Acórdão nº 018/22.2BALSB de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 22 de Março de 2023

Magistrado ResponsávelISABEL MARQUES DA SILVA
Data da Resolução22 de Março de 2023
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Acordam no Pleno da Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo: - Relatório - 1 – A..., S.A., com os sinais dos autos, vem, nos termos do n.º 2 a 4 do artigo 25.º do Regime Jurídico da Arbitragem em Matéria Tributária (RJAT), interpor recurso para uniformização de jurisprudência para este Supremo Tribunal Administrativo da decisão arbitral proferida em 23 de dezembro de 2021 no processo n.º 295/21-T, por alegada contradição, quanto à mesma questão fundamental de direito, com o decidido na decisão arbitral proferida em 28 de setembro de 2018 no processo arbitral n.º 40/2018-T.

A Recorrente termina as suas alegações de recurso formulando as seguintes conclusões: 1) Chamado a pronunciar-se sobre a questão de saber se a aplicação ao caso concreto (ou seja, a imóveis adquiridos pelo fundo Banco 1... em data anterior a 1 de janeiro de 2014) do disposto nos n.ºs 15 e 16 do artigo 8.

º do Regime jurídico do FIIAH, na redação que lhe foi conferida pelo artigo 235 .º da Lei n.

º 83-C/2013, de 31 de dezembro, em conjugação com o regime transitório previsto no n.

º 2 do artigo 236.

º deste último diploma legal, consubstancia uma violação ao princípio da proteção da confiança ínsito no princípio fundamental do Estado de direito democrático, consagrado no artigo 2.º CRP, o Tribunal a quo decidiu considerar «improcedente o vício imputado pela Requerente (violação do princípio da proteção da confiança ínsito no princípio fundamental do Estado de direito democrático) aos atos de liquidação cm questão, não merecendo censura a interpretação sufragada pela AT no que a este concreto ponto diz respeito».

2) Já na decisão fundamento conclui-se, perante um quadro normativo e factual idêntico ao da decisão recorrida «pela desaplicação do nº 2, do art. 236° da lei 83-C/2013, de 31 de Dezembro, cm conjugação com o nº 16° do art. 8° da Lei nº 64-A/2008, de 31 de Dezembro, na redação da lei 83-C/2013, com fundamento na sua inconstitucionalidade, como impõe o artigo 204° da Constituição da República Portuguesa» e, nessa medida, pela ilegalidade dos atos de IMT relativos a imóveis adquiridos, por fundo de investimento imobiliário para arrendamento habitacional, em data anterior a 1de janeiro de 2014.

3) De resto, não obstante o amplo apelo feito pelo Tribunal a quo ao Acórdão de uniformização de jurisprudência proferido, em 24 de novembro de 2021, pelo Pleno do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo no âmbito do processo n.

º 23/21.6BALSB, o certo é que a jurisprudência uniformizadora no mesmo firmada não é aplicável ao caso sob apreciação, razão pela qual a decisão recorrida não perfilha a jurisprudência mais recente consolidada do Supremo Tribunal Administrativo, inexistindo, no que em concreto à questão de direito em debate neste processo diz respeito, qualquer Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo em sentido igual ao que foi seguido pelo Tribunal a quo.

4) Significa, portanto o que antecede, que se encontram preenchidos todos os requisitos prescritos nos artigos 25.

º n.ºs 2 e 3 do RJTA e 152.

º do CPPT, devendo, em consequência, o presente recurso ser admitido para aí ser apreciada a invalidade da decisão recorrida.

5) Posto isto, e passando à demonstração da invalidade da decisão arbitral recorrida recorde-se que as liquidações de IMT sub judice foram praticadas com base nos pressupostos fixados nos «n.ºs 15 e 16 do artigo 8.

º do REFIIAH, na redação que lhe foi dada pelo artigo 235.

º da Lei n.

º 83-C/2013, de 31 de dezembro (regime que entrou em vigor no dia 1 de janeiro de 2014)», ou seja: por um lado, porquanto uns dos imóveis não foram efetivamente arrendados nos 3 anos subsequentes ao dia 1 de janeiro de 2014 (n.º 15 do artigo 8.º do Regime jurídico do PIIAH); por outro lado, na medida em que outros imóveis foram alienados antes de decorrido o prazo de 3 anos contado a partir de 1 de janeiro de 2014 (n.º 16 do artigo 8.º do Regime jurídico do PIIAH).

6) Sucede, porém, que, a aplicação do novo regime introduzido pelo artigo 235.º da Lei n.º 83-C/2013, de 31 de dezembro (mais especificamente, o disposto nos referidos n.º' 15 e 16 do artigo 8.0 do Regime jurídico do FIIAI I) a imóveis adquiridos - como se verifica com todos os imóveis aqui em causa -por fundo de investimento imobiliário para arrendamento habitacional, antes da sua entrada em vigor (ou seja, cm data anterior a 1 de janeiro de 2014), consubstancia uma violação ao princípio da proteção da confiança ínsito no princípio fundamental do Estado de direito democrático, consagrado no artigo 2.º da CRP, encontrando-se os atos assim praticados (em concreto, os atos objeto do presente processo) feridos do vício de nulidade, por força da alínea d) do n.º 2 do artigo 161.º do CPA.

7) Esta é, de resto, a interpretação já alcançada pelo Tribunal Constitucional quando chamado a pronunciar-se sobre a matéria aqui em debate, designadamente no âmbito do Acórdão do Tribunal Constitucional n.º 175/2018, de 5 de abril de 2018, através do qual veio afirmar, preclaramente, que «é de concluir pela inconstitucionalidade, por violação do princípio da tutela da confiança, da norma constante do n.º 2 do artigo 236.º da Lei n.º 83-C/2013, de 31 de dezembro, em conjugação com o n.º 16 do artigo 8.º do regime jurídico aplicável aos FIIAH e às SIIAH, na versão decorrente da aludida Lei n.º 83-C/2013, por dela resultar que os prédios adquiridos na vigência da Lei n.º 64-A/2008, de 31 de dezembro, têm de ser efetivamente arrendados num prazo fixo, sem que possam ser vendidos na hipótese de o contrato de arrendamento não vir a ser celebrado, sob pena de caducidade da isenção» (No mesmo sentido, Acórdãos do Tribunal Constitucional n.º 489/2018, de 9 de outubro de 2018, e n.º 622/2019, de 23 de outubro de 2019) (os destacados são da RECORRENTE).

8) Do que fica exposto, sobressai, portanto, o acerto da decisão fundamento (e, reflexamente, o erro do juízo subjacente à decisão recorrida): os n.'" 15 e 16 do artigo 8.º do Regime jurídico do FIIAII, na redação que lhe foi conferida pelo artigo 235.º da Lei n.º 83-C/2013, de 31 de dezembro, conjugados com n.º 2 do artigo 236.º deste último diploma legal, violam o princípio da proteção da confiança ínsito no princípio fundamental do Estado de direito democrático, consagrado no artigo 2.° CRP, sempre que interpretadas e aplicadas no sentido de que o benefício fiscal consagrado no artigo 8.º do regime jurídico dos FIIAH caduca se os imóveis que, tendo sido adquiridos por fundo de investimento imobiliário para arrendamento habitacional, em momento anterior a 1 de Janeiro de 2014, não sejam efetivamente arrendados nos 3 anos subsequentes ao dia 1de janeiro de 2014 ou sejam vendidos antes de decorrido o prazo de 3 anos contado a partir do dia 1de janeiro de 2014.

9) A esta luz, traduzindo os atos tributários sob apreciação a aplicação daquele específico regime jurídico violador do conteúdo essencial do artigo 2.º da CRP, deverão os mesmos considerar-se nulos por força da referida alínea d) do n.º 2 do artigo 161.º do CPA, ou seja, por «( . . .) ofenderem o conteúdo essencial de um direito fundamental».

10) Consequentemente, tendo em consideração que «O ato nulo não produz quaisquer efeitos jurídicos, independentemente da declaração de nulidade», e, bem assim, que «Salvo disposição legal em contrário, a nulidade é invocável a todo o tempo por qualquer interessado e pode, também a todo o tempo, ser conhecida por qualquer autoridade e declarada pelos tribunais administrativos ou pelos órgãos administrativos competentes para a anulação» (cf., respetivamente, n.º' 1 e 2 do artigo 162.º do CPA), impõe-se concluir, sem mais, pela nulidade dos atos de liquidação de IMT aqui em causa.

11) Em face de todo o exposto, deve a decisão recorrida - oposta à que foi proferida na decisão fundamento - ser revogada e substituída por Acórdão que conclua pela ilegalidade dos atos de liquidação de IMT e respetivos juros compensatórios sob apreciação, e que, em consequência, determine a sua anulação, com todos os efeitos legais.

NESTES TERMOS, E NOS MAIS DE DIREITO, QUE VV. EXAS. NÃO DEIXARÃO DE SUPRIR, DEVERÁ SER ADMITIDO E DECLARADO PROCEDENTE O PRESENTE RECURSO, COM A CONSEQUENTE REVOGAÇÃO DA DECISÃO ARBITRAL RECORRIDA, QUE DEVE SER SUBSTITUÍDA POR ACÓRDÃO QUE CONCLUA PELA ILEGALIDADE DOS ATOS DE LIQUIDAÇÃO DE IMT E RESPETIVOS JUROS COMPENSATÓRIOS SOB APRECIAÇÃO, E QUE; EM CONSEQUÊNCIA, DETERMINE A SUA ANULAÇÃO; COM TODOS OS EFEITOS LEGAIS.

2 – Contra-alegou a Recorrida, concluindo nos seguintes termos:

  1. Foi interposto recurso para uniformização de jurisprudência do acórdão arbitral proferido no processo n.º 295/2021-T, com fundamento em oposição com decisão arbitral proferido em processo constituído sob a égide do Centro de Arbitragem Administrativa, no âmbito do processo n.º 40/2018-T, nos termos do disposto na nova redação do artigo 25.º, n.º 3 do RJAT, que lhe foi atribuída pela Lei n.º 119/2019, de 18 de setembro.

  2. Sem...

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