Acórdão nº 247/22.9T8BCL.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 16 de Março de 2023

Data16 Março 2023

Acordam na Secção Social do Tribunal da Relação de Guimarães Apelante: AA E OUTRAS (autoras) Apelada: HOSPITAL DE ..., E.P.E.

I – RELATÓRIO AA E OUTRAS, com os demais sinais nos autos, intentaram a presente acção declarativa, sob a forma de processo comum, contra HOSPITAL DE ..., E.P.E., também nos autos melhor identificada, pedindo a condenação da ré a: 1. Pagar a cada uma das Autoras os danos não patrimoniais conforme o acima alegado no valor de € 2.000,00, cada, perfazendo o valor total de € 12.000,00 (doze mil euros); 2. Pagar à Autora AA o valor global de € 3.670,69, a título de créditos, retroativos e diferenças salarias devidos e não pagos com a proveniência supra alegada; 3. Pagar à Autora BB o valor global de € 3.670,69, a título de créditos, retroativos e diferenças salarias devidos e não pagos; 4. Pagar à Autora CC o valor global de € 3.670,69, a título de créditos, retroativos e diferenças salarias devidos e não pagos; 5. Pagar à Autora DD o valor global de € 3.670,69, a título de créditos, retroativos e diferenças salarias devidos e não pagos; 6. Pagar à Autora EE o valor global de € 3.670,69, a título de créditos, retroativos e diferenças salarias devidos e não pagos; 7. Pagar à Autora FF o valor global de € 2.833,75, a título de créditos, retroativos e diferenças salarias devidos e não pagos; 8. A pagar sobre todas as quantias acima peticionadas os respetivos juros de mora à taxa legal em vigor até integral pagamento das mesmas, bem como custas de parte e processuais Alegam para tanto, e em síntese, que são trabalhadoras por conta da ré, a qual não cumpriu o acordo colectivo de trabalho, que identificam, que entrou em vigor em 1 de Julho de 2018.

Tendo-se realizado audiência de partes, malogrou-se, nessa sede, a conciliação entre elas.

Notificada para o efeito, a ré apresentou contestação para, além de deduzir a excepção da incompetência material do Tribunal e de, não pondo em causa a existência das alegadas relações laborais, impugnar parte da matéria alegada pelas autoras, sustentar que vem cumprindo o aludido ACT.

Prosseguindo os autos, veio a realizar-se a audiência final e, após, foi proferida sentença com o seguinte dispositivo: “Pelo exposto julgo a acção totalmente improcedente e, em consequência, absolvo a ré do pedido.” Inconformadas com esta decisão, dela vieram as autoras interpor o presente recurso de apelação para este Tribunal da Relação de Guimarães, apresentando alegações que terminam mediante a formulação das seguintes conclusões (transcrição): “I. O artigo 82.º, n.º 4 da Lei Geral do Trabalho em Funções Públicas (LGTFP) garante que “Todos os trabalhadores têm direito ao pleno desenvolvimento da respetiva carreira profissional, que pode ser feito por alteração de posicionamento remuneratório ou por promoção”.

  1. Sendo regra geral, nos termos do artigo 156.º, n.º 7 da LGTFP, que haja “lugar a alteração obrigatória para a posição remuneratória imediatamente seguinte àquela em que o trabalhador se encontra, quando a haja, independentemente dos universos definidos nos termos do artigo 158.º, quando aquele, na falta de lei especial em contrário, tenha acumulado 10 pontos nas avaliações do desempenho referido às funções exercidas durante o posicionamento remuneratório em que se encontra”.

  2. Por sua vez, a Cláusula 25.º do Acordo Coletivo de Trabalho (ACT), de 14 de maio de 2018, publicado no Boletim de Trabalho e Emprego (BTE) n.º 23, de 22 de junho de 2018, prevê expressamente que “Os trabalhadores abrangidos pelo presente AC têm direito a um desenvolvimento profissional, o qual se efetua mediante alteração de posicionamento remuneratório ou, sendo o caso, provimento, por concurso, em categoria superior, nos mesmos termos em que estes institutos se encontram regulados para os trabalhadores com vínculo de emprego público integrados em carreiras gerais”.

  3. À data da entrada em vigor do ACT, a 01 de julho de 2018 – com exceção da Recorrente FF, que só a partir de janeiro de 2018 -, todas as Recorrentes tinham acumulados mais de 10 pontos nas avaliações do desempenho referido às funções exercidas durante o posicionamento remuneratório em que se encontravam, pelo que tinham já preenchidos os requisitos exigidos para a alteração obrigatória para a posição remuneratória seguinte àquela em que se encontravam.

  4. À data da entrada em vigor do ACT, e até 30 de setembro de 2020, as Recorrentes estiveram posicionadas na 1.º posição remuneratória, a realizar um horário semanal de 40 horas e a auferir uma retribuição ilíquida de € 780,72, correspondente a € 683,13 de retribuição base, e € 97,59 de acréscimo pelo aumento da carga horária em 5 horas semanais.

  5. O ACT foi subscrito pela Recorrida e é aplicável às Recorrentes.

  6. A Recorrida obrigou as Recorrentes a optarem entre duas escolhas que as mantinham ilegalmente na 1.º posição remuneratória: 1) realizarem um horário de trabalho de 35 horas semanais e auferirem a remuneração base de € 683,13, ou; 2) realizarem um horário de trabalho de 40 horas semanais e manterem a respetiva retribuição ilíquida de € 780,72.

  7. O Tribunal a quo fez uma errada interpretação dos n.ºs 3 e 5 da Cláusula 33.

  8. Se as Recorrentes tivessem sido contratadas com Contrato de Trabalho em Funções Públicas (CTFP), à data da entrada em vigor do ACT estariam já posicionadas na 2.º posição remuneratória.

  9. A 2.º posição remuneratória implicava uma retribuição base ilíquida de € 789,54, pela realização de um horário semanal de 35 horas.

  10. Só em outubro de 2020, por ato discricionário da Recorrida, as Recorrentes foram posicionadas na 2.º posição remuneratória e passaram a realizar um horário semanal de 35 horas.

  11. Não existindo nenhum fundamento legal para a Recorrida só em outubro de 2020 ter decidido aplicar o ACT que entrara em vigor a 01 de julho de 2018.

  12. Nem tampouco existe fundamento legal para recusar o pagamento de retroativos pela não aplicação do ACT à data em que este entrou em vigor.

  13. De 01 de julho de 2018 a 30 de setembro de 2020, as Autoras receberam um valor hora de € 4,50, calculados com base na 1.º posição remuneratória, quando um colega que tivesse sido contratado na mesma data em que estas foram, com CTFP, estaria a receber um valor hora de € 5,21, calculado com base na 2.º posição remuneratória.

  14. Tudo isto, com a agravante de que as Recorrentes terem conhecimento de que um seu colega – arrolado por estas como testemunha – apresentou a mesma reclamação à Recorrida, e viu-lhe ser deferido o pagamento de todos os retroativos devidos pelo período em que não houve aplicação do ACT.

  15. Questão sobre a qual o Tribunal a quo não se pronunciou, pelo que a decisão se encontra enferma com o vício da omissão de pronúncia (artigo 591.º, n.º1, alínea d) 1.º parte, CPC).

  16. De igual modo, o Tribunal a quo não se pronunciou no respeitante aos danos não patrimoniais suscitados pelas Recorrentes, incorrendo, também aqui, no vício da omissão de pronúncia.

  17. Já em sentido oposto, o Tribunal a quo, em claro vício de excesso de pronúncia (artigo 591.º, n.º 1, alínea d), 2.º parte, CPC) conheceu da questão de fundo, sobre a aplicação do ACT, baseando-se na declaração subscrita pelas Recorrentes, considerando que a opção feita por estas resultou da sua vontade, e não de uma “obrigação” imposta pela Recorrida, que “forçou” as Recorrentes a optarem entre duas escolhas, sendo que nenhuma delas exprimia a vontade das mesmas.

  18. Sem prejuízo do exposto, o Tribunal a quo ao decidir do mérito da ação, sem, sequer, a realização da audiência prévia, não respeitou o princípio do contraditório, genericamente consagrado no artigo 3.º, n.º 3 do CPC, e que é por este assegurado pela imposição do dever processual, que especialmente lhe incumbia, de garantir às Recorrentes o direito (que lhes assiste) de dizer aquilo que, no momento processualmente adequado (definido previamente pela lei), ainda entenderem ser, do seu ponto de vista, relevante.” A recorrida apresentou contra-alegações, concluindo pela improcedência do recurso, pois, e em suma: “1- A douta sentença apreciou corretamente os factos alegados pelas partes, os documentos juntos não impugnados e efetuou uma correta interpretação e aplicação da lei aplicável.

2- Não merece, assim, qualquer censura.

3- Deverá o Recurso improceder totalmente por não se mostrarem violadas quaisquer disposições legais.” Admitido o recurso na espécie própria e com o adequado regime de subida, foram os autos remetidos a este Tribunal da Relação e pela Exma. Senhora Procuradora-Geral Adjunta foi emitido parecer no sentido da procedência do recurso.

Tal parecer não mereceu qualquer resposta.

Dado cumprimento ao disposto na primeira parte do n.º 2 do artigo 657.º do Código de Processo Civil foi o processo submetido à conferência para julgamento.

II - OBJECTO DO RECURSO Delimitado que é o âmbito do recurso pelas conclusões da recorrente, sem prejuízo das questões que sejam de conhecimento oficioso (artigos 608.º n.º 2, 635.º, n.º 4 e 639.º, n.ºs 1 e 3, todos do Código de Processo Civil, aplicável por força do disposto no artigo 87.º n.º 1 do CPT), enunciam-se então as questões que cumpre apreciar:

  1. Nulidade da sentença; b) Errada aplicação do direito.

    III - APRECIAÇÃO DO RECURSO Da nulidade da sentença: A esta questão se reportam as conclusões XV e ss do recurso.

    Comecemos por apreciá-la com referência aos fundamentos invocados pelas recorrentes nas conclusões XV e XVI.

    Em suma, sustentam as apelantes que se verifica o vício da omissão de pronuncia porque, tendo alegado a existência de um seu colega de trabalho – arrolado como testemunha –, que nas mesmas condições laborais/contratuais das recorrentes, e após fazer idêntica reclamação, viu-lhe ser deferido pela recorrida o pagamento dos retroativos respeitantes ao período em que a recorrida não lhe aplicou o ACT, questão sobre a qual o Tribunal a quo não se pronunciou.

    Vejamos então.

    Estabelece o art. 615.º/1 d) e n.º 4 do CPC: “Causas de nulidade da sentença 1 - É nula a sentença quando: (…)...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT