Acórdão nº 35/22.2T8FCR.C1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 02 de Fevereiro de 2023

Data02 Fevereiro 2023
Órgãohttp://vlex.com/desc1/1997_01,Supreme Court of Justice (Portugal)

Acordam no Supremo Tribunal de Justiça As Partes, a Acção e o Pedido AA instaurou procedimento cautelar de suspensão de deliberações sociais contra L..., Lda, e BB, pedindo que fosse ordenada a suspensão das deliberações exaradas, em de 25 de Fevereiro de 2022, no Documento Particular denominado “Deliberação “Unânime por Escrito” da Sociedade L..., Lda”.

Alegou ser titular de quotas do capital social da requerida L..., Lda, ocupando o cargo de gerente.

Mais tarde, cedeu a participação social que detinha na requerida que passou na sua totalidade a ser detido por duas sociedades, mas fê-lo simuladamente, a fim de prejudicar a sua filha com quem está de relações cortadas, tendo mantido a sua qualidade de gerente.

Todavia, o seu filho, requerido neste procedimento e sócio gerente das sociedades que detêm a totalidade do capital social da requerida, sem para tal estar mandatado e sem convocar qualquer assembleia geral, procedeu em 25 de Fevereiro de 2022, à deliberação cuja suspensão requer, visando única e exclusivamente, favorecer-se contra os interesses da sociedade requerida.

As deliberações tomadas são nulas - artº 56º, nº 1, alíneas a) e b) do CSC - por não ter sido convocada judicialmente a assembleia geral da requerida, na ausência da marcação da assembleia geral da requerida pelo seu gerente; porque o requerente que também é sócio das sociedades L... e ..., Lda e A...,Lda, sócias da requerida, não foi convocado nem estava presente para subscrever a deliberação e porque o sócio gerente das sociedades J..., Lda. e A..., Lda. não foi expressamente autorizado a votar em deliberações unânimes por escrito.

As deliberações são também anuláveis - artº 58º, nº1, al. b) do CSC - porque são apropriadas para satisfazer o propósito de um dos sócios de conseguir, através do exercício do direito de voto, vantagens especiais para si ou para terceiros, pois foi o voto de BB, na qualidade de sócio maioritário e de gerente das sócias L... e ..., Lda. e A..., Lda que permitiu: a) a destituição do gerente CC; e, b) a designação de gerente de BB (ou seja, a pessoa que emitiu o voto em representação das sócias); As deliberações em causa são, só por si, causadoras de prejuízo apreciável à sociedade, atenta a gestão de facto que o requerido, BB, vinha já executando, revelada no atraso no pagamento a fornecedores da sociedade, na liquidação de facturas, na falta de entrega de documentos à contabilidade e na demais factualidade invocada.

Por despacho judicial de 26.04.2022, foi deferida a dispensa de contraditório prévio dos requeridos, ao abrigo do disposto no art.º 366.º do Código de Processo Civil.

As Decisões Judiciais A sentença proferida em 1.ª instância declarou a suspensão da execução da Deliberação Unânime por Escrito, tomada a 25 de Fevereiro de 2022, que sob o ponto 1 e 2 deliberou destituir do cargo de gerente o Requerente, nela se autonomeando gerente o Requerido, declarando-se suspensos todos os efeitos e todos os actos praticados em resultado daquelas deliberações.

O Requerido, porém, recorreu de apelação, que a Relação julgou procedente, absolvendo o Requerido do pedido, na improcedência da peticionada providência cautelar.

O Requerente reclamou então para a Conferência invocando as nulidades do art.º 615.º n.º1 als. c) e d) do CPCiv, ao que o Requerido/Apelante respondeu, peticionando, para além do mais, a condenação do Requerente como litigante de má fé.

A Conferência pronunciou-se pela improcedência das nulidades invocadas, mais tendo condenado o Requerente, como litigante de má fé, em multa, que fixou em 3 UC`s.

Inconformado com essa condenação como litigante de má fé, recorre de revista o Autor, apresentando as seguintes conclusões de alegação: A) É sempre admissível o recurso, em um grau (do Tribunal de 1.ª Instância para o Tribunal da Relação ou deste para o Supremo Tribunal de Justiça), da decisão que condene por litigância de má-fé, independentemente do valor da causa e da sucumbência (artigo 629º, nº 1 do C. P. Civil). No entanto, considera-se que o juízo de censura ou reprobabilidade em que assenta deve ser sempre sindicável. Trata-se da relevância dos valores imateriais envolvidos neste tipo de condenação, sendo admissível o Recurso Ordinário (nesse sentido, José Lebre de Freitas/Isabel Alexandre, Código de Processo Civil Anotado, Volume 2.º, Coimbra, Almedina, 2018, p.461.).

  1. No caso em apreço, o Recorrente foi condenado por litigância de má-fé apenas pelo Tribunal da Relação, sem que a questão, anteriormente, tivesse sido colocada.

  2. Como entendeu o Tribunal da Relação de Guimarães, no âmbito do Acórdão proferido em 31/10/2019, no âmbito do Processo nº587/18.1T8PTL-A.G1, disponível in www.dgsi.pt, “Verificando-se que a matéria atinente aos pressupostos da litigância de má-fé não foi objeto de discussão anterior, por ter sido percecionada e suscitada oficiosamente pelo Tribunal a quo somente com a prolação da sentença que julgou totalmente procedente a oposição deduzida pelo requerido, mostra-se acertada a decisão que no referido contexto decide determinar a notificação das partes para, querendo, no prazo de dez dias, tomarem posição sobre tal matéria, ao abrigo do disposto no artigo 3.º, n.º 3, do CPC, só depois proferindo decisão condenatória quanto à litigância de má-fé;” D) Não tendo sido notificado, previamente, para se pronunciar sobre a questão da litigância de má fé, deverá declarado nulo todo o processado, prévio à decisão tomada e, consequentemente, revogada tal decisão.

  3. O Requerente apresentou Reclamação do douto Acórdão, por entender que, para efeitos de legitimidade processual para a interposição da Providência Cautelar de Suspensão de Deliberações Sociais, a qualidade de sócio, para efeitos do disposto no artigo 396º do C. P. Civil, não exige, necessariamente, que conste, formalmente, registado como sócio no registo comercial, podendo tal qualidade ser demonstrada com outros meios de prova, desde que, factualmente alegados e provados.

  4. Sendo esta a principal questão em análise no Recurso, o Acórdão reclamado não deveria ter efetuado uma análise meramente formal, considerando apenas, como absoluto e único meio de prova, o registo comercial, mas atendendo indiciariamente a todos os elementos fatuais alegados e considerados já provados na sentença, proferida em sede de primeira instância. Espera-se que o Mais Alto Tribunal faça a apreciação em conformidade com a verdade e com os fatos constantes dos autos e dados como provados.

  5. Ao contrário do alegado pelo Requerido e aceite pelo Acórdão agora recorrido, o Acórdão reclamado não alterou os fatos considerados assentes pela sentença proferida em sede de primeira instância. Apenas deles expurgou os conceitos conclusivos e de direito.

  6. No entanto, com o devido respeito, considerou provado e assente, tal como a primeira instância, o seguinte (os qual não foi impugnado, nem alterado pelo Venerando Tribunal da Relação, como se pode ler a página 22 do Acórdão reclamado): “No caso, o tribunal a quo ao dar como provados que a cedência da quotas foi formal e simulada, violou o disposto no artº 607º, nº 3 do CPC. A caracterização de um contrato como simulado é uma conclusão de direito a extrair de determinados factos que sejam suscetíveis de preencher os pressupostos exigidos pelo artº 240º do CC: o acordo entre o declarante e o declaratário, no intuito de enganar terceiros e a divergência entre a vontade real e a declarada. Devem assim tais expressões serem retiradas do ponto 21., passando a ter a seguinte redação: A cedência das quotas seria apenas uma forma de prejudicar a irmã, para que esta não tivesse forma de ficar com nenhum bem material do pai, dado a postura assumida perante o mesmo.” I) Salvo o devido respeito, fazer uma cedência de quotas apenas para prejudicar a irmã, o que será se não uma clara e descarada simulação, tal como alegado pelo Requerente?!!! Como é que de tal alegação se pode extrair a existência de uma conduta censurável, qualificada como litigância de má fé?!! Com tal alegação, o ora Recorrente mostrou discordância e inconformismo, pelo fato do Acórdão reclamado, apesar de assentes os fatos que demonstram a inexistência real de qualquer cedência de quotas, mesmo assim ter afastado a legitimidade do Requerente para interpor e fazer seguir a Providência Cautelar de Suspensão de Deliberações Sociais.

  7. Sendo esta a questão fulcral do processo, aliás, a única verdadeira questão subjacente aos autos e tendo indiciariamente tais fatos sido dados como provados, verdadeiros e assentes, o Recorrente tem fundamentos, de fato e de direito, para considerar que o Acórdão reclamado padece de nulidade, por falta / omissão de pronúncia.

  8. O Recorrente tem todas as razões, de fato e de direito, para discordar de tal...

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