Acórdão nº 00013/16.0BECBR de Tribunal Central Administrativo Norte, 16 de Setembro de 2022
Magistrado Responsável | Antero Pires Salvador |
Data da Resolução | 16 de Setembro de 2022 |
Emissor | Tribunal Central Administrativo Norte |
Acordam, em conferência, no Tribunal Central Administrativo Norte – Secção do Contencioso Administrativo: I. RELATÓRIO 1.
O ESTADO PORTUGUÊS - Ministério da Educação, inconformado, veio interpor recurso jurisdicional da sentença do TAF de Coimbra, datada de 9 de Novembro de 2019, que julgando procedente a acção administrativa, intentada pela A./Recorrida “ST..., CE...
”, proprietária do estabelecimento de ensino particular denominado ST ...
, com sede na Rua ..., ..., declarou a nulidade do Despacho do Secretário de Estado do Ensino da Administração Escolar, de 20/4/2015, pelo qual foi determinado o pagamento/devolução da quantia de 11.273,15€.
*Nas suas alegações de recurso, o recorrente Ministério da Educação formulou as seguintes conclusões: "
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A Administração Educativa, Ré, aqui Recorrente, celebrou com o A., aqui Recorrido, um contrato de associação para prestação de serviço educativo, tendo como correlato o pagamento de certas quantias, o que foi feito; b) No exercício dos seus poderes de superintendência, que a lei lhe faculta sobre a execução do contrato, por parte do contraente privado, realizou uma auditoria, e ao deparar-se com a inexecução/má execução desse mesmo contrato, exerceu os seus poderes sancionatórios – que ninguém contesta, nesta ação ou em anterior [P. º n.º 178/06.0BECBR]; c) Não foi a má execução contratual/incumprimento, contratual, que foi a fonte da sanção, mas sim atuou a Administração ao abrigo da lei, que lhe permite tal atuação – que também ninguém contesta nas instâncias; d) Ou seja, a ordem de reposição – considerada nula pela aqui aliás douta sentença recorrida – não tem por fonte o contrato, mas sim a própria lei; e) Daí, ao assim não discorrer, faz a mesma sentença uma errada interpretação do direito e até da lei, ao «amarrar» todo o processado, da parte da Administração, a obrigações contratuais, que houvesse que pedir a reposição, por violação desse mesmo contrato.
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Mas não é assim, pois a fonte da sanção é – repete-se - a lei e não o contrato.
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Aliás, descaindo para «terrenos» pisados – e mal, como se viu – pela aliás douta sentença aqui recorrida, as prestações que o contraente privado [Colégio], aqui Recorrido, recebeu foi-o por adiantamento do contrato que se veio a celebrar mais tarde, ou como ainda o podemos considerar, como uma «conta-corrente» que havia entre o Estado e aquele, para a prestação do serviço, a que ambos se obrigaram, embora o contrato só tivesse sido celebrado mais tarde; h) Também não há identidade de causa de pedir entre o ato anulado no P. º n.º 178/06.0BECBR e o ato aqui declarado nulo, pela presente sentença aqui recorrida [que esta última se reporta à ordem de reposição do Secretário de Estado, de 20.4.2015], não se verificando, assim, os requisitos do caso julgado, do art.º 581º do CPC, aqui aplicado ex vi do art.º 1º do CPTA; i) Ainda, a invocação da «nulidade de actos desconformes com a sentença [rectius. P. º n.º 178/06.0BECBR], bem como a anulação daqueles que mantenham, sem fundamento válido, a situação constituída pelo acto anulado», prevista no art.º 176º, 5 da CPTA, não é já possível à data da propositura da presente ação, por ter sido já largamente ultrapassado o prazo que legalmente a A., aqui Recorrida, tinha o fazer à luz do mesmo art.º 176º, 2 do CPTA, sobre o qual a aliás douta sentença, aqui recorrida, nem sequer se pronunciou, apesar de ter sido facto alegado na contestação, pelo Reu, aqui Recorrente; j) De qualquer forma, a invocada nulidade nunca impediria a Autoridade Administrativa de obter as quantias devidas pelo defeituoso cumprimento do contrato aqui em causa, por o permitir o art.º 289º, 1 do CC, sobre o que a aliás douta sentença aqui recorrida, nem sequer se pronunciou, apesar de alegado pelo Reu, aqui Recorrente, quando deduziu a sua contestação; k) Também não se pode aceitar que a aliás douta sentença aqui recorrida impute ao ato do Secretário de Estado do Ensino e da Administração Escolar, de 20.4.2015, a sua viciação por não ter sido dado previamente em audiência ao interessado [Colégio] e o mesmo fundamentado, quando foi dado efetivamente em audiência prévia ao interessado e esse mesmo despacho está devidamente fundamentado, como permite o art.º 153º, 1 do CPA/91”.". *Notificadas as alegações, apresentadas pelo recorrente, supra referidas, veio a A./Recorrida “ST..., CE...
” apresentar contra alegações que concluiu do seguinte modo: “1.
A Autora é cumpridora de todas as suas obrigações com o Estado e nomeadamente com o Ministério da Educação, tenham elas por fonte a Lei ou qualquer tipo de contrato, não existindo qualquer dúvida, sombra ou expressão humana, que permitam concluir que em tempo algum assim não tenha sido.
2.
E nos presentes autos assim também o é; em boa verdade, se na jurisprudência dos tribunais existem abundantes decisões relacionadas com o por demais conhecido “Contrato de Associação”, em boa verdade não pode ser apontado à Autora qualquer tipo de incumprimento contratual, ou qualquer violação da Lei, ou mesmo que a Autora alguma vez tenha sido objecto da aplicação de qualquer pena de carácter sancionatório.
3.
E porque assim é (!) correu termos o processo n.º 178/06.0BECBR, que por acórdão do Tribunal Central Administrativo do Norte de 14.12.2012, transitado em julgado ordenou a anulação in totum, do ato impugnado na parte em que ordenou a reposição aos cofres do Estado da mesma quantia que o ato ora impugnado pretende ver restituída.
4.
O referido acórdão do processo n.º 178/06.0BECBR considerou verificados os vícios de incompetência absoluta em razão da matéria, de revogação ilegal de actos constitutivos de direitos, de violação dos princípios da certeza, confiança e segurança jurídicas, e o erro na interpretação do contrato de associação (a não sujeição a cabimentação e prestação de contas; e erro nos pressupostos de facto).
5.
A Entidade Demandada ao decidir como decidiu, proferindo um novo acto administrativo tendo por base a mesma situação de facto, como ressalta da Informação de 26.02.2014 e da decomposição dos valores aí descritos (cfr, alíneas J) e alínea K) do probatório), com base nos mesmos factos em sede de processo disciplinar n.º ...02..., sobre a qual já havia sido proferido acórdão anulatório de anterior decisão com base nos mesmos pressupostos, proferiu um ato administrativo viciado, e por isso nulo por violação do princípio do caso julgado.
6.
Mas ainda que assim não fosse, o referido ato administrativo padece do vício de falta de fundamentação, dado que a entidade Demandada foi proferindo informações seguidas de novas informações, nem todas levadas ao conhecimento da Autora, sendo o acto impugnado totalmente omisso acerca da matéria de Direito, ainda por remissão, e por isso inquinado e violador do disposto no n.º 2 do mesmo artigo 125º por obscuridade, contradição ou insuficiência, que não permite esclarecer e concretizar a motivação do ato administrativo que ordena a ordem de reposição”.
*O Digno Magistrado do M.º P.º, notificado nos termos do art.º 146.º, n.º1 do CPTA, não emitiu Parecer.
*Sem vistos, mas com envio prévio do projecto aos Ex.mos Srs. Juízes Desembargadores Adjuntos, foram os autos remetidos à Conferência para julgamento *2.
Efectivando a delimitação do objecto do recurso, cumpre apreciar e decidir as questões colocadas pelo recorrente, sendo certo que o objecto do recurso se acha delimitado pelas conclusões das respectivas alegações, acima elencadas, nos termos dos arts. 660.º, n.º 2, 664.º, 684.º, ns. 3 e 4 e 685.º A, todos do Código de Processo Civil, “ex vi” dos arts.1.º e 140.º, ambos do CPTA.
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FUNDAMENTAÇÃO 1. MATÉRIA de FACTO A sentença do TAF de Coimbra julgou provada seguinte matéria de facto, cuja completude e fidelidade não se mostram questionadas nesta sede recursiva: “A.
A Autora é proprietária de um estabelecimento de ensino particular denominado ST ..., a funcionar na Rua ..., em ... – cfr. doc. 1 junto à p.i.; B.
Em 27 de Junho de 2000, entre o ESTADO por um lado, e a AUTORA por outro, foi celebrado o contrato de associação válido para o ano lectivo de 1999/2000, de 1 de Setembro de 1999 a 31 de Agosto de 2000 – cfr. doc. 2 junto à p.i. / doc. nº 4 junto com a contestação, que aqui se dá por integralmente reproduzido, C.
Na sequência de uma auditoria realizada pela Inspecção-Geral da Educação à execução do referido contrato de associação, por despacho de 15.10.2002 da Senhora Secretária de Estado da Administração Educativa, e por alegada execução ilegal do contrato, foi mandado instaurar processo disciplinar, ao qual coube o n.º 10.07/293-2002/GAJ – cfr. doc. 3 junto à p.i., D.
Este processo disciplinar veio a ser arquivado por despacho, de 19.09.2003, do Secretário de Estado da Administração Educativa – Cfr. Doc. n.º 4 junto à p.i.; E.
Por despacho do Secretário de Estado Adjunto e da Educação datado de 26 de Agosto de 2005, aposto sobre a informação IGE nº ...05, foi decidido o seguinte.
“1. Revogo parcialmente o despacho de 19.09.2003, exarado pelo do Secretário de Estado da Administração Educativa (...) na parte que manda enviar ao Tribunal de Contas a efectivação da reposição de 11.273,15 €; a regularização das quotizações para a CGA e das contribuições para a Segurança Social (....) 2. Em sua substituição determino à entidade proprietária do ST... a reposição aos Cofres do estado da importância de 11.273,15 €, bem como a regularização das quotizações para a Caixa Geral de Aposentações e para a Segurança Social (...)”– cfr. documento 2 junto com a contestação, F.
O qual foi notificado à Autora em 15.11.2005 – acordo e doc. 4 junto à p.i.; G.
O acto administrativo referido em E. foi objecto de apreciação judicial por este Tribunal, na acção administrativa especial sob n.º 178/06.0BECBR, proposta pela Autora, que por sentença de 07.10.2011 julgou a acção procedente, com base em dois vícios assacados na petição inicial – Cfr. Doc. n.º 6 junto à p.i.
; a saber: - prescrição da reposição, defendida com sustento no...
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