Acórdão nº 00442/10.3BEPRT de Tribunal Central Administrativo Norte, 02 de Junho de 2022

Magistrado ResponsávelTiago Miranda
Data da Resolução02 de Junho de 2022
EmissorTribunal Central Administrativo Norte

Acordam em conferência os Juízes Desembargadores que compõem a Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Norte: I - Relatório A..., Lda., NIPC (…), com sede na Rua (…), interpôs, em 95/73/2013, recurso de apelação relativamente à sentença proferida em 15 de Fevereiro de 2013, no Tribunal Administrativo e Fiscal de Braga, que julgou improcedente a impugnação judicial movida contra a liquidação nº 900148.9, de 15/12/2009, relativo a aquisições de gasóleo ocorridas nos anos de 2006 a 2009, no valor total de 3 759,49 €.

Antes, porém, designadamente em 24/1/2011, a mesma recorrente apresentara recurso de apelação do despacho de 7/1/2011 que mandara desentranhar e devolver-lhe um articulado que apresentara em 4/1/2011, após a notificação da contestação da Autoridade Tributária e Aduaneira (AT) recurso que subiu a final, conforme despacho de recebimento, de 7/1/2011.

As alegações do recurso relativo ao despacho interlocutório de desentranhamento e devolução do articulado, terminam com as seguintes conclusões: «CONCLUSÕES: 1ª Apesar de o despacho proferido a fls. em 07/01/2011, que recaiu sobre o requerimento de fls. 55 e ss. apresentado pela Recorrente, mandou desentranhar o articulado de resposta, por inadmissibilidade (SIC).

  1. - Dispõe o nº 3 do artigo 108º do CPPT que com a petição, elaborada em triplicado, sendo uma cópia para arquivo e outra para o representante da Fazenda Pública, o impugnante oferecerá os documentos de que dispuser, arrolará testemunhas e requererá as demais provas que não dependam de ocorrências supervenientes.

  2. - Salvo melhor opinião, como se alcança dos pedidos constantes das alíneas a), b) e c) do requerimento de fls. 55 e ss., verifica-se que não estamos perante um novo articulado, mas antes de um requerimento de prova.

    49 - Como se alcança da alínea b) dos pedidos do requerimento que juntou a fls. 55 e ss., a Recorrente justificou que as provas ali requeridas dependiam de ocorrências supervenientes.  5â - Mesmo que as provas juntas e requeridas pela Recorrente no requerimento de fls. 55 não pudessem ser justificadas em ocorrências supervenientes à petição inicial, sempre lhe assistiria razão, porquanto o disposto no invocado nº 3 do artigo 108º do CPPT não determina que não é admissível às partes, requererem a todo o tempo, até ao encerramento da discussão da audiência de julgamento, novas provas, juntar documentos e aditarem testemunhas ao rol respectivo até 20 dias antes da audiência de julgamento.

    6â - O Tribunal a quo só poderia mandar desentranhar do processo os documentos juntos com o requerimento de fls. 55 e ss e restitui-los à apresentante, condenando-a ao pagamento de multa nos termos do Regulamento das Custas Processuais, se fundamentasse a sua decisão na desnecessidade e impertinência de tais documentos, o que não fez.

  3. - Por outro lado, dispõe o nº 1 do artigo 512.2-A do CPC que o rol de testemunhas pode ser alterado ou aditado até 20 dias antes da data em que se realize a audiência de julgamento, sendo a parte contrária notificada para usar, querendo, de igual faculdade, no prazo de 5 dias.

  4. - O Tribunal a quo deveria ter permitido, mas não permitiu, a alteração do rol das testemunhas que a Recorrente já havia indicado na petição inicial.

    9- - A Recorrente pretende provar em sede de audiência de julgamento que todos os abastecimentos de gasóleo colorido em causa nos autos, sem excepção, foram efectuados na presença de agentes da Guarda Fiscal em serviço na Alfândega de Viana do Castelo, e pretende indicar como testemunhas 3 desses agentes cuja identificação e domicílio desconhece só a parte contrária conhece.

  5. - Pelo que, assiste à Recorrente o direito de requerer ao Tribunal a quo a notificação da parte contrária para fornecer a identificação e o domicílio de todos os agentes que presenciaram e/ou fiscalizaram todos os abastecimentos de gasóleo colorido na embarcação "Saudades ... (...)" no período de 04/02/2006 a 12/05/2009 pelo proprietário do posto de abastecimento de gasóleo colorido titular da licença POS 59614, sendo de prever a dificuldade da Recorrente em obter aquelas informações.

  6. - O despacho recorrido proferido pelo Tribunal a quo violou o disposto no nº 4 do artigo 266º, no nº 1 dos artigos 512º-A, 542º e 543º, todos do CPC.

    Termos em que, devem as conclusões do recurso proceder, por provadas, e o recurso merecer provimento, com as legais consequências.» As alegações de recurso relativamente à Sentença da Recorrente terminam com as seguintes conclusões: «CONCLUSÕES: Iª - Na petição inicial de impugnação, a Recorrente indicou e requereu a produção de prova que pretendia produzir, pois, além dos documentos que juntou também requereu a inquirição em audiência de discussão e julgamento da testemunha, e pelo seu depoimento pretendia provar diversos factos que fundamentaram a impugnação, AA..., proprietário da bomba de combustível onde foram efectuados todos os abastecimentos de gasóleo colorido para a embarcação "Saudades ... (...)" no período de 06/02/2006 a 30/06/2009.

  7. - A Recorrente requereu ainda ao Tribunal a quo a notificação da Alfândega de Viana do Castelo para identificar nos autos todos os agentes da Brigada Fiscal que autorizaram os abastecimentos de gasóleo colorido em causa para a embarcação "Saudades ... (...)", mediante a apresentação do cartão de microcircuito n° 1049968 emitido em nome do anterior proprietário da embarcação, BB..., pois, também pretendeu indicá-los, como indicou, como testemunhas no processo de impugnação.

  8. - Com tais meios de prova, que tempestivamente apresentou e requereu nos autos, a Recorrente pretendeu provar que todos os abastecimentos de gasóleo colorido em causa foram efectuados na presença e com a autorização do elemento da Guarda Nacional Republicana destacado na Brigada Fiscal da Alfândega de Viana do Castelo em serviço no posto de combustível POS 59614.

    4a - Apesar disso, o Tribunal a quo não procedeu à requerida notificação da Alfândega de Viana do Castelo para identificar nos autos os agentes da Brigada Fiscal que autorizaram os abastecimentos em causa, não diligenciou pela produção de qualquer outra prova requerida pela Recorrente, não designou a data de julgamento para efeitos de produção da prova requerida, mas conheceu dos pedidos.

  9. - O tribunal não pode resolver o conflito de interesses que a acção pressupõe sem que a resolução lhe seja pedida por uma das partes e a outra seja devidamente chamada para deduzir oposição; do mesmo modo, o juiz deve observar e fazer cumprir, ao longo de todo o processo, o princípio do contraditório, não lhe sendo lícito, salvo caso de manifesta desnecessidade, decidir questões de direito ou de facto, mesmo que de conhecimento oficioso, sem que as partes tenham tido a possibilidade de sobre elas se pronunciarem (n° 3 do artigo 3o do CPC).

  10. - A Recorrente põe em causa a decisão do tribunal a quo que se pronunciou e decidiu sobre questões de direito e de facto que a Recorrente não teve oportunidade de realizar prova, nomeadamente, a prova testemunhal tempestivamente requerida nos autos.

  11. - O tribunal deve assegurar, ao longo de todo o processo, um estatuto de igualdade substancial das partes, designadamente no exercício de faculdades, no uso de meios de defesa e na aplicação de cominações ou de sanções processuais.

  12. - O n° 2 do artigo 517° do CPC dispõe que quanto às provas constituendas, a parte será notificada, quando não for revel, para todos os actos de preparação e produção da prova, e será admitida a intervir nesses actos nos termos da lei.

  13. - A decisão a quo, proferida sem que os autos tivessem produzido a prova requerida peta Impugnante, lesa claramente o princípio da justa composição partes e do litígio, e fere directa e incisivamente os direitos e os interesses da Recorrente quanto ao objecto do processo de impugnação, com clara violação do seu direito ao exercício do contraditório relativamente aos factos controvertidos.

  14. - Discorda-se totalmente da fundamentação da sentença segundo a qual o tribunal a quo conheceu de imediato os pedidos e decidiu a matéria de fato com base no acordo das partes, onde o mesmo foi possível e na prova documental junta aos autos; a prova documental junta aos autos não é suficiente, de per si, para demonstrar que não se verificam os fundamentos de facto e de direito apresentados pela Impugnante no processo de impugnação, ou que nem a prova testemunhal sustentaria a tese desta.

  15. - Para a Recorrente, a prova testemunhal requerida tinha por objectivo provar que os abastecimentos de gasóleo foram sempre autorizados e presenciados pela autoridade competente, bem como as circunstâncias em que ocorreram, onde se inclui o cartão utilizado, entre outra matéria de factos controvertidos nos autos.

  16. - O princípio do contraditório é um princípio basilar do processo, que hoje ultrapassou a concepção clássica, que o associava ao direito de resposta, para se assumir como uma garantia da participação efectiva das partes no desenvolvimento de todo o litígio, mediante a possibilidade de influírem em todos os elementos que se liguem ao objecto da causa. Entre as várias manifestações daquele princípio, importa ter em conta a prevista no artigo 508.°-A, n.º 1, alínea b) do CPC (ex vi artigo 42 °, n.º 1, do CPTA) que diz que o juiz deve convocar audiência preliminar de molde a facultar às partes a discussão de facto e de direito, nos casos em que ao juiz cumpra apreciar excepções dilatórias ou quando tencione conhecer imediatamente, no todo ou em parte, do mérito da causa; porém, percorridos os autos, assim tal não sucedeu, pois, não se realizou audiência preliminar apesar de ter conhecido, no todo, do mérito da causa.

  17. - Ao decidir como decidiu, a sentença recorrida é nula por violar o direito da Recorrente ao exercício do contraditório dos factos controvertidos nos autos, uma vez que o tribunal a quo não permitiu que pudesse utilizar nos autos as provas que requereu, e que também fundamentaram a impugnação...

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