Acórdão nº 00099/22.9BEVIS de Tribunal Central Administrativo Norte, 16 de Setembro de 2022

Magistrado ResponsávelHelena Ribeiro
Data da Resolução16 de Setembro de 2022
EmissorTribunal Central Administrativo Norte

Acordam, em conferência, os juízes desembargadores da Secção Administrativa do Tribunal Central Administrativo Norte: I.RELATÓRIO 1.1.

M..., S.A., moveu a presente ação administrativa de contencioso pré-contratual contra o MUNICÍPIO DE ..., identificando como contrainteressado a sociedade comercial “ N..., S.A.”, pedindo que, no âmbito do concurso público para a “Contratação de infraestrutura de comunicações com integração fixo/móvel, dados, alojamento e caixas de email e serviços conexos”, a que corresponde o procedimento n.º 15488/2021, cujo aviso de abertura foi publicado em 10/12/2021, seja proferida decisão que julgue procedentes os seguintes pedidos: «i)Considerar que a Entidade Adjudicante deve realizar o procedimento a que se refere o nº 2 do artigo 86º do CCP, pela violação do dever de prestar a habilitação completa para a execução integral do objeito do contrato a celebrar dentro do prazo concedido no programa de procedimento, nos termos do nº 1 do artigo 81º, com fundamento na falta de entrega obrigatória, no prazo de habilitação, da declaração RCBE, de acordo com o nº 1 do artigo 36º da Lei nº 89/2017 de 21 de Maio; ia)Suspender a decisão de adjudicação, atendendo que sendo a fase de habilitação uma fase de verificação de impedimentos (ou não) à fase subsequente, a da outorga do contrato a celebrar, não pode, por essa razão, prosseguir a adjudicação, conforme previsão expressa na alínea c) do nº 2 do artigo 272º do CCP; iii)Declarar caduca a Adjudicação à Concorrente/Adjudicatária NOS por facto que lhe seja imputável, sempre que da audiência prévia referida no nº 2 do artigo 86º, resulte falta de prova do justo impedimento (aferido nos termos do artigo 140º do CPC, conforme a melhor jurisprudência e doutrina), conforme nº 3 do artigo 86º do CCP, e emita o acto administrativo correspondente; iv)E, em consequência emita o acto administrativo exigível e a que se refere o nº 4 do artigo 86º do CCP, adjudicando a proposta ordenada em segundo lugar ao supra referido Lote 1 – a da ora Autora.» A Autora apresentou a competente petição inicial, cujos pedidos formulados e causa de pedir alterou através de articulado superveniente que apresentou previamente à citação da Entidade Demandada e da contrainteressada.

Como fundamento para a sua pretensão, alega, em síntese, que o júri do respetivo procedimento devia ter excluído a proposta apresentada pela NOS, relativamente ao lote 1 do procedimento, por tal proposta violar os termos e condições do caderno de encargos (CE), nomeadamente, o disposto no artigo 11º do mesmo, quanto às características que o serviço de acesso à internet deve apresentar.

Mais alega que nos termos da alínea b) do n.º 2 do artigo 70º do Código dos Contratos Públicos, a referida proposta viola aspetos da execução do contrato não submetidos à concorrência pelo caderno de encargos, pelo que, na dúvida quando ao cumprimento do caderno de encargos, deveria ter solicitado esclarecimentos ao concorrente.

Considera que a exclusão da referida proposta se impõe também por aplicação dos princípios da contratação pública, nomeadamente, o princípio da igualdade, concorrência, comparabilidade das propostas e boa administração.

Entretanto, teve conhecimento de facto superveniente à entrada da petição inicial em juízo, nos termos do qual verificou que a Contrainteressada, após ser notificada para juntar os documentos de habilitação, apenas o fez parcialmente, em tempo, na medida em que não juntou a declaração comprovativa da respetiva inscrição no registo central de beneficiário efetivo (RCBE), razão pela qual não pode ser determinada a aceitação dos documentos de habilitação entregues pela NOS , uma vez que esta não entregou a declaração RCBE, que se impunha nos termos da Lei 89/2017, de 21 de agosto, pelo que, se impõe a caducidade da adjudicação nos termos do art.º 86.º do CCP.

Tal é assim, porque a fase de habilitação se destina à verificação da existência ou inexistência de incompatibilidade à celebração do contrato, e por isso, ocorre antes da outorga do contrato objeto do procedimento.

Advoga que o elenco de documentos de habilitação legalmente exigíveis não se esgota no que fica estipulado nas peças procedimentais, nem estas têm de as elencar porque estas resultam da lei, havendo que ter presente o que resulta de leis especiais aplicáveis à contratação pública.

E que resulta de forma clara, imperativa e inequívoca da alínea b) do artigo 37.º da Lei 89/2017 que a declaração RCBE é um documento de habilitação, tal como é, a título de exemplo, o documento comprovativo de situação tributária regularizada.

Salienta que a entrada em vigor da Lei 89/2017 é posterior à entrada em vigor do CCP na redação dada pelo D.L. n.º 111-B/2017, de 31/08, pelo que, os documentos de habilitação exigíveis nos termos de leis especiais fora do CCP são aplicáveis aos procedimentos de contratação pública, como é o caso do disposto na portaria 372/2017 e na Lei 96/2015.

Entende, por isso, que a sanção de caducidade prevista no regime do artigo 86.º do CCP é aplicável à falta de apresentação da declaração do RCBE.

Ademais, a falta de junção da declaração RCBE não pode ser suprida, por tal não ser permitido pelo art.º 86.º do CCP.

1.3. Citada, a Entidade Demandada contestou a ação, pugnando pela improcedência dos pedidos formulados, por não se verificarem os vícios invocados pela Autora.

Para tanto alega, em síntese, que a Autora faz uma errada leitura do caderno de encargos, porque o mesmo não exige que o serviço securizador tenha de garantir os mesmos débitos que o serviço principal, tanto que o CE estabelece que o acesso securizador possa ser construído em fibra ótica ou utilizando tecnologia 4G ou 5G.

Adianta que utilizando a tecnologia 4G nunca poderia ser garantido o mesmo débito do que com o recurso a fibra ótica, ou seja, utilizando tecnologia 4G não é possível garantir débito mínimo de 500/500 Mbps, o que a Autora não ignora.

Explicita que as características exigidas no ponto 1.01 referem-se apenas e tão só ao serviço principal, não podendo ser feita outra interpretação.

Ademais, para além incorreta interpretação do referido ponto do CE, a Autora interpretou incorretamente a resposta do Réu ao pedido de esclarecimento efetuado pela mesma.

1.4. Citada, a Contrainteressada contestou igualmente a ação, pugnando pela improcedência dos pedidos formulados pela Autora, sustentando, em suma, a validade do ato de adjudicação impugnado, e considerando errada a interpretação que a Autora faz do Caderno de Encargos.

No que concerne ao pedidos de caducidade da adjudicação por não apresentação do comprovativo do registo central do beneficiário efetivo, entende que esse pedido não pode proceder uma vez que apresentou o comprovativo do cumprimento da obrigação declarativa no dia da outorga do contrato.

Ademais, contrapõe que tal documento não constitui um documento de habilitação e, consequentemente, não se verifica qualquer causa de caducidade de adjudicação.

1.5. Proferiu-se despacho que dispensou a realização da audiência prévia, fixou o valor da ação em €30.639,60 e considerou desnecessária a produção de outra prova para além da prova documental junta aos autos e constante do PA, para a prolação da decisão de mérito, a qual julgou a presente ação improcedente, constando da mesma o seguinte dispositivo: «Pelo exposto, julgo a presente execução improcedente por não provada e, em consequência, absolvo a Entidade Demandada e Contra-Interessada dos pedidos contra si formulados.

Custas a cargo da Autora.

Registe e notifique.» 1.6. Inconformada com a sentença assim proferida que julgou a ação improcedente, a Autora interpôs a presente apelação, na qual formula as seguintes Conclusões: «A.

A Sentença recorrida merece censura do ponto de vista jurídico – legal; B.

O Tribunal a quo efectua uma incorrecta aplicação da Lei, na subsunção dos factos ao Direito; C.

Aplicando a Lei que de forma díspar com o regime legal vigente para a Contratação Pública; D.

O Tribunal a quo teria de socorrer-se da Jurisprudência mais recente do TCA e STA, os quais seguem na esteira do defendido pela Recorrente! E.

Por considerar não considerar como requisito e documento de habilitação, o RCBE, que claramente o é; F.

E considerando que um acesso securizador, uma redundância do serviço principal, a funcionar em 30% e 2% de capacidade do acesso principal, não viola o art.º 11º do Caderno de Encargos e dos esclarecimentos prestados pela Entidade Adjudicante, os quais se convolam também em elementos do procedimento; G.

Devendo ser o Recurso julgado procedente e ser revogada a Sentença a quo, como todas as legais consequências.

Pelo que, devem V. Exas., Venerandos Desembargadores, nestes termos e nos melhores de Direito que Doutamente suprirão, deve o presente Recurso ser julgado procedente e, consequentemente, revogar-se a decisão Recorrida, Fazendo assim V. Exas. a Costumada Justiça! 1.7.O Apelado Município contra-alegou, formulando as seguintes Conclusões: «1ª/ Louva-se a sentença proferida, inexistindo quaisquer defeitos a apontar à mesma, seja relativamente à matéria de facto seja relativamente à matéria de direito.

  1. / A Recorrente, desde o início do procedimento concursal, fez uma incorrecta interpretação da lei, peças procedimentais e caderno de encargos.

  2. / Uma correcta leitura e interpretação do caderno de encargos mostra claramente que a contrainteressada NOS Comunicações, S.A. cumpriu os requisitos exigidos na sua proposta, não existindo qualquer motivo para que seja excluída.

  3. / A exigência de débito mínimo de 500/500 Mbps como consta no art. 11.º, refere-se apenas e tão só às características do serviço de acesso principal, o que é demais demonstrado pelo esclarecimento prestado pelo Recorrido informando a Recorrente que a forma como o serviço securizador seria assegurado ficava ao critério das concorrentes, exigindo-se os meus níveis de serviço e não às mesmas características, i. É, débito mínimo de 500/500 Mbps.

  4. / E uma correcta...

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