.

7ª - No seguimento do requerido veio o Tribunal a proferir despacho por via do qual imputava ao Recorrente o ónus de demonstrar qual o fundamento pelo qual os autos de execução fiscal se encontravam sustados.

8ª - O que veio a verificar-se com a junção, em 23.02.2022, de Certidão emitida pela AT, datada de 12.02.2022, por via da qual a AT veio confirmar que o imóvel em questão corresponde ao domicílio fiscal do Executado e que nessa data se encontravam reunidas as condições para se verificar o impedimento previsto no n.º 2 do art.º 244º do CPPT.

9ª - Não conformado com a Certidão junta pela AT, o Tribunal veio solicitar àquela entidade que viesse esclarecer a “alegada” contradição existente naquela quando se aludia à falta de comprovação presencial da afetação do imóvel e a conclusão de que se encontravam verificados os pressupostos do preenchimento do impedimento do n.º 2 do art.º 244º do CPPT – cf. despacho de 29.3.2022.

10ª - Em resposta veio a AT inicialmente informar que tentou efetuar diligências no sentido de verificar presencialmente a efetiva afetação do imóvel e, subsequentemente, após insistência do Recorrente, confirmar que tentou, presencialmente, estabelecer contacto sem que lhe fosse aberta a porta do prédio.

11ª - Perante esse posicionamento, invocou o Recorrente que, nos termos do Código do IRS, no n.º 12 do seu art.º 13º, se refere que: “o domicílio fiscal faz presumir a habitação própria e permanente do sujeito passivo que pode, a todo o tempo, apresentar prova em contrário” e, por esse facto, requereu que fosse o Executado notificado para, querendo, vir afastar essa presunção, bem como fosse a AT notificada para vir esclarecer se pretendia – ou não – vender o aludido imóvel em sede de execução fiscal.

12ª - Pelo que do supra citado artigo se retira que não terá de ser a AT a atestar a afetação do imóvel à habitação própria permanente do Executado, face à presunção legal naquele artigo consagrada.

13ª - O Executado, no passado dia 22 de setembro, veio aos autos assumir que o aludido imóvel configura efectivamente sua habitação própria permanente, não só não afastando a presunção legal supra, como veio cabalmente confirmar tal evidência.

14ª - Nessa esteira, não podendo ser vendido o imóvel penhorado nos autos de execução fiscal, bem como face ao indeferimento da reclamação de créditos apresentada pelo Exequente, o mesmo ficará impossibilitado ver satisfeito o crédito que detém sobre o Executado, pela via da Execução Fiscal onde se encontra – primariamente – este imóvel penhorado.

15ª - Não obstante veio o Tribunal, por via do despacho em crise, decorrido cerca de 1 ano desde o requerimento inicial e depois de devidamente esclarecida e clarificada a impossibilidade de venda do imóvel em sede de execução fiscal – por via do disposto no n.º 2 do art.º 244º do CPPT – a não se pronunciar sobre o levantamento da requerida sustação da execução relativamente à fração em causa (a habitação própria e permanente do executado) o que, obviamente, face ao nele constante (no despacho) configura um claro indeferimento da pretensão do recorrente.

16ª - E, mais que isso, a selecionar e escolher os bens da titularidade do executado que o exequente / recorrente pode penhorar, sem cuidar de sequer analisar ou aferir se os mesmos se encontram (ou não) desonerados.

17ª - Por outro lado, apesar de, durante cerca de 1 ano, se constar que a AT não pretende prosseguir os autos de Execução Fiscal – inclusivamente já recusou, no âmbito do processo de execução fiscal – uma reclamação de créditos com o fundamento de não ter sido aberto concurso de credores, o Tribunal não se abstém de convidar o exequente / recorrente a praticar atos inúteis, sugerindo que o mesmo “impulsione” a execução Fiscal! 18ª - Ora, salvo todo o respeito por opinião diversa o Tribunal erra manifestamente na prolação da decisão da qual nesta sede se recorre, pois que, para além de dever proceder ao levantamento da sustação dos presentes autos executivos no que concerne ao imóvel em discussão como, também, deveria abster de escolher quais os bens que o exequente deverá penhorar.

19ª - “Ao prosseguimento da execução comum, onde foi efetuada a segunda penhora, não obsta o disposto no art.º 822º do C. Civil, já que, a A.T. pode vir reclamar o seu crédito nesta outra execução, devendo para isso ser notificada ao abrigo do preceituado no art.º 786º do Código de Processo Civil, sendo o seu crédito graduado no lugar que lhe competir”.

20ª - “Se na execução cível for penhorado imóvel que constitua casa de morada de família do executado e se sobre esse imóvel incidia já registo de penhora anteriormente efetuada em execução fiscal - execução esta que se encontra suspensa face ao art.º 244º, n.º 2 do CPPT (redação da Lei 13/2016) - não há lugar à sustação da execução cível, nos termos do art.º 794º, n.º 1 CPC, visto que o imóvel não pode ser vendido naquela execução fiscal, devendo ser vendido na execução cível mediante prévia convocação de credores incluindo a Fazenda Nacional”.

21ª - Ora, certo é que o Executado possui outros bens imóveis que podem ser alvo de penhora, contudo, os mesmos estão onerados, não conferindo ao Exequente qualquer garantia que aquele possa vir a recuperar o seu crédito com a penhora dos referidos bens, sendo que compete ao...

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