Acórdão nº 01079/10.2BEBRG de Tribunal Central Administrativo Norte, 25 de Março de 2022

Magistrado ResponsávelAntero Pires Salvador
Data da Resolução25 de Março de 2022
EmissorTribunal Central Administrativo Norte

Acordam, em conferência, no Tribunal Central Administrativo Norte – Secção do Contencioso Administrativo: I RELATÓRIO 1 .

O MUNICÍPIO (...), inconformado, veio interpor recurso jurisdicional da sentença do TAF de Braga, datada de 30 de Abril de 2021, que, julgando procedente a acção administrativa especial - no que se refere ao pedido de indemnização civil, a liquidar em fase complementar Sendo que, por sentença de 20/11/2020, transitada em julgado, foi declarada a nulidade do despacho de 21/12/2009 que deferiu o pedido de licenciamento de um edifício destinado a garagens e escritórios, apresentado pelo contra-interessado Joaquim Ribeiro, entretanto – nessa mesma decisão – absolvido da instância.

- instaurada pelos AA./Recorridos (i) A., (ii) J., (iii) JG..., (iv) F... e (v) AA..., condenou o Município (...) ao pagamento, com referência a cada A., nas seguintes quantias: - a título de indemnização por danos patrimoniais: € 828,04, acrescida de juros a contar de 10/12/2020 até efectivo e integral pagamento Quantias, aliás, já pagas pelo (...)MUNICÍPIO (...) a cada um dos AA., na sequência da sentença ora objecto de recurso, mas não nesta parte.

; e, - a título de compensação por danos não patrimoniais: € 5.000,00.

* Discordando da sentença, o recorrente MUNICÍPIO (...) formulou as seguintes conclusões: 1ª) Na decisão da matéria de facto, mais precisamente em G) e H) dos factos provados, o tribunal julgou provados factos que, sendo relevantes para a quantificação dos danos não patrimoniais, não foram alegados pelos AA., pelo que a respectiva inserção na matéria de facto provada constitui manifesto excesso de pronúncia conducente à nulidade da sentença (artigos 95º nº 1 do CPTA e 668º nº 1 alínea d) do CPC).

  1. ) Nos artigos 80º e 81º da inicial os AA. alegaram que sofreram os danos não patrimoniais, aí traduzidos em factos, durante quase dois meses, sendo que o tribunal a quo não deu esta duração (de quase dois meses) como provada, mas, em sede de aplicação do direito aos referidos factos, considerou que durante dois meses e meio os Autores ficaram expostos às poeiras, ouviram durante o dia ruídos, assistiram a movimentação de máquinas e viaturas, ocupando os lugares de estacionamento disponíveis, impedindo o uso normal da zona envolvente e dificultando o acesso às respectivas habitações e durante oito anos sofreram um dano irreversível porque deixaram de poder usufruir de uma envolvente tradicionalmente RAN.

  2. ) Também a referida matéria de facto, respeitante à duração dos danos, sendo relevante para a quantificação dos danos não patrimoniais, não foi alegada pelos AA. e não foi julgada provada, pelo que a respectiva consideração na decisão da matéria de direito constitui manifesto excesso de pronúncia e condenação extra vel ultra petitum, ou seja, condenação em quantidade superior e em objecto diverso do pedido, também conducentes à nulidade da sentença (artigos 95º nº 1 do CPTA e 668º nº 1 alíneas d) e e) do CPC).

  3. ) Se se entender que não se verifica a acima alegada nulidade da sentença, sempre será de concluir que, com os mesmos fundamentos referidos nas conclusões 1ª, 2ª e 3ª, se verificou a violação do princípio dispositivo segundo o qual o juiz só pode fundar a decisão nos factos alegados pelas partes (artigo 264º nº 2 do CPC), pelo que, aqueles factos nunca poderiam ter sido julgados provados.

  4. ) Atendendo aos factos que poderiam ser julgados provados, é de considerar excessiva a indemnização fixada, pelos danos não patrimoniais, em 5.000,00€ para cada Autor, considerando-se que a indemnização a fixar aos AA. não deverá ultrapassar os 350,00€ por Autor.

  5. ) A decisão recorrida viola, por isso, claramente, as normas dos artigos 95º nº 1 do CPTA, 264º nº 2 e 668º nº 1 alíneas d) e e) do Código de Processo Civil e 496º nº 1 do Código Civil”.

* E termina, referindo que "...

deve o presente recurso ser julgado procedente e, em consequência, declarada nula a sentença recorrida ou, se assim se não entender, deve a sentença recorrida ser parcialmente revogada e substituída por outra que exclua da matéria de facto provada os factos referidos nas conclusões 1ª, 2ª e 3ª supra e fixe a indemnização por danos não patrimoniais a pagar a cada A. no montante de 350,00€, para que se faça JUSTIÇA !" * Notificadas as alegações, apresentadas pelo recorrente, supra referidas, vieram os AA./Recorridos, por um lado, apresentar contra alegações e, por outro, caso seja dado provimento, ainda que parcial, ao recurso do MUNICÍPIO (...), deduzir recurso subordinado que assim sintetizaram, concluindo: "I.

Na sentença do Tribunal a quo que condenou o Município recorrido, foram os Autores parte totalmente vencedora.

II.

Contudo, dela recorreu o Réu MUNICÍPIO (...), mas apenas na parte referente à sua condenação em indemnização pelos danos não patrimoniais sofridos pelos AA, ora recorrentes, pelo que a restante parte condenatória transitou já em julgado.

III.

Na eventual procedência de tal Recurso, os Autores tornar-se-ão, porém, parte vencida, na medida em que o Réu MUNICÍPIO (...) requer que seja declarada nula a sentença recorrida, naquela parte, ou, assim se não entendendo, que seja parcialmente revogada e substituída por outra que exclua da matéria de facto provada os factos referidos nas conclusões 1ª, 2ª e 3ª, e fixe a indemnização por danos não patrimoniais a pagar a cada A. no montante de apenas € 350,00.

IV.

Assim, nessa eventualidade – e apenas nesse caso –, de tal hipotética modificação da sentença, interpõem os AA. o presente Recurso Subordinado, nos termos do disposto nos n.ºs 1 e 2, do art. 633º, do C.P.C.

V.

Com efeito, resultando tal hipotética revogação e modificação da sentença de um dos fundamentos do Recurso de Apelação interposto pelo Réu, entendem, contudo, os AA, Recorrentes, que deveria improceder o recurso interposto pelo Réu, porquanto os factos em causa - seja os respeitantes aos danos, seja os que se referem à duração dos danos -, sempre poderiam ser considerados instrumentais, ou complemento ou concretização dos alegados pelos AA, e resultantes da instrução da causa, e, por isso, relevantes e compreendidos nos poderes de cognição do tribunal, nos termos previstos no n.º 2, alíneas a) e b), do art. 5º, do C.P.C.

VI.

E, quando assim se não entendesse, sempre os AA invocam que, tratando-se de factos que, indiscutivelmente, resultaram da instrução da causa, só não foram por si expressamente alegados porque tal possibilidade lhes foi coarctada pelo Tribunal, em clara violação do disposto no n.º 7 do artigo 95º do CPTA (correspondente ao n.º 6 vigente à data da instauração da Ação).

VII.

Com efeito, será importante relembrar, e não esquecer, que a decisão em causa foi proferida no âmbito da liquidação e instrução aberta, no que concerne ao pedido de condenação do Réu no pagamento de uma indemnização pelos danos causados pela prática do acto declarado nulo por douta sentença de 20/11/2020, conforme resulta da parte final da mesma, uma vez que haviam peticionado os AA, em c) do petitório, que fossem, ainda, «o R. e o Contra-Interessado condenados a pagar, solidariamente, aos Autores, indemnização pelos danos causados, acrescido de juros à taxa legal e até ao seu efectivo e integral pagamento, a liquidar, contudo, em fase complementar nos termos do disposto no n.º 6 do art. 95º do C.P.T.A.

» (sublinhado nosso).

VIII.

Ora, dispõe o actual n.º 7, do artigo 95º, do CPTA (n.º 6 em vigor à data da interposição da Ação) que «Quando, tendo sido formulado pedido de indemnização por danos, do processo não resultem os elementos necessários à liquidação do montante da indemnização devida, terá lugar uma fase complementar de audição das partes, por 10 dias cada, e eventual realização de diligências complementares, destinada a permitir essa liquidação.» (sublinhados nossos).

IX.

Assim, conforme resulta da referida norma, e é entendimento, entre outros, do Centro de Estudos Judiciários, in “e-book do CEJ – Formação Contínua, Processo Administrativo e fiscal – Setembro 2020, pág. 57”, «(…) não incumbindo ao autor deduzir, por sua iniciativa, o incidente de liquidação, tal como se exige nos artigos 358º e 359º do C.P.C., só se pode entender a referência à “audição das partes” contida naquele n.º 7 do artigo 95º do CPTA, como uma obrigação do tribunal de, oficiosamente, requerer ao autor para vir, em 10 dias, identificar e especificar os danos indemnizáveis, assim como, para que venha formular o seu pedido em quantia certa, tal como ocorre nos artigos 358º e 359º do C.P.C.».

Igualmente deve ser dada ao autor a faculdade de apresentar provas ou de as requerer nesse mesmo articulado que apresente. De seguida, terá o réu direito ao contraditório, podendo impugnar o que tiver sido alegado pelo autor naquele anterior articulado, sendo por essa via “ouvido”

.

X.

Todavia, tal obrigação, de audição das partes, não foi cumprida pelo Tribunal a quo, porquanto se limitou este a definir os temas de prova e a conceder o prazo de 15 dias para as partes renovarem os requerimentos probatórios, coarctando, assim, aos AA, aqui recorrentes, a possibilidade de identificarem e especificarem os danos indemnizáveis, para além dos alegados na p.i, nomeadamente aqueles que se tivessem produzido e verificado já depois da instauração da acção e durante os cerca de oito anos que perdurou a suspensão da eficácia do acto declarado nulo.

XI.

Desse modo, na eventualidade de procedência do recurso de apelação interposto pelo Réu, MUNICÍPIO (...), com consequente prejuízo para os Autores – mediante redução do quantitativo indemnizatório atribuído como compensação dos danos não patrimoniais sofridos -, deverá declarar-se nulo o julgamento, apenas nessa parte, por preterição de formalidade processual obrigatória, e essencial (n.º 7, do artigo 95º, do CPTA), e consequente violação desta norma processual, da qual teria resultado claro e grave prejuízo para os AA, e ordenar-se a sua repetição, devidamente precedida do...

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