Acórdão nº 00078/07.6BEVIS de Tribunal Central Administrativo Norte, 02 de Junho de 2022

Magistrado ResponsávelIrene Isabel Gomes das Neves
Data da Resolução02 de Junho de 2022
EmissorTribunal Central Administrativo Norte

Acordam em conferência, os juízes da Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Norte: 1. RELATÓRIO 1.1. O Recorrente (AA...), notificado da decisão do Tribunal Administrativo e Fiscal de Aveiro em que foi julgada parcialmente procedente a impugnação judicial deduzida contra a liquidação de IRS, relativa ao ano de 2002, no montante global de 24.317,64 €, inconformado vem dela interpor o presente recurso jurisdicional.

Alegou, formulando as seguintes conclusões: «1ª- Tendo em consideração o longo tempo decorrido entre a entrada em juízo da impugnação e tendo igualmente em conta as normas legais vigentes à data, mais propriamente o art. 49º da LGT, a obrigação fiscal em causa nestes autos já prescreveu.

  1. - A sentença recorrida considerou que o recorrente não foi validamente notificado, nos termos previsto no art. 36º do CPPT e 77º da LGT, vício que não traduz uma mera irregularidade, como considerou a sentença, mas sim uma nulidade que determina a nulidade da liquidação do imposto.

  2. - As liquidações que resultaram da inspeção tributária são ilegais, porquanto não tiveram em devida conta o Regime Especial de Tributação de Bens em Segunda-Mão previsto na Diretiva 94/5/CE, artigo 26ºA em articulação com o artigo 11º nº 3, regime esse transposto para a legislação nacional, mais propriamente no artigo 16º, nº 6 ponto C do CIVA.

  3. - A liquidação do IRS tal qual resultou do relatório de inspeção tributária e confirmada pela douta sentença objeto do presente recurso, considerou que o recorrente tem de pagar IRS sobre um rendimento que engloba o valor do IA que teve de pagar quando importou 1as viaturas automóveis usadas da Alemanha, as matriculou em Portugal e as vendeu aos seus clientes.

  4. - O pagamento de um imposto de matrícula, cujo pagamento é obrigatório para que o veículo em questão possa circular em Portugal, nunca poderá ser englobado no valor tributável resultante dessa operação comercial.

  5. - Essa interpretação viola de forma flagrante o disposto no art. 104º, nº 2 da CRP, que declara que “a tributação das empresas incide fundamentalmente sobre o seu rendimento real”.

  6. - Nas faturas emitidas pelo recorrente o imposto automóvel obrigatoriamente pago por este, foi sempre discriminado de forma autónoma, para que esse valor possa ser tratado de forma distinta do preço de venda propriamente dito do veículo.

  7. - Este valor liquidado pela AT e pago pelo recorrente vem também expresso na Declaração Aduaneira de Veículo (DAV), documento que é validado pela AT como suporte contabilístico do pagamento do referido Imposto Automóvel 9ª- Os valores referentes ao IA pagos, foram contabilizados em contas de terceiro/contas passagem, não devendo ser considerados como englobados no valor de venda.

  8. - A Diretiva 77/388/CE de 14.02.1994, com a redação introduzida pela Diretiva 94/5/CE, de 14.02.1994, em vigor à data da liquidação do imposto, que rege o Regime especial do IVA aplicável aos bens em segunda mão, aos objetos de arte e de coleção e às antiguidades estabelece no ponto 3, do seu art. 26ºA que por preço de venda se entende tudo o que constitua a contraprestação obtida ou a obter pelo sujeito passivo revendedor 2da parte do comprador ou de um terceiro, incluindo as subvenções diretamente ligadas a essa operação, os impostos, direitos, contribuições e taxas, as despesas acessórias, tais como as despesas de comissão, embalagens, transporte e seguro cobradas pelo sujeito passivo revendedor ao comprador, com exclusão dos montantes referidos no ponto A, nº 3 do art. 11.

  9. - Os montantes referidos no ponto A, nº 3 do art. 11, mais propriamente os previstos na alínea c), são as quantias que um sujeito passivo recebe do adquirente ou do destinatário, a título de reembolso das despesas efetuadas em nome e por conta destes últimos, e que estão registados na sua contabilidade em contas transitórias. O sujeito passivo deve justificar o montante efetivo de tais despesas e não pode proceder à dedução do imposto que eventualmente tenha incidido sobre elas.

  10. - A alínea c) do nº 6 do art. 16º do CIVA, prevê que são excluídos do valor tributável as quantias pagas em nome e por conta do adquirente dos bens ou do destinatário dos serviços., registadas pelo sujeito passivo em contas de terceiros apropriadas.

  11. - O recorrente, na organização da sua contabilidade, teve sempre em consideração aquelas disposições legais e o entendimento sufragado por esta jurisprudência, discriminando nas suas faturas o imposto automóvel pago para poder matricular as viaturas adquiridas na Alemanha e introduzidas em Portugal, contabilizando esse valor numa conta de terceiros, pois o mesmo não podia ser englobado no valor de venda ou no valor tributável.

    2 14ª- Não é a definição do valor de compra que está em apreciação nestes autos, pelo que, com o devido respeito, as referências feitas na douta sentença a esse propósito em nada relevam para a decisão a proferir no presente recurso.

  12. - Viola a lei considerar que um imposto pago pelo recorrente para matricular uma viatura que vai comercializar no âmbito da sua atividade comercial, seja considerado um montante incluído na sua “margem de lucro” sujeito a tributação em sede de IRS.

  13. - A incidência do IVA sobre o IA pago pelo recorrente, traduz uma clara dupla tributação, violadora do princípio absoluto e constitucionalmente protegido da neutralidade fiscal.

  14. - O IA é um verdadeiro imposto de matrícula, facto gerador do imposto, uma vez que a sua liquidação só é efetuada quando na fase da venda do veículo a sua matrícula se torna necessária, situação que tanto ocorre relativamente aos veículos novos, como aos usados.

  15. - Este imposto é pago pelo revendedor dos veículos em nome e por conta dos clientes, sendo os respetivos montantes registados em contas de terceiros, o que fundamenta não dever incidir IVA sobre esse imposto automóvel pago.

  16. - Sob pena desse adquirente ser onerado com uma dupla tributação fiscal.

  17. - Esta dupla tributação viola o disposto no já referido art. 26ºA da Diretiva 94/5/CE, atualmente transporta para os art. 78º, 79º e 83º da Diretiva 2006/112/CE, pelo que, por ser violadora do direito europeu, deve ser considerada nula.

    3Nestes termos deve o presente recurso ser julgado procedente, revogando-se a sentença proferida pelo TAF de Aveiro.» 1.2. A Recorrida (Fazenda Pública), notificada da apresentação do presente recurso, não apresentou contra-alegações.

    1.3. O Ministério Público junto deste Tribunal emitiu parecer a fls. 623 SITAF, no sentido da improcedência do recurso: «Tanto quanto nos parece resultar da douta sentença esta fez uma correcta apreciação e valoração dos factos apresentados mostrando-se devidamente fundamentada, pelo em nosso entender deverá ser mantida nos seus precisos termos.» 1.4.

    Com dispensa dos vistos legais dos Exmos. Desembargadores Adjuntos (cfr. art. 657º, n.º 4 do Código de Processo Civil (CPC), submete-se desde já à conferência o julgamento do presente recurso.

    Questões a decidir: As questões sob recurso e que importam decidir, suscitadas e delimitadas pelas alegações de recurso e respectivas conclusões, são as seguintes: (i) Da prescrição do tributo, atento o lapso de tempo decorrido e tendo em conta os preceitos legais vigentes à data, o que alega para os devidos efeitos legais; (ii) Do erro de julgamento de direitos aos ter o tribunal a quo reconhecido não ter sido validamente notificado o relatório final da inspecção externa ter considerado que se traduz numa mera irregularidade; (iii) Do erro de julgamento ao considerar que a liquidação impugnada não enferma de erro sobre os pressupostos de facto; (iv) Da dupla tributação decorrente da incidência do IVA sobre o IA pago pelo recorrente, em violação do principio da neutralidade fiscal.

    1. FUNDAMENTAÇÃO 2.1. De facto 2.1.1. Matéria de facto dada como provada e não provada na 1ª instância e respectiva fundamentação: «3.1. Com interesse para a decisão a proferir, julgam-se provados os seguintes factos: 1. O sujeito passivo, ora impugnante, à data dos factos, encontrava-se registado para o exercício da atividade de “Comércio de Veículos Automóveis” (CAE 501000). – cfr. fls. 9 verso do processo administrativo apenso.

    2. Com base na Ordem de Serviço n.º ...36, de 21.01.2006, o Impugnante foi objeto de uma ação inspetiva de âmbito parcial (IVA e IRS), que incidiu sobre os anos de 2002 a 2005 e teve lugar entre 30.01.2006 e 22.06.2006. – cfr. fls. 9 verso do processo administrativo apenso.

    3. Em 30.01.2006, o sujeito passivo, ora Impugnante, foi notificado para, no prazo de 15 dias a contar da notificação: - proceder à entrega das declarações de rendimentos anuais dos anos de 2002, 2003 e 2004; - apresentar declarações periódicas de IVA desde 02.03T até à última declaração que deveria ser entregue e que não foram apresentadas nos prazos legais; - exibir a inspeção tributária, em 15.02.2006, pelas 10h00, os livros de escrita devidamente organizada e regularizada e todos os documentos de suporte que lhe serviram de base.

      (cfr. fls. 19 do processo administrativo apenso).

    4. Em 14.06.2006 o Impugnante prestou as declarações que constam do auto de fls. 22 do processo administrativo apenso e cujo teor se tem por reproduzido.

    5. Através do ofício n.º ...80, remetido por carta registada em 03.07.2006, foi o Impugnante notificado do projeto de relatório de inspeção tributária bem como para, querendo, e no prazo de 15 dias, exercer o direito de audição. – cfr. fls. 161/162 do processo administrativo apenso.

    6. Em 25.07.2006, foi elaborado o relatório de inspeção tributária que consta de fls. 8/17 do processo administrativo apenso, que se dão por reproduzidas, e do qual consta, entre o mais, o seguinte: “(...)[imagem que aqui se dá por reproduzida] (...)”.

    7. As conclusões do relatório de inspeção tributária foram sancionadas superiormente. – cfr. fls. 8 frente e verso do processo administrativo apenso.

    8. Em 26.07.2006, funcionários da Direção de Finanças de Aveiro tentaram notificar...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT