Acórdão nº 0142/21.9BALSB de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 22 de Março de 2023

Magistrado ResponsávelGUSTAVO LOPES COURINHA
Data da Resolução22 de Março de 2023
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Acordam no Pleno da Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo I – RELATÓRIO I.1 – Alegações I. A AUTORIDADE TRIBUTÁRIA E ADUANEIRA, inconformada com a decisão arbitral proferida no processo n.º 354/2020-T no dia 6 de Outubro de 2021 que correu termos no Centro de Arbitragem Administrativa (CAAD), julgou parcialmente procedente o pedido arbitral deduzido pelo requerente, ora recorrido Banco 1..., S.A. e consequentemente procedeu à anulação parcial dos atos de autoliquidação de Imposto sobre o Valor Acrescentado (“IVA”) n.º 112198524490, respeitante a dezembro de 2017, no montante total de 3.113.487,25 EUR, anulou a decisão de indeferimento expresso da reclamação graciosa apresentada contra aquele ato e condenou a Autoridade Tributária Aduaneira ao pagamento da restituição do imposto acrescido de juros indemnizatórios, vem dela interpor recurso para uniformização de jurisprudência, dirigido ao Supremo Administrativo, nos termos do disposto no artigo 152º, nº 1, do Código de Processo nos Tribunais Administrativos e do nº 2, do artigo 25º do RJAT (Regime Jurídico da Arbitragem em Matéria Tributária) por considerar que o referida decisão arbitral colide com o acórdão fundamento proferido pelo Supremo Tribunal Administrativo, datado de 15 de novembro 2017, no âmbito do processo nº 0485/2017, o qual transitou em julgado.

II. A Recorrente veio apresentar alegações de recurso a fls. 4 a 38 do SITAF, no sentido de demonstrar a alegada oposição de julgados, formulando as seguintes conclusões: A. O Recurso Para Uniformização de Jurisprudência previsto e regulado no artigo 152.º do Código de Processo nos Tribunais Administrativos tem como finalidade a resolução de um conflito sobre a mesma questão fundamental de direito, devendo o STA, no caso concreto, proceder à anulação da decisão arbitral e realizar nova apreciação da questão em litígio quando suscitada e demonstrada tal contradição pela parte vencida.

B. Ora, desde logo, quanto ao estabelecido pelas regras que determinam os requisitos de admissibilidade deste tipo de recursos, resulta que, para que se tenha por verificada a oposição de acórdãos, é necessário que i) as situações de facto sejam substancialmente idênticas; ii) haja identidade na questão fundamental de direito; iii) se tenha perfilhado nos dois arestos uma solução oposta; e iv) a oposição decorra de decisões expressas e não apenas implícitas.

C. No que concerne ao requisito das situações de facto substancialmente idênticas, temos, subjacente ao acórdão recorrido, a factualidade melhor descrita nas alegações, para cuja leitura se remete.

D. Por seu turno, subjacente ao Acórdão Fundamento, encontrava-se factualidade também descrita nas alegações, e para cuja leitura igualmente se remete.

E. Aqui chegados, e considerando a factualidade supra aludida, fica, desde logo, demonstrado que entre o acórdão recorrido e o Acórdão Fundamento existe uma manifesta identidade de situações de facto.

F. Estava em causa em ambos os processos aferir da determinação da percentagem do IVA dedutível, resultante dos custos suportados pelo sujeito passivo com serviços de utilização mista, afectos tanto a operações tributadas como a operações isentas.

G. Em ambos os casos, Recorrente e a ora Recorrida têm natureza de sujeito passivo misto em sede de IVA, exercendo actividades sujeitas a IVA e actividades isentas de IVA.

H. Ambas consubstanciam instituições de crédito abrangidas pelo Regime Geral das Instituições de Crédito e Sociedades Financeiras e exercem, entre outras, as actividades de leasing (locação financeira) e ALD (aluguer de longa duração).

I. Ambas consubstanciam instituições de crédito abrangidas pelo Regime Geral das Instituições de Crédito e Sociedades Financeiras e exercem, entre outras, as actividades de leasing (locação financeira) e ALD (aluguer de longa duração).

J. Ambas corrigiram valores deduzidos ao longo de um período fiscal (2017 e 2010, respectivamente), por força do pro rata definitivo determinado para o respectivo ano, dado terem observado as instruções da Autoridade Tributária constantes no Ofício-Circulado n.º 30.108, de 30-01-2009.

K. Ambas apuraram um montante a deduzir distinto ao que foi apurado por recurso ao pro rata provisório.

L. Ambas imputam aos actos de autoliquidação de IVA vícios de violação de lei, por entenderem que nos termos do artigo 23.º, n.º 4 do CIVA, o pro rata de dedução deve considerar no seu cálculo o montante anual da globalidade das rendas de locação financeira e não apenas o montante correspondente aos juros e outros encargos relativos à actividade de leasing e ALD.

M. Ainda no âmbito da matéria de facto, nenhum dos Acórdãos – o arbitral e o fundamento (0485/17) – deu como provado que o IVA suportado com os custos mistos à actividade sujeita e à actividade sujeita, mas isenta, fosse predominante consumido pela gestão e financiamento de contratos de locação financeira, fosse pela disponibilização de veículos.

N. No acórdão fundamento, foi dado como não provado que os custos em que o Banco incorreu no âmbito dos contratos de locação financeira fossem referentes a actos de disponibilização de veículo.

O. No acórdão recorrido, no ponto 1 da matéria dada como não provada, foi dado como não provado que a utilização de bens e serviços nas operações de leasing e “ALD financeiro”, consumidos em actividades mistas, fosse sobretudo determinada pelo financiamento e pela gestão dos contratos de leasing e “ALD financeiro”.

P. No acórdão recorrido, no ponto 2 da matéria dada como não provada, foi dado como não provado que a utilização de bens e serviços nas operações de leasing e “ALD financeiro”, consumidos em actividades mistas, não fosse sobretudo determinada pelo financiamento e pela gestão dos contratos de leasing e “ALD financeiro”.

Q. Na fundamentação da matéria de facto do acórdão recorrido, o Tribunal arbitral considerou que «não existem elementos probatórios que demonstrem o grau de utilização destes custos (área ocupada/número de elementos de pessoal afecto, massa salarial, horas-máquina, horas-homem) pelo Requerente e que permitam concluir que a sua utilização pelo Requerente respeita mais à actividade de disponibilização dos veículos ou respeita mais ao financiamento e gestão dos contratos.» R. Ainda que não tenha escrito nem feito constar na matéria de facto dada como não provada, o Tribunal arbitral considerou também como não provado que os custos mistos em sede de locação financeira sejam sobretudo consumidos com os actos de disponibilização de veículos, dado não existirem «nos autos elementos probatórios que identifiquem ou listem com exactidão os bens e serviços comuns utilizados pelo Requerente de forma mista, nem os bens e serviços concretos utilizados com a disponibilização dos veículos (ou seja, identificação dos fornecedores, dos registos contabilísticos efectuados, dos centros de imputação de custos contabilísticos, das facturas, de datas em que os custos são incorridos, dos nomes e extensão dos bens e serviços, dos valores incorridos).» S. Mesmo que no acórdão recorrido não se tenha dado como não provado que aqueles mesmos custos foram (ou não foram) consumidos sobretudo pelos actos de disponibilização de veículos, o certo é que, de toda a matéria provada e não provada, resulta o desconhecimento – ou o não apuramento – pelo Tribunal sobre se os custos gerais são influenciados e sobretudo, predominante absorvidos pelos actos de disponibilização de veículos ou se pelo financiamento ou gestão de contratos.

T. Tal como consta do teor do Acórdão 95/19, era esse o ponto que importava descortinar e que constituiu motivo para ordenar a ampliação da matéria de facto: «Em face da interpretação fornecida pelo Tribunal de Justiça sobre a questão, cuja doutrina é inteiramente aplicável ao caso em apreço, deve ser considerada a necessidade de apurar se nas operações de locação financeira para o sector automóvel que podem implicar a utilização de certos bens ou serviços de utilização mista, essa utilização é sobretudo determinada pelo financiamento e pela gestão dos contratos de locação e não pela disponibilização dos veículos.» U. Na prática, o Tribunal arbitral não conseguiu apurar, para o que aqui interessa, se aqueles custos comuns foram sobretudos determinados e consumidos pelo acto de disponibilização de veículos, se pelo financiamento e gestão dos contratos.

V. No acórdão fundamento entendeu-se que o decidido pelo TJUE no processo C183/13, o artigo 23.º, n.º 3 do CIVA constitui a transposição do artigo 17.º, n.º 5, parágrafo 3, c) da Sexta Directiva e que, sendo assim, os Estados membros podem obrigar uma instituição bancária, que exerce actividades de locação financeira, a incluir no numerador e denominador da fracção que serve para estabelecer um único e mesmo pro rata de dedução para todos os seus bens e serviços de utilização mista, apenas a parte das rendas pagas pelos clientes, no âmbito dos contratos de locação financeira, correspondente aos juros.

W. Foi assim decidido no acórdão fundamento porquanto, em sede de factos dados como não provados na sentença da 1.ª instância, fixou-se como não provado o facto de que os custos mistos, comuns à actividade isenta e à actividade sujeita, respeitassem à disponibilização de veículos objecto dos contratos de locação financeira.

X. A decisão arbitral entendeu, por referência a diversas decisões arbitrais, de que se destaca a proferida no processo 498/2018-T, que a solução da ora Recorrida de aplicar o método de imputação específico, escorado no Ofício-Circulado n.º 30108, era incompatível com o disposto nos artigos 173.º e 174.º da Directiva IVA e, por consequência, com a solução proposta no artigo 23.º, n.º 3 e 4 do CIVA, não podendo a Autoridade Tributária aplicar um método de imposto específico para apurar a percentagem de dedução em sede de IVA.

Y. Em oposição, o Acórdão fundamento (0485/17) entendeu que o artigo 17°, n° 5, terceiro parágrafo, alínea c), da Sexta Diretiva...

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