Acórdão nº 01455/20.2BEPRT de Tribunal Central Administrativo Norte, 08 de Abril de 2022

Magistrado ResponsávelAntero Pires Salvador
Data da Resolução08 de Abril de 2022
EmissorTribunal Central Administrativo Norte

Acordam, em conferência, no Tribunal Central Administrativo Norte – Secção do Contencioso Administrativo: I RELATÓRIO 1 . JL.

, residente na Rua do (…) , inconformado, veio interpor recurso jurisdicional da decisão do TAF do Porto, datada de 10 de Setembro de 2021, que julgou improcedente a acção administrativa instaurada contra a Ordem dos Advogados, para efectivação de responsabilidade civil extracontratual, decorrente da nulidade do Despacho de 1/8/2017, do Conselho Regional do Porto da Ordem dos Advogados que decidiu o arquivamento do processo de apoio judiciário, n.º 31096/2017- * 2 .

No final das suas alegações, o recorrente formulou as seguintes proposições conclusivas: "A – Entende o Autor que o despacho exarado no dia 1 de agosto de 2017, pela Sra. Vogal do Concelho Regional do Porto da Ordem dos Advogados, é denegatório do seu interesse legalmente protegido de acesso ao direito e aos Tribunais, uma vez que impediu a concessão de apoio judiciário, ao não permitir a nomeação de novo patrono, impossibilitando desse modo o seu acesso à justiça, por carência de meios económicos.

B - Tal direito, encontra-se consagrado constitucionalmente, nomeadamente no artigo 20º da Constituição da República Portuguesa, e como tal, dúvidas não há de que o mesmo se traduz num direito fundamental.

C – A referida ofensa atingiu o seu núcleo essencial, na medida em que o referido despacho teve por consequência desprover o Autor do conteúdo essencial da proteção que esse direito lhe dá.

D - Considerando o tribunal recorrido, como o fez que, “a R. omitiu uma formalidade essencial (sublinhado nosso), preterindo a audiência prévia do A., julgando-se, assim, verificado o invocado vício de forma …”, sempre teria o ato que ser declarado nulo com as devidas consequências.

E - A preterição de audiência prévia dos interessados – que, como se demonstrou é, in casu, uma formalidade absolutamente essencial – e a consequente ofensa do direito de audiência prévia determina a nulidade do ato final, isto porque, nos termos do artigo 161º, nº 2, alínea d) do CPA, são nulos os atos que ofendam o conteúdo essencial de um direito fundamental.

F - Conclui o A. que, quer se qualifique o direito à audiência prévia como mero direito fundamental, quer se denomine esse direito numa perspetiva reforçada, como direito análogo a uma garantia de natureza jus-fundamental, a preterição desse momento e direito procedimental, resultará sempre na nulidade do ato.

G - Entende o A. que a falta de audiência prévia é fundamento de uma ilicitude suficientemente certa e segura para efeitos de responsabilidade civil extracontratual da Entidade Demandada.

H - De facto, o Autor viu ofendida a sua posição jurídica ativa, quer pela preterição de formalidades essenciais, quer pela denegação do seu interesse legalmente protegido de acesso ao direito e aos tribunais, I - Pelo que, como já foi pelo mesmo alegado, sentiu-se revoltado, angustiado e injustiçado, com o procedimento adotado e com a decisão tomada pelo Conselho Regional do Porto.

J - Sendo certo que, é um direito do Autor, enquanto cidadão nacional, ser representado por um Advogado e ver a (in)viabilidade da sua pretensão analisada, julgada e decidida pelos Tribunais.

K - Tal direito, consagrado constitucionalmente, traduz-se num direito à proteção jurídica através dos Tribunais, pressupondo além do direito de defesa, uma dimensão de natureza prestacional, que se traduz na obrigação do Estado de assegurar a prestação de patrocínio judiciário.

L - No que se refere ao patrocínio judiciário e oficioso, a garantia constitucional inserta no art.º 20.º, n.ºs 1 e 2 da Constituição da República Portuguesa, é concretizada, entre outros mecanismos, através do sistema público de proteção jurídica, plasmado na Lei n.º 34/2004, de 29 de julho.

M - Tem sido prática comum do Conselho Regional do Porto, a concessão de, pelo menos, mais uma nomeação oficiosa, como se pode constatar em solicitações anteriores de nomeação de patrono oficioso, com base em escusa de patrocínio por inexistência de fundamento legal da pretensão do beneficiário, pelo ora Autor.

N - Aliás, diga-se que, em diversas situações, é concedida uma terceira nomeação oficiosa, mesmo com base em escusa de patrocínio por inexistência de fundamento legal da pretensão do beneficiário.

O - Não se compreende nem se aceita, que o tribunal considere que “a repetir-se o procedimento administrativo, não comparecem indícios seguros, factuais e jurídicos, de que a nova decisão pudesse ser outra”, bem como, “não se vislumbra com a prática do acto impugnado qualquer restrição desequilibrada ou desproporcional do direito de acesso ao direito e aos Tribunais, garantido constitucionalmente, o que equivale a dizer que, neste conspecto, nenhum vício de violação de lei se perscruta, faltando, de novo, a verificação do pressuposto da ilicitude para efeitos de efectivação da responsabilidade civil extracontratual da Ré”.

P - Se o Autor tivesse sido ouvido antes de a decisão final ser tomada, nos termos do artigo 100° do CPA, não deixaria de ter posto em evidência esses pressupostos de facto e a decisão a tomar teria de ser outra.

Q - No caso vertente, a situação de responsabilidade civil extracontratual resulta de danos emergentes da conduta adotada pela Ordem dos Advogados Portugueses, pelo que a aferição dos respetivos pressupostos de responsabilidade deve reger-se, igualmente, pelo RRCEE, conforme resulta do disposto no artigo 1º n.º 1 e 2, deste diploma.

R - Ora, não há dúvida que a conduta adotada pela Ordem dos Advogados Portugueses ofendeu os direitos e interesses legalmente protegidos do A., sendo violadora do art.º 20.º, n.º 1 e 2 da Constituição da República Portuguesa, e dos artigos 4º e 23º, nº1da Lei n.º34/2004, de 29 de julho.

S - E efetivamente, se não fosse a conduta imprópria da Ré, manifestamente violadora de normas legais supramencionadas, os danos morais não se teriam verificado na esfera jurídica do Autor".

* E Finaliza " ...Nestes Termos, e nos demais de Direito doutamente supridos pelos Ex.mos Senhores Juízes Desembargadores, se requer se dignem julgar o presente Recurso procedente, por provado, revogando a douta Sentença Judicial proferida pelo digníssimo Tribunal de 1.ª instância com todas as consequências legais".

* 3 .

Notificadas as alegações, apresentadas pelo recorrente, supra referidas, veio a Ordem dos Advogados apresentar contra alegações que concluiu do seguinte modo: “A.

Chegados a este ponto, estamos em condições de proceder à descrição conclusiva das razões fundadoras do exercício discursivo de contra-alegação, cfr. o disposto nos n.º 3 do art.º 144º do CPTA e n.º s 1 e 2 do art.º 639º do CPC ex vi n.º 3 do art.º 140º do CPTA, o que se passará a fazer em seguida, B.

Tendo sido notificado em 13.09.2021 do Despacho Saneador-Sentença que considerou improcedente o seu pedido vertido na petição inicial que encetou os presentes autos, veio o Autor nos autos interpor recurso da referida decisão em 19.10.2021.

C.

Fê-lo, no entanto, sem ser capaz, inclusive, de assacar uma única irregularidade à Sentença prolatada nos autos e cuja a validade e força persuasiva, salvo melhor opinião que não se discerne, não sai abalada pelo teor das alegações de recurso em causa, D.

Quedou-se, pois, o Autor ora Recorrente por um exercício de repetição e persistência nos argumentos já apresentados com a dedução da petição inicial que encetou os presentes autos, pelo que, e para todos os devidos e legais efeitos, a Ré dá como reproduzido todo o teor das peças processuais por si juntas aos autos, nomeadamente, a Contestação apresentada.

Desde logo, E.

Porque, a propósito da pretensa violação do direito de audição prévia, que não se concede, não estando em causa o direito de audição em sede de qualquer processo disciplinar ou sancionatório, sempre se poderá daqui retirar de forma segura e consentânea com o entendimento unânime da actual jurisprudência e doutrina que, caso tivesse havido violação do dever de notificação para audição prévia, (i) nunca se poderia fazer dimanar da preterição da referida formalidade o desvalor da nulidade, e (ii) nunca estaria em causa a violação do conteúdo essencial de um direito fundamental.

F.

Assim o disse o Tribunal Constitucional no Acórdão n.º 594/2008, publicado na 2.ª Série do Diário da República de 26 de janeiro de 2009, que cristalizando o referido entendimento se pronunciou da seguinte forma, «[…]atribuir -se ao direito de audição, na conformação do procedimento a que o legislador ordinário se encontra obrigado, uma função essencial, e, até, quando previsto, a natureza de uma formalidade essencial, não consequência, necessariamente, que o preceito constitucional o tenha como elemento essencial do ato, até, porque o ato é evento posterior do procedimento a que respeita a audição, ou, sequer, que o mesmo artigo obrigue o legislador ordinário a atribuir -lhe tal natureza cuja falta haja de ser sancionada com a nulidade, nos termos do artigo 133.º, n.º 1, do CPA, em vez de o ser, apenas, mediante a sanção regra que o legislador ordinário adotou para sancionar a ilegalidade dos atos administrativos — a anulabilidade (artigo 135.º do CPA).

O que vem de dizer -se não impede que, em certos casos, se reconheça ao direito de participação, sob a forma de direito de audição, uma natureza especial tal que demande que a sua violação seja sancionada com o estigma da nulidade própria da afetação do núcleo essencial dos direitos fundamentais (cf. artigo 133.º, n.º 2, alínea d), do CPA).

Será o caso do direito de audiência e de defesa, nos procedimentos contra-ordenacionais e quaisquer processos sancionatórios (artigo 32.º, n.º 10, da CRP) e nos processos disciplinares (artigo 269.º, n.º 3, da CRP).

Mas, aqui, a configuração como verdadeiro direito subjectivo fundamental não se funda, directamente, no referido artigo 267.º, n.º 5, da Constituição, mas em outros preceitos constitucionais, prendendo -se...

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