Acórdão nº 02408/12.0BELSB de Tribunal Central Administrativo Norte, 10 de Fevereiro de 2023
Magistrado Responsável | Rogério Paulo da Costa Martins |
Data da Resolução | 10 de Fevereiro de 2023 |
Emissor | Tribunal Central Administrativo Norte |
EM NOME DO POVO Acordam em conferência os juízes da Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Norte: O IFAP - Instituto da Financiamento da Agricultura e Pescas, IP, veio interpor RECURSO JURISDICIONAL da sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal de Aveiro, de 08.02.2022 pela qual foi julgada procedente a acção contra si intentada pela Quinta ...- Sociedade Agrícola, L.da.
e, em consequência, foi anulada a decisão da Autoridade Demandada constante do ofício ...12, de 04.07.2012 que determinou a Autora a restituição da quantia de 44.802€68, considerada ajuda indevidamente recebida, pelo vício de “prescrição do procedimento”.
Invocou para tanto, em síntese, que a decisão recorrida violou, por erro de interpretação e aplicação ao caso concreto do n.º 1 do artigo 323º do Código Civil.
A Recorrida contra-alegou defendendo a manutenção da decisão recorrida.
O Ministério Público neste Tribunal não emitiu parecer.
* Cumpre decidir já que nada a tal obsta.
* I - São estas as conclusões das alegações que definem o objecto do presente recurso jurisdicional: A. Vem o presente recurso jurisdicional interposto de sentença de 8/2/2022 do Tribunal Administrativo e Fiscal de ... que julgou procedente a ação e, em consequência foi anulada “… a decisão da ED. constante do oficio n° ...12, com registo de saída n° 12612/2012, de 04/07/2012”, no entendimento que “…com a notificação do oficio de 18/07/2005 (alínea Z) do probatório) a Autora foi interrompida a prescrição do procedimento e começou a contar novo prazo de prescrição de quatro anos”, razão pela qual “… quando a ED. remeteu a Autora o oficio de 04/07/2012 (alínea CC) do probatório), já se encontrava prescrito o procedimento há muito tempo, ao abrigo do disposto no artigo 38 do Regulamento (CE, EURATOM) n° 2988/95, do Conselho, de 18/12”.
B. Salvo melhor entendimento, o Tribunal não faz uma correta interpretação dos factos e aplicação do direito, porquanto, o Tribunal dá como provado que entre a notificação à ora recorrida, em 2005, do ofício de audiência prévia e a decisão final impugnada nos presentes autos em 2012, pelo IFAP, I.P. foi proferida uma decisão final em 2005 que foi impugnada judicialmente, não levando em consideração que entre 2005 e 2012 a contagem do prazo de prescrição encontrava-se interrompido pelo de decurso de uma ação administrativa.
C. A este respeito, entendeu o Tribunal a quo (Pág. 40 da sentença recorrida), que “o ato de 14/10/2005 foi declarado nulo pelo tribunal (alíneas AA) e BB) do probatório) e dado que se tratava de um ato final, enquanto decorreu a ação em tribunal apenas não começou a correr o prazo de execução da decisão, que depois da declaração de nulidade deixou de existir no ordenamento jurídico.” D. Salvo melhor opinião, não é correto o entendimento de que no decurso da ação em Tribunal, apenas não começou a correr o prazo de execução da decisão, dado que depois da declaração de nulidade, esta deixou de existir no ordenamento jurídico, pois se é certo que a declaração de nulidade tem efeitos relativamente à própria decisão final, já não tem efeitos relativamente ao decurso do tempo que o Tribunal levou a decretar a referida nulidade no âmbito do Proc. 336/06.7BELSB.
E. Com efeito, nos termos do nº 1 do Artº 323º do CC “a prescrição interrompe-se pela citação ou notificação judicial de qualquer acto que exprima, directa ou indirectamente, a intenção de exercer o direito, seja qual for o processo a que o acto pertence e ainda que o tribunal seja incompetente”, sendo que nos termos do disposto no nº 1 do Artº 326º do CC que “a interrupção inutiliza para a prescrição todo o tempo decorrido anteriormente, começando a correr novo prazo a partir do acto interruptivo, sem prejuízo do disposto nos n.ºs 1 e 3 do artigo seguinte.” F. Por outro lado, nos termos e para os efeitos do nº 3 do artigo 134° do Código do Procedimento Administrativo (na anterior versão do CPA, em vigor à data dos factos) é possível a atribuição de efeitos jurídicos a situações decorrentes de atos nulos de harmonia com os princípios da boa-fé, da proteção da confiança e da proporcionalidade, designadamente quando associados ao decurso do tempo.
G. Ou seja, o referido preceito não consagra a sanação ou supressão da ilegalidade do ato nulo, mas atribui certos efeitos ao tempo decorrido. (Neste sentido vide acórdão proferido pelo Tribunal Central Administrativo Norte em 3/5/2019, no âmbito do Proc. nº 00841/09.3BEAVR), H. Na situação em apreço, com a interposição da ação relativa ao Proc. 336/06.7BELSS, na qual foi judicialmente impugnada uma decisão final proferida pelo IFAP, I.P. (ex- IFADAP) e até trânsito em julgado da sentença que pôs termo a este processo, interrompeu-se a contagem do prazo de prescrição.
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Atento o exposto, não olvidando todo o processo administrativo supra melhor referido e uma vez que a sentença proferida no âmbito do Proc. 336/06.7BELSS não se pronunciava sobre as razões substantivas/do mérito da decisão proferida pelo Instituto, o ora recorrente notificou a recorrida, através do ofício nº ...12, de 04/07/2012, da decisão final de reposição do montante total de € 44.802,68 J. Face ao exposto, salvo melhor entendimento, a sentença proferida pelo Tribunal a quo não faz uma correta interpretação dos factos e da legislação aplicável, razão pela qual, deve o presente recurso ser admitido e julgado procedente por provado e em consequência ser proferido acórdão revogando a sentença recorrida, substituindo-a por outra em que se considere que não ocorreu qualquer tipo de prescrição, pois o procedimento encontrava-se interrompido nos termos do nº 1 do Artº 323º do CC.
* II –Matéria de facto.
A decisão recorrida deu como provados os seguintes factos, sem reparos nesta parte: A) Em 29.09.2000, a Autora apresentou uma candidatura ao IFADAP – Serviço Regional de ..., no âmbito do regime de apoio à reconversão e reestruturação da vinha (VITIS), tendo sido atribuído ao projecto o nº ...28, candidatura aqui dada por integralmente reproduzida.
(cfr. consta do processo administrativo apenso).
B) Em 11.04.2001 o projecto foi aprovado pelo IFADAP para a reestruturação de 20,00 hectares de vinha e em 25.06.2001 foi assinado o contrato de atribuição de ajuda, que foi objecto de alteração, documentos aqui se dão por integralmente reproduzidos.
(Documentos que constam do processo administrativo apenso, o contrato e a sua alteração dos documentos ... e ... juntos pela Autora com a petição inicial).
C) Em 27.04.2001, o IFADAP realizou uma acção de controlo, que deu origem ao relatório de controlo de aplicação (RCA) nº ...71, de 25.06.2001, que é do seguinte teor: (Imagem na decisão recorrida que aqui se dá por reproduzida).
(Documento que consta do processo administrativo apenso, documento ... junto pela Autora com a petição inicial e depoimento da testemunha da Entidade Demandada AA).
D) Em 27.02.2002, o IFADAP realizou uma acção de controlo, que deu origem ao relatório de controlo de aplicação (RCA) nº ...55, de 01/03/2002, que é do seguinte teor: (Imagem na decisão recorrida que aqui se dá por reproduzida).
(Documento que consta do processo administrativo apenso, documento ... junto pela Autora com a petição inicial e depoimento da testemunha da Entidade Demandada AA).
E) Em 02.05.2002, o IFADAP realizou uma acção de controlo, que deu origem ao relatório de controlo de aplicação (RCA) nº ...87, de 02.05.2002, que é do seguinte teor: (Imagem na decisão recorrida que aqui se dá por reproduzida).
(Documento que consta do processo administrativo apenso, documento ... junto pela Autora com a petição inicial e depoimento da testemunha da Entidade Demandada AA).
F) Através do ofício ...3.511/2895/021, de 13.05.2002, do IFADAP, foi devolvida à Autora a garantia bancária emitida pelo Banco 1..., com o nº D.13856, por não subsistirem os pressupostos que determinaram a sua apresentação.
(documento que consta do processo administrativo apenso e documento ... junto pela Autora com a petição inicial).
G) Em 12.12.2002, o IFADAP realizou uma acção de controlo, que deu origem ao relatório de controlo da aplicação de financiamentos nº ...89, de 16/12/2002, que aqui se dá por integralmente reproduzido e do qual se destaca aqui o seguinte: «Com vista a aferir a área efectivamente reestruturada de vinha, foi efectuado um levantamento com recurso a GPS, da qual resultou uma área de 15,37 ha.
Assim, considerando uma margem de tolerância de 5%, a área plantada, acrescida deste valor, corresponderá a 16,14 ha.
Neste sentido, correspondendo a área candidata de vinha a reestruturar a 20,00 ha, decorre um défice na área plantada de 3,86 ha, isto é, aproximadamente 19,30%.
6. PARECER DOS TÉCNICOS Irregularidade detectada A área verificada é inferior, em 3,86 ha, à área candidata”.
(cfr. documento que consta do processo administrativo apenso).
H) O IFADAP remeteu à Autora o ofício nº ...2, datado de 2002.12.18, sob o “Assunto: Projecto Nº ......”, do seguinte teor: «Na sequência da visita efectuada à exploração de V. Exa., em 12/12/02, e no seguimento do levantamento efectuado com recurso a GPS, verificou-se que a área afecta à reestruturação da vinha é de 15,37 ha, conforme mapa anexo.
Assim, considerando que a área de reestruturação candidata do projecto é de 20,00 ha, solicitamos que nos informe, para a morada abaixo indicada e num prazo de 10 dias úteis, o que sobre o assunto houver por conveniente.
(...)» (cfr. documento que consta do processo administrativo apenso).
I) Por carta datada de 31/01/2003, sob o “Assunto: Projecto Nº ......” e recebida pelo IFADAP em 04/02/2003, a Autora comunicou o seguinte: «No seguimento da vossa carta de 2002.12.18 com a vossa referência 37.500/1625/02, vimos prestar os seguintes esclarecimentos: - Só após a nossa candidatura ao programa Vitis, é que foram realizados os movimentos de terra e alteração de perfil da propriedade, para se proceder à instalação da vinha, pelo que é de compreender que o cálculo da...
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