Acórdão nº 01453/18.6BELRA de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 09 de Março de 2023

Magistrado ResponsávelSUZANA TAVARES DA SILVA
Data da Resolução09 de Março de 2023
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Acordam na Secção do Contencioso Administrativo do Supremo Tribunal Administrativo: I – Relatório 1 – A..., S.A.

e os seus administradores AA e BB, todos com os sinais dos autos, propuseram no Tribunal Administrativo e Fiscal de Leiria, contra o Estado Português, acção administrativa, com fundamento em responsabilidade civil extracontratual do Estado por alegada violação do direito dos Autores a uma decisão em prazo razoável.

2 – Por sentença de 20.04.2020, o TAF de Leiria julgou a acção improcedente.

3 – Inconformados os AA. recorreram para o TCA Sul, que, por acórdão de 29.10.2020, negou provimento ao recurso.

4 – Os AA. interpuseram recurso de revista dessa decisão, a qual foi admitida por acórdão de 14.01.2021, tendo sido proferido acórdão por este STA em 11.03.2021, que concedeu parcial provimento ao recurso e revogou o acórdão do TCA Sul na parte em que se julgou procedente a excepção da prescrição dos pedidos indemnizatórios e determinou a baixa dos autos àquele Tribunal para apreciação das questões relativas aos pressupostos da responsabilidade civil extracontratual invocada que, em face daquela decisão quanto à prescrição, se haviam tido por prejudicadas.

5 – O TCA Sul proferiu novo acórdão em 14.07.2022 no qual “concedeu parcial provimento ao recurso, revogou a sentença recorrida na parte afectada e fixou a indemnização devida pelo dano não patrimonial sofrido pela A. A..., S.A., no montante de EUR 5.000,00, e pelos AA. AA e BB, no montante de EUR 4.000,00, a cada um, a que acrescem juros vincendos à taxa legal até efectivo e integral pagamento”.

6 – Ainda não conformados com esta decisão, os AA. interpuseram novo recurso de revista para este STA, o qual foi admitido por acórdão de 12.01.2023.

7 – Os Recorrentes apresentaram alegações que remataram com as seguintes conclusões: «[…] 1. O recurso é admissível, até porque o acórdão viola a jurisprudência do próprio TCAS e do STA e do TEDH.

  1. Violando dessa forma o princípio da segurança jurídica e o artigo 6.º, n.º 1, da Convenção Europeia dos Direitos do Homem.

  2. O direito europeu tem primado sobre todo o direito nacional.

  3. Sintetizando, as questões a tratar são as seguintes: a) Sobre a responsabilidade do Estado pela duração da acção executiva e se é responsável pela duração da execução confiada aos solicitadores de execução.

    b) Sobre a ainda contínua duração do processo de insolvência e o direito a uma indemnização até ao fim da liquidação, pois só aí termina o processo.

    c) Se no cálculo da indemnização por atraso na justiça, e segundo a jurisprudência do TEDH, se deve contabilizar a duração total da causa, e não apenas o tempo excedente ao prazo tido por razoável.

    d) Sobre os danos não patrimoniais comuns e especiais dos administradores da Sociedade, i.e.

    dos AA. AA e BB, se foram correctamente calculados e) Se devem ser fixados danos patrimoniais e como.

    f) Se este processo nos tribunais administrativos viola o direito ao prazo razoável.

    g) Se os juros devem ser calculados desde a citação ou da data do acórdão.

    h) Se os valores fixados para as indemnizações estão correctos, ou seja, porque não fixar 1.500,00 € por cada ano de duração do processo.

    i) Se os honorários devem ser fixados e pagos de acordo com a jurisprudência do Tribunal Europeu dos Direitos do Homem, como um dano indemnizável autónomo, e de acordo com o Estatuto da Ordem dos Advogados, como decidiu recente acórdão do TCAS de 02/06/2022, anexo a estas alegações.

  4. Devem ser fixados honorários segundo o Estatuto da Ordem dos Advogados.

  5. Os autores já pagaram a soma 19.854,45€ mais 300,00€ mais IVA.

  6. Os respectivos recibos já estão nos autos, sendo que agora se junta o recibo 222 de pagamento deste recurso.

  7. Há decisão contra legem, contra o artigo 105.º do Estatuto da Ordem dos Advogados, se os honorários não foram fixados de acordo com tal artigo.

  8. Já agora há muita diferença entre um advogado oficioso e um mandatário constituído.

  9. Deve ser acrescentado com todo o vigor que não se pode aplicar o regulamento actual das custas processuais, porque isso violaria as regras europeias, tal como interpretadas pelo Tribunal Europeu dos Direitos do Homem.

  10. O TEDH condena sempre nos honorários do advogado.

  11. Se os honorários não fossem pagos dessa forma, não havia interesse em recorrer aos tribunais para contestar a morosidade dos tribunais, pois se pagava em honorários mais do que se recebia de indemnização.

  12. E dessa forma se esvaziaria o conteúdo do direito constitucional e convencional do direito à justiça em prazo razoável.

  13. Dissuadindo as vítimas de recorrer aos tribunais.

  14. Quando praticamente nunca têm direito ao apoio judiciário.

  15. Até porque todos têm o direito constitucional de escolherem o Advogado que entendam por bem.

  16. Não é demais relembrar que os tribunais têm de aplicar a lei internacional e não a nacional, sob pena de violação do artigo 1.º e 6.º, n.º 1, da Convenção Europeia dos Direitos do Homem.

  17. O Estado é responsável pela duração da acção executiva confiada aos solicitadores de execução.

  18. O agente de execução é um auxiliar da justiça, pelo que os actos ilícitos cometidos na respectiva actuação implicam a responsabilidade civil do Estado.

  19. O agente de execução age em nome do Estado que tem o monopólio da justiça.

  20. Dispõe o artigo 1.º, n.º 4 do Regime da Responsabilidade Civil do Estado e Demais entes Públicos o seguinte: (…) 4 - As disposições da presente lei são ainda aplicáveis à responsabilidade civil dos demais (…) por acções ou omissões que adoptem no exercício de prerrogativas de poder público ou que sejam reguladas por disposições ou princípios de direito administrativo.” 22. Sendo que o Agente de Execução, no caso específico dos processos de execução actua no exercício de prerrogativas de poder público, havendo diversos atos ao longo do processo que tem que ser avaliados pelo Juiz.

  21. Em conclusão, a excessiva duração do processo executivo é imputável ao Estado.

  22. Face ao exposto, deve a duração global da tramitação da acção, da execução e do PER e da insolvência e todos os seus apensos ser imputada ao Estado Português, e consequentemente ser revogado o douto Acórdão proferido pelo Tribunal a quo, condenando-se o Recorrido tal como peticionado, mostrando-se violados os artigos e 615.º n.º 1-d) do Código de Processo Civil; 6.º, da C.E.D.H. e 24.º, n.º 1, da C.R.P.

  23. O PROCESSO DE INSOLVÊNCIA TEM O MESMO OBJECTIVO DA ACÇÃO E EXECUÇÃO: RECEBER OS CRÉDITOS VENCIDOS.

  24. O próprio tribunal e a lei admitem que o processo de insolvência também se destina ou se destina especialmente à repartição do produto obtido pelos credores, sendo um processo de execução universal que tem como finalidade a satisfação dos credores.

  25. Logo, a afirmação conclusiva do tribunal de que a execução e a falência não têm a mesma finalidade (pagamento dos credores) está em contradição com as premissas que o tribunal utilizou e é uma afirmação claramente contra legem, violando o artigo 1.º da lei atrás citada pelo tribunal e o direito a um processo equitativo, previsto no artigo 6.º, n.º 1, da Convenção Europeia dos Direitos do Homem, constituindo um erro grosseiro e intolerável, 28. Materialmente, o objectivo é o mesmo, pelo que deve concluir-se que o processo de insolvência faz parte do conceito de determinação de direitos e obrigações de carácter civil como estabelece o artigo 6.º, n.º 1, da Convenção dos Direitos do Homem, que portanto foi violado.

  26. O direito dos autores só é determinado quando recebessem a verba a que teriam direito no processo de insolvência, sendo que nada vão receber conforme certidão junta.

  27. Sobre a ainda contínua duração do processo de insolvência e o direito a uma indemnização até ao fim da liquidação 31. Como já vimos, o STA não se pronunciou sobre isso e o anterior acórdão do TCAS idem, por este entender que tinha havido prescrição.

  28. Mas o STA mandou julgar a acção e conhecer dos pedidos.

  29. Segundo a lei portuguesa os processos de falência/insolvência são processos urgentes.

  30. E segundo o TEDH estes processos são dos que devem ser geridos com especial celeridade.

  31. Sobre os danos não patrimoniais comuns e especiais dos administradores da Sociedade, i.e. dos AA. AA e BB, há que ter em conta os pesadíssimos danos especiais morais ainda causados no caso concreto.

  32. Os factos provados mostram que a demora do processo causou os danos comuns e ainda danos especiais nos gerentes. É um dano especial ter de tomar medicamentos, antidepressivos, ansiolíticos, tranquilizantes para poder dormir e relacionar-se, tudo por causa da demora do processo.

  33. A autora sociedade perdeu o seu crédito, que é o valor da acção, e os lucros cessantes do investimento provado.

  34. Bem como os danos emergentes e lucros cessantes do resultado comprovado no n.º 133.

  35. Um dia ou um mês numa empresa pode contribuir para a perda de negócios ou a oportunidade de os realizar. As oportunidades são únicas num mundo competitivo.

  36. O TCAS interpretou erradamente o acórdão do STA, de 24/05/2018, pois foi o retardamento havido na emissão daquela decisão judicial que impossibilitou o credor de ter podido diligenciar, mais cedo, pela dedução e instauração dos meios e dos mecanismos de garantia e de cobrança executiva e que estes, por conferidores de anterioridade e prioridade registal, lhe teriam permitido obter na ação executiva, em sede da operação de pagamento dos credores graduados, o pagamento da totalidade do seu crédito e que só tardiamente lhe veio a ser reconhecido naquela decisão.

  37. Em qualquer circunstância houve uma perda de chance de ganho pelo atraso do processo, como, repetidamente, diz o STJ.

  38. Os factos provados 113-131 mostram que a autora-sociedade tinha grandes chances de receber o seu crédito e que essas chances eram reais, sérias e consistentes.

  39. Na pior das hipóteses deveria relegar-se o dano para liquidação de sentença ou ser fixado equitativamente.

  40. Pois nada faltava para que a sociedade autora recebesse os seus créditos se não houvesse demora da justiça.

  41. ...

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