Acórdão nº 00361/11.6BECBR de Tribunal Central Administrativo Norte, 18 de Janeiro de 2012

Magistrado ResponsávelFernanda Esteves
Data da Resolução18 de Janeiro de 2012
EmissorTribunal Central Administrativo Norte

Acordam, em conferência, os Juízes da Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Norte: 1.Relatório M… SGPS, S.A, NIF 5..., com sede em …, interpôs recurso jurisdicional da sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal de Coimbra que julgou improcedente a reclamação por si apresentada contra a decisão do Chefe do Serviço de Finanças de Coimbra 1, proferida no âmbito do processo de execução fiscal (doravante, PEF) nº 07282011010680.6, que indeferiu o seu pedido de isenção de prestação de garantia.

A recorrente terminou as suas alegações de recurso, formulando as seguintes conclusões: 1.ª O artigo 60° da LGT estabelece como princípio-geral e sob a epígrafe de “princípio da participação”, o direito de audição prévia do contribuinte na “formação das decisões que lhes digam respeito”, maxime antes do “indeferimento total ou parcial dos pedidos, reclamações, recursos ou petições”.

  1. O legislador apenas dispensa a administração do dever de cumprir tal formalidade nos casos em que a decisão do pedido, reclamação, recurso ou petição for favorável ao contribuinte, tendo sido claro ao tipificar os casos em que existe lugar à notificação para efeitos de exercício do direito de audição e os casos em que não há lugar ao exercício desse direito.

  2. O presente caso concreto não se subsume à hipótese normativa que autoriza a dispensa da audição, integrando-se, outrossim, naquele conjunto típico de casos abrangidos pela fattispecie normativa delineada no n° 1 do artigo 60° da LGT.

  3. Assim, ubi lex non distinguit nec nobis distinguire debemus, pelo que, consequentemente, tipificando o legislador os casos de dispensa do direito de audição e não distinguindo, nos demais, quaisquer situações em que aquele não tem [ou deva ter] lugar, a resposta não pode deixar de ser outra que não a contrária à acolhida na decisão em recurso.

  4. Nessa medida, ainda que a decisão administrativa repouse essencialmente em argumentos formais - como não ter sido feita prova dos pressupostos do pedido ou, por exemplo, que o mesmo é extemporâneo -, essa motivação deve ser levada comunicada ao contribuinte antes da decisão final, de modo a que este possa contraditar os fundamentos da proposta de decisão e, eventualmente, levar à sua consideração novos elementos para apreciação que podem ser determinantes de uma decisão contrária à que seria tomada sem a audição prévia.

  5. Ainda que a falta de junção de prova documental pudesse - admita-se academicamente - constituir fundamento para o indeferimento da pretensão do contribuinte, não constituía razão para, como disse o tribunal - dispensar “a elaboração de proposta de decisão e notificação para o direito de audição”.

  6. Não podem confundir-se as condições determinantes do conhecimento e procedência do pedido dirigido à administração com os pressupostos legais que configuram a obrigação de notificação da proposta de decisão em sede de audição prévia.

  7. E, mesmo que assim não fosse, a falta de invocação da prova documental não se traduz numa conditio sine qua non que determine semel pro semper a improcedência do pedido, como sucederá sempre que os factos invocados não careçam de prova como sucede nos casos em que “o órgão competente [deles] tenha conhecimento em virtude do exercício das suas funções”.

  8. Ora, a preterição do direito de audição in casu traduziu-se na impossibilidade da recorrente ter intervindo no procedimento em termos susceptíveis de determinar decisão diversa da adoptada, seja controvertendo a legalidade da interpretação acolhida na proposta de decisão e sufragada pela decisão final, seja através da invocação de novos elementos probatórios, como posteriormente veio a fazer em sede contenciosa.

    Por outro lado, 10.ª A exigência de actualidade dos elementos probatórios do pedido de dispensa de prestação de garantia, deve ter em consideração a tipologia, a natureza e a aptidão funcional - probatória dos elementos documentais que podem servir de sustentáculo para a apreciação das condições de isenção da prestação de garantia.

  9. Nessa medida, os elementos documentais apresentados - com referência ao último exercício que é possível contabilizar com exactidão em termos de se poder com firmeza apurar a situação económico-financeira e fiscal da sociedade recorrente - traduzem a informação mais rigorosa e actualizada que será exigível relativamente ao quadro da sociedade, e permitem, como permitiram, o controlo pelo tribunal (ainda que erroneamente realizado) da situação de manifesta insuficiência da empresa.

    Por fim, 12.ª O tribunal erra na valoração que faz das contas 4121 e 4123 do balanço económico do exercício de 2009, quanto a empréstimos concedidos a empresas do grupo, ao olhar exclusivamente para um valor do activo, definindo a partir daí a situação da empresa, sem ter em conta o respectivo passivo, mais especificamente aquele que decorre da relação da recorrente com as entidades relativamente às quais possui créditos, porquanto estes são largamente ultrapassados pelos débitos contabilizados para com tais sociedades, de tal modo que, feita a imparidade de uns com outros, o saldo é negativo, como decorre dos documentos valorados pelo tribunal e se encontra detalhadamente justificado no documento de fls. 248 e ss..

  10. A existência de créditos, só por si, não determina a inexistência de uma “manifesta insuficiência de meios económicos”, quando, num quadro de imparidade ou compensação, esses créditos são inferiores aos valores devidos pela sua titular.

  11. O tribunal a quo faz uma errada interpretação da norma do artigo 52.°, n.° 4, da LGT, ao aferir a verificação da hipótese da norma apenas em função da existência de “activos”, sem os ponderar de forma global, integrada e omnicompreensível em relação com os demais elementos caracterizadores da situação patrimonial da empresa.

  12. Destarte, por errada interpretação da lei, a sentença recorrida violou o disposto nos artigos 60.º, n.° 1, alínea b), e 52.º, n.° 4, da LGT.

    Não foram apresentadas contra-alegações.

    O Exmo Magistrado do Ministério Público junto deste Tribunal manteve o douto parecer emitido no STA, no sentido de dever ser concedido provimento ao recurso.

    Foram dispensados os vistos legais, atenta a natureza urgente do processo (cfr. artigo 707º, nº 4 do Código de Processo Civil (CPC) e artigo 278º, nº 5 do Código do Processo e do Procedimento Tributário (CPPT)].

    Objecto do recurso - Questões a apreciar e decidir: As questões suscitadas pela Recorrente e delimitadas pela alegação de recurso e respectivas conclusões [nos termos dos artigos 660º, nº 2, 664º e 684º, nºs 3 e 4, todos do CPC, ex vi artigo 2º, alínea e) e artigo 281º do CPPT] são as seguintes: (i) saber se a sentença recorrida enferma de erro de julgamento ao não ter concluído pela violação do direito de audição prévia previsto no artigo 60º da LGT; (ii) saber se a sentença recorrida enferma de erro de julgamento ao não ter considerado preenchidos os pressupostos para a dispensa de prestação de garantia, designadamente a “manifesta insuficiência de meios económicos”, violando, assim, o disposto no artigo 52º, nº 4 da LGT.

    1. Fundamentação 2.1. Matéria de Facto 2.1.1. A sentença recorrida deu como assente a seguinte matéria de facto: 1). Nos Serviços de Finanças de Coimbra-1 corre termos o processo de execução fiscal nº. 072820110101680.6 instaurado e autuado em 2011.03.21 contra a executada “M… -SGPS, S.A.”, com sede …, por dividas de IRC e de juros compensatórios referentes ao exercício económico de 2006 que ascendem à quantia total de € 1 841 882,67, conforme teor de fls. 88 a 89 dos autos cujo teor se dão aqui por reproduzidos.

      2). A firma executada foi citada da instauração do processo de execução fiscal em 2011.03.28, conforme resulta do teor de fls. 90 dos autos que aqui se dão por reproduzidos.

      3). A reclamante, através do seu mandatário, em 31 de Março de 2011, apresentou um requerimento no respectivo Serviço de Finanças de Coimbra 1, no qual informa aqueles serviços que deduziu impugnação judicial contra a liquidação de IRC, a que se reporta o processo de execução fiscal nº. 072820110101680.6, conforme resulta do teor de fls. 98 e 99 dos autos que aqui se dão por reproduzidas.

      4). Na sequência do requerimento que antecede, foi proferido despacho pelo Chefe do Serviço de Finanças nos seguintes termos: “Notifique-se para a prestação de garantia, nos termos do artigo 169º. do Código de Procedimento e Processo...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT