Acórdão nº 00503/11.1BEPNF de Tribunal Central Administrativo Norte, 13 de Junho de 2014
Magistrado Responsável | Hélder Vieira |
Data da Resolução | 13 de Junho de 2014 |
Emissor | Tribunal Central Administrativo Norte |
Acordam, em conferência, na Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Norte: I – RELATÓRIO Pelo Réu e ora Recorrente Fundo de Garantia Salarial (FGS) foi interposto recurso da sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal de Penafiel que, no âmbito da supra identificada acção administrativa especial condenou o Réu “a proferir um acto administrativo, no prazo de 20 (vinte) dias úteis a contar do trânsito em julgado da presente decisão, que autorize o pagamento ao A. dos créditos salariais vencidos entre 22/09/2009 e 22/03/2009, incluindo a retribuição e o subsídio relativo ao direito a férias vencido em 01/01/2009, os proporcionais de férias, subsídios de férias e de natal relativos a 2009, com o limite máximo da importância paga previsto no n.º 1, do artigo 320.º do RCT. Caso o montante dos créditos seja inferior ao limite máximo acima mencionado, deve ainda o FGS assegurar até este limite o pagamento dos créditos vencidos após 22/09/2009 e até 30 de Novembro de 2009 (conforme a antiguidade reconhecida ao A. pela transacção).
”.
O objecto do recurso é delimitado pelas seguintes conclusões da respectiva alegação(1): “1.- Os créditos respeitantes à retribuição e subsídio de férias relativos às férias vencidas a 01/01/2009, não poderão ser pagos pelo FGS por força do disposto no artigo 319.º, n.º 1 da Lei 35/2004, de 29/07.
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- A ação de insolvência da entidade patronal do Autor – CAR, Lda. – foi instaurada a 22/09/2009. Logo, o FGS, em cumprimento do disposto no referido artigo 319.º, n.º 1 da Lei 35/2004, de 29/07, assegura, por referência àquela entidade patronal, os créditos emergentes de contrato de trabalho que se tenham vencido no período temporal de 22/03/2009 a 22/09/2009.
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- A interpretação mais consonante com todo o regime jurídico instituído pelo Código do Trabalho é a de que os créditos conexos com o direito a férias, incluindo retribuição e subsídio de férias, se vencem a 01 de Janeiro de cada ano.
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- No caso concreto os créditos do Autor pela retribuição e subsídio de férias referentes às férias vencidas a 01/01/2009, venceram-se também eles em 01/01/2009.
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- Logo, tais créditos venceram-se antes do período de seis meses anteriores à data da propositura da ação de insolvência do entidade patronal do Autor, ou seja, são créditos vencidos fora do período de 22/03/2009 a 22/09/2009. E por isso não poderão ser pagos pelo FGS (cfr. art. 319.º, n.º 1 da Lei n.º 35/2004, de 29/07).
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- É por referência ao valor do salário do Autor indicado nas declarações de remunerações feitas à segurança social para efeitos de pagamento de contribuições e quotizações, que tem como último registo € 648,13, que deverão ser calculados os valores a pagar pelo FGS. E não por referência ao valor, consideravelmente superior, de € 1.436,97 só agora indicado pelo Autor para efeitos de pedido formulado ao Fundo.
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- Também o trabalhador aqui Autor tem responsabilidade no facto do valor declarado à segurança social para efeitos de pagamento de contribuições ser consideravelmente inferior ao valor que agora alega ser o seu salário real. E assim porque era esse valor, o mais baixo naturalmente, que constava dos recibos que durante anos lhe foram entregues pela entidade patronal sem que o trabalhador tivesse qualquer reação, só invocando tal facto quando o mesmo foi suscetível de lhe trazer algum benefício.
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- Reconhecer ao trabalhador que assim atuou o direito a receber do FGS, também ele financiado com as verbas resultantes da taxa contributiva entregue pelas entidades patronais (cfr. art. 321.º da Lei n.º 35/2004, de 29/07), é uma flagrante violação do princípio da contributividade, previsto nos artigos 54.º da Lei n.º 4/2007, de 16/01 (que aprova as bases gerais da segurança social) e 11.º, n.º 3 do Código dos Regimes Contributivos do Sistema Previdencial de Segurança Social (Lei n.º 110/2009, de 16/09), que pretende a existência de uma relação sinalagmática direta entre a obrigação legal de contribuir e o direito às prestações garantidas aos cidadãos.
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- Assim como um flagrante abuso de direito, o que, se outro fundamento não existisse, sempre tornaria ilegítima a pretensão do Autor (cfr. art. 334.º do Código Civil).
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- Em cumprimento do disposto no artigo 14.º, n.º 3 do Regulamento do FGS aprovado e publicado em anexo ao Decreto-Lei n.º 139/2001, de 24/04, deverá ainda ser alterada a decisão proferida a título de condenação em custas processuais, fazendo-se constar da decisão final a proferir nos presentes autos, independentemente do sentido da mesma, que o Réu FGS se encontra isento do pagamento de custas judiciais.
Nestes termos e nos melhores de Direito, que V. Exas. mui doutamente suprirão, deverá o presente recurso ser julgado totalmente procedente, revogando-se o douto acórdão recorrido na parte em que condena o FGS a proferir ato administrativo que autorize o pagamento ao Autor dos créditos salariais respeitantes à retribuição e ao subsídio de férias relativos ao direito de férias vencido em 01/01/2009, e revogado ainda na parte em que reconhece ao Autor o direito a receber do FGS créditos laborais calculados por referência ao valor de € 1.436,97, antes se decidindo que todos os créditos a pagar pelo Fundo ao Autor deverão ser calculados por referência ao valor salarial constante do Sistema de Informação da Segurança Social (SISS), cujo último registo é de € 648,13.
Deverá ainda, em cumprimento do disposto no artigo 14.º, n.º 3 do Regulamento do FGS aprovado e publicado em anexo ao Decreto-Lei n.º 139/2001, de 24/04, ser alterada a decisão proferida a título de condenação em custas processuais, fazendo-se constar da decisão final a proferir nos presentes autos, independentemente do sentido da mesma, que o Réu FGS se encontra isento do pagamento de custas..
”.
O Recorrido contra-alegou, concluindo: “1. O direito a férias é uma realidade que não pode ser confundida com o direito à retribuição durante as férias e com o respectivo subsídio de férias.
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A aquisição do direito a férias nasce com a celebração do contrato de trabalho, o que não confere de imediato o direito ou a possibilidade do gozo, pois em regra, as férias são gozadas no ano civil em que se vencem e são marcadas por acordo entre o trabalhador e o empregador, sendo que, na falta de acordo, caberá ao empregador marcá-las, em princípio, entre 01 de Maio e 31 de Outubro.
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Por outro lado, o direito à retribuição do período de férias (como se estivesse ao serviço), bem como ao subsídio de férias, só se torna exigível aquando do gozo das férias, sendo que a lei especifica que, salvo acordo escrito em contrário, o subsídio deverá ser pago antes do início do período de férias.
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No caso sub judice, está assente que o Autor entre 18.09.2007 e 22.03.2009 esteve com incapacidade total devida a um acidente de trabalho e, por esta razão e face ao que inequivocamente prevê o art. 239-6 do CT/09, o gozo das férias a que o recorrido tinha direito em 2009, só poderia legalmente ocorrer após seis meses completos de execução do contrato, a partir da cessação daquela incapacidade (22.03.2009).
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Por tais razões, a sentença sob recurso, no que respeita à elegibilidade dos créditos pecuniários do período de férias e subsídio de férias de 2009, não merece qualquer censura.
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O facto da entidade empregadora não ter declarado à Segurança Social o valor real do salário não pode ser imputado ao trabalhador.
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No presente caso, o valor real da retribuição está reconhecido por decisões judiciais transitadas em julgado.
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Cabe à Segurança Social reclamar (agora necessariamente no processo de insolvência) as diferenças dos valores das contribuições em falta, não podendo a recorrente invocar a eventual omissão ou insucesso da cobrança para denegar ao trabalhador o direito em causa nos presentes autos.
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Em todo o caso, o recorrente não pode ser prejudicado por causa do incumprimento do empregador ou da inoperância da Segurança Social.
Nestes termos e nos mais de direito, deve ser julgado improcedente o recurso e confirmada a decisão recorrida, assim se fazendo JUSTIÇA!”.
O Ministério Público, notificado ao abrigo do disposto no artº 146º, nº 1, do CPTA, não se pronunciou.
As questões suscitadas(2) e a decidir(3) resumem-se em determinar: — Se o FGS é responsável pelo pagamento dos créditos respeitantes à retribuição e subsídio de férias vencidas a 01/01/2009, por se entender que tais créditos se venceram antes do período de seis meses anteriores à data da propositura da acção de insolvência da entidade patronal do Autor e ora Recorrido, fora do período, no caso concreto, de 22/03/2009 a 22/09/2009; — Se é por referência ao valor do salário indicado nas declarações de remuneração feitas à Segurança Social que deverão ser calculados os valores a pagar pelo FGS ou pelos valores indicados pelo ora Recorrido no âmbito do pedido formulado ao FGS; — Se deve ser alterada a decisão de condenação da ora Recorrente nas custas do processo, face ao disposto no nº 3 do artigo 14º do Regulamento do FGS aprovado pelo Decreto-Lei nº 139/2001, de 24 de Abril.
Colhidos os vistos legais, cumpre decidir.
II – FUNDAMENTAÇÃO II.1 – DE FACTO Na decisão sob recurso foram assentes, por provados, os seguintes factos: 1.º - O A. foi trabalhador da empresa “CAR, Lda.” (cf. fls. 28, 32 e 33 dos autos); 2.º - O A. esteve desde 18/09/2007 a 22/03/2009 a receber equivalência por acidente de trabalho com incapacidade total (cf. fl. 78 do PA); 3.º - Em 22 de Setembro de 2009 foi intentada no Tribunal Judicial de Cinfães a acção para a declaração da insolvência da firma “CAR, Lda.”, que seguiu trâmites sob o n.º 331/09.4TBCNF (cf. fls. 14 a 17 dos autos); 4.º - A sociedade acima identificada foi declarada insolvente pela sentença proferida em 15/10/2009 e complementada por decisão proferida em 23/11/2009, tendo a mesma transitado em julgado em 24/12/2009 (cf. fl. 28 do PA); 5.º - Entre o ora A. e o Administrador de Insolvência, em representação da Massa Insolvente de “CAR...
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