Acórdão nº 3080/17.6T8BCL-I.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 09 de Fevereiro de 2023
Magistrado Responsável | AFONSO CABRAL |
Data da Resolução | 09 de Fevereiro de 2023 |
Emissor | Tribunal da Relação de Guimarães |
Acordam no Tribunal da Relação de Guimarães I- Relatório Nos presentes autos de inventário para partilha dos bens comuns do ex-casal onde figura como requerente AA e cabeça-de casal BB, por este foi apresentada a relação de bens constante de fls. 38 a 43.
A requerente AA veio reclamar contra a relação de bens. Acusou omissão de bens (automóveis e máquinas) e omissão de benfeitorias (obras realizadas nos imóveis relacionados).
O cabeça de casal respondeu dizendo no essencial que os automóveis e as máquinas pertencem à sociedade S..., Lda.
Foi produzida a prova oferecida pelas partes.
No final do incidente, foi proferido despacho que decidiu, entre outras coisas: a) determinar que os bens propriedade da sociedade constituem parte das quotas sociais e assim devem ser relacionados; b) determinar, nos termos e ao abrigo do disposto nos artigos 1092.º e 1093.º ambos do Código de Processo Civil, a remessa das partes para os meios comuns a fim de ser apreciada a questão relativa às benfeitorias e respectivo valor.
Inconformado com esta decisão, o cabeça de casal BB, veio dela interpor recurso para este Tribunal da Relação de Guimarães, que foi recebido como de apelação, a subir imediatamente nos próprios autos, com efeito meramente devolutivo (artigos 629º,1, 631º,1, 637º, 638º,1, 644º,1,a), 645º,1,a) e 647º,1 do Código de Processo Civil).
Termina a respectiva motivação com as seguintes conclusões: a)- Do texto da decisão recorrida parece resultar que o cabeça-de-casal tem de relacionar os bens da sociedade, o que está em contradição com os fundamentos da decisão.
b)- Se o cabeça-de-casal tem de relacionar os bens da sociedade, ainda que como fazendo parte das quotas sociais, está na realidade a relacionar bens de terceiro que, como tal, não podem ser objecto da presente partilha.
c)- Nos termos do artigo 1082°, alínea d) do Código de Processo Civil, o processo de inventário subsequente ao divórcio destina-se à partilha dos bens comuns do casal.
d)- A sociedade S..., Lda. tem personalidade jurídica própria e tem património próprio.
e)- Os seus bens não são propriedade da Requerente e do Cabeça-de-casal e não podem ser objecto de partilha subsequente ao divórcio.
f)- Não é correcto afirmar que os bens da sociedade estão contidos nas quotas sociais.
g)- Tendo a sociedade personalidade jurídica própria, os respectivos sócios não são titulares de qualquer direito sobre o património que a integra.
h)- A partilha das quotas no presente inventário não vai ter qualquer influência nos bens desta, que continuarão a pertencer única e exclusivamente à sociedade.
i)- A decisão recorrida viola assim o disposto no artigo 1082°, alínea d) do Código de Processo Civil.
j)- Não existia fundamento para que a questão das benfeitorias fosse remetida para os meios comuns.
k)- Nos termos do artigo 1093°, nº 1 do Código de Processo Civil, o Tribunal pode remeter as partes para os meios comuns quando a complexidade da matéria de facto subjacente à questão tomar inconveniente a apreciação da mesma por implicar redução das garantias das partes.
l)- A matéria referente às benfeitorias não reveste uma especial complexidade.
m)- A apreciação de tal matéria no âmbito deste inventário não afecta minimamente as garantias das partes, dado que foi plenamente observado o direito ao contraditório e foi admitido às partes requerer as provas que bem entendessem, tendo havido lugar a produção de prova com respeito pelas regras legais aplicáveis.
n)- A insuficiência de prova não constitui fundamento para que determinada questão não seja apreciada em sede de inventário.
o)- O fundamento invocado pelo Tribunal a quo não permite concluir que a questão venha a ser melhor resolvida nos meios comuns.
p)- A decisão do Tribunal a quo violou o disposto no artigo 1093°, n.º 1 do Código de Processo Civil, devendo assim determinar-se que a decisão sobre as benfeitorias reclamadas seja apreciada nestes autos com base na prova produzida.
A recorrida contra-alegou, findando com as seguintes conclusões: 1.
Atento o escopo ou função do processo de inventário (cfr. art. 1082.º al. d) do CPC), o Tribunal recorrido, ao decidir no sentido do cabeça de casal fazer constar sob as verbas onde relacione as quotas da sociedade “S..., Lda.”, a relação ou inventário dos bens que pertenciam, integravam ou faziam parte da referida sociedade á data da instauração da acção de divórcio (cfr. art. 1789.º/1 do CPC), julgou correctamente, não tendo violado qualquer norma legal.
-
Ao decidir desse modo o Tribunal recorrido está a possibilitar a obtenção, no processo de inventário, do valor real dessas quotas, pois o senhor perito que vier a realizar essa avaliação necessita de saber quais são os bens que integravam o património da sociedade na referida data, sendo ainda necessário, para tal efeito, a junção nos autos dos balanços, balancetes e demais documentos contabilísticos da sociedade.
-
Subjacente também á decisão do Tribunal da 1.ª Instância de remeter os interessados para os meios comuns, quanto á existência e extensão das benfeitorias em causa nos autos, esteve também a pretensão de atingir aquele escopo ou função do inventário que é, realizar um partilha justa e equitativa do património comum do casal.
-
Também esta decisão não violou qualquer norma legal e antes foi proferida em conformidade com o Direito.
II As conclusões das alegações de recurso, conforme o disposto nos artigos 635º,3 e 639º,1,3 do Código de Processo Civil, delimitam os poderes de cognição deste Tribunal, sem esquecer as questões que sejam de conhecimento oficioso. Assim, e, considerando as referidas conclusões, as questões a decidir consistem em saber: a) se os bens propriedade da sociedade devem ser relacionados neste inventário; b) se foi correcta a decisão de remeter a questão das benfeitorias para os meios comuns; III Para decidir importa ter em conta a seguinte tramitação e factos: O casamento celebrado entre AA e BB foi dissolvido por sentença transitada em julgado, proferida a .../.../2019, no âmbito do processo de divórcio a que estes autos vão apensos.
O casamento foi celebrado sob o regime de comunhão geral de bens.
O cabeça-de-casal apresentou a seguinte relação de bens (só a parte agora relevante): -Activo: - Participações Sociais: 1- Quota titulada pela requerente na sociedade S... Lda, valor nominal €2.500,00; 2- Quota titulada pelo cabeça-de-casal na sociedade S... Lda, valor nominal €2.500,00; A requerente acusou a omissão de bens, entre os quais, bens pertencentes à sociedade supra-referida.
O Tribunal a quo fundamentou assim a sua decisão, na parte que interessa: “Sustentou, ainda, a reclamante que o cabeça de casal não relacionou os seguintes veículos: veículo automóvel de marca ..., modelo ..., do ano de 1996, matrícula ..-..-HP e veículo automóvel, marca ..., modelo...
Para continuar a ler
PEÇA SUA AVALIAÇÃO