Acórdão nº 00781/20.5BEPRT de Tribunal Central Administrativo Norte, 28 de Janeiro de 2022

Magistrado ResponsávelMaria Fernanda Antunes Aparício Duarte Brandão
Data da Resolução28 de Janeiro de 2022
EmissorTribunal Central Administrativo Norte

Acordam, em conferência, na secção de contencioso administrativo do Tribunal Central Administrativo Norte: RELATÓRIO “P., Lda.”, com sede na Rua (…), propôs acção administrativa contra a APDL, S.A., com sede na (…).

Formulou o seguinte pedido: - anular-se a decisão da APDL que impõe a amortização do investimento adicional a realizar com as obras de alteração e ampliação do edifício do estabelecimento da concessão até ao termo do respectivo contrato; e, - reconhecer-se o direito subjectivo da Autora de, em alternativa, a APDL a reembolsar da parte do investimento não amortizado no termo da concessão ou prorrogar o contrato de concessão pelo prazo necessário à amortização desse investimento, conforme previsto no art.º 35.º/2 do Dec.-Lei n.º 226-A2007, de 31 de maio.

Por sentença proferida pelo TAF do Porto foi julgada procedente a acção e a)Anulado o acto contido na informação/parecer sob o n.º 29/GD/2019, proferida em 02.08.2019, no processo n.º MTS2019/00655, na parte em que determina que a amortização do investimento deve ocorrer até ao termo do contrato de concessão; b)Reconhecido o direito da A. a, no termo do prazo fixado no contrato de concessão, caso venha a realizar investimentos adicionais aos inicialmente previstos no contrato de concessão, devidamente autorizados pela entidade competente, e caso demonstre que os mesmos não foram ainda nem teriam podido ser recuperados, que a APDL , S.A. opte por reembolsar a mesma A. do valor do investimento adicional concretamente realizado e ainda não recuperado, ou, excepcionalmente e por uma única vez, o direito da A. em ver prorrogada a concessão pelo prazo necessário a permitir a recuperação daquele mesmo investimento, não podendo em caso algum o prazo total exceder os 75 anos.

Desta vem interposto recurso.

Alegando, a Entidade Demandada formulou as seguintes conclusões: 1ª) Nos termos expressos no D.L. nº 226-A/2007, de 31 de Maio e na Lei nº 58/2005, de 15 de Novembro, a APDL é a autoridade competente na jurisdição das áreas do domínio público hídrico que lhe estão afetas, gozando de uma considerável margem de discricionariedade, expressão de autonomia privada, regulada pelo direito privado, embora sempre subsidiária dos princípios gerais da atividade administrativa, contidos nos artigos 3º e seguintes do Código do Procedimento Administrativo.

  1. ) Tanto o regime legal definido pela Lei da Água como o que se estabelece no Regime Legal da Utilização dos Recursos Hídricos preveem a possibilidade de realização de obras pelos concessionários.

    O regime-regra, comum a ambos os dispositivos legais, é no sentido de prever a reversão gratuita a favor do Estado das obras executadas e das instalações construídas no âmbito da concessão, findo o prazo fixado no título.

    O DL nº 226-A/2007 regula a circunstância excecional da eventual realização pelo titular do contrato de concessão de investimentos adicionais aos que foram inicialmente previstos, afastando a regra geral da reversão gratuita para o Estado, estabelecendo o modus operandi para o seu concreto funcionamento, impondo condições para a sua aplicabilidade e determinando a competência para o exercício dos poderes discricionários que deixa previstos.

  2. ) Quanto ao modus operandi, diz o DL nº 226-A/2007 que o regime especial que contempla poderá ser alternativamente levado a cabo pelo reembolso ao titular do valor não recuperado (amortizado) ou, excecionalmente e por uma única vez, através da prorrogação da concessão pelo prazo necessário a permitir a recuperação dos investimentos.

    Quanto às condições exigidas para a sua aplicabilidade, estabelece que depende da existência de prévia autorização da autoridade competente para a realização dos investimentos em causa, obriga à demonstração de que os mesmos não foram nem poderiam ter sido recuperados pelo concessionário durante o prazo da concessão e proíbe a realização de qualquer outro investimento no prazo de prorrogação, se for esta a opção da autoridade competente.

    Quanto à competência para o exercício dos poderes discricionários que deixa previstos, o regime legal remete para a autoridade competente.

  3. ) Correspondem a situações muito distintas o parecer favorável levado a cabo nos termos previstos no artigo 13º-A do D.L. nº 555/99, de 16 de Dezembro (RJUE), que se configura como ato preparatório em cumprimento do disposto quanto ao licenciamento de uma pretendida operação urbanística e o ato administrativo que se contém no parecer da autoridade competente emitido no âmbito do regime legal aplicável às obras realizadas pelos concessionários de utilização dos recursos hídricos.

  4. ) O ato administrativo deixado expresso em 02.08.2019 pela APDL contém diversos segmentos decisórios que não podem ser separados entre si, sob pena de se perder o sentido com que a declaração foi emitida, enquanto meio direto de manifestação de vontade destinada a produzir efeitos jurídicos.

    A autorização para a execução das obras pretendidas não pode deixar de estar associada à declaração expressa que a condiciona, no sentido de que o investimento deverá ser amortizado até ao termo do contrato de concessão.

  5. ) É admissível e legítima a declaração de ato administrativo sob condição, podendo o poder discricionário cometido à entidade competente ser expresso através da adição de cláusulas particulares às disposições pré-fixadas.

    1. ) Nos termos contidos no Regime da Utilização dos Recursos Hídricos (DL nº 226-A/2007) a lei não estabelece critérios normativos dentro dos quais a decisão da entidade competente tenha de operar no que concerne poder de autorizar ou não a realização de investimentos adicionais desta forma remetendo para a oportunidade e conveniência que em concreto forem por ela julgadas aplicáveis ao caso, o que significa que é cometido à entidade competente como um poder discricionário.

      A entidade competente, analisada a concreta situação, pode, pois, no uso legítimo do direito discricionário que lhe é conferido pelo legislador, aprovar/autorizar ou não o que lhe é submetido pelo titular da concessão à sua análise, nomeadamente tendo sempre em conta as consequências práticas que decorrerão dessa eventual anuência.

    2. ) Nos termos das disposições transitórias previstas no artigo 90º do D.L. 226-A/2007, a Apelante está legalmente impedida de prorrogar o prazo do contrato de concessão em análise nos presentes autos, como forma de assegurar o retorno (amortização) dos novos investimentos que a Apelada se proponha realizar.

    3. ) A decisão proferida faz má interpretação do direito e viola as normas legais contidas na Lei nº 58/2005 e no DL nº 226-A/2007, no artigo 149.º do Código do Procedimento Administrativo e no artigo 3.º nº 1 do CPTA.

      Nestes termos, concedendo-se provimento ao presente Recurso, revogando-se a sentença proferida e proferindo-se decisão que julgue a ação improcedente e absolva a Ré do pedido se fará Justiça A Autora juntou contra-alegações, concluindo: 1ª) As obras de alteração e ampliação do edifício do estabelecimento da concessão mostram-se autorizadas pela APDL e implicam a realização de um investimento adicional ao inicialmente previsto no contrato de concessão, cujo valor estimado se situa entre € 200.000 a € 250.000.

  6. ) Como muito bem refere a sentença recorrida a margem de discricionariedade conferida à administração pelo art. 35º/2 do Dec.Lei 226-A/2007 reduz-se às duas opções legais: i) ou reembolsa o particular; ii) ou prorroga-lhe o contrato.

  7. ) Razão pela qual a condição imposta de amortização do investimento até ao termo do prazo da concessão não está compreendida na margem de livre apreciação conferida pela atrás citada norma legal e, como tal é claramente contra legem.

  8. ) Termos em que a sentença não viola nem o disposto na Lei 58/2005, nem o art. 35.º/2 do Dec.Lei 226-A/2007, nem o art.149.º do CPA, nem tão pouco o art. 3.º/ 1 do CPTA.

  9. ) Nem tão pouco viola o art. 90.º/4 do Dec. Lei 226-A/ 2007, posto que nesta sede a recorrente parte de uma premissa errada quando propugna que a conversão da licença em contrato de concessão, ao abrigo do art. 90.º/4 do Dec. Lei 226-A/ 2007, consubstancia uma primeira prorrogação do contrato de concessão.

  10. ) Com efeito a conversão da licença de que a ora recorrida era titular em contrato de concessão por efeito do disposto no art . 90.º/4 do Dec. Lei 0 226-A/2007 não consubstancia obviamente a prorrogação de um contrato de concessão que ainda nem sequer existia antes dessa conversão.

  11. ) Acresce que a recorrente converteu essa licença de que a ora recorrida era titular em contrato de concessão com base nos investimentos iniciais, não amortizados, até ao ano de 2007 razão pela qual não é claramente aplicável o disposto no art. 35.º, n.º4, do Decreto-Lei 226-A/2007 8ª) Em suma, a sentença recorrida encontra-se claramente fundamentada e faz correcta apreciação dos factos e boa aplicação do Direito não merecendo qualquer reparo.

    Nestes termos, nos melhores de Direito e sempre com o suprimento, deve o presente recurso ser julgado improcedente, mantendo-se in totum a sentença recorrida.

    Assim se fazendo JUSTIÇA O Senhor Procurador Geral Adjunto, notificado nos termos e para os efeitos do artigo 146º/1 do CPTA, não emitiu parecer.

    Cumpre apreciar e decidir.

    FUNDAMENTOS DE FACTO Na decisão foi fixada a seguinte factualidade: 1) Em 21.06.2005, a APDL , S.A. concedeu um título de licença à A., através do qual conferiu o direito de utilização exclusiva de terreno situado na Praia de Matosinhos Sul, Apoio Norte – Praia do Titan, pelo período de 01.01.2005 a 31.12.2005, prorrogável por períodos sucessivos de um ano (cf. doc. junto com a contestação); 2) Em 27.12.2017, a A. apresentou um requerimento dirigido à Entidade Demandada, peticionando a conversão da licença n.º 2005GD100044 em contrato de concessão pelo período de 15 anos (cf. fls. 830 e ss. do PA); 3) Em 24.01.2018, os serviços da Entidade Demandada prestaram a seguinte informação: “Na sequência do pedido efetuado em 27 de dezembro pelo titular da...

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