Acórdão nº 359/21.6T8GMR-A.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 23 de Fevereiro de 2023

Magistrado ResponsávelALCIDES RODRIGUES
Data da Resolução23 de Fevereiro de 2023
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

Acordam no Tribunal da Relação de Guimarães I. Relatório Por apenso à execução ordinária intentada por I... Unipessoal, Lda veio o executado AA, em 6/6/2022, deduzir oposição à execução, mediante embargos de executado.

*Notificado para se pronunciar sobre a extemporaneidade dos embargos, o embargante sustentou a tempestividade dos mesmos (ref.ªs ...93 e ...72).

*Datado de 7/07/2022, a Exmª Juíza “a quo” proferiu despacho nos termos do qual decidiu indeferir os embargos, por serem extemporâneos, e, em consequência, determinou a extinção da instância dos embargos (ref.ª ...33).

*Inconformado com esse despacho, dele interpôs recurso o embargante (ref.ª ...04), tendo formulado, a terminar as respetivas alegações, as seguintes conclusões (que se transcrevem): «I. A apelação interposta da douta sentença de fls., decorre da sentença que indeferiu os embargos apresentados, por serem extemporâneos e, em consequência, determinou a extinção da presente instância.

  1. O apelante discorda, respeitosamente, do indeferimento dos embargos apresentados, por serem extemporâneos.

  2. O executado apresentou oposição à execução mediante embargos, em 6/6/2022.

  3. Isto após ter sido citado dos termos da execução e para, querendo e em 20 dias oferecer embargos, em 21/04/2022.

  4. Em21/04/2022, o recorrente apresentou no Centro Distrital da Segurança Social de ... requerimento para obtenção de apoio judiciário nas modalidades de dispensa de taxa de justiça e demais encargos com o processo e nomeação e pagamento da compensação de patrono oficioso.

  5. Em 18/05/2022 foi remetido aos autos e-mail pela ordem dos Advogados, dando conhecimento da nomeação de patrono oficioso ao embargante.

  6. Em 24/05/2022, a Segurança Social juntou aos autos a decisão de concessão de apoio, ou seja, o deferimento total do pedido às modalidades requeridas.

  7. Em 06/06/2022, foi oferecida oposição à execução mediante embargos e juntos documentos comprovativos da concessão de apoio.

  8. É certo que é um dever comunicar o pedido de apoio judiciário ao Tribunal, mas o próprio Tribunal recorrido admite que os requerentes “…muitas vezes, não são efectivamente informadas dos procedimentos a adoptar em relação ao pedido de apoio judiciário…”.

  9. O que in casu aconteceu.

  10. O recorrente é pessoa idosa, sem possibilidades económicas e foi informado de que nada teria de fazer, como prontamente veio esclarecer o douto Tribunal recorrido.

  11. Dispõe o art. 24º, º4 da Lei nº 34/2004, de 29 de Julho, que a interrupção do prazo previsto no artigo 728º, nº 1 do Código de Processo Civil, efectua-se com a junção aos autos pelo executado do comprovativo do pedido de apoio judiciário.

  12. O Tribunal Constitucional ter entendido que essa obrigação não padece de inconstitucionalidade.

  13. Mas admitindo apenas a letra da lei, estamos perante a violação dos direitos de defesa e tutela jurisdiciona efectiva, bem como o direito a um processo equitativo, consagrados nos artigos 13º e 20º da Constituição da República Portuguesa.

  14. O reclamante quando foi citado pediu de imediato apoio judiciário, significando isto que, se o reclamante tivesse condições económicas para poder constituir um advogado, iria apresentar os embargos à execução nos 20 dias seguintes à citação.

  15. Ora, o instituto do apoio judiciário foi consagrado constitucionalmente para assegurar que a insuficiência económica não seja impeditiva para que os cidadãos que pretendam fazer valer os seus direitos nos tribunais acedam à Justiça.

  16. O douto Tribunal recorrido, ao efectuar a interpretação literal e acrítica do artigo 24º, nº4, da Lei nº 34/2004, de 29 de Julho, mesmo que a aplicando à informação trazida ao processo pelos serviços externos (Ordem dos Advogados e Segurança Social), está a descurar a interpretação teleológica e sistemática do preceito legal acima aludido, parecendo descurar que a ratio do instituto do apoio judiciário.

    XVIII. É certo que, o recorrente tinha que apresentar a sua oposição à execução mediamente a dedução de embargos de executado e, no decurso do respectivo prazo, requereu a concessão de apoio judiciário junto do Instituto da Segurança Social, IP., pelo que, numa interpretação e redacção conformes com a Constituição da República Portuguesa, sempre se dirá que o prazo de 20 dias a que alude o artigo 728º, nº 1 do Código de Processo Civil, ficou paralisado, suspenso, com o respectivo requerimento de protecção jurídica apresentado pelo apelante junto dos serviços competentes da Segurança Social.

  17. E essa interrupção de prazo cessou com a notificação à patrona oficiosa da sua nomeação, por força do disposto no artigo 24º, nº 5, alínea a), da Lei nº 34/2004, de 29de Julho, que ocorreu no dia 18/05/2022, pelo que, assim, o prazo para dedução dos embargos iniciou a sua contagem naquele mesmo dia, terminando a 07/06/2022.

  18. Apenas com a nomeação da patrona oficiosa é que o recorrente pôde exercer os seus direitos de defesa e de acesso ao direito, tendo sido após a designação daquela que o executado, enquanto beneficiário de apoio judiciário, teve conhecimento claro e cabal dos factos que podia e devia contestar, em que medida o poderia fazer e como enquadrá-los juridicamente, exercendo em termos minimalistas o seu direito a um processo equitativo e ao patrocínio judiciário.

  19. No modesto entendimento do recorrente, a concretização do artigo 20º da Constituição da República Portuguesa não pode ser impeditiva por acasos burocráticos e por falta de junção a processos judiciais dos comprovativos de pedidos de apoio judiciário, quando lhe requerida a concessão de patrono oficioso, uma vez que a Constituição pretende, com o nº 2 do normativo referido, é que efectivamente a pessoa tenha um patrono judiciário.

  20. Nem o requerente do apoio pode ficar dependente da informação prestada pelas entidades competentes, neste caso, a Ordem dos Advogados e a Segurança Social, em tempo útil.

  21. Em harmonia com o previsto no artigo 9º do Código Civil, não nos devemos cingir à letra da lei, mas, outrossim, reconstituir a partir dos textos o pensamento legislativo, tendo sobretudo em conta a unidade do sistema jurídico.

  22. In casu estamos perante um processo executivo. E está claramente estatuído na Lei Processual Civil a gravidade das consequências para o executado e embargante da não dedução de oposição mediante embargos. Ou seja, implica a confissão dos factos invocados pela Exequente, enquanto revelia operante, em conformidade com o preceituado no art. 567º, nº 1 do Código de Processo Civil.

  23. Pelo que, decidindo como decidiu o douto Tribunal recorrido, o recorrente perde o seu direito à justiça! XXVI. Pelas razões supra enunciadas, no modesto entendimento do recorrente, a interpretação perfilhada pelo douto Tribunal a quo violou, assim, o disposto no art. 24º, nº 4 da Lei nº 34/2004, de 29 de Julho, bem como os artigos 13º e 20º, ambos da Constituição da República Portuguesa.

  24. Pelo que, deve ser proferido douto acórdão revogando o douto despacho recorrido, considerando-se tempestivos os embargos apresentados, e determinando-se o prosseguimento dos autos.

    Nestes termos, e nos melhores de direito aplicáveis que V.as Ex.as doutamente suprirão, deve ser dado provimento ao presente recurso, e, em consequência, ser revogada a douta sentença recorrida, substituindo-a por outra que considere tempestivos os embargos à execução apresentados, determinando-se que os autos prossigam os seus termos posteriores.

    Assim decidindo, farão V.as Ex.as, venerandos desembargadores, a habitual JUSTIÇA!»*Não foram deduzidas contra-alegações.

    *O recurso foi admitido como de apelação, a subir imediatamente, nos próprios autos e com efeito suspensivo (ref.ª ...75).

    *II. Delimitação do objeto do recurso. Sendo o âmbito dos recursos delimitado pelas conclusões das alegações do recorrente – arts. 635.º, n.º 4, e 639.º, n.ºs 1 e 2 do CPC –, ressalvadas as questões do conhecimento oficioso que ainda não tenham sido conhecidas com trânsito em julgado, a questão que se coloca à apreciação deste Tribunal no presente recurso consiste em saber se deve ser revogado o despacho que julgou intempestivos os embargos de executado, mercê da interrupção do prazo em curso (de oposição à execução) face ao requerido apoio judiciário, na modalidade de nomeação de patrono.

    * III.

    Fundamentos IV. Fundamentação de facto.

    A decisão recorrida deu como provados os seguintes factos como relevantes para o conhecimento da questão em apreço: 1 – O executado/embargante foi citado para os termos da execução e para, querendo e em 20 dias oferecer embargos, em 21-4-2022; 2 – Em 21-4-2022, o embargante apresentou no Centro Distrital da Segurança Social de ... requerimento para obtenção de apoio judiciário nas modalidades de dispensa de taxa de justiça e demais encargos com o processo, e de nomeação e pagamento da compensação de patrono oficioso.

    3 – Em 18/5/2022 foi remetido aos autos e-mail pela Ordem dos Advogados, dando conhecimento da nomeação de patrono oficioso ao embargante.

    4 – Em 24/5/2022 foi junta pela Segurança Social decisão de concessão de apoio.

    5 – Em 6/6/2022 oferecida oposição à execução por embargos e juntos documentos comprovativos da concessão de apoio.

    *V. Fundamentação de direito. 1. Da tempestividade dos embargos de executado em consequência da interrupção do prazo em curso (de oposição à execução) face ao requerido apoio judiciário, na modalidade de nomeação de patrono.

    A questão a decidir...

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