Acórdão nº 0102/22.2BALSB de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 23 de Fevereiro de 2023

Magistrado ResponsávelPAULA CADILHE RIBEIRO
Data da Resolução23 de Fevereiro de 2023
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Acordam no Pleno da Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo: 1. Relatório 1.1. A..., S.A.

vem, ao abrigo do disposto nos artigos 152.º, n.º 1, do Código de Processo nos Tribunais Administrativos (CPTA) e 25.º, n.ºs 2 a 4, do Regime Jurídico da Arbitragem Tributária (RJAT), aprovado pelo Decreto-Lei n.º 10/2011, de 20 de janeiro, interpor recurso para o Pleno da Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo da decisão arbitral proferida pelo Centro de Arbitragem Administrativa (CAAD), no processo n.º 652/2021-T, por entender que a mesma se encontra em oposição, quanto à mesma questão fundamental de direito, com a decisão arbitral proferida pelo mesmo CAAD, no âmbito do processo n.º 835/2021-T.

Com a interposição do recurso apresentou alegações e formulou as seguintes conclusões: «A. O presente Recurso tem como objecto a Decisão Arbitral proferida, em 20 de Junho de 2022, no âmbito do processo n.º 652/2021-T, por Tribunal Arbitral constituído no âmbito do CAAD, a qual julgou improcedente o Pedido de Pronúncia Arbitral apresentado pelo ora Recorrente com vista à declaração de ilegalidade do acto de indeferimento tácito do pedido de revisão oficiosa por aquele apresentado e subjacentes liquidações de AIMI, no montante de € 631.266,91.

  1. Visou aquele Pedido de Pronúncia Arbitral, consequentemente, a declaração da ilegalidade do acto de indeferimento tácito do pedido de revisão oficiosa apresentado pelo Recorrente e, bem assim, a declaração da ilegalidade parcial dos actos de liquidação de AIMI sindicados naquele pedido de revisão oficiosa, actos esses referentes aos anos de 2017, 2018, 2019 e 2020.

  2. Nesta matéria, à questão colocada a respeito da possibilidade de se apresentar pedido de revisão oficiosa (como fez a Recorrente) no prazo de 4 anos, o Tribunal Arbitral entendeu que «[d]as várias situações de revisão oficiosa elencadas no artigo 78º, da LGT, surpreendem-se as previstas nos nºs 1 e 6, do citado normativo, relativas a atos de liquidação e as previstas nos nºs 4 e 5, relativas a atos de fixação de valores patrimoniais. Daqui decorre, com cristalina evidência, que só dentro do condicionalismo previsto nos citados nºs 4 e 5 se poderia equacionar a possibilidade legal de revisão oficiosa”.

  3. Naquele pressuposto, considerou que “no caso sub juditio, os valores das matrizes que serviram de base às liquidações sob impugnação, estavam fixados desde 2007 e foi apenas em 25-5-2021 que o requerente formulou o seu pedido de revisão oficiosa dessas liquidações ora impugnadas alegando a errónea aplicação dos coeficientes de localização, de afetação e qualidade e conforto no cálculo do VPT dos terrenos para construção. Ou seja, no momento em que é apresentado o pedido de revisão oficiosa, estava transcorrido o prazo para que pudesse eventualmente ser autorizada pela AT a revisão dos atos de fixação de valores patrimoniais. Assim é que, por intempestividade desse pedido e independentemente dos fundamentos, estava afastada a possibilidade de revisão oficiosa dos VPT’s”.

  4. E, analisando o pedido quanto aos anos 2017, 2018, 2019 e 2020, mais concretamente, debruçando-se sobre a questão da possibilidade de se impugnar liquidações de AIMI com fundamento em vícios de actos de fixação de valores patrimoniais, o Tribunal concluiu que “quando o sujeito passivo não concordar com o resultado da avaliação direta de prédios urbanos, pode/deve requerer uma segunda avaliação, no prazo de 30 dias (cfr artigo 76º-1, do CIMI), cabendo então, do resultado da segunda avaliação – é com esta que se esgotam os meios graciosos do procedimento de avaliação -, impugnação judicial nos termos do CPPT (artigo 77º-1, do CIMI)”.

  5. Pelo que, «[d]o exposto decorre a irrelevância como fundamentos da impugnação das liquidações de IMI ou AIMI, eventuais vícios dos antecedentes atos de fixação dos VPT’s, entretanto firmados na ordem jurídica por falta de tempestivo esgotamento dos meios graciosos citados”.

  6. O presente recurso baseia-se na contradição, sobre a mesma questão fundamental de direito, entre a Decisão Recorrida e a Decisão arbitral, de 5 de Maio de 2022, proferida no processo n.º 835/2021-T.

    A identidade da questão de direito sobre que recaíram as decisões em confronto e a identidade substancial das situações fácticas H. Em ambos os arestos aqui em confronto, a questão decidenda ou a questão colocada foi a de saber se, deixando um contribuinte precludir a possibilidade de sindicar o VPT, poderá ainda assim arguir a ilegalidade das liquidações de AIMI com fundamento na ilegalidade subjacente ao cálculo dos VPT que serviram de base às liquidações sindicadas.

    I. Contudo, os Tribunais Arbitrais chamados a pronunciar-se sobre aquela questão – assente em factos iguais e num quadro normativo que não sofreu qualquer modificação relevante – alcançaram soluções totalmente antagónicas que não podem coexistir na ordem jurídica.

    A identidade das situações fácticas em causa nos autos J. Na Decisão Arbitral Recorrida o tribunal foi chamado a apreciar a (i)legalidade do acto de indeferimento tácito do pedido de revisão oficiosa apresentado pelo Recorrente e, bem assim, sobre a ilegalidade parcial dos actos de liquidação de AIMI sindicados naquele pedido de revisão oficiosa, actos esses referentes aos anos de 2017, 2018, 2019 e 2020.

  7. Por sua vez, na Decisão Arbitral Fundamento foi apreciada a (i)legalidade do acto de indeferimento tácito do pedido de revisão oficiosa apresentado pelo Recorrente e, bem assim, sobre a ilegalidade parcial dos actos de liquidação de AIMI sindicados naquele pedido de revisão oficiosa, actos esses referentes aos anos 2017, 2018, 2019 e 2020.

    L. Atendendo à factologia dada como provada e, por conseguinte, tomada em consideração pelos Tribunais Arbitrais nas suas decisões, resulta que, em ambos os processos, foi apreciada a seguinte matéria de facto: M. Na Decisão Arbitral Recorrida “o Requerente apresentou, no dia 25 de Maio de 2021 (cf. Documento 1 e 3), ao abrigo do disposto no artigo 78.º da LGT, correspondente pedido de revisão oficiosa destes atos tributários; o referido pedido de revisão oficiosa considerou-se tacitamente indeferido, por inércia da AT em emitir uma decisão dentro do prazo de 4 meses previsto no n.º 1 do artigo 57.º da LGT”.

  8. Na Decisão Arbitral Fundamento o Requerente “vem requerer […] a constituição de tribunal arbitral para apreciar a legalidade dos atos tributários de liquidação de Adicional ao IMI n.ºs 2017…, 2017…, 2018…, 2018…, 2019… e 2020…, relativos aos anos de 2017, 2018, 2019 e 2020 […] e do ato de indeferimento tácito do pedido de revisão oficiosa contra eles deduzido”.

  9. Assim, em ambos os arestos em confronto, foram apresentados pedidos de revisão oficiosa dos actos tributários de AIMI, nos quais sustentaram a ilegalidade que lhes subjazia, na errónea fixação da matéria colectável, porquanto os VPT dos imóveis em apreço, consideravam os coeficientes de afectação, localização e qualidade e conforto, coeficientes estes que não se encontravam previstos no artigo 45.º do Código do IMI, na redacção em vigor à data dos factos.

  10. Em face do exposto, resulta evidente que a factologia relevante é totalmente coincidente nas Decisões Arbitrais aqui em confronto. Em ambos os processos, foram apresentados pedidos de revisão oficiosa, pedidos esses que tinham por objecto liquidações de AIMI ilegais por assentarem em VPT’s calculados contra legem. Em ambos os processos foi peticionada a constituição de tribunal arbitral a fim de ser apreciada a (i)legalidade subjacente aos actos de indeferimento tácito e, consequentemente, a (i)legalidade parcial dos actos de liquidação àqueles subjacentes.

  11. Acontece que, mesmo perante uma factologia idêntica, os Tribunais Arbitrais alcançaram soluções totalmente antagónicas.

    Identidade da regulamentação jurídica aplicável R. A admissibilidade do recurso para uniformização de jurisprudência, depende ainda da consideração, nos arestos em confronto, do mesmo normativo legal, sendo essencial que tal normativo não tenha sofrido alterações substanciais.

  12. Ora, conforme decorre expressamente das Decisões Arbitrais aqui em confronto, o normativo legal em juízo, em ambos os processos, respeita, essencialmente, ao artigo 78.º da Lei Geral Tributária (“LGT”).

  13. Em ambos os arestos os Tribunais Arbitrais constituídos percorrem a legislação e jurisprudência aplicáveis à inimpugnabilidade dos actos de liquidação com fundamento em vícios próprios do acto de fixação do VPT (cf. página 28 e seguintes da Decisão Arbitral Recorrida e página 5 e seguintes da Decisão Arbitral Fundamento).

    Das soluções jurídicas (expressas) totalmente opostas U. Não obstante as Decisões Arbitrais aqui em confronto terem-se debruçado sobre a mesma questão fundamental de direito, assentando em iguais pressupostos de facto e aplicando os mesmos normativos legais, delas resultaram soluções jurídicas totalmente opostas.

    V.

    De facto, estão em causa soluções antagónicas entre si, as quais não podem, de todo, coexistir na ordem jurídica, impondo-se aqui a intervenção deste Supremo Tribunal ao abrigo dos poderes que lhe são concedidos no âmbito deste Recurso.

  14. Ora, a respeito da inimpugnabilidade dos actos de liquidação com fundamentos em vícios próprios dos actos de fixação de VPT, o Tribunal Arbitral na Decisão Arbitral Recorrida começa por mencionar que “o entendimento do Tribunal vai no sentido da inadmissibilidade da impugnação da liquidação de IMI e/ou AIMI com fundamento na circunstância de terem sido corrigidos ulteriormente os valores que à data das liquidações e pagamentos respectivos constavam das matrizes e que não haviam sido postos em causa”.

    X. Acrescenta que “seguindo de perto a decisão arbitral proferida no Proc 540/2020-T […], por força do preceituado no artigo 15.º do CIMI a avaliação dos prédios urbanos é direta e, por isso, suscetível, nos termos da Lei, de impugnação contenciosa direta e, consequentemente, depende do esgotamento dos...

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