Acórdão nº 00735/18.1BEAVR de Tribunal Central Administrativo Norte, 10 de Março de 2023

Data10 Março 2023
Órgãohttp://vlex.com/desc1/1998_01

Acordam, em conferência, os juízes desembargadores da Secção Administrativa do Tribunal Central Administrativo: I. RELATÓRIO 1.1.

N..., S.A.

, sociedade comercial anónima, pessoa coletiva número ..., com sede na Rua ..., Campo ..., ... ..., e NC..., S.A., pessoa coletiva número ..., com sede na Rua ..., Campo ..., ... ..., movem a presente ação administrativa contra o Município ...

, com sede no ... ..., com o NIF ..., formulando o seguinte pedido “Neste termos e nos demais de direito aplicáveis, deve a presente ação ser julgada procedente, por provada, e em consequência ser a CM... condenada a: - Analisar o pedido de autorização da N... nos termos do DL 11/2003, de 18.1, - sem aplicação das normas do RMUEMA aplicadas ou outras desse regulamento, - devendo ser descontado o período entre 5.2.2018 e 5.2.2018 e 27.2.2018, para efeitos do n.º 8 do art. 6º do DL 11/2003, - e serem desaplicadas as normas do RMUEMA aplicadas, nos termos supra expostos - ou caso assim não se entenda ser anulado o ato de indeferimento datado de 26.2.2018”.

Para tanto, alegam, em síntese, que a 1.ª A., mandatada pela 2.ª A., apresentou junto da Câmara Municipal ..., em 5/02/2018, um pedido de autorização para instalação de infraestrutura de suporte de Estação de Radiocomunicações na Rua ..., ..., ...; Após a apresentação do requerimento, foi notificada do ato de indeferimento de 26/02/2018, que assenta na “omissão de elementos cuja apresentação é obrigatória nos termos do Regulamento Municipal de Urbanização e Edificação do Município de ...” (RMUEMA), bem como pelo não cumprimento do afastamento previsto no artigo 30.º do RMUEMA; Entendem que o ato em causa é ilegal por violação do princípio da audiência prévia, a que se refere o artigo 9.º do Decreto-lei n.º 11/2003; Tal violação importa a condenação do R. a apreciar o pedido das AA., sem aplicação das normas do RMUEMA que estiveram na base do ato impugnado; O ato está igualmente ferido de ilegalidade por violação do princípio da proporcionalidade e da imparcialidade, por ter sido adotada uma solução sem o esgotamento prévio da busca de soluções alternativas; Mais alegam que o ato de indeferimento viola o artigo 7.º do Decreto-lei n.º 11/2003, porquanto o mesmo apenas poderia ter como base os fundamentos referidos no mesmo artigo e que nos termos dos artigos 1.º e 5.º do Decreto-lei n.º 11/2003, não poderia a autarquia ter solicitado outros documentos que não os previstos no diploma, sendo inválida a aplicação de normas do RMUEMA; Ademais, sustentam que o ato impugnado padece de falta de fundamentação porquanto, nenhum facto em concreto resulta do ato em crise nos autos sobre a justificação de não ser possível a instalação da infraestrutura em causa; Referem que as normas do RMUEMA são nulas, na medida em que o órgão que as emanou não dispunha de habilitação legal para o efeito, violando disposição legal superior; Advogam que o ato em causa viola o princípio da colaboração com os particulares, previsto no artigo 11.º do CPA, porquanto o R. nem contactou a primeira autora a solicitar quaisquer esclarecimentos sobre o processo de autorização municipal, nomeadamente, quanto à titularidade do terreno em questão; Entendem que é igualmente à Anacom, e não aos municípios, que compete adotar medidas condicionantes na instalação e funcionamento das infraestruturas de telecomunicações, bem como aferir do cumprimento dos níveis de referência relativos à exposição da população a campos eletromagnéticos; Consideram que o ato é igualmente ilegal ao violar do princípio da prossecução do interesse público associado ao setor das telecomunicações, ao não permitir a instalação da infraestrutura em causa, em manifesta oposição a esse interesse reconhecido quer pelo legislador quer pelas ANACOM.

Concluem, pugnando pela procedência da ação.

* 1.2 Citado, o Município ... apresentou contestação, defendendo-se por impugnação, alegando, em síntese, que o objetivo da audiência prévia prevista no artigo 9.º Decreto-lei n.º 11/2003 justifica-se para a criação de condições de minimização do impacto visual e ambiental que possam levar ao deferimento do pedido, sendo que, no caso concreto, mantendo-se a localização proposta, a mesma não cumpriria o disposto no artigo 30.º, n.º 1, al. a) do Regulamento Municipal da Urbanização e Edificação do Município ...; Sustenta que o ato em crise não viola qualquer norma constitucional, nomeadamente o artigo 265.º, n.º 5 da Constituição da República Portuguesa, porquanto não foi vedado às autoras que apresentassem novo pedido que respeitasse as condições legalmente exigíveis; Mais alega que as diligências e procedimentos destinados a cumprir com a obrigação de cumprimento de distância mínima de 100 metros prevista no antedito artigo do regulamento municipal, cabem às autoras, e não ao réu; Conclui, pugnando pela improcedência da ação.

1.3. Por sentença de 16/09/2021, a NT..., S.A. foi habilitada para prosseguir a presente lide como autora, em substituição da O..., S.A., anterior N..., S.A.

1.4. Por despacho de 24/11/2021 foi dispensada a realização de audiência prévia.

1.5.Proferiu-se despacho saneador tabelar, fixou-se o valor da ação em €30.500,00 e proferiu-se decisão final que julgou a ação procedente, sendo o respetivo dispositivo do seguinte teor: «Com base no supra exposto, julgo a presente ação totalmente procedente e, em consequência, condeno o Município ... a analisar o pedido de autorização apresentado pela N..., nos termos do Decreto-lei n.º 11/2003, sem aplicação das normas do Regulamento Municipal de Urbanização e Edificação do Município ..., devendo ser descontado o período entre 6/02/2018 e 25/02/2018, para efeitos do n.º8 do artigo 6.º daquele diploma.

Custas pelo réu.

Registe e notifique.

» 1.6. Inconformado com a decisão assim proferida, o réu interpôs recurso de apelação, no qual formulou as seguintes CONCLUSÕES: «1. As Autoras vieram nos presentes autos peticionar a anulação do “ato de indeferimento” da autoria da Senhora Presidente da Câmara Municipal ..., imputando para o efeito vários vícios.

  1. Todos têm por base a aplicação única e exclusiva do Decreto-Lei n.º 11/2003, de 18 de janeiro, o que afastaria a aplicação do Regulamento Municipal de Urbanização e Edificação do Município ... (RMUEMA).

  2. Daí que tenha peticionado, a final, a condenação do Município a apreciar o pedido sem aplicação das normas do RMUEMA.

  3. Aderindo a esta tese, a sentença recorrida condenou o Município ... a apreciar o pedido em causa nos termos daquele Decreto-Lei “sem aplicação das normas do Regulamento Municipal de Urbanização e Edificação do Município ...”, o que constitui erro de julgamento e de aplicação do Direito.

  4. O Exmo. Senhor Juiz a quo interpreta bem o Decreto-Lei n.º 11/2003, no sentido de que nele se criou e regulou um procedimento especial, cuja instrução do requerimento deve seguir o disposto no artigo 5.º e que o indeferimento do pedido conhece as suas causas no artigo 7.º.

  5. Contudo, s.m.o. e com o máximo respeito, aplica-o erradamente ao caso concreto, pelo que não é a interpretação legal que está em causa no presente recurso, mas antes, e só, a sua aplicação ao caso sub judice.

  6. O Tribunal a quo admitiu que o ato impugnado será um ato de indeferimento, e não de rejeição liminar, porque o artigo 6.º apenas o prevê para casos em que o requerimento não contém “os documentos previstos no artigo 5.º e, como se deixou antedito, os fundamentos de rejeição assentaram em causas distintas”.

  7. Com o devido respeito, crê-se ser este o primeiro erro de raciocínio, confundindo-se a rejeição liminar com a eventual ilegalidade das suas causas.

  8. As causas são o fundamento do ato, não o tipo de ato, pelo que claramente erra a sentença recorrida quando considera que o ato impugnado não é, pelas razões que alega, um ato de rejeição liminar.

  9. Na verdade, ainda que se discuta as causas da rejeição liminar, o ato é claramente deste “tipo” e não de “indeferimento”, pois nele não se analisa substantivamente a pretensão apresentada pelas AA, antes se constata a falta de elementos instrutórios que, no entender do Município, são obrigatórios, porquanto exigidos regulamentarmente.

  10. A não instrução do requerimento com elementos obrigatórios, seja porque impostos legalmente, seja porque impostos regulamentarmente, constitui irregularidade ou deficiência do requerimento que justifica despacho de rejeição liminar, conforme previsto no artigo 6.º daquele diploma legal, numa interpretação, se se quiser, extensiva.

  11. Daí que forçoso seja já concluir pela errada aplicação do Direito ao caso concreto, quando na sentença recorrida se conclui que, por estarmos “perante um ato de indeferimento do pedido, como previsto no artigo 7.º, o mesmo teria de ter sido obrigatoriamente antecedido de audiência prévia”.

  12. Sendo o ato de rejeição liminar, não se insere no âmbito do disposto no artigo 9.º que, como expressamente confessa o Exmo. Senhor Juiz a quo, prevê uma audiência prévia “pro ativa”, para se encontrar uma outra solução substantiva.

  13. Mas neste caso o Município não analisou substantivamente a pretensão em causa, antes rejeitou previamente o seu requerimento, por falta de elementos obrigatórios.

  14. Consequentemente, não se verifica qualquer violação do disposto no artigo 9.º do Decreto-Lei n.º 11/2003, nem dos artigos “267.º, n.º 5 da Constituição, 12.º e 121.º do CPA”, ao invés da conclusão da sentença recorrida.

  15. O que este ato (de rejeição liminar) convoca, necessariamente, é a discussão de saber se pode ou não um Município, no exercício das suas atribuições e competências, desde logo ao abrigo do princípio da autonomia local, prever outras elementos, que apenas acrescem ou completam os já previstos legalmente.

  16. E neste âmbito a sentença recorrida acaba por enfermar de um segundo erro de raciocínio: volta a confundir a instrução do requerimento com o indeferimento da pretensão, quando em causa nos autos está um ato de rejeição liminar, e não um indeferimento por razões...

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