Acórdão nº 541/21.6T8CNT-A.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 14 de Março de 2023

Magistrado ResponsávelMÁRIO RODRIGUES DA SILVA
Data da Resolução14 de Março de 2023
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

Tribunal Judicial da Comarca de Coimbra Juízo Local Cível de Cantanhede 541/21.6T8CNT-A.C1 Acordam na 3ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Coimbra RELATÓRIO Em 2-7-2021 veio AA requerer a instauração de inventário para liquidação e partilha do património comum do seu dissolvido casal com BB.

Em 27-10-2021, a cabeça de casal BB apresentou a relação de bens.

Em 10-01-2022, o requerente AA apresentou reclamação contra a relação de bens.

Em 24-08-2022 foi proferida decisão que julgou parcialmente a reclamação de bens.

Inconformada com esta decisão, BB interpôs recurso, terminando as suas alegações com as seguintes conclusões: “1. Por aplicação do disposto no artigo 1105º, nº 1 e nº 2 do CPC, o requerimento que abre o Incidente de Reclamação contra a Relação de bens tem que indicar todos os bens que o reclamante considera em falta na relação de bens, e ainda todos os meios de prova, sob pena de preclusão do direito de os indicar.

  1. O Despacho Judicial datado de 17-02-2022 com a ref. Citius 87635465 que admitiu o aditamento do bem e respetiva prova indicado na Sentença Recorrida como verba 2, é nulo por violação da norma do artigo 1105º, nº 1 e nº 2 do CPC, uma vez que da Reclamação Inicial não consta reclamada a falta deste bem na relação de bens inicial (Requerimento com ref. Citius 6970580 de 10-01-2022), tendo sido trazido ao processo por requerimento anómalo e extemporâneo (Requerimento com ref. Citius 7017524 de 28-01-2022), quando já estava precludido o direito de o reclamante indicar bens em falta na relação de bens inicial, e respectivos meios de prova.

  2. O Despacho Judicial datado de 17-02-2022 com ref. Citius 87635465, que admitiu o aditamento do bem e respectiva prova indicado na Sentença recorrida como verba 2, é nulo por violação do disposto no Decreto-Lei nº 158/2002 de 2 de Julho e do artigo 1733º, nº 1 e) do Código Civil.

  3. Deve a verba indicada na relação de bens constante da Sentença recorrida ser retirada.

  4. O Despacho proferido em acta datada de 25-02-2022, na primeira sessão de produção de prova é nulo; o despacho proferido no dia 08-03-2022 com ref. Citius 87840890 é nulo; o despacho proferido em 10-03-2022 com ref. Citius 87871989 é nulo; o despacho proferido em acta no dia 15-03-2022 com ref. Citius 87907754 é nulo; o despacho proferido em 3-04-2022 com ref. Citius 88093313 é nulo, todos com os mesmos fundamentos legais- admitiram aditamentos de bens e aditamentos de elementos probatórios, em fases posteriores, sem atender ao efeito preclusivo resultante do disposto no artigo 1105º, nº 2 do CPC, com violação do disposto nesse artigo 1105º, nº 1 e nº 2 do CPC, princípios da concentração, principio da responsabilização das partes com efeito preclusivo, e violação por parte do Tribunal do principio do dispositivo e do poder/dever de gestão processual.

  5. Devem tais despachos ser declarados nulos, e em consequência devem ser retiradas da relação de bens constante da Sentença recorrida as verbas 13 a 29.

  6. O artigo 1722º nº 1 b) do Código Civil prescreve que são considerados bens próprios dos cônjuges, os bens que lhes advieram depois do casamento por sucessão ou doação. E o nº 2 do mesmo normativo prescreve que considerando-se entre outros, adquiridos por direito próprio anterior, sem prejuízo da compensação eventualmente devida ao património comum.

    Este é o caso dos autos. A recorrente já tinha um direito próprio, o seu quinhão hereditário, servindo a partilha apenas para o concretizar.

  7. Para o recorrido tentar concretizar o seu pedido de atribuir ao bem a natureza de comum teria que alegar e provar o pagamento de tornas foi efetuado com dinheiro comum do casal. E ainda que alegasse e provasse o referido, o bem continuaria a ser próprio por força do disposto no artigo 1722º nº 1 b) do Código Civil.

  8. Assim, o bem descrito na verba 30 da relação de bens constante da Sentença recorrida é um bem próprio da recorrente, por aplicação do disposto no artigo 1722º nº 1 b) e nº 2 do Código Civil, havendo por parte da Sentença recorrida uma errada interpretação e aplicação do disposto no artigo 1726º do Código Civil, devendo assim a decisão de bem comum ser substituída por outra que declara ao bem a natureza de bem próprio da cabeça-de-casal/recorrente.

  9. Em consequência deve a verba 30 ser retirada da Relação de Bens.

  10. A verba A do passivo deve ser retirada da Relação de Bens constante da Sentença recorrida, por errada interpretação e aplicação pelo Tribunal dos pressupostos que a lei faz depender a aplicação do disposto no artigo 1726º e do disposto no artigo 1722º, nº 1 b) e nº 2, ambos do Código Civil e por violação pelo Tribunal do Principio do Dispositivo.

  11. Ao serem retiradas da Relação de bens constante da Sentença recorrida as verbas 2, 13 a 29, 30 do activo, e verba A do passivo, existe uma improcedência total do Incidente de Reclamação da Relação de Bens, ao contrário da decidida procedência parcial, o que o recorrente pretende ver decidido.

  12. A Sentença recorrida viola as normas constantes dos artigos 1104º, 1105º, nº 1 e nº 2, ambos do Código de Processo Civil e artigos 1733º, nº 1, 1726º, nº 1 e 1722º, nº 1 b) e nº 2, todos do Código Civil.

    Requer a procedência total do Presente Recurso, assim se fazendo Justiça.

    O recorrido apresentou contra-alegações, sustentando em síntese a improcedência do recurso.

    O recurso foi admitido.

    Colhidos os vistos, cumpre decidir.

    OBJETO DO RECURSO Considerando as conclusões das alegações, as quais delimitam o objeto dos recursos sem prejuízo das questões de conhecimento oficioso, as questões a decidir são as seguintes: 1. Saber se devem ser declarados nulos os despachos datados de 17-02-2022, 25-02-2022, 8-03-2022, 10-03-2022, 15-03-2022 e 3-04-2022.

  13. Saber se a verba 30 do ativo da relação de bens deve ser considerado bem próprio ou bem comum.

  14. Saber se a verba A do passivo deve constar da relação de bens.

    FUNDAMENTOS DE FACTO Na decisão recorrida foi fixada a seguinte matéria de facto: Factos provados 1) Requerente e requerida foram casados entre si, desde 30.06.2001, segundo o regime de comunhão de adquiridos.

    2) O divórcio entre os aqui requerente e cabeça de casal correu os seus trâmites no Tribunal de Grande Instância ..., em França, tendo a ação respetiva sido instaurada a 24.05.2017, o despacho de não conciliação sido proferido a .../.../2017 e a decisão de divórcio tomada a 19.12.2019.

    3) Na referida decisão de divórcio, foi consignado, além do mais, que a requerente, contrariamente ao cabeça de casal, esteve sem trabalhar durante três anos e que a situação financeira deste último era claramente mais favorável que a da requerente.

    4) Nos termos do processo de inventário nº ...5..., do Tribunal Judicial ..., instaurado a 4.01.2005, por óbito de CC, foi arrolado como verba única o prédio urbano inscrito na matriz predial urbana nº ...09 da freguesia ..., consistente em casa de habitação de rés-do-chão, com a área coberta de 115,60m2, sita na freguesia ..., a conftontar de norte com rua, sul com DD, norte com caminho e poente com EE.

    5) No âmbito do referido processo de inventário nº ...5..., a aludida verba única foi adjudicada à aqui cabeça de casal, pelo valor de €6 896,73, datando a sentença homologatória da partilha de 21.03.2007.

    6) No âmbito do referido processo de inventário nº ...5..., à interessada BB, aqui cabeça de casal, na qualidade de herdeira, cabia-lhe um quinhão de € 986,24 Euros, correspondente ao seu quinhão hereditário, pagando tornas aos restantes herdeiros no montante de € 5911,....

    7) O referido artigo 509 deu origem ao atual artigo ...31 urbano da União de Freguesias ... e ....

    8) O requerente veio de França à casa de habitação, sita na Rua ..., ..., ..., e levou consigo: -uma televisão, correspondente à verba 5 da relação de bens de 27.10.2021; -uma máquina de lavar a roupa, correspondente à verba 8 da relação de bens de 27.10.2021; -um móvel aparador de entrada com espelho, correspondente à verba 16 da relação de bens de 27.10.2021; -cama de casal com colchão, correspondente à verba 14 da relação de bens de 27.10.2021.

    9) Imóvel inscrito na matriz predial urbana sob o art. ...09 da freguesia ..., sito no FF, nº ..., em ..., foi sujeito a obras de reconstrução, nos termos do alvará de obras de construção nº ...08, processo ..., da Câmara Municipal ....

    10) Nos termos do referido alvará, a área de construção ascendeu a 153 m2, em 2 pisos, com uma área de implantação de 116m2 e área bruta de construção de 231, 18m2, com início a 20.02.2008 e fim a 18.02.2009.

    11) O referido prédio urbano era composto por prédio de rés-do-chão com a superfície de 115,60m2, e com o valor patrimonial de apenas € 6896,73 Euros, por ser um prédio já antigo, cujas paredes eram em tijolo sem reboco.

    12) Após a adjudicação em sede de inventário n.º ...5..., o ex-casal constituído pelos aqui interessados pagou a demolição do referido imóvel inscrito na matriz sob o art. ...09, a sua reconstrução e ampliação, demolindo todo o seu interior, só ficando no ar as paredes exteriores.

    13) O imóvel inscrito na matriz predial urbana sob o art. ...31 da União de Freguesias ... e ..., é composto por rés-do-chão e 1º andar, com a superfície coberta de 115,60m2, com a área bruta privativa de € 231,20m2, e com o valor patrimonial de € 41203,85 Euros.

    14) À data de 24.05.2007, os aqui interessados eram titulares da quantia global de €1137, 58 depositada na conta com o IBAN ...57, da Caixa Geral de Depósitos, S.A..

    15) Os aqui interessados são titulares de um Plano de Poupança Reforma (PPR) constituído pela cabeça de casal na vigência do casamento, denominado “LEVE PPR” em nome da cabeça de casal, Apólice n.º ...12, junto do Grupo Caixa Geral de Depósitos, no valor de € 7346,58 Euros, à data de 31.12.2012.

    16) Estão na posse da cabeça de casal os seguintes bens móveis adquiridos pelo casal antes de 24.05.2017: - Máquina de lavar louça, no valor de € 580,00; - Máquina de secar roupa no valor de € 400,00; - Ferro de engomar com central a...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT