Acórdão nº 0971/21.3BELRS de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 08 de Fevereiro de 2023

Data08 Fevereiro 2023
Órgãohttp://vlex.com/desc1/1541_01,Supremo Tribunal Administrativo (Portugal)

ACÓRDÃO X RELATÓRIO X"L...", com os demais sinais dos autos, deduziu recurso dirigido a este Tribunal visando sentença proferida pelo Mº. Juiz do Tribunal Tributário de Lisboa, exarada a fls.50 a 58 do processo físico, a qual, além do mais, julgou totalmente improcedente a presente execução de julgado de decisão arbitral já transitada e exarada no processo nº.429/2019-T, no que diz respeito ao pagamento de juros moratórios por parte da A. Fiscal.

XO recorrente termina as alegações do recurso (cfr.fls.60 a 68 do processo físico) formulando as seguintes Conclusões: A-Nestes autos de Execução de Julgado, a Recorrente solicitou o pagamento de Juros de mora decorrente do atraso da AT em efetuar o pagamento de Juros Indemnizatórios reconhecido em sede de Decisão Arbitral proferida em 02-03-2020 no Processo n.º 429/2019-T.

B-Na referida Decisão Arbitral consta: “Nestes termos, decide o Tribunal Arbitral Coletivo: (…) d) Julgar procedente o pedido de restituição de imposto pago, acrescido dos juros indemnizatórios, relativo ao montante de € 3.762.867,55 a deduzir ao lucro tributável, que deverá ser determinado em execução do julgado.” C-O Tribunal “a quo” não se pronunciou sobre os pressupostos ou a falta destes de que depende a fixação de juros de mora por considerar que nesse caso haveria anatocismo, como tal, vedado por Lei (art.º 560.º do CC aplicável ex vi artigo 2.º, al, d, da LGT), pois entende que é; D-Manifesto que a Exequente não tem direito a receber juros moratórios sobre os juros indemnizatórios que lhe foram pagos pela administração tributária, em 07 de Setembro de 2021, não obstante tal pagamento tivesse sido efetuado depois do decurso do prazo de execução espontânea de decisão arbitral que a condenou no pagamento desses juros”.

E-Obviamente, dissentimos de tal entendimento porque tal decisão padece de erro de julgamento por omissão de pronúncia, perante uma análise, apenas, na perspetiva de anatocismo, i.e. aprecia a questão do cálculo de juros de mora sobre juros indemnizatórios nesta vertente, mas, sem que tal seja aplicável, e; F-Não aprecia os argumentos apresentados pela Recorrente: a. no que respeita à desigualdade de armas entre o Estado e o Contribuinte, b. à evidente violação do princípio da igualdade consagrado na Constituição da República Portuguesa, e c. bem assim do princípio da equidade processual, G-E ao comparar o pedido de juros de mora em apreço, com a prática de anatocismo, o Tributal a quo extrai ilação - por paralelismo da situação - que também o Estado pratica anatocismo quando impõe o pagamento de juros de mora que vão incidir sobre juros compensatórios quando as dividas não são pagas pelos contribuintes dentro do prazo fixado! H-Admitindo, assim, poder existir um dualismo de critério que conduza a uma distorção injustificada na proteção conferida ao Estado e aos Cidadãos.

I-A Sentença padece, pois, de erro de julgamento, ao considerar que o cálculo de juros de mora sobre juros indemnizatórios se enquadra no conceito de anatocismo previsto no artigo 560.º do CC, que se subsume à prática de capitalização de juros, vulgo "contagem de juros sobre juros", J-O que não se verifica no caso em apreço dada a distinta natureza entre o que são (i) juros indemnizatórios e (juros compensatórios) vs (ii) juros moratórios, tal como comprovado nos presentes autos.

K-Decorre do princípio da proteção jurídica, consagrado no artigo 20º da CRP existir o dever de garantir a equidade processual entre as partes aplicado ao processo tributário, pelo que tem direito - por legalmente consagrado - a receber juros de mora sobre o montante de juros indemnizatórios, nos termos peticionados e assentes nos autos, pelo período de tempo em ocorreu atraso da AT no seu pagamento.

L-Portanto, é devida a quantia relativa ao montante dos juros de mora decorrentes do atraso no pagamento, por parte da Autoridade Tributária, dos juros indemnizatórios, sobre o montante de imposto deferido e determinado reembolsar - em sede administrativa (Ofício n.º 13056 de 10 de dezembro de 2018, da Direção de Serviços de IRC) – em sede de processo de Revisão do Ato Tributário, M-Porquanto, à data em que foi efetuado o reembolso do imposto indevidamente pago, já, se mostravam devidos tais juros indemnizatórios, pese embora o entendimento da AT e esta se tenha recusado a liquidar e pagar os mesmos, vide artigo 1.º da Lei n.º 3/10, de 27/03.

N-A Constituição da República Portuguesa consagra o princípio da proteção jurídica equitativa, nomeadamente na sua dimensão processual, estatuindo este princípio o dever de igual tratamento processual entre as partes, ou seja, a equidade processual, conforme Acórdão de 24-09-2003, Proc. n.º 03P243, do Supremo Tribunal de Justiça.

O-Ora, conferindo o legislador à Autoridade Tributária cumulativamente, por via dos artigos 35.º, n.º 1 e 44.º n.º 1, ambos da LGT, respetivamente, o direito ao recebimento de juros compensatórios e, adicionalmente sobre estes, juros de mora devidos pelo contribuinte, em forma de garantia do cumprimento da atividade administrativa que exerce, também ao contribuinte deve ser garantido que a sua capacidade contributiva e tempestividade no cumprimento das obrigações seja devidamente assegurada mediante imposição desse dever à AT.

P-A Constituição da República Portuguesa consagra no artigo 62.º o Direito à propriedade privada e atendendo ao erro da Autoridade Tributária com a consequente privação do valor pago indevidamente pela recorrente, não o restituído atempadamente.

Q-No Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo, Processo n.º 0279/17, de 7 de junho de 2017 espelha-se com pertinência para a boa decisão do presente caso o seguinte: “Se assim não fosse, e nas situações de incumprimento grave, ou seja, quando se mantém o incumprimento já após o fim do prazo de cumprimento voluntário das decisões transitadas em julgado, apenas o contribuinte seria onerado com tal “sanção”, à AT bastar-lhe-ia proceder ao pagamento dos juros indemnizatórios para não mais lhe ser aplicável tal preceito legal. Efetivamente, nas situações em que o contribuinte se mantenha faltoso após a data do termo do prazo de execução espontânea da decisão judicial transitada em julgado, e até ao pagamento efectivo do imposto devido, tem que arcar sempre com os juros de mora contados ao dobro da taxa legal, sendo certo que tais juros agravados incidem, também, sobre o montante dos juros compensatórios que sejam devidos”.

R-No mesmo sentido, veja-se o Acórdão do TCA Sul 2565/04.9BELSB-A de 05/07/2020 “1. Constitui preterição do prazo de restituição oficiosa do imposto, com vista à outorga de juros indemnizatórios, a recusa de reembolso de IVA suportado indevidamente; 2. As taxas de juros aplicáveis à obrigação de pagamento de juros indemnizatórios são as que resultam do regime legal vigente à data da constituição da obrigação de pagamento de juros; 3. É admissível a atribuição cumulativa de juros indemnizatórios e de juros moratórios, calculados a uma taxa de juros redobrada, sobre a mesma quantia e relativamente ao mesmo período de tempo.” S-Ainda, nestas circunstâncias consideram Diogo Leite Campos e outros, a propósito da Lei n.° 64-B/2011, de 30 de Dezembro:“…estes juros de mora agravados são devidos relativamente ao período entre o termo do prazo de execução e a emissão da nota de crédito, é de concluir que, nos casos em que esteja em causa executar uma decisão e se trate de uma situação enquadrável no n.º 1, em que são devidos juros indemnizatórios, estes juros de mora serão cumuláveis com os indemnizatórios, pois estes são «contados desde a data do pagamento indevido do imposto até à data do processamento da respectiva nota de crédito, em que são incluídos» (art. 61.º, n.º 5, do CPPT) ”.

T-Assim sendo, dúvidas não subsistem que se deve concluir pela admissibilidade da fixação da obrigação de pagamento de juros moratórios (ainda que tenham somente por base de incidência) sobre juros indemnizatórios (não) pagos não se conformando com a posição do Tribunal a quo, na decisão de que se recorre, ao pender pela inadmissibilidade.

U-Pelo que, nos termos dos artigos 668.º, n.º 1, alínea d) do Código de Processo Civil (CPC) e 125.º, n.º 1, do Código de Procedimento e Processo Tributário, a sentença é nula quando o juiz deixe de pronunciar-se sobre questão que devesse apreciar – vide art. 660.º, n.º 2 do CPC, e de resolver todas as questões que tiverem sido submetidas à sua apreciação.

V-A sentença recorrida violou o disposto no arts. 660.º, n.º 2, 668.º, n.º 1, alínea d) do Código de Processo Civil; os arts. 61.º e 125.º, n.º 1, do Código de Procedimento e Processo Tributário; o artigo 560.º do Código Civil; os arts. 35.º n.º 1 e 44.º n.º 1 da Lei Geral Tributária, o art. 1.º da Lei n.º 3/10, de 27/03 e os arts. 20.º, 60.º e 103. °, n.º 2 da CRP.

XA entidade recorrida produziu contra-alegações no âmbito da instância de recurso (cfr.fls.71 a 76-verso do processo físico), as quais encerra com o seguinte quadro Conclusivo: A-O presente recurso tem por objeto a Douta Sentença proferida no âmbito do processo à margem indicado, pelo Tribunal Tributário de Lisboa, na parte que denegou a pretensão da Recorrente quanto ao pedido de pagamento de juros de mora, pela AT, devido ao atraso verificado no pagamento dos Juros Indemnizatórios, reconhecidos em sede de Decisão Arbitral proferida no Processo n.º 429/2019-T.

B-Invoca a...

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