Acórdão nº 00616/13.5BECBR de Tribunal Central Administrativo Norte, 03 de Fevereiro de 2022

Magistrado ResponsávelTiago Miranda
Data da Resolução03 de Fevereiro de 2022
EmissorTribunal Central Administrativo Norte

Acordam em conferência os Juízes Desembargadores que compõem a Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Norte: I - Relatório M., viúva, NIF (...), interpôs o presente recurso de apelação relativamente à sentença proferida em 21 de Outubro de 2016, no Tribunal Administrativo e Fiscal de Coimbra, que julgou improcedente a impugnação apresentada relativamente à liquidação oficiosa de Imposto do Selo, no ano de 2013 nº 000906049, no valor total de 18 539,63 €.

Da sua alegação seleccionamos e transcrevemos as conclusões: CONCLUSÕES A) - O presente recurso é interposto face à decisão do Tribunal Administrativo e Fiscal de Coimbra, que julgou improcedente a impugnação judicial, deduzida contra a liquidação n° 2013 000906049 do imposto do selo no montante de 18.539,63 euros, efectuada pela Autoridade Tributária e Aduaneira - AT.

Em sentido contrário opinou a Exma. Procuradora da República no douto parecer que emitiu a fls. 115 e 116 dos autos, e que o Tribunal transcreve a fls. 4 da sentença, não lhe fazendo, para além desse facto, qualquer referência.

B) - A sentença recorrida não pôs em causa o substrato dos factos, nem dos vícios arguidos na citada impugnação judicial; Serviu-se, isso sim, para fundamentar a decisão a tomar, de um Acórdão do STJ (que não é da jurisdição Administrativa e Fiscal), cujo objecto não retrata o assunto dos presentes autos.

C) - A aquisição do imóvel por usucapião - artigo 340 urbano da freguesia de (…), através da escritura de justificação de 30 de Janeiro de 2012, nos moldes citados, é uma transmissão gratuita, nos termos do artigo 1º, n° 3 do Código do Imposto do Selo, e para os efeitos da verba 1.2 da Tabela Geral do Imposto do Selo; D) -A recorrente beneficia do direito à isenção do Imposto do Selo, ex vi do artigo 6º, alínea e) do CIS, que refere “são isentos de imposto do selo, quando este constitua seu encargo: (...) “e) O Cônjuge ou unido de facto, DESCENDENTES e ascendentes, nas transmissões gratuitas sujeitas à verba 1.2 da TGIS de que são beneficiários” (cfr. a este propósito o Acórdão do STA, no processo 0431/10, de 23 de Outubro de 2010, e o Acórdão do STA no Ac. do Pleno da S.T. de 02 de Maio de 2012, no proc. 0746/11).

E) -A sentença é nula porque os fundamentos de facto dados como provados estão em oposição com a decisão.

Com efeito, resulta dos autos que existem factos que provam a veracidade da declaração da impugnante, quando esta diz ter recebido de seus pais, por doação verbal, parte do prédio urbano inscrito sob o artigo 340°, da freguesia de Alvalade - Lisboa -, a saber: - Factos referenciados no artigo 2º da p.i. (transcritos a fls. 8 e 9 da sentença) - Factos confirmados pelas testemunhas A...., B. ..., e C. ..., - Factos traduzidos na avaliação que o Notário - Sr. J. - fez da veracidade da declaração da justificante, considerando a prova testemunhal suficiente para fazer prova do alegado.

- Factos que a impugnante viu confirmados pelo Tribunal, quando a dado passo da sentença, diz «Com interesse para a decisão, inexistem factos que importe registar como não provados» (pág.10 da sentença).

Frase que é contraditória com o decidido! Daqui resulta que a decisão está em oposição com os fundamentos de facto, imputando-se-lhe o vício de nulidade, nos termos do artigo 615°, n° 1, alínea c) do Código de Processo Civil.

F) - A douta sentença direccionou e definiu que a decisão a tomar nos presentes autos, devia assentar na prova de que as afirmações prestadas na escritura de justificação notarial de 30 de Janeiro de 2012 eram verdadeiras, prova que, no dizer do Tribunal, não foi feita, mas que a recorrente contesta, nos termos amplamente desenvolvidos ao longo do presente recurso.

G) - O Tribunal apoiou-se no Acórdão do STJ de 19.02.2013, proferido no processo 367/2002.P1.S que, como vimos, não assentou no direito da propriedade de imóvel, mas tão somente na alegação da ali recorrente de que a força provatória da escritura de justificação notarial faria presumir a área nela declarada de 600 m2 ( foi isto que se tratou naquele acórdão ), sendo que, no que concerne ao direito de propriedade do imóvel, o acórdão até subscreve o valor probatório da escritura de justificação do acórdão recorrido, quando refere « ... o acórdão recorrido reconheceu à recorrente a propriedade do prédio em lide » ( cf. pág. 7 do acórdão ), H) - A impugnante não pode deixar de dissentir da douta sentença, uma vez que o tribunal “a quo", não atendeu aos factos relevantes para apreciação da questão decidenda, ou seja, a douta sentença recorrida incorreu em erro de julgamento (estribando-se num acórdão inaplicável ao caso concreto), e valoração da matéria de facto, com consequências na aplicação do direito.

- Com efeito, se por um lado, o citado Acórdão não é da jurisdição administrativa e fiscal, por outro, tal acórdão não retrata o que aqui se discute, sendo certo que a recorrente, para fazer valer o seu direito, além da lei aplicável - artigo 6º, alínea e) do CIS - citou o Acórdão do STA, no processo 0431/10, de 23 de Outubro, e o Acórdão do STA, no Pleno da S.T. de 02 de Maio de 2012, proferido no processo 0746/11, que retiram à Excelentíssima magistrada a argumentação estribada na sentença agora recorrida, não sendo despiciendo referir, ainda, que o Acórdão plasmado na sentença recorrida não é vinculativo, sobretudo quando existem outros do STA que, sobre o cerne da questão, sentenciam de forma diferente! 1) - Ora, entende a recorrente que tal argumentação é ilegal, em razão do que não pode manter-se no ordenamento jurídico-fiscal, atendendo à prova produzida nos presentes autos.

J) - A douta sentença recorrida deu como provados vários factos, de onde se destacam os seguintes:“que a impugnante é filha de D. e de E.”, “que em 31.01.2012 foi outorgada uma escritura de justificação notarial, onde a impugnante declarou que por escritura de doação ... feita em 20 de Julho de 1987, seus pais lhe doaram o imóvel já devidamente identificado e nas condições referidas”, “que as testemunhas confirmaram as declarações prestadas pelas primeiras intervenientes, ali constando que o Notário preveniu as primeiras e segundas outorgantes de que «incorrem nas penas aplicáveis ao crime de falsas declarações perante oficial público, se dolosamente e em prejuízo de outrem as tiverem prestado ou confirmado»; L) - Perante estes factos, a recorrente entende que a douta sentença recorrida incorreu em erro de apreciação e valoração da matéria de facto, quando, também, a dado passo – fl. 17 da sentença - refere «...mas não fica provado que seja verdadeira tal afirmação».

- Ora, as afirmações constantes da escritura de justificação notarial, são verdadeiras e dão-se como provadas pelas testemunhas: - A., solteiro, maior, natural da freguesia de, concelho de ; - B., solteira, maior, natural da freguesia de, concelho de r; e - C., divorciada, natural da freguesia de, concelho de, que disseram «Que por serem totalmente verdadeiras, confirmam as declarações prestadas pelas primeiras intervenientes».

E certo que a força probatória dos depoimentos das testemunhas é apreciada livremente pelo Tribunal (art° 396° do Código Civil), mas tal circunstância só é verdadeira quando prestada perante o julgador, o que, IN CASU, se não verificou! IN CASU, as testemunhas apresentaram-se perante o Notário - J. -. e foi ele quem avaliou o comportamento e outros factos relativos à justificante e testemunhas no decurso do acto de formalização da escritura de justificação, de tal modo que nada de anormal se lhe apresentou, confirmando-se, assim, a veracidade das declarações da justificante pelas testemunhas, sabendo estas das responsabilidades penais em que incorriam, sendo, por isso, suficientes para fazer prova dos factos alegados.

M) A escritura de justificação notarial de 30 de Janeiro de 2012, lavrada no Cartório Notarial do Porto, notário J., não foi objecto de impugnação judicial.

N) - O diferente entendimento das partes (Autoridade Tributária e Aduaneira / Contribuinte) sobre imposto do selo nas aquisições por usucapião, já foi resolvida em Acórdão do Pleno da Secção do Contencioso Tributário do STA, proferido no processo n° 0746/11, de 02 de Maio de 2012, considerando que o teor da alínea e) do artigo 6º do CIS é muito claro e de sentido unívoco: o cônjuge está isento do imposto do selo, quando o imposto constitua encargo seu - como teria de acontecer no caso, se não houvesse isenção legal a favor do cônjuge, formulando a final, o seguinte silogismo: se o cônjuge está isento de imposto do selo nas transmissões gratuitas; e, para efeitos fiscais, a aquisição por usucapião é uma transmissão gratuita; a aquisição por usucapião pelo cônjuge está isenta do imposto do selo.

Regra que transportamos para o caso dos presentes autos, mutatis mutandis.

O) -Motivos pelos quais deverá ser anulada a Sentença Recorrida e considerada procedente a impugnação judicial.

TERMOS EM QUE, deve o presente recurso ser julgado procedente e em consequência ser revogada a douta sentença recorrida, anulando-se a liquidação do imposto do selo n° 2013 000906049 do valor de 18.539,63 euros, reconhecendo-se ainda o direito aos juros indemnizatórios, nos termos do artigo 43°, n° 1 da LGT, incidentes sobre o valor das prestações já pagas e das que, entretanto, vier a pagar até à decisão do pleito, a calcular nos termos do n° 4 do mesmo normativo.

A recorrida não apresentou contra-alegações.

O Ministério Público junto deste Tribunal emitiu douto parecer redutível à seguinte transcrição: «(…) NULIDADE DA SENTENÇA A Recorrente veio arguir a nulidade da sentença recorrida por alegada contradição entre a respectiva fundamentação e a sua parte dispositiva e, daí, em infracção ao disposto no artigo 615°, n° 1, alínea c) do CPC (cf. Conclusão E das Alegações, inserta a fls. 159 e 160 do processo fiscal).

Ora, dispõe o n° 1, do citado artigo 615°, do CPC, no segmento que nos interessa que “É nula a sentença quando: (...), c) Os fundamentos...

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