Acórdão nº 00096/18.9BECBR de Tribunal Central Administrativo Norte, 04 de Abril de 2019

Magistrado ResponsávelAna Patrocínio
Data da Resolução04 de Abril de 2019
EmissorTribunal Central Administrativo Norte

Acordam, em conferência, os juízes que constituem a Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Norte: I. Relatório O Ministério Público interpôs recurso jurisdicional da sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal de Coimbra, proferida em 10/07/2018, que declarou extintos, por prescrição do procedimento, determinando o arquivamento dos processos de contra-ordenação n.º 07442017060000043232, n.º 07442017060000043240, n.º 07442017060000043259, n.º 07442017060000043267 e n.º 07442017060000043275, cuja apensação foi determinada pelo tribunal recorrido, na sequência de recursos das respectivas decisões de aplicação de coima, pela falta de pagamento de taxas de portagem, interpostos pela sociedade CACSI, S.A., NIPC 51xxx34, com domicílio fiscal na Rua O…, na Figueira da Foz.

O Recorrente terminou as suas alegações de recurso formulando as seguintes conclusões: “1. Na sequência de circulação do veículo nº xx-GX-xx, durante o mês de Maio de 2013, por diversas vezes, em infraestrutura rodoviária sujeita ao pagamento de taxa de portagem, foram levantados autos de notícia a CACSI, SA, uma vez que não procedeu ao pagamento dos valores em causa durante o prazo legal, nos termos do preceituado na Lei 25/2006.

  1. Em face disso foi a mesma entidade notificada, tendo em conta os elementos constantes do registo automóvel da viatura em causa, para proceder ao pagamento dos valores das portagens, acrescidos dos custos administrativos, sem que tivesse a mesma regularizado os pagamentos nos prazos legais (folhas 248 a 267), factos ocorridos antes de ter lugar o decurso do prazo de prescrição do procedimento, nos termos do preceituado no artigo 32º, do RGIT (não sendo de aplicar o preceituado no nº2 do aludido normativo).

  2. Face a tal incumprimento foram levantados autos de notícia, tendo sido dado conhecimento à infractora, que manteve a posição anteriormente assumida; 4. Não há lugar, em situações desta natureza, a qualquer liquidação tributária, não tendo, assim, aplicação o previsto no artigo 32º nº 2, do RGIT, uma vez que o valor a pagar é do conhecimento do utente da via no momento em que deve proceder ao seu pagamento.

  3. Não decorreu, como resulta dos autos, o prazo de prescrição do procedimento, uma vez que as notificações efectuadas à infractora para regularizar a situação tiveram lugar em 2014, tendo os factos ocorrido em 2013.

  4. No que concerne às coimas aplicadas verifica-se não ter, igualmente, decorrido o prazo de prescrição – artigo 34º, RGIT.

  5. Assim, deve a decisão ora recorrida ser revogada, uma vez que resulta ter sido violado o preceituado nos artigo 32º nº 1 e 34º, do RGIT, assim como o disposto nos artigos 1º, 5º, 9º, 10º e 14º, da Lei 25/2006.

Termos em que, concedendo-se provimento ao presente recurso, será feita JUSTIÇA.”*A Recorrida apresentou contra-alegações, tendo concluído da seguinte forma: “I. De acordo com a Lei n.º 25/2006, de 30 de junho, a pessoa coletiva deve ser notificada na sua sede, cuja morada consta da Conservatória do Registo Comercial.

  1. Nos presentes autos ficou provado que a Recorrida, em 20/05/2014, procedeu não só ao registo da alteração da sua sede social, como também à renúncia de AMBRC ao cargo de Administrador; pelo que, os ofícios posteriormente enviados não só foram enviados para outra morada que não a da sede, como foram enviadas para um ex-administrador, sem poderes e/ou qualidade para as receber.

  2. Significa isto que a notificação por via postal dirigida a um domicílio que não corresponde ao domicílio legal da sociedade Recorrida consubstancia uma nulidade processual que determina a invalidade dos atos subsequentes.

  3. Uma vez que não é suficiente a tentativa de notificação do interessado. O objectivo legal consiste em chamar ao processo o arguido e daí que a diligência deva observar os requisitos indispensáveis para esse efeito, entre os quais a correcção do endereço postal para onde é efetuada a notificação via postal.

  4. Assim, a notificação imposta pelo artigo 14º da Lei 25/2006 foi irregularmente concretizada, não sendo possível concluir que lhe tenha sido dada oportunidade para exercer o seu direito de defesa, consubstanciando tal omissão uma nulidade processual que determina a invalidade dos atos subsequentes nos quais se inclui a própria decisão sancionatória.

  5. Por outro lado, como é sabido, todo o procedimento tributário conducente à cobrança está assente num ato de liquidação, que é um ato de autoridade da administração.

  6. A liquidação da taxa é, de facto, prévia ao processo de contraordenação, sendo obrigatoriamente comunicada por carta registada com aviso de receção; não tendo a Recorrida sido notificada pela Concessionária, de acordo com o disposto nos artigos 10.º e 14.º da Lei n.º 25/2006, da liquidação da taxa em discussão, nomeadamente para, querendo, reclamar ou impugnar a mesma, a liquidação tornou-se ineficaz e, consequentemente, a dívida tornou-se inexigível.

  7. Quando um utente utiliza uma infraestrutura rodoviária e não paga, primária ou secundariamente, há necessariamente lugar a uma liquidação a posteriori (que tem por base a taxa, os custos administrativos e a coima). É esta liquidação que é notificada ao devedor, como forma de garantir a participação na formação das decisões que lhes digam respeito, que possam lesar os seus direitos e interesses legalmente protegidos. Só depois há uma fase de decisão, que resulta no ato de liquidação em sentido estrito. E se o utente é considerado infrator, então tem o direito de se defender e/ou reagir àquela liquidação.

  8. Ora, estando perante uma liquidação, o prazo de prescrição do procedimento contraordenacional está necessariamente vinculado ao disposto no n.º 2 do artigo 33.º do RGIT, pois está em causa uma infração cuja coima depende do valor da prestação tributária a liquidar através do ato tributário correspondente.

  9. Face ao exposto, conclui-se que as coimas aplicáveis às infrações que resultam dos presentes autos variam em função do montante da prestação tributária que deveria ter sido anteriormente liquidada. A infração está, assim, absolutamente dependente do ato de liquidação, porquanto a sanção que é aplicável à Recorrida depende do montante que for voluntariamente entregue.

  10. Pelo que o prazo de prescrição do procedimento contraordenacional não pode deixar de ser igual ao prazo de caducidade do direito à liquidação da taxa de portagem, o qual, nos termos do artigo 33.º n.º 2 do RGIT, é de quatro anos contados a partir do dia em que foram transpostas as barreiras de portagem.

  11. Motivo pelo qual deve o despacho decisório ser inteiramente confirmado, improcedendo totalmente o recurso interposto pelo Ministério Público.”*Colhidos os vistos legais, cumpre apreciar e decidir.

*II - DELIMITAÇÃO DO OBJECTO DO RECURSO – QUESTÕES A APRECIAR No artigo 75.º do Regime Geral do Ilícito de Mera Ordenação Social (RGIMOS) estabelece-se que a decisão do recurso jurisdicional pode alterar a decisão recorrida sem qualquer vinculação aos seus termos e ao seu sentido, com a limitação da proibição da reformatio in pejus, prevista no artigo 72.º-A do mesmo diploma.

Não obstante, o objecto do recurso é delimitado pelas respectivas conclusões (cfr. artigo 412.°, n.º 1, do Código de Processo Penal ex vi artigo 74.°, n.º 4 do RGIMOS), excepto quanto aos vícios de conhecimento oficioso; pelo que este tribunal apreciará e decidirá as questões colocadas pelo Recorrente, sendo que importa apreciar o invocado erro de julgamento na decisão que conheceu a prescrição do procedimento contra-ordenacional e, consequentemente, determinou o arquivamento dos processos de contra-ordenação em apreço.

*III. Fundamentação 1. Matéria de facto Na sentença prolatada em primeira instância foi proferida decisão da matéria de facto com o seguinte teor: “Com interesse para a decisão do recurso, consideram-se documentalmente provados, os seguintes factos: 1. Em 26.09.2017 foi levantado auto de notícia contra a ora Recorrente, imputando-lhe a prática de cinco infracções previstas no artigo 5.º, n.º 2 da Lei n.º 25/06 de 30.06 e punidas no artigo 7.º da mesma Lei (falta de pagamento de taxa de portagem) (cfr. auto de notícia a fls. 5 dos autos); 2. O que originou, igualmente em 26.09.2017, a instauração contra a visada Recorrente, pelo Serviço de Finanças de Figueira da Foz-1, do processo contra-ordenacional autuado sob o n.º 07442017060000043232 (cfr. autuação do visado PCO a fls. 4 dos autos); 3. Na mesma data foi levantado novo auto de notícia contra a ora Recorrente, imputando-lhe a prática de uma infracção de idêntica natureza (cfr. auto de notícia a fls. 52 dos autos); 4. O que originou, igualmente em 26.09.2017, a instauração contra a visada Recorrente, pelo mesmo Serviço de Finanças, do processo contra-ordenacional autuado sob o n.º 07442017060000043240 (cfr. autuação do visado PCO a fls. 51 dos autos); 5. Na mesma data foi ainda levantado novo auto de notícia contra a ora Recorrente, imputando-lhe a prática de uma infracção de idêntica natureza (cfr. auto de notícia a fls. 94 dos autos); 6. O que originou, igualmente em 26.09.2017, a instauração contra a visada Recorrente, pelo mesmo Serviço de Finanças, do processo contra-ordenacional autuado sob o n.º 07442017060000043259 (cfr. autuação do visado PCO a fls. 93 dos autos); 7. Também na mesma data foi levantado novo auto de notícia contra a ora Recorrente, imputando-lhe a prática de outras quatro infracções de idêntica natureza (cfr. auto de notícia a fls. 136 dos autos); 8. O que originou, igualmente em 26.09.2017, a instauração contra a visada Recorrente, pelo mesmo Serviço de Finanças, do processo contra-ordenacional autuado sob o n.º 07442017060000043267 (cfr. autuação do visado PCO a fls. 135 dos autos); 9. Finalmente, e também na mesma data, foi levantado novo auto de notícia contra a ora Recorrente, imputando-lhe a prática de uma infracção de idêntica natureza (cfr. auto de notícia a fls. 178 dos autos); 10. O que originou, igualmente em...

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