Acórdão nº 00175/18.2BEMDL de Tribunal Central Administrativo Norte, 10 de Março de 2022
Magistrado Responsável | Antero Pires Salvador |
Data da Resolução | 10 de Março de 2022 |
Emissor | Tribunal Central Administrativo Norte |
Acordam, em conferência, no Tribunal Central Administrativo Norte – Secção do Contencioso Administrativo: I RELATÓRIO 1 . V..., residente na Rua (…), inconformado, veio interpor recurso jurisdicional da sentença do TAF de Mirandela, datada de 18 de Maio de 2019, que julgou improcedente a acção administrativa instaurada contra o FUNDO de GARANTIA SALARIAL, onde pretendia, em procedência da acção, a anulação da decisão, de 24/10/2018, que indeferiu o requerimento de pagamento de créditos salariais por si reclamados, com o fundamento de que não estariam preenchidos os requisitos previstos no Dec. Lei 59/2015, de 21 /4, uma vez que seria Membro de Órgão Estatutário – sócio gerente – e assim não abrangido pelo Regime do Fundo de Garantia Salarial.
* Nas suas alegações, o recorrente formulou as seguintes conclusões: “1) O Impugnante não se conforma com a decisão ora recorrida, que julgou totalmente improcedente a Impugnação Judicial apresentada contra a decisão proferida pelo Fundo de Garantia Salarial (doravante FGS), que indeferiu o seu requerimento com fundamento de que seria Membro de Órgão Estatutário (MOE), e portanto não estavam os créditos reclamados abrangidos, por não se encontrar em regime de contrato de trabalho; 2) Não podendo o Autor conformar-se com essa decisão, atendendo a que fez prova de que estava sob uma relação jurídica de trabalho; 3) Motivo pelo qual não poderia ter sido dado como não provado tal facto; 4) O qual aliás resultou plenamente provado da prova produzida em Audiência de discussão e Julgamento, através da prova carreada pelo Autor; 5) Vejamos, as Testemunhas do Autor, sendo ambos ex-funcionários da empresa J--- LDA, que entretanto foi declarada insolvente, tinham conhecimento directo e pessoal dos factos; 6) E confirmaram de forma livre, espontânea, isenta, sincera e natural que não obstante o Autor ter estado na gerência da empresa durante uma série de anos, conjuntamente com um Irmão, 7) depois os negócios começaram a correr mal, e desfez-se a parceria, passando a ser o Autor o único administrador, todavia, as dificuldades económicas da empresa e o desgaste do Autor, fizeram com que os seus filhos se inserissem na empresa e fizessem alterações, o que aconteceu de forma progressiva, mas o Autor foi ficando na retaguarda, acabando por apenas exercer as funções de Director de Vendas; 8) Aliás, a própria testemunha P..., diz inocentemente o seguinte: P...: Ele era gerente, passou-nos a nós, a mim e a minha Irmã.
Mandatária do Autor: As quotas? P...: As quotas e mesmo a própria gerência foi uma passagem gradual, mas foi passando e entretanto passou de vez para o Sr. B....
9) Já tendo dito anteriormente que já era vontade do Pai transmitir o negócio aos filhos, o que acabou por fazer; 10) Os filhos, tendo adquirido as quotas da empresa, nomearam um terceiro, já com experiencia na área, para gerir a empresa; 11) Tendo os filhos tomado as rédeas da empresa e tentado recuperar a empresa, no que malogradamente não foram bem-sucedidos; 12) Não obstante, com a entrada dos filhos na gestão da empresa e depois com a nomeação de novo gerente, passou o Autor a dar reporte das suas funções e a obedecer às ordens deste, que além do Autor dava ordens e mandava nos demais colaboradores da empresa; 13) Ora, tudo o que acabamos de expor resultou claro dos depoimentos prestados, remetendo para a sua transcrição, constante das alegações, as quais aqui se consideram integralmente reproduzidas; 14) Concluindo-se pela subordinação do Autor, e logo pela relação de trabalho; 15) Logo, não poderia o Tribunal a quo ter decidido da forma que decidiu e deveria ter considerado provada a existência de relação jurídica de trabalho, atendendo ao facto do Autor ter estado sob direcção e autoridade de outrem; 16) Pelo que a acção deveria ter sido declarada totalmente procedente, o que agora se requer; 17) É certo que entre nós está consagrado o Principio da Livre Apreciação, devidamente delimitado; 18) Da prova produzida resultou para o Tribunal de Instância Inferior a seguinte convicção: “As testemunhas inquiridas foram particularmente esclarecedoras, em especial a testemunha M..., ex-funcionária da empresa “J---, Ld.ª” e que esclareceu que ali trabalhou durante 30 (trinta) anos e que o Autor foi seu patrão durante esse tempo, sensivelmente.
Depois passou a Director Comercial e passou o Sr. B… a exercer a gerência.
A testemunha P..., filho do Autor, veio esclarecer que o pai e o tio é que sucederam ao avô, fundador da empresa. Há uns anos, o pai cedeu-lhe quotas a si e à irmã e depois alteraram a gerência e introduziram o Sr. B...
.” 19) Todavia, da convicção retirou a conclusão que: “embora tenha dito que o pai não dava mais ordens tal não é todo credível. Alguém que é o “dono da empresa”, o “patrão”, durante quase 40 (quarenta) anos, não deixa de o ser só porque entregou a gerência a outrem, que inclusivamente não era sócio até então”.
20) Portanto, a convicção do Tribunal não assenta na não credibilidade dos depoimentos prestados, que aliás foram tidos em consideração pelo Tribunal Recorrido; 21) A convicção do Tribunal, pese embora não concretamente fundamentada, parece que se baseia nos critérios de razoabilidade e probabilidade, das regras da experiência comum; 22) Ou seja, tira a ilação de que não é lógico que o Autor sendo gerente durante cerca de 30 anos, passe a ser um trabalhador da empresa, obedecendo às ordens, autoridade, hierarquia e direcção da nova gerência; 23) Ora, salvo o devido respeito, não podemos concluir de igual modo; 24) Aliás, apreciada a prova produzida apenas se pode retirar a conclusão contrária, sendo a mesmo consentânea com as regras da experiencia comum e existindo nexo causal entre os factos; 25) Todavia, as ilações que o Tribunal deve retirar resultantes do seu juízo crítico, devem de alguma forma conciliar-se com a prova dos Autos, o que não é claramente o caso da sentença ora em recurso; 26) Não sendo razoável, justificável ou aceitável a decisão proferida, existindo erro manifesto e grosseiro na apreciação da prova, impondo-se decisão diversa; 27) Qualquer outra solução, traduzir-se-á na violação de princípios jurídico-constitucionais, que sejam o princípio da proporcionalidade, da legalidade, da justiça e da razoabilidade, entre outros; 28) Assim, apodíctico é que a douta sentença recorrida, violou, entre outros, o disposto nos artigos 1.º e 2.º do DL 59/2015, de 21 de Abril, 94.º CPTA e 607.º do CPC e ainda por violação dos princípios da igualdade e do acesso ao direito e à justiça plasmados nos artigos 2.º, 3.º, 13.º, 18.º e 20.º da Constituição da República Portuguesa e 7.º do Código do Procedimento Administrativo”.
* E termina, pedindo a revogação da “…. sentença sub juditio e proferindo-se acórdão que acolha as conclusões precedentes será feita inteira e sã justiça!!!”.
* Notificadas as alegações, apresentadas pelo recorrente, supra referidas, veio o Fundo de Garantia Salarial apresentar contra alegações que concluiu do seguinte modo: “1 .
O Fundo de Garantia Salarial apenas assegura o pagamento dos créditos que se tenham vencido nos seis meses que antecedem a propositura da ação.
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No presente caso, a ação de insolvência foi intentada no dia 27.09.2016.
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Para efeitos do estabelecido no Decreto-Lei n.º 59/2014, de 21.04, o Fundo de Garantia Salarial intervém nos casos de "O Fundo de Garantia Salarial, abreviadamente designado por Fundo, assegura o pagamento ao trabalhador de créditos emergentes do contrato de trabalho ou da sua violação ou cessação ".
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Ou seja, a intervenção do Fundo pressupõe a existência de um contrato de trabalho, nos termos regulados pelo artigo 11.º e seguintes do Código de Trabalho.
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O requerente foi membro de órgão estatutário da empresa J---, L. DA., 6.
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