Acórdão nº 00058/10.4BEBRG de Tribunal Central Administrativo Norte, 03 de Fevereiro de 2022

Magistrado ResponsávelAna Patrocínio
Data da Resolução03 de Fevereiro de 2022
EmissorTribunal Central Administrativo Norte

Acordam, em conferência, os juízes que constituem a Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Norte: I. Relatório O Digníssimo Magistrado do Ministério Público interpôs recurso jurisdicional da sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal de Braga, proferida em 08/09/2011, que julgou procedente a impugnação judicial deduzida por S., Lda., contra a liquidação de IVA e juros compensatórios respeitante ao ano de 2004, no montante de €40.261,01.

O Recorrente terminou as suas alegações de recurso formulando as conclusões que se reproduzem de seguida: “I - Em face das provas constantes do processo e da inverosimilhança dos depoimentos prestados, a sentença em crise concluiu, indevidamente, existir dúvida fundada sobre a existência dos factos tributários quando, na verdade, se mostra evidente a sua verificação.

II – Por conseguinte, infringiu o disposto nos artigos 75.º, n.º 2, a), da LGT, 100.º, n.º 1, 123.º, n.º 2, do CPPT, e 653.º, n.º 2 e 655.º, n.º 1 do C. Processo Civil.

III – Deve, pois, a coberto do art.º 712.º, n.º 1, a) do C. P. Civil, ser revogada e substituída por outra que reconheça a validade das liquidações e decrete a improcedência da acção.

No entanto, Vossas Excelências Venerandos Desembargadores, uma vez mais, farão a melhor justiça.”****A Recorrida contra-alegou, concluindo da seguinte forma: “1. A Meritíssima Juiz do Tribunal a quo situou a questão jurídica a dirimir no facto de ser necessário saber se o sistema informático em uso no estabelecimento da impugnante é, ou não, idóneo a permitir a correcção meramente aritmética do rendimentos declarados pela impugnante no ano de 2004, para efeitos de IVA e se o procedimento inspectivo padece de alguma ilegalidade, sendo que considerou a Meritíssima Juiz a quo primar pela consideração da primeira questão, porquanto, sendo aquela que oferece mais garantias e tutela ao contribuinte, caso fosse procedente implicaria, como sucedeu, a procedência da impugnação, obstando ao conhecimento das demais questões colocadas.

  1. Para saber se o sistema informático, única base na qual a administração tributária assentou a correcção meramente aritmética da matéria colectável, era ou não idóneo a sustentar essa correcção, necessariamente teremos de assumir o que foi dado como provado.

  2. Assim ficou provado que: “No “âmbito de uma acção especial desenvolvida pela direcção de Finanças do Porto, foi realizada uma cópia do sistema informático que a impugnante tinha a funcionar na discoteca V. – facto 1 dado como provado.

  3. “Da análise dos referidos registos informáticos, a inspecção tributária, constatou existirem divergências significativas, entre estes e os valores declarados pela impugnante nas suas declarações de rendimentos ao exercício de 2004 – facto 2 dado como provado.

  4. “Na sequência da referida acção inspectiva, baseada em correcções meramente aritméticas, foram efectuadas as liquidações adicionais n.° 08144238 (1.º trimestre de 2004) 08144240 (2.º trimestre de 2004) 08144242 (3.º trimestre de 2004) 08144244 (4.º trimestre de 2004) de imposto sobre o valor acrescentado (IVA) e as dos respectivos juros compensatórios (liquidações n.º 08144239, 08144241, 08144243, 08144255) - Facto 4 dado como provado.

  5. “O sistema informático utilizado pela impugnante na discoteca V. é o software Winrest que foi adquirido em Novembro de 2002 à empresa I., Lda.”, – facto 5 dado como provado 7.

    “O Winrest é um programa que pode ser adaptado às necessidades específicas dos utilizadores” – facto 6 dado como provado 8.

    “O técnico informático, J., da empresa I., Lda., não chegou a concluir a modelação do software Winrest às necessidades específicas da discoteca V. porque a empresa para que trabalhava fechou portas em Dezembro de 2002” – facto 7 dado como provado 9.

    “Entre 2002 e 2005, J., foi algumas vezes chamado à discoteca para auxiliar na resolução de problemas relacionados com o sistema informático, nomeadamente no que respeita ao funcionamento de uma impressora, de uma porta de conexão do hardware e às telas do touch screen” – facto 8 dado como provado.

  6. “Entre 2002 e 2005, o sistema informático utilizado pela impugnante na discoteca V. não deixou de ser um modelo de testes, por nunca ter sido devidamente modelado, apresentando algumas limitações como o facto de apenas os gerentes poderem registar ofertas ou existirem problemas com a estrutura da família dos produtos” – facto 9 dado como provado.

  7. “Alguns funcionários e colaboradores da empresa com formação poderiam registar a venda de bebidas ao preço de € 0,00 – facto 10 dado como provado 12.

    “Os funcionários da discoteca V., eram geralmente jovens estudantes, que eram recrutados por dois ou três meses, e não tinham conhecimentos informáticos nem lhe era dada formação relativamente ao software instalado” – facto 11 dado como provado.

  8. “ Apesar de o sistema informático ser um modelo de testes com limitações, a duplicação de registos não era automática só podendo ocorrer por erro humano” – facto 12 dado como provado 14.

    “A discoteca V. realizava às quartas-feiras, a festa da Noite da Mulher em que concedia ofertas às clientes do sexo feminino e, aos sábados, oferecia a segunda bebida da noite aos clientes” – Facto 13 dado como provado.

  9. Só este último facto dado como provado sob o número 13 na decisão recorrida, seria suficiente para firmar que o sistema informático, face a toda a prova documental, mormente as relações de todos os registos, não era idóneo para sustentar a contabilidade da impugnante e como tal sustentar qualquer correcção aritmética da matéria colectável, porquanto resulta inequívoco que na maior parte dos registos ao sábado e à quarta-feira não constam as ofertas, mas eram sim registadas como transacção económica efectiva, o que não correspondia à verdade. Por isso mesmo o sistema era utilizado pela discoteca apenas para controlar o número de bebidas servidas independentemente de serem pagas ou serem ofertas.

  10. Ora, como se disse, no caso a que os autos se reportam, a administração tributária constatou existirem divergências significativas entre os valores constantes do sistema informático do estabelecimento da impugnante e os valores por esta declarados nas suas declarações de rendimentos relativas ao exercício de 2004, considerando como idóneos esses dados, através de uma correcção meramente aritmética a administração tributária substitui os valores declarados pelos que constam do sistema informático e, assim produziu os actos de liquidação impugnados.

  11. Resulta inequívoco dos factos dados como provados e de toda prova documental existente nos autos que nunca poderia o sistema informático sustentar a operação de liquidação realizada pela administração tributária e, na pior das hipóteses, sempre se poderia concluir, como firma a douta sentença recorrida que, “face à prova produzida não é seguro que todos os valores registados no sistema informático correspondam efectivamente a transacções económicas” 18. Ora, dos factos provados resulta que o sistema informático nunca chegou a ser modelado para as necessidades especificas do estabelecimento da impugnante e o programa apresentava limitações como o facto de apenas os gerentes poderem registar ofertas, o que implicou que, como se afere dos registos diários do programa informático junto aos autos, a maior parte das vezes as ofertas, dadas como provadas que se realizavam – facto 13 –, não eram registadas como ofertas mas como transacção económica efectiva 19. Apresentava o programa limitações com a estrutura das famílias dos produtos 20...

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