Acórdão nº 00380/07.7BECBR de Tribunal Central Administrativo Norte, 03 de Março de 2022

Magistrado ResponsávelIrene Isabel Gomes das Neves
Data da Resolução03 de Março de 2022
EmissorTribunal Central Administrativo Norte

Acordam em conferência, os juízes da Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Norte: 1. RELATÓRIO 1.1. A Recorrente (Fazenda Pública), notificada da decisão do Tribunal Administrativo e Fiscal de Coimbra, em que foi julgada totalmente procedente a impugnação judicial contra a liquidação do IRC relativa ao ano de 2004, no valor de 7.927,38€, inconformada vem dela interpor o presente recurso jurisdicional.

Alegou, formulando as seguintes conclusões: 1 - Nos autos encontra-se em causa a sujeição a tributação autónoma da quantia de € 15.000,00, resultante da inscrição na contabilidade da impugnante, nas contas de meios financeiros, de um pagamento, naquele valor, efetuado pelo cheque n.º 636474, em dezembro de 2004, sem que existisse qualquer documento de suporte que permitisse conhecer a operação económica em causa e o respetivo beneficiário do pagamento; 2 - Assim sendo, e estando em causa uma despesa não documentada, foi a mesma sujeita a tributação autónoma, à taxa de 50%, de acordo com o disposto no n.º 1 do art.º 81º do CIRC, que determina que “As despesas confidenciais ou não documentadas são tributadas autonomamente, à taxa de 50%, sem prejuízo do disposto na alínea g) do n.º 1 do artigo 42º”; 3 - Em face da apresentação, conjuntamente com a p.i., de uma cópia autenticada do recibo n.º 5849, de 2004-12-02, no valor de € 15.000,00, decidiu o Tribunal “a quo” julgar procedente a impugnação, por ter considerado que, não obstante à data da inspeção não ter sido exibido qualquer documento de suporte da despesa materializada no cheque e no respetivo extrato de conta, existir um documento que indicia que a quantia havia sido dada à AAC-OAF, pelo que esta despesa constitui donativo a instituição de utilidade pública; 4 - No entanto, tal conclusão assenta, com todo o respeito pela douta sentença proferida, em erro na apreciação da prova e erro na interpretação do art.º 81º do CIRC, que conduziu à decisão por tal procedência; 5 - Efetivamente, a verdade é que, para além da coincidência entre o valor da despesa não documentada na contabilidade da impugnante e o valor do recibo registado na contabilidade da AAC-OAF, não é possível concluir que aquela despesa se refere àquele donativo, o que resulta, precisamente, do facto de, na contabilidade da impugnante, não existir qualquer documento, elemento, ou averbamento, ainda que de origem interna, que suporte ou titule a referida despesa; 6 - O que justifica a tributação autónoma, resultante de despesa não documentada, conforme previsto no n.º 1 do art.º 81º do CIRC, é a inexistência, na contabilidade da sociedade inspecionada, de documento de suporte da referida despesa, sendo irrelevante, para esse efeito, a sua eventual existência na contabilidade de outra entidade; 7 - Em sede de IRC, o objeto da tributação tem como base a realidade contabilística, impondo-se, nos termos do art.º 115º n.º 1, n.º 3 al. a) e n.º 4 do CIRC, na redação vigente à data, que a contabilidade seja organizada nos termos da lei comercial e fiscal, determinando-se que todos os lançamentos se apoiem em documentos justificativos, datados e susceptíveis de serem apresentados sempre que necessário, não sendo permitidos atrasos na contabilidade superiores a 90 dias; 8 - Além disso, a contabilidade rege-se por regras e princípios que obrigam a que os registos e respetivo acervo documental estabilizem periodicamente através do encerramento do exercício, devendo o relatório de gestão, as contas do exercício e os restantes documentos de prestação de contas ser apresentados no prazo de três meses a contar da data do encerramento do exercício (art.º 65º, n.º 5 do Código das Sociedades Comerciais); 9 - E após o encerramento contabilístico já não é tecnicamente aceitável a sua alteração posterior, sem prejuízo de correção de eventuais erros em exercícios futuros, quando detetados e desde que reúnam os requisitos legais para o efeito; 10 - Assim sendo, a situação verificada pelos Serviços de Inspeção, quanto à contabilização e documentação dos registos relativos ao exercício de 2004, nomeadamente a constatação que a contabilidade contém despesas não documentadas, que deveriam ter sido sujeitas a tributação autónoma aquando do preenchimento e entrega da declaração anual de rendimentos do exercício de 2004, a entregar até ao final de Maio de 2005, não poderá posteriormente ser alterada; 11 - Entendeu a Mm.ª Juiz que “acordo com o artigo 81º do CIRC tais despesas são tributadas autonomamente à taxa de 50% (...), salvo se o sujeito passivo puder provar que tais encargos correspondem a operações efetivamente realizadas e não têm um caráter anormal ou um montante exagerado”, todavia tal salvaguarda apenas se verifica nas situações previstas no n.º 8 do art.º 81º do CIRC, ou seja, quando estão em causa importâncias pagas ou devidas a entidades residentes fora do território português e aí submetidas a um regime fiscal claramente mais favorável, o que não é, manifestamente, o caso; 12 - Assim, e uma vez que o pressuposto legal que legitima a tributação autónoma em causa é a inexistência, na contabilidade do sujeito passivo inspecionado, de qualquer documento de suporte ao pagamento de € 15.000,00, efetuado pelo cheque n.º 636474, estando, assim, em causa uma despesa não documentada, independentemente da sua eventual existência na contabilidade de outra entidade, será de sujeitar a mesma a tributação autónoma, de acordo com o disposto no n.º 1 do art.º 81º do CIRC.

Nestes termos e com o douto suprimento de V.

as Ex.

as, deve a decisão recorrida ser revogada e substituída por douto acórdão que conclua pela verificação dos pressupostos que fundaram a tributação autónoma em Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Coletivas do montante em causa, enquadrável na previsão legal do art.º 81º do CIRC, na redação vigente à data, assim se fazendo JUSTIÇA.» 1.2. A Recorrida (A (...), Lda.), notificada da apresentação do presente recurso, não apresentou contra-alegações.

1.3. O Ministério Público junto...

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