Acórdão nº 00151/11.6BEPRT de Tribunal Central Administrativo Norte, 18 de Abril de 2012

Magistrado ResponsávelIrene Isabel Gomes das Neves
Data da Resolução18 de Abril de 2012
EmissorTribunal Central Administrativo Norte

Acordam, em conferência, os juízes da Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Norte: I - Relatório A Fazenda Pública recorre da sentença proferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto que julgou procedente a presente reclamação de atos do órgão de execução fiscal, que A…, n.i.f. 1…, com domicílio na Rua…, 4415 Pedroso, interpôs a coberto dos artigos 276.º e seguintes do Código de Procedimento e de Processo Tributário (adiante sob a abreviatura «C.P.P.T.»), tendo por objeto o despacho proferido pela Sr.ª Chefe do Serviço de Finanças de Vila do Conde no processo de execução fiscal n.º 1902200901065254, que indeferiu o requerimento ali entrado em 2010.11.30, onde pedia a dispensa da prestação de garantia.

Com a interposição do recurso, apresentou as respetivas alegações e formulou as seguintes conclusões: I. A Douta sentença de que se recorre concedeu provimento à presente reclamação, considerando que o despacho reclamado padece de falta de fundamentação, por não fazer alusão à “possível fundamentação” existente em informação constante do processo executivo, II. Assim, incorreu a sentença recorrida em erro de julgamento, por errada valoração da prova e erro na aplicação do direito.

III. O despacho reclamado, mais do que ser conjugado com a informação que o antecede, deve ser lido como integrando essa informação, ou, pelo menos, como sequência material e formal daquela, dado que a informação que antecede o Despacho é lavrada na mesma página que este, e assim é notificada ao reclamante, colocando-o na posse de todos os elementos de facto e de direito que conduziram à decisão, o mesmo que dizer, na posse do itinerário cognoscitivo e valorativo seguido para a tomada da decisão.

IV. Na sentença recorrida reconhece-se a existência de informação fundamentadora que legitima a decisão controvertida que foi comunicada ao interessado.

V. Em todo o caso, a sentença recorrida dá igualmente como provado que o despacho reclamado, por si só, refere qual a fundamentação de direito para a decisão tomada; e, do mesmo modo, VI. Ora, a dignidade constitucional do direito à fundamentação procura acautelar quer a racionalidade da decisão tributária, quer as condições materiais para o adequado exercício dos direitos de defesa por parte dos executados; VII. Nos casos em que a lei não imponha especiais requisitos de fundamentação, o cumprimento do dever de fundamentar por parte da administração tributária afere-se em face do disposto nos números 1 e 2 do artigo 77.º da L.G.T., e atendendo aos fins visados pelo dever de fundamentação; VIII. Sem que possa deixar de observar o disposto no n.º 2 do artigo 77.º da LGT, um pôr em causa as finalidades do direito à fundamentação, a verdade é que, estando o conteúdo do ato tributário em sintonia com a sequência lógica do processo em que o executado participou, de cujos atos/decisões lhe foi sempre dado conhecimento pela via adequada, e tendo este reagido contra o ato de indeferimento da pretensão que originou a decisão reclamada, não se verifica motivo determinante da anulação do ato tributário por falta de fundamentação.

IX. Tendo em conta o teor da comunicação decisória efetuada ao reclamante, pela qual o destinatário demonstrou, pelo próprio teor da reclamação apresentada, perfeito conhecimento das razões de facto e de direito que conduziram ao indeferimento da sua pretensão, não se concebe o despacho controvertido como não fundamentado ou insuficientemente fundamentado.

X. A doutrina e jurisprudência vêm entendendo, de forma uniforme, pacífica e reiterada que a fundamentação há de ser expressa, (através de uma exposição sucinta dos fundamentos de facto e de direito da decisão), clara, (permitindo que através dos seus termos, se apreendam com precisão os factos e o direito com base nos quais se decide), suficiente (possibilitando ao administrado ou contribuinte, um conhecimento concreto da motivação do ato, ou seja, as razões de facto e de direito que determinaram o órgão ou agente a atuar como atuou), e congruente (de modo que a decisão constitua conclusão lógica e necessária dos motivos invocados como sua justificação, envolvendo entre eles um juízo de adequação, não podendo existir contradição entre os fundamentos e a decisão).

XI. É jurisprudência uniforme e constante que a fundamentação é um conceito relativo que varia em função do tipo concreto de cada ato e das circunstâncias concretas em que é praticado, cabendo ao Tribunal, em face de cada caso, ajuizar da sua suficiência, mediante a adoção de um critério prático que consiste na indagação sobre se um destinatário normal face ao itinerário cognoscitivo e valorativo constante dos atos em causa, fica em condições de saber o motivo porque se decidiu num sentido e não noutro.

XII. No caso em presença, temos que, considerando a factualidade apurada, o despacho objeto da presente ação se tem como dotado de fundamentação suficiente porquanto, atentas as razões de facto e de direito nele expressamente enunciadas, um destinatário normal, face ao itinerário cognoscitivo e valorativo constante do ato em causa, fica em condições de saber o motivo pelo qual foi indeferido o pedido de dispensa de prestação de garantia.

XIII. Mais, se a fundamentação de direito está, pela própria sentença recorrida, considerada verificada, e se esta fundamentação consiste na apreciação dos requisitos exigidos nos art. 170º do CPPT e 52° da LGT para a dispensa de prestação de garantia, requisitos cujo preenchimento depende sempre de prova a efetuar pelo reclamante, se o reclamante não fez essa prova, e se o órgão de execução fiscal, através do despacho, isso declarou, o ato deve ter-se por completamente fundamentado.

XIV. Não existe qualquer ilegalidade no despacho reclamado que acarrete o provimento da reclamação, devendo o mesmo manter-se na ordem jurídica, tendo a sentença recorrida violado o disposto nos art. 77º da LGT e 125º do CPA. XV. Em todo o caso, tendo a Douta sentença concedido provimento à reclamação interposta, constata-se que aquela necessita de esclarecimento.

XVI. Considerando que o Tribunal a quo prestou esclarecimento no sentido de que a Douta decisão deve ser interpretada: A) Extensivamente, no sentido de que deu provimento à totalidade do pedido, nomeadamente à revogação da decisão do Órgão de execução Fiscal, impondo ao Órgão de Execução Fiscal que a deva substituir por outra que dispense o Reclamante de prestar garantia nos presentes autos a fim de ver suspensa a Execução Fiscal.

XVII. Considera-se que, tendo a Douta sentença concedido provimento à reclamação interposta, apenas por ter considerado como provado o vício de falta de fundamentação do despacho reclamado, XVIII. e dado como prejudicado a análise do vício arguido de erro nos pressupostos de facto, que não poderia concluir como concluiu, decidindo “Face ao exposto, concedo provimento à reclamação em apreço.” XIX. Sendo que, através desta forma processual, a Reclamação das decisões do órgão de execução fiscal, prevista nos art. 276 e ss. do CPPT, o Tribunal se limita a anular, ou não, o despacho reclamado, XX. Não poderia o Tribunal a quo conhecer do pedido da forma que o fez, XXI. na medida em que tendo julgado extensivamente, “num sentido amplo” procedente a reclamação, sem se reportar ao pedido formulado no requerimento inicial, e não tendo apreciado a matéria de facto que poderia suportar a decisão de dispensa de prestação de garantia requerida pelo reclamante, XXII. encontra-se desta forma a Douta sentença viciada de nulidade, em virtude de o douto Tribunal a quo não ter apreciado todas as questões que importavam ser apreciadas.

XXIII. nomeadamente sobre a manifesta falta de meios económicos revelada pela insuficiência de bens penhoráveis ou a sobre a possibilidade da prestação da garantia causar ao reclamante prejuízo irreparável, e não um mero prejuízo inerente a qualquer execução fiscal, desde que em qualquer dos casos a insuficiência ou inexistência de bens não seja da sua responsabilidade, nos termos do n° 4 do art. 52° da LGT.

XXIV. Sem conceder, considerando que o Tribunal a quo prestou esclarecimento no sentido de que a Douta decisão deva ser interpretada: B) Restritivamente no sentido de que apenas se deu provimento à primeira parte do pedido, nomeadamente à revogação da decisão do Órgão de execução Fiscal; XXV. Considera-se que, e na eventualidade de efetivamente ter existido falta de fundamentação do despacho sub judice, essa formalidade essencial degrada-se numa formalidade não essencial, porquanto a decisão do órgão de execução fiscal XXVI. analisada a matéria de facto, não poderia ser outra, que não aquela que deu, indeferimento do pedido de isenção de garantia.

XXVII. Acresce ao expendido que o pedido do reclamante é pela procedência da isenção de prestação de garantia, XXVIII. Assim sendo, não se pronunciando acerca da totalidade do pedido, condenando em objeto diverso do formulado pelo reclamante, a Douta Sentença recorrida violou o disposto nos artºs 123º do CPPT, 264º e 660º do CPC, importando a sua nulidade nos termos dos artºs 125.º, n.º 1, do CPPT, ne 668º nº 1 e), do Código de Processo Civil.

O Recorrido apresentou contra-alegações nos termos que constam de fls. 558 e seguintes dos autos, concluindo fosse negado provimento ao recurso.

Neste Tribunal, o Ex.mo Senhor Procurador-Geral Adjunto emitiu douto parecer no sentido de que deve ser negado provimento ao recurso.

Com dispensa dos vistos legais (artigos 36.º, n.º 2, do Código de Processo dos Tribunais Administrativos – «C.P.T.A.» – e 707.º, n.º 4, do Código de Processo Civil – «C.P.C.»), o mesmo é submetido à Secção do Contencioso Tributário para julgamento do recurso.

II -DELIMITAÇÃO DO OBJETO DO RECURSO – QUESTÕES A APRECIAR São as seguintes as questões a decidir, devidamente delimitadas pelas conclusões do recurso: a) Saber se a sentença recorrida é nula por omissão de pronúncia e condenação em objeto diverso do formulado pelo reclamante b) Saber se a...

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