Acórdão nº 00756/18.4BEPNF de Tribunal Central Administrativo Norte, 24 de Março de 2023

Magistrado ResponsávelAntero Pires Salvador
Data da Resolução24 de Março de 2023
EmissorTribunal Central Administrativo Norte

Acordam, em conferência, no Tribunal Central Administrativo Norte – Secção do Contencioso Administrativo: I RELATÓRIO 1.

AA, com domicílio profissional na Rua ..., ...

, inconformado, veio interpor recurso jurisdicional da sentença do TAF de Aveiro, datada de 26 de Setembro de 2022, que julgou improcedente a Acção Administrativa que havia instaurado contra o MINISTÉRIO do PLANEAMENTO e INFRAESTRUTURAS, entretanto legalmente substituído pelo MINISTÉRIO da COESAÃO TERRITORIAL (art.º 28.º, n.,º7 do Dec. Lei 32/2022, de 19/5), na qual pedia a anulação do acto administrativo que ordenou a demolição de um muro de vedação inserido na tipologia REN e a apresentação da prova do envio dos resíduos de demolição e construção para operar licenciado.

* 2.

Nas suas alegações recursivas, o Recorrente formulou as seguintes conclusões: “1 – Está em causa nos presentes autos, a impugnação do ato administrativo proferido pelo Senhor Vice-Presidente da Comissão de Coordenação e Desenvolvimento Regional do Centro, em 28.02.2018, concretamente a “Demolição do muro de vedação quer fica inserido na Tipologia da REN “Dunas” (os muros a demolir, são os que se encontram identificados a vermelho, na figura 2 anexa)”.

2 – Decidiu o douto Tribunal a quo, pela improcedência da ação, alegando, em síntese conclusiva, que “Não se estando perante uma operação urbanística legalizável, a ordem de demolição configura uma atuação vinculada da Administração, imposta pela obediência devida ao princípio da legalidade. Acrescente-se que, a ordem de demolição proferida abrange apenas a parte do muro que se insere no ecossistema de “dunas costeiras”, e que por isso, contrariamente ao restante, não será legalizável, mostrando-se, pois adequada e proporcional.” 3 – Com tal decisão não pode o A. conformar-se, porquanto, a decisão recorrida ignorou nos factos provados, os documentos identificados com os números 5, 7, 8 e 9, além de que, ignorou o facto de apenas ter sido emitida ordem de demolição para uma parte do muro, e não para a totalidade, bem assim, o facto de o muro em questão, que é de vedação, mesmo à data em que foram emitidos os pareceres e alvará de licença camarária, já se encontrar construído.

4 – O A. defende na sua ação, não encontrar fundamento para o facto de, tratando-se de um muro de vedação e de delimitação do terreno. Isto porque, o espaço físico e inserido na REN, é o mesmo, pelo que carece de sentido, que relativamente a uma parte se isente de comunicação prévia, o que, de resto, culminou na emissão do alvará de licença por parte da Câmara Municipal ..., apenas seja autorizada a construção de metade e não da totalidade! 5 – Para além de o mencionar, o próprio ato administrativo que aqui se impugna, vem acompanhado de relatório fotográfico, onde é visível a localização do terreno, a sua envolvente, e o muro já construído, sendo possível verificar que a zona envolvente não tem qualquer característica de “Duna”, uma vez que é aí se encontram edificadas várias habitações, servidas pelas necessárias infraestruturas, essas sim, com elevado impacto no solo.

6 – A douta sentença a quo não fundamenta, desde logo, em que medida a construção da metade do muro que se pretende demolir, determina alterações na topografia do solo ou constitui lesão para as Dunas Costeiras. Limita-se apenas, a fazer o enquadramento legal, sem contudo, se pronunciar pela situação de exceção que aqui possa estar em causa, facto, de resto, alegado na p.i., ou a justificação para não poder ser enquadrada nessas mesmas exceções.

7 – Parece a douta sentença a quo, olvidar o facto de que uma parte do muro em questão ter obtido o parecer favorável quer da CCDRC, quer do ICNF, e de a mesma ter obtido o alvará de licença camarário.

8 – Pois, bem, nenhum proprietário com intenção de vedar a sua propriedade, consegue aceitar o facto de lhe licenciarem apenas metade da construção e a outra metade não.

9 – É patente o desequilíbrio da decisão, e constitui uma clara violação ao direito da propriedade.

10 – E é nessa medida que o A. entende, que existe viabilidade de licenciamento da totalidade do muro, aproveitando as exceções que a lei impõe e fazendo o devido enquadramento legal.

11 – E que por essa via, o ato de ordenar a demolição, como ultima ratio que é, nunca devia ter sido praticado, sem que tivessem sido analisadas todas as possíveis soluções que viabilizassem a manutenção do muro no seu todo.

12 – Além da CCDRC, apesar da restrição REN, ter isentado de comunicação prévia a operação urbanística em causa, também o ICNF veio considerar que na “área classificada, não será previsível a existência de impactes negativos significativos sobre os valores de conservação que justificaram a designação do Sítio Ria de Aveiro, decorrentes da construção e permanência dos muros de vedação e do estacionamento para veículos ligeiros pretendido”.

13 – O Regime Jurídico da REN considera desvios ao regime de interdição geral dos usos e ações de iniciativa pública ou privada, nos casos em que os usos e ações sejam compatíveis com os objetivos de proteção ecológica e ambiental e de prevenção e redução de riscos naturais de áreas integradas em REN, como é o caso da construção do A..

14 – Feita uma análise do RJREN, que «decifra» os conceitos de “Dunas Costeiras” e “Dunas Fósseis” (Anexo I, secção I, alínea g), ponto I e ponto II do RJREN) e confrontando com a realidade do local (visível nas fotografias), percebe-se com relativa facilidade, que o prédio onde foi erigido o muro de vedação, não só não se situa ao lado do mar, como sequer confronta com ele, tratando-se sim, de uma zona circundada por habitações.

15 – Além de que, se o que se visa proteger é o ecossistema “Dunas Costeiras”, a verdade é que se mostra potencialmente mais lesivo para a efetivação da função das Dunas, a demolição da obra existente.

16 – Se o legislador previu desvios à regra geral prevista no n.º 1 do artigo 20º do RJREN, permitindo que fossem praticadas ações desde que, designadamente, não coloquem em causa as funções das respetivas áreas (n.º 3 do artigo 20º), então não se deve interpretar a lei no seu sentido (apenas) literal, só porque o legislador não menciona expressamente a construção de muros.

17 – É, pois, evidente, que a pretensão em causa não colide com o RJREN, e que é possível o seu enquadramento, facto que Recorrida devia ter aprofundado, antes de decretar a demolição, a qual constitui a última das medidas a ser ordenada, por aplicação dos princípios da necessidade, da adequação e proporcionalidade.

18 – Diga-se também, não ser razoável que, relativamente ao mesmo espaço de construção, todo ele inserido em REN, se isente uma parte de comunicação prévia por não colidir com o RJREN, e à outra metade, façam enquadramento diferente.

19 – Entende-se assim, que o douto Tribunal terá incorrido em vício de omissão de pronúncia sobre factos essenciais, sobre os quais se deveria ter pronunciado e serem objeto de prova, refugiando-se em afirmações de cariz conclusivo, ao afirmar que a construção do muro (nem sequer foi da metade do muro) não se enquadrava no artigo 20º, n.º 1 do RJREN, concluindo, sem mais, que a deliberação impugnada não padecia dos vícios que lhe eram assacados.

20 – O douto Tribunal a quo para decidir a matéria que lhe havia sido submetida, sempre teria de proceder a acrescida fixação da necessária factualidade, designadamente, provada, após o que se imporia a análise do suscitado, por forma a não limitar a uma decisão conclusiva, sem a necessária pontual atendibilidade da factualidade relevante.

21 – Só assim, seria possível fundamentar de facto, uma plausível solução de direito, designadamente aquela que culminaria na anulação do ato impugnado, pois se a área onde se situa o muro é a mesma, não se percebe que uma parte possa ser licenciada (tal como foi) e outra não. Certo é também, que tal fundamentação não resulta, como deveria, do ato impugnado.

22 – Entende assim o A., que a sentença está ferida de nulidade, nos termos do disposto no artigo 668º, n.º 1, alíneas b) e d) do Código de Processo Civil, aplicável por força do artigo 140º do Código de Processo nos Tribunais Administrativos”.

* 3.

Notificados da interposição do recurso, o R./Recorrido apresentou contra-alegações de recurso, bem como a Digna Procuradora da República no Tribunal a quo.

3.1.

Nas suas contra-alegações, o Recorrido/Réu Ministério da Coesão Territorial elencou as seguintes conclusões: “A.

O Recorrente invoca normas do CPC que já não correspondem à versão em vigor, mas antes àquela que foi revogada em 2013, sendo em qualquer caso certo que a sentença recorrida não padece das nulidades invocadas.

B.

Quanto à alínea b) do n.º 1 do artigo 615.º do CPC, é absolutamente evidente que a sentença recorrida especifica os factos que considerou provados e não provados, no ponto 1 (“Dos factos”) da fundamentação da decisão, onde são enunciadas dezenas de alíneas de factos provados, da mesma forma que justifica juridicamente a decisão tomada no ponto 2, intitulado “Do direito”, pelo que é manifestamente improcedente a invocação da nulidade da sentença ao abrigo dessa norma.

C.

O juiz não deixou de se pronunciar sobre questões que deveria apreciar, nem conheceu de questões de que não poderia tomar conhecimento, conforme previsto na alínea d) do n.º 1 do artigo 615.º do CPC.

D.

Na alegação do Recorrente não vem identificada qualquer suposta questão que o Tribunal a quo teria supostamente deixado de conhecer, mas antes e apenas a defesa de que não teria considerado alguns documentos juntos aos autos, o que por si só é suficiente para constatar a improcedência da nulidade da sentença que vem invocada, já que não está em causa, nem sequer em abstrato, a existência de uma “questão”, no sentido jurídico-processual aqui perspetivado, que tivesse que ser decidida pelo Tribunal.

E.

Embora o Recorrente alegue que a sentença recorrida não teria considerado como provados determinados factos que deveriam ter sido assim entendidos, não...

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