Acórdão nº 00174/12.8BEVIS de Tribunal Central Administrativo Norte, 15 de Setembro de 2022

Magistrado ResponsávelRosário Pais
Data da Resolução15 de Setembro de 2022
EmissorTribunal Central Administrativo Norte

Acordam em conferência os Juízes da Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Norte: 1. RELATÓRIO 1.1. A..., Lda.

, devidamente identificada nos autos, vem recorrer da sentença proferida no Tribunal Administrativo e Fiscal de Viseu em 25.09.2018, pela qual foi julgada improcedente a impugnação das taxas de vistoria de bombas carburantes, ar e água, aplicadas pela Presidente da Câmara de ..., nos termos dos artigos X, n.º 1.3, XI, n.º 1.4 e XI, n.º 2.4 do Regulamento e Tabela de Taxas Municipais da Câmara Municipal de ..., no montante global de 22 035,24€.

1.2. A Recorrente terminou as respetivas alegações formulando as seguintes conclusões: «

  1. O presente recurso vem interposto da sentença que pôs termo, no Tribunal Administrativo e Fiscal de Viseu, à impugnação judicial, que correu termos sob o n.º 174/12.8BEVIS, contra o indeferimento da reclamação graciosa apresentada relativamente à liquidação de taxas pelo Município de ... no valor de € 22.035,24.

  2. Porque inequivocamente demonstrado ao longo do presente processo, tendo sido admitido pelo Município e porque relevante para a boa decisão da causa, deve ser aditado à factualidade provada o seguinte facto: «K) O abastecimento das viaturas não é efectuado na via pública, mas integralmente na propriedade privada na qual o posto de abastecimento se encontra instalado – cfr. doc. n.º 10 em anexo à pi. de impugnação, factualidade não questionada pela Entidade Impugnada».

  3. A questão submetida ao Tribunal recorrido e que, novamente, se submete a V. Exas. prende-se, fundamentalmente, com o facto de a Recorrente ter constatado que o Município de ... procedeu à liquidação de tributos quando não se verificavam – in totum – os pressupostos de facto e de direito para o efeito.

  4. Embora não concordando com as liquidações efectuadas, a Recorrente efectuou um pagamento superior ao (supostamente) devido, posto que já posteriormente às liquidações em apreço, o Município resolveu efectuar uma actualização do valor das mesmas, ou seja, o Município alterou o valor cobrado depois de este ter sido já notificado à Recorrente.

  5. O argumento utilizado na sentença recorrida para justificar a actualização praticada não colhe, pois que a norma de actualização aí citada apenas pode ser aplicada às taxas liquidadas ex novo e não também a taxas já liquidadas antes da actualização e que se apresentem, assim, já a pagamento no momento da referida actualização.

  6. Por este motivo a diferença entre os montantes liquidados e os efectivamente pagos pela Recorrente deve, sem mais, ser-lhe restituída, sendo revogada a sentença recorrida na parte em que o não admite.

  7. A Recorrente requereu à Câmara Municipal de ... a licença de exploração para o Posto de Abastecimento em causa – a qual foi emitida – nos termos do Decreto-Lei n.º 267/2002, de 26 de Novembro, no seguimento do processo de obras de alteração promovidas no mesmo, a que correspondeu o processo de obras n.º ...10.

  8. As liquidações em crise confirmadas pelo acto de indeferimento impugnado e, agora, também pelo Tribunal a quo, não reflectem a aplicação das taxas previstas no artigo 22.º do Decreto-Lei n.º 267/2002, de 26 de Novembro, sendo que se deve entender que para a obtenção do necessário licenciamento do posto de abastecimento apenas é devido o pagamento das taxas pelos actos taxativamente previstos nas alíneas a) a g) daquela norma.

  9. Quanto à taxa paga a título de vistoria – aplicada por analogia do artigo X, n.º 1.3 do Regulamento, como indicado na liquidação impugnada – o parecer homologado afirma que se deve a lapso o facto do artigo XI não discriminar a taxa devida pela vistoria a postos de abastecimento, apenas estando prevista naqueloutra norma.

  10. Mais é afirmado que a sua aplicação analógica se justifica – e cita-se – «uma vez que o objectivo final da vistoria é, em ambos os casos, a verificação do cumprimento dos regulamentos aplicáveis e a garantia de pessoas e bens».

  11. Ora, a instalação e o tipo de licenciamento da exploração requerido pela Impugnante é para um posto de abastecimento de combustíveis – como foi considerado pelos serviços da Câmara Municipal ..., na licença junta como doc. n.º 7 em anexo à p.i. – e não para uma área de serviço, cujos termos de licenciamento se encontram regulados no Decreto-Lei n.º 260/2002, de 23 de Novembro.

  12. No entanto, a taxa aplicada para a vistoria foi a que se encontra prevista para o licenciamento de áreas de serviço prevista do Regulamento, o que consubstancia uma errada aplicação desta taxa ao acto praticado pelo Município, em clara violação ao Princípio da Legalidade, previsto no artigo 8.º da Lei Geral de Tributária, aplicável por força do artigo 2.º, alínea b) da Lei n.º 53-E/2006, de 29 de Dezembro, pelo que é ilegal a taxa aplicada pela vistoria prevista no artigo X, n.º 1.3. porquanto assenta num manifesto erro sobre a qualificação do facto tributário.

  13. Ademais, constitui jurisprudência pacífica a de que «as normas de incidência dos tributos bem como as que concedem isenções ou exclusões de tributação, devem ser interpretadas nos seus exactos termos, sem o recurso à analogia» – cfr.

    Acórdão deste Venerando Tribunal, proferido em 29 de Junho de 2016, no âmbito do processo n.º 09640/16 (sublinhado nosso, cit.) e demais jurisprudência aí citada, no mesmo sentido – razão pela qual deve também a sentença recorrida ser revogada e substituída por outra que dê provimento à impugnação apresentada N) As taxas aplicadas nos termos do artigo XI, n.º 1.4 e 2.4 do Regulamento e que ora se contestam, apresentam como pressuposto de aplicação que as bombas estejam «instaladas inteiramente em propriedade particular mas abastecendo na via pública».

  14. Todavia, e ainda que o Município reconheça que tanto o posto de abastecimento está totalmente implantado e o abastecimento das viaturas é efectuado inteiramente em propriedade privada – cfr.

    doc. n.º 1, doc. n.º 9 e doc. n.º 10 em anexo à p.i. –, sustenta o mesmo Município que «é a prática e o costume no concelho o abastecimento na via pública, no entanto, os serviços fizeram uma interpretação extensiva do normativo previsto, nos termos do artigo 11.º do Código Civil, porque não poderia deixar de aplicar uma taxa que está legalmente prevista» (cit.).

  15. Face ao exposto, não pode a Recorrente aceitar a presente liquidação e cobrança destes tributos, por clara e manifesta violação dos princípios da equivalência jurídica e da publicidade, tal como descritos no referido parecer.

  16. Deste passo cumpre notar que, de acordo com o disposto no artigo 8.º da Lei n.º 53-E/2006, de 29 de Dezembro, «As taxas das autarquias locais são aprovadas por regulamento», o qual deve incluir, nomeadamente, «a indicação da base de incidência objectiva e subjectiva» (cit.); ora, a base de incidência objectiva das taxas em apreço, previstas no Regulamento, restringe-se aos postos de abastecimento que abasteçam na via pública e não outros, como o caso do posto de abastecimento explorado pela Impugnante em ..., o qual não abastece na via pública.

  17. É um absurdo defender que uma norma de incidência de tributos possa determinado facto e, por interpretação extensiva, o seu exacto oposto! Foi, assim, de interpretação correctiva aquela de que o Município de socorreu para liquidar a taxa em crise à Recorrente e não de interpretação extensiva.

  18. Nos termos das regras aplicáveis à interpretação das normas jurídicas, não só deve o intérprete presumir que o legislador consagrou as soluções mais acertadas e soube exprimir o seu pensamento em termos adequados como se proíbe a interpretação corretiva da Lei, i.e., interpretação do pensamento legislativo que não tenha um mínimo de correspondência verbal na letra da Lei.

  19. Para admitir a inclusão de postos de abastecimento que abastecem exclusivamente em propriedade privada no âmbito de uma norma de incidência que pretende tributar bombas estejam «instaladas inteiramente em propriedade particular mas abastecendo na via pública» seria necessário recorrer, justamente, a interpretação corretiva sem um mínimo de correspondência verbal na letra da Lei.

  20. Desta sorte, onde não há norma, onde não há disposição regulamentar, não poderá haver a incidência de um tributo, sendo inadmissível qualquer interpretação analógica ou mesmo extensiva.

  21. Em concreto, o pressuposto de facto não se verifica no presente posto de abastecimento, pelo que, o facto tributário não existe e como tal não pode corresponder às taxas aplicadas, consubstanciando a liquidação destas taxas numa errada...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT