Acórdão nº 129/22.4PBCVL.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 22 de Fevereiro de 2023

Magistrado ResponsávelMARIA JOSÉ GUERRA
Data da Resolução22 de Fevereiro de 2023
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

Acordam em conferência os juízes do Tribunal da Relação de Coimbra I- Relatório 1. No Processo Abreviado Nº 129/22.... … foi proferida oralmente sentença … a) Condenar o arguido AA, pela prática, no dia 02 de Abril de 2022, em autoria material, na forma consumada, de um crime de desobediência, previsto e punido pelos artigos 14.º, n.º 1, 26.º, e 348.º, n.º 1, alínea b), todos do Código Penal., na pena de 90 … dias de multa … * Inconformado com tal decisão dela interpôs recurso o arguido extraindo da motivação do recurso as seguintes conclusões que se transcrevem: «… 2. … o Tribunal a quo considera que o ora arguido/recorrente praticou o crime supra referido, porquanto, estando o seu estabelecimento a funcionar para além do horário determinado por deliberação camarária, o arguido não cumpriu a ordem de encerramento do mesmo, emanada pelos Srs. Agentes da PSP.

  1. Porém, para a consumação do crime em causa não basta a mera desobediência a uma ordem comunicada e emanada de autoridade; 4. É necessário também que não exista disposição legal que sancione especificamente essa conduta por parte do agente incumpridor.

  2. Ora, no caso em apreço, o funcionamento de um estabelecimento comercial fora do horário estabelecido está devidamente sancionado por disposição legal, nomeadamente, pelo o Regulamento n.º 1069/2016, publicado em Diário da República, 2.ª série — N.º 233 — 6 de dezembro de 2016; 6. Cujo artigo 12º n.º 1, alínea b), determina que constitui contraordenação punível com coima de €250,00 a € 3.750,00, para pessoas singulares e de €2.500,00 a € 25.000,00, o funcionamento de estabelecimento comercial para além do horário estabelecido.

  3. Salvo melhor e douta opinião, não poderia, como não pode, a Autoridade Policial efetuar a advertência dada como provada nos presentes autos e não deveria, como não deve, consequentemente, o ora arguido ser punido pela prática de um crime de desobediência, atendendo ao carácter meramente subsidiário da incriminação prevista na alínea b) do n.º 1 do artigo 348º do Código Penal.

  4. Pelo que, o Tribunal a quo fez uma errada aplicação do artigo 348º n.º 1, alínea b) do Código Penal …» … * Ao recurso interposto respondeu o Digno Magistrado do MºPº junto da primeira Instância … E conclui que o recurso do arguido não merece provimento.

    Neste Tribunal da Relação, a Exma. Sra. Procuradora-Geral Adjunta, emitiu parecer no sentido de que o presente recurso não merece provimento… … * II - Fundamentação A) Delimitação do objecto do recurso … a única questão a decidir é a seguinte: - O incorrecto enquadramento jurídico-penal dos factos … * B) Da decisão recorrida … Na sentença foram considerados como provados, os seguintes factos: 1. O arguido AA explora o estabelecimento comercial “F...”, sito na Rua ..., ....

  5. Na sequência de várias reclamações apresentadas relativas ao incumprimento reiterado do encerramento dentro do horário estipulado e do constante ruído provocado pelo funcionamento do estabelecimento, a Câmara Municipal ... deliberou, em reunião de 04.02.2022, restringir o horário de encerramento do estabelecimento “F...” até às 00h00, o que foi noticiado ao arguido AA.

  6. Não obstante, no dia 02.04.2022, pelas 03h00, o estabelecimento em causa, explorado pelo arguido AA, encontrava-se aberto ao público, em pleno funcionamento, com cerca de quinze pessoas no seu interior.

  7. Em virtude do exposto, o arguido foi abordado pela patrulha da Polícia de Segurança Pública que se deslocou ao local dos factos, composta pelos agentes BB, CC e DD, os quais se identificaram como tal.

  8. Nesse contexto, os referidos agentes da Polícia de Segurança Pública advertiram expressamente o arguido da necessidade de encerrar o estabelecimento “F...”, em virtude da deliberação camarária, sob pena de incorrer na prática de um crime de desobediência.

  9. Não obstante, o arguido manteve o estabelecimento “F...” em pleno funcionamento até, pelo menos, às 05h50.

  10. O arguido sabia que devia obediência à ordem que lhe tinha sido regularmente comunicada, a qual sabia legítima e proveniente de autoridade competente.

  11. O arguido agiu com o propósito concretizado de não obedecer à ordem legítima, regularmente comunicada e emanada de autoridade competente, que lhe foi transmitida, apesar de ter sido advertido de que tal falta o faria incorrer no crime de desobediência, pondo em causa a autoridade subjacente à mesma.

  12. O arguido agiu livre, deliberada e consciente, bem sabendo que a sua conduta era proibida e punida por lei.

    … * C) Apreciação do recurso … insurge-se o arguido e ora recorrente apenas quanto à sua condenação pelo crime de desobediência, previsto pelo art. 348º, nº1 b) do C. Penal, por entender que, em termos normativos, o legislador previu as consequências sancionatórias da sua conduta nela descrita, nos termos do disposto no disposto no art. 12º, nº1, b) do Regulamento Nº 1069/2016, publicado no Diário da República, 2ª Série – Nº 233, de 6 de Dezembro de 2016, nele estipulando que constitui contraordenação o funcionamento fora do horário estabelecido … e que, sendo a sua conduta … susceptível de integrar a referida contraordenação, não se legitima materialmente a criminalização do incumprimento da ordem emanada pela Autoridade Policial, porque a lei prevê as consequências sancionatórias para a mesma, pelo que a ordem emitida por esta não foi legítima … A questão que se coloca para conhecimento deste Tribunal da Relação, impõe que nos detenhamos na abordagem do crime de desobediência, previsto e punido pelo art. 348º do C. Penal, a qual faremos, seguindo, no essencial, a formulação de Lopes da Mota, in Crimes Contra a...

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