Acórdão nº 02081/16.6BEBRG de Tribunal Central Administrativo Norte, 13 de Maio de 2022
Magistrado Responsável | Luís Migueis Garcia |
Data da Resolução | 13 de Maio de 2022 |
Emissor | Tribunal Central Administrativo Norte |
Acordam em conferência os juízes deste Tribunal Central Administrativo Norte, Secção do Contencioso Administrativo: Município (...) (R. (…)) interpõe recurso jurisdicional de decisão do TAF de Braga, em acção administrativa intentada por SP...
(R. (…)), por si e em representação dos seus filhos DG...
e AM...
, julgada que foi “procedente a presente ação, condenando-se o Réu no pagamento de 15.000,00€ a cada um dos Autores filhos e 75.000,00€ à Autora mãe, a que acrescem juros de mora, desde a citação até integral pagamento, a título de responsabilidade extracontratual, por danos não patrimoniais, pelo falecimento de JL...”.
Conclui: 1ª Resulta do facto provado 23 que a árvore caída se integrava num parque onde existiam muitas mais árvores, o que é relevante na medida em que, tal como resulta dos factos provados 32 e 33 e do depoimento da testemunha FD... (cfr. minuto 36 e 25 s do depoimento prestado no dia 03.11.2021 com início aos 23m30s), de todas as árvores ali existentes caíram três árvores da mesma espécie (carvalhos) e mais nenhuma.
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O facto provado 23 deve ser alterado passando a ter a seguinte redacção: “No parque, onde se deu o acidente, havia tílias, freixos e carvalhos, tendo caído na tarde daquele dia três carvalhos, incluindo o que causou o evento destes autos.”, o que se requer.
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A matéria dos factos provados 24, 25 e 26 foi dada por assente com base nos relatórios das visitas realizadas em 08.10.2015 e 28.05.2015, não tendo sido considerados os depoimentos das testemunhas sobre esta matéria.
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O relatório de 28.05.2015 baseia-se numa inspecção aos restos das três árvores caídas que se encontravam depositados nas instalações do Município expostos ao ar, vento, chuva e sol desde o dia 04.05.2015, ou seja, não é possível com base nesse relatório assegurar que as condições e o estado da árvore caída em 04.05 (especialmente quando se refere de modo genérico às três árvores caídas no mesmo dia) se mantinham iguais à data da inspecção dado que a deterioração e o perecimento daqueles restos é inevitável.
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Aquele relatório não só não analisa árvore a árvore como também não analisou as raízes que se encontravam no subsolo onde antes estava implantada a árvore, ou seja, o relatório é pouco preciso e fundamentado.
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O segundo relatório de 08.10.2015 enferma dos mesmos problemas do anterior com a agravante dos restos da árvore terem sido analisados cinco meses após o evento e de não concretizar o que foi observado, pois refere apenas que “parecem existir indícios de podridão” (ponto 2.1.7), isto é, nem sequer afirma que há indícios.
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Esse segundo relatório confirma que só com uma observação mais detalhada é que se poderia obter mais informação, o que implicava a recolha de amostras ao solo, raiz e tronco para análise laboratorial e tal não foi feito (ponto 3.6).
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Os factos 24, 25 e 26 não poderiam ter sido dados por provados apenas com recurso aos relatórios atenta a fragilidade dos mesmos, os quais deveriam ter sido ponderados com os depoimentos das testemunhas FD... (cfr. 31m10s; 32m,37s; 37m44s; 52m00s; 52m15s do depoimento prestado em 03.11.2021 com inicio aos 23m30s), AA... (cfr. 57m09s; 57m39s; 58m05s; 01h13m00s; 01h14m00ss do depoimento prestado em 03.11.2021 com inicio aos 54m45s) e AJ... (cfr. 01h21m14s do depoimento prestado em 03.11.2021 com inicio à 01h15m38s).
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Aqueles factos são contraditórios com os depoimentos das testemunhas e tais depoimentos foram valorados pelo Tribunal noutras questões por não ter sido questionada a sua isenção e credibilidade e é por esse motivo que o Tribunal deveria ter feito uma maior apreciação crítica dos diversos meios de prova ao dispor (conjugando os relatórios com os depoimentos).
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As duas testemunhas que estiveram no local no dia do evento e observaram a árvore atestaram o seu bom estado, com ausência de fungos, cogumelos ou outros indiciadores que pudessem apontar para um problema e a testemunha que um ano depois analisou as raízes foi peremptória em confirmar que as mesmas estavam saudáveis.
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As passagens transcritas dos depoimentos das testemunhas em causa rebatem os relatórios e acabam por se afigurar mais credíveis por respeitarem ao dia do evento, pelo que ponderados os relatórios e os depoimentos a conclusão é de que devem os factos 24, 25 e 26 serem dados por não provados, o que se requer.
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Quanto ao facto não provado 5 prestaram depoimento no dia 03.11.2021 as testemunhas FD... (cfr. 43m30s) e AJ... (cfr. 01h26m28s), pelo que se entende e requer que o mesmo seja dado por provado com a seguinte redacção: “No dia do sinistro, para além das quedas das referidas árvores, caíram outras em diversas localidades do país.” 13ª Alterada a matéria de facto no sentido requerido é imperioso concluir que face aos factos provados 17 a 23 e 27 a 36 a queda da árvore se deveu a causa de força maior, concretamente o intenso temporal de vento e chuva que se fez sentir no dia 04.05.2015, especialmente durante a tarde.
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Como se refere no facto provado 30 a árvore apresentava-se “saudável, robusta, sólida e bem implantada, sem sinais de fragilidade ou doenças que pudesse afectar a sua sustentabilidade” e o Município faz uma avaliação regular ao seu património arbóreo (factualidade provada 17 a 20), ou seja, o Recorrente cumpre com o seu dever de vigilância, tendo a presunção de culpa que recai sobre o Município sido afastada.
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Decorre da factualidade provada 23 e 32 a 35 que no dia do evento se verificaram excepcionais e gravosas condições climatéricas, absolutamente invulgares e violentas, que levaram à queda de três árvores naquele local e em muitas outras localidades, ou seja, a queda da árvore deveu-se aos tremendos ventos verificados, os quais foram causa directa do sucedido e tal é confirmado pela ciência quando nos diz que ventos na ordem dos 80/90 km/h são excepcionalmente fortes e capazes de derrubar uma árvore por mais saudável que esteja e não há nada que o Homem possa fazer para evitar esta acção da Natureza.
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Conforme decorre do depoimento da testemunha FD... (cfr. 31m10s), naquela tarde do dia 04.05.2015 abateu-se sobre Braga um temporal essencialmente de vento que nenhuma acção humana conseguiria deter.
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Considera-se que a acção deve ser julgada improcedente por não se mostrarem preenchidos dois dos requisitos da obrigação de indemnizar (ilicitude e culpa), pois por maior que fosse a vigilância a árvore em questão iria sempre cair por efeito exclusivo do vento e nada poderia o Recorrente ter feito para o evitar.
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A título subsidiário e para o caso de não ser alterada a matéria de facto, continua a colocar-se a necessidade de apreciar se os mesmos requisitos da ilicitude e da culpa se mostram preenchidos, como o considerou a sentença recorrida.
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Aqueles dois requisitos, apesar de serem autónomos, andam associados à presunção de culpa leve que recai sobre o Recorrente, por força do disposto no artigo 10º/nº 3 da Lei nº 67/2007, de 31.12, motivo pelo qual a primeira questão a abordar prende-se com o cumprimento ou não por parte do Recorrente do seu dever de vigilância e que a sentença recorrida considera que não foi cumprido (cfr. fls. 16).
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Os factos provados 17 a 20 demonstram a existência de manutenção regular ao património arbóreo levada a cabo por cerca de 90 funcionários do Município, com os meios actualmente disponíveis e conhecidos.
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Para apreciação dos factos provados 24, 25 e 26 é indispensável que se considere a demais informação constantes dos relatórios e factualidade provada, quanto a esta última tem de se ter especial atenção aos factos provados 27 e 30 (dos quais decorre que a árvore não apresentava qualquer indício de problemas) e do facto provado 28 (não é garantido que se consiga detectar a fragilidade de raízes).
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Resulta dos relatórios de 08.10.2015 e 28.05.2015 que não é possível detectar fragilidades nas raízes de uma árvore, pelo que é de concluir que se a árvore não apresentava qualquer sinal exterior de problemas (apesar adas constantes observações – cfr. facto provado 30), nada poderia o Recorrente ter feito para evitar a queda.
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Face ao excelente estado da árvore, não era exigível ao Município qualquer actuação tendente a prevenir uma queda, que não se previa nem era de prever, razão pela qual se deve considerar que, não obstante as fragilidades da árvore que a sentença julgou provadas, o dever de vigilância do Recorrente foi cumprido no máximo que hoje a ciência e os conhecimentos técnicos lhe permitiram e por esse motivo a sua actuação não foi ilícita nem culposa.
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Ainda que se considerasse que o Recorrente actuou com culpa (no sentido do dever de vigilância não ter sido cumprido), a verdade é que o evento sempre se daria, pois a fragilidade da raiz não era visível nem havia forma de a detectar e as rajadas de vento sentidas naquela tarde eram aptas, por si sós, sem mais nada, para derrubar a árvore em causa.
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A factualidade provada na sentença, mesmo sem a alteração requerida, aponta para a total falta de culpa do Recorrente e para a excepcionalidade e raridade dos ventos sentidos em Braga naquela tarde e que eram aptos a derrubar árvores, motivo pelo qual a decidir de modo diverso a sentença recorrida incorreu em erro de julgamento de Direito, concretamente do artigo 10º/nºs. 1 e 3 da Lei nº 67/2007, de 31.12.
Os recorridos SP… contra-alegaram, bem como a recorrida AM…, em ambos os casos estendendo sob conclusões reprodução do alegado a montante, terminando por opinar pela manutenção da decisão recorrida.
*A Exm.ª Procuradora-Geral Adjunta foi notificada nos termos do art.º 146º, n.º 1, do CPTA, não emitindo parecer.
*Dispensando vistos, vêm os autos a conferência, cumprindo decidir.
*Os factos, que o tribunal “a quo” fixou como provados: 1. A Autora SP... contraiu casamento com JL..., em 14.09.1996 – cfr. doc. 1 junto com a petição inicial; 2. Na constância desse matrimónio, nasceram dois filhos, AM..., em 08.04.2000, e DG..., em 13.03.2008, aqui, também, Autores – cfr. docs. 2 e 3 juntos...
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