Acórdão nº 382/22.3T8ETZ.E1 de Tribunal da Relação de Évora, 16 de Março de 2023

Magistrado ResponsávelMARIA DOMINGAS
Data da Resolução16 de Março de 2023
EmissorTribunal da Relação de Évora

Processo n.º 382/22.3T8ETZ.E1 Tribunal Judicial da Comarca de Évora Juízo de Competência Genérica de Estremoz I. Relatório Banco (…), SA instaurou contra (…), Transportes, SA procedimento cautelar especificado de entrega judicial de bem locado, nos termos do artigo 21.º do DL 149/95, de 24 de Junho, requerendo a final a entrega dos veículos que identificou, a fixação de sanção pecuniária, a suportar pela requerida, de valor não inferior a € 100,00 por cada dia de atraso na entrega, mais requerendo a antecipação do juízo sobre a causa principal, fazendo valer o direito acautelado pela providência, tudo com dispensa da audição da requerida. Em fundamento alegou, em síntese, ter celebrado com a requerida em 7 de Junho de 2017 e 11/1/2016, contratos de locação financeira no âmbito dos quais cedeu a esta o gozo dos veículos que identificou, mediante o pagamento das rendas acordadas. Mais alegou que a requerida entrou em incumprimento contratual, o que motivou a resolução de ambos os contratos, a qual lhe foi comunicada mediante cartas datadas de 23 de Junho de 2022, devidamente recepcionadas, sendo que até ao momento não procedeu ao pagamento das quantias em dívida nem à entrega dos veículos, apesar de para tal ter sido expressamente interpelada. As viaturas são pertença da requerente, continuando a ser abusivamente utilizadas pela requerida, existindo o fundado receito de que tal utilização ocorra sem quaisquer cuidados de manutenção, como o comprovam a existência de multas e falta de pagamento de portagens que àquela foram comunicadas, o que justifica a presente providência. * Presentes os autos à Sr.ª juíza, após ter facultado à requerente o exercício do contraditório, considerando a pendência dos autos de processo especial de revitalização no mesmo Juízo de Competência Genérica de Estremoz do TJ da Comarca de Évora, foi proferido despacho a determinar a suspensão do procedimento cautelar nos termos do artigo 17.º-E, n.º 1, do CIRE. Inconformada, apelou a requerente e, tendo desenvolvido nas alegações apresentadas os fundamentos da sua discordância com o decidido, formulou a final as seguintes conclusões: “A) O presente recurso tem por objecto o douto despacho proferido no dia 06.01.2023,referência Citius 32511329, o qual, em suma, determinou, nos termos do artigo 17.º-E, n.º 1, do Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas (C.I.R.E.), a suspensão do presente procedimento cautelar; B) Visando obter uma Decisão que substitua a decisão recorrida por uma decisão de prosseguimento do presente procedimento cautelar, com vista a que venha a ser decretada a providência cautelar de entrega judicial dos veículos aqui em causa, face à resolução desde 23.06.2022, ou seja, em momento anterior ao do PER da Requerida, dos contratos de locação financeira aqui em causa; C) Não se peticionando, neste procedimento cautelar, reconhecimento de uma eventual dívida da Recorrida para com o Recorrente, deveria ter sido decidido que a suspensão prevista no artigo 17.º-E, n.º 1, do C.I.R.E. não se poderia aplicar nesta concreta providência cautelar, violando, por isso, o douto despacho aqui em causa o disposto no artigo 17.º-E do C.I.R.E., artigo 21.º, nºs 1 a 4, do Decreto Lei n.º 149/95, de 24 de Junho de 1995, na sua redação vigente, artigo 272.º do Código de Processo Civil (C.P.C.) e artigos 362.º e 363.º, ambos do C.P.C.; D) O presente procedimento cautelar destina-se à entrega judicial de 3 viaturas (matrícula …, matrícula … e matrícula …), face à resolução, por incumprimento, dos respectivos contratos de locação financeira, desde 23.06.2022, tudo ao abrigo do disposto no artigo 21.º do Decreto Lei n.º 149/95, de 24 de Junho de 1995, na sua redação vigente; E) Não tendo até hoje a Recorrida entregue as viaturas em causa; F) Gerando e acumulando, ao invés, multas, faltas de pagamento de portagens e dos seguros dos carros e, ainda, a notificação do Banco Recorrente, no passado dia 10.01.2023, 16/19 quanto à viatura com a matrícula (…), por parte do MAI, PSP, CT Évora, para proceder à identificação do condutor por motivo de intervenção em acidente e abandono do local de sinistro com outro veículo sem apresentação de identificação; G) Verifica-se um gritante descuido por parte da Recorrida quanto às viaturas em causa nos contratos de locação financeira, fazendo um uso abusivo e reprovável das mesmas, não podendo colher que, com esta conduta, a Recorrida tenha uma efectiva necessidade destes veículos para a sua actividade, estando, ao invés, a aproveitar-se de, até esta data, não existir nenhuma decisão judicial que ordene a entrega das viaturas para continuar a usar essas viaturas de forma ilegítima e abusiva e em claro prejuízo do direito do aqui Recorrente; H) Cabendo ao Tribunal pôr um termo a esta realidade; I) A pendência de um Processo Especial de Revitalização da aqui Recorrida que corre os seus termos neste Tribunal Judicial da Comarca de Évora, Juízo de Competência Genérica de Estremoz, sob o processo n.º 258/22.4T8ETZ, não é impeditiva do presente procedimento cautelar nem motivo de suspensão, face ao disposto no artigo 17.º-E, n.º 1, do C.I.R.E., na sua redação actual, que determina que a decisão de nomeação de administrador judicial (apenas) obsta à instauração de quaisquer acções executivas (já não se reportando a acções para cobrança de dívidas como previsto na redação anterior); J) Já à luz da redação anterior, a jurisprudência entendia que o procedimento cautelar que aqui nos ocupa não era, nem se equiparava, à acção (declarativa ou executiva) “para cobrança de dívidas” aludida no artigo 17.º-E, n.º 1, do CIRE, na sua redacção anterior; K) Não procurando o Recorrente, com o presente procedimento cautelar, como resulta do seu pedido, a condenação da Recorrida no pagamento de qualquer quantia (nem mesmo aquando da antecipação do juízo sobre a causa principal) mas sim e tão só a restituição/entrega judicial das viaturas que lhe pertencem, mas permanecem de forma ilegítima e abusiva na posse da Recorrida; L) Determina o artigo 21.º, n.º 1, do Decreto-Lei n.º 149/95, na sua redação atual, o seguinte: Se, findo o contrato por resolução ou pelo decurso do prazo sem ter sido exercido o direito de compra, o locatário não proceder à restituição do bem ao locador, pode este, após o pedido de cancelamento do registo da locação financeira, a efectuar por via electrónica sempre que as condições técnicas o permitam, requerer ao tribunal providência cautelar consistente na sua entrega imediata ao requerente; M) Resulta deste normativo que não estamos, em sede do procedimento cautelar nele em causa, perante um pedido de devolução de um bem qualquer pertencente à locatária, e nem estamos perante um pedido de condenação da Recorrida no pagamento de qualquer prestação pecuniária; N) À luz da antiga redação do artigo 17.º-E, n.º 1, do CIRE, só se mandavam suspender as ações e procedimentos em curso que tivessem por finalidade “a cobrança de dívidas contra o devedor”; O) E, à luz da redação actual, apenas se manda suspender as acções em curso com idêntica finalidade, leia-se, às acções executivas para cobrança de créditos, ou seja, as que tenham por objecto uma prestação pecuniária, o que, no caso concreto, não se verifica; P) Se o legislador quisesse incluir outro tipo de acções, nessa previsão de suspensão, tinha tido a oportunidade de o fazer expressamente, aquando da última revisão feita e que deu azo à redação vigente desta norma, não o tendo, porem, feito; Q) Ora, por via da presunção estabelecida no artigo 9.º, n.º 3, do Código Civil, devemos concluir que o legislador soube exprimir corretamente o seu pensamento, não incluindo, assim, na previsão de suspensão prevista no artigo 17.º-E, n.º 1, do C.I.R.E., na sua redação vigente, outras acções para além das ações executivas para pagamento de quantia certa; R) Constando, ainda, dos presentes autos, a existência de um processo de insolvência da recorrida (que o Recorrente...

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