Acórdão nº 625/21.0T8CSC.L1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 01 de Fevereiro de 2023

Magistrado ResponsávelMÁRIO BELO MORGADO
Data da Resolução01 de Fevereiro de 2023
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Revista n.º 625/21.0T8CSC.L1.S1 MBM/JG/RP Acordam na Secção Social do Supremo Tribunal de Justiça I.

1. E...

e AA, em ações separadas cuja apensação foi, entretanto, determinada, impugnaram judicialmente a regularidade e licitude do seu despedimento, efetuado por FCA - Portugal, Lda.

pedindo que: 2.

A R. apresentou articulados de motivação dos despedimentos, alegando, em síntese, que os AA. procederam à venda de viaturas com perdas económicas sem aprovação do departamento financeiro, em desvio dos procedimentos instituídos e ocultando tal circunstância da empregadora, em violação dos deveres de obediência, lealdade e de promover e executar atos tendentes à melhoria da produtividade da empresa.

3.

Na 1.ª instância, a ações foram julgadas improcedentes.

4.

Interposto recurso de facto e de direito pelos AA., o Tribunal da Relação de Lisboa (TRL), concedendo parcial provimento à impugnação da matéria de facto e, no mais, julgando procedente a apelação e revogando a decisão recorrida:

  1. Julgou ilícito o despedimento dos AA.

  2. Condenou a R. a reintegrar os AA., sem prejuízo da sua categoria e antiguidade, bem como a pagar-lhes as respetivas retribuições mensais (incluindo subsídios de férias, Natal), vencidas e vincendas, desde a data do seu despedimento e até ao trânsito em julgado da decisão, deduzindo-se as quantias que cada um dos AA. tenha recebido a título de subsídio de desemprego, nos termos e para os efeitos do art. 390º, n.º 2, c), do Código de Trabalho.

    5.

    A R. interpôs recurso de revista, sustentando, em resumo, nas conclusões da sua alegação, que a conduta dos recorridos configura justa causa de despedimento.

    6.

    Os AA. contra-alegaram, pugnando pelo improvimento do recurso.

    7.

    O Ministério Público pronunciou-se no sentido de ser negada a revista, em parecer a que as partes não responderam.

    8.

    A única questão a decidir[1] é a de saber se existe justa causa de despedimento.

    [2] E decidindo.

    II.

    9.

    A matéria de facto fixada pelo acórdão recorrido é a seguinte:[3] 1. O Trabalhador BB e o Empregador FCA - Portugal, Lda. celebraram contrato de trabalho em 02-11-2017; 2. O Trabalhador, enquanto Fleet & Business Sales Diretor, era responsável por toda a Área de Frotas, Rent-a-Car & Usados, e pela gestão da equipa afecta a esta área, que integra o Trabalhador AA, Responsável de Rent a Car & Usados, e CC, Key Account Manager de Usados; (…) 4. O Trabalhador BB recebeu uma comunicação emitida pelo Empregador, em 22 de Novembro de 2018, com o título «Comportamentos contrários aos procedimentos internos / deveres laborais», com o seguinte teor: «A FCA Portugal S.A. (“FCA”) tomou conhecimento da ocorrência da adoção de condutas contrárias aos procedimentos internos, e intoleráveis para as funções que desempenha, relacionadas com o processo de autorização de venda de veículos em frota.

    De facto, como é do seu conhecimento o processo de venda de frota prevê uma série de autorização em HQ, como condição prévia para apresentação de proposta ao cliente final e autorização prévia para a assinatura do contrato.

    Todavia, no passado dia 11 do mês de Julho, você assinou um acordo com o cliente 'F... de descontos de HQ que fez constar da proposta e prévia autorização dos nossos Departamento Legal e Departamento Financeiro.

    Este comportamento é apto a configurar um incumprimento das regras e procedimentos em vigor na FCA, bem como no Grupo, as quais são do seu conhecimento.

    A adoção de comportamentos de semelhante natureza poderá não só comprometer o bom e regular funcionamento da Empresa, mas sobretudo põe em causa a imagem de excelência comercial da mesma perante os clientes, o que justifica a necessidade de o advertir para a importância de cumprir com os referidos procedimentos Como bem saberá, no contexto da relação laboral que mantém com a FCA, está adstrito, de entre outros aspetos, a prestar a sua atividade profissional com zelo e diligência e ao cumprimento de todas as ordens e instruções emitidas pelo seu empregador ou de superior hierárquico respeitantes à execução ou disciplina do trabalho, sob pena de incorrer em responsabilidade disciplinar”.

    Deste modo, embora aqui pudesse estar em causa a violação de importantes deveres laborais, a presente comunicação não assume natureza sancionatória, apenas tendo em vista adverti-lo que a Empresa irá continuar a supervisionar o escrupuloso cumprimento dos seus deveres contratuais e legais, devendo ficar ciente que uma futura inobservância destes deveres será tratada em sede disciplinar, caso se verifiquem os respetivos pressupostos.» 5. O trabalhador AA e o empregador FCA - Portugal, Lda. celebraram contrato de trabalho em 28-08-2017; 6. O trabalhador AA iniciou o seu percurso profissional no Empregador no departamento logístico, como outsourcing; 7. O trabalhador AA prestava, desde Julho de 2019, a sua atividade profissional de Responsável no canal de vendas de carros para as empresas de renting e carros usados, no Departamento de Frotas & Usados do Empregador, sendo responsável pelas vendas de carros novos, pelo canal de venda Rent-a-car e pela venda de carros usados; 8. O trabalhador AA é o responsável pela gestão dos parceiros comerciantes, como seja a Consilcar e a Benecar, e superior hierárquico direto do trabalhador CC; (…) 14. O Empregador é uma empresa que se dedica, entre outros, à importação e distribuição de veículos automóveis do ... (anteriormente), incluindo atividades promocionais e de marketing, bem como de apoio à rede de concessionários; 15. O ..., do qual faz parte o Empregador, constitui um grupo industrial internacional e tem sede em Itália, designado doravante como HQ; 16. No Empregador existe, desde, pelo menos, 2017, um procedimento interno de venda de carros usados, quando se trata de vendas com perdas económicas, o qual é conhecido de todos os trabalhadores da área comercial do Empregador, incluindo os trabalhadores BB e AA, em função da respectiva área de actividade; 17. Após envio das condições comerciais (detalhe de viaturas e valores) por parte de qualquer elemento da área comercial do Departamento de Usados ao Departamento Financeiro (DD) e com conhecimento da Dekra e restante equipa de usados (CC, ou AA no caso de ser o Eng.º CC a submeter o detalhe) o Departamento Financeiro, se aprovar o negócio, valida e carrega os preços em sistema; 18. De acordo com esse procedimento, o Departamento de Carros Usados deve, sempre, previamente a qualquer transação que envolva perdas económicas ou descontos, validar com o Departamento Financeiro a operação, enviando para o Controller da área Financeira (neste caso, DD) a proposta de venda (com detalhe de viaturas e valores do negócio), para aprovação, validação e carregamento dos valores; 19. Caso o Controller de Departamento Financeiro esteja de acordo, deve inserir o preço no sistema, e informar o parceiro Dekra (empresa contratada para dar suporte à atividade de viaturas usadas), que verifica os danos dos veículos e também o parque logístico dos usados, criando um número de pedido; 20. Não existem faturações de viaturas sem validação do departamento financeiro, uma vez que é este que valida, carrega preços e submete à Dekra para posterior disponibilização e faturação no sistema SAP DEUS; 21. Em seguida ao pedido de encomenda e de carregamento de preços no sistema do Controller, a Dekra contacta a FCA Services (entidade financeira responsável por verificar a ordem de encomenda com o pagamento do cliente final), confirmando o prévio pagamento ou disponibilidade de plafond do cliente (para comerciantes ou concessionários, respetivamente), validando novamente em SAP as encomendas para que, com nova intervenção da Dekra, as viaturas tenham uma data de saída de parque (transporte) e consecutivamente faturadas; 22. Deste modo, os veículos em causa ficam fora do stock, faturados e totalmente pagos pelo comprador; 23. Em situações pontuais, sucedia que o pedido de transporte era realizado diretamente pelo Departamento de Usados à Dekra, sem envio de validação prévia do Departamento Financeiro para a Dekra, sem prejuízo de ser necessária, em todo o caso, a aprovação do Departamento Financeiro e o seu carregamento de preços para a faturação; 24. Em Julho de 2020, o Empregador emitiu e difundiu um documento intitulado «Procedimento do processo de aprovação de descontos», que, no que se reporta à atividade de viaturas usadas, tinha o seguinte teor: «D Viaturas Usadas A política comercial, ou qualquer alteração à mesma, deverá ser enviada pelo Responsável do Departamento de Usados por e-mail para aprovação do controller que deverá verificar se a estimativa de spending...

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