Acórdão nº 01417/13.6BEPRT de Tribunal Central Administrativo Norte, 30 de Abril de 2019

Magistrado ResponsávelAna Paula Santos
Data da Resolução30 de Abril de 2019
EmissorTribunal Central Administrativo Norte

Acordam, em conferência, os juízes que constituem a Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Norte: Relatório A Autoridade Tributária e Aduaneira [Ministério das Finanças] interpôs recurso jurisdicional da sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto, que julgou procedente a acção administrativa especial apresentada por ACJ, visando os despachos de indeferimento do pedido de isenção de Imposto Municipal sobre Imóveis (IMI) proferidos em 21/02/2013 pelo Chefe de Finanças do Porto-2 no âmbito dos processos de isenção nºs 002531898, 002531900, 002531902, 0025319039 002531904 e 002531905, pedidos esses relativos ao prédio urbano composto por uma morada de casas de cinco andares, sito na Rua B…, descrito na Conservatória do Registo Predial do Porto sob o número 398 e inscrito na matriz predial urbana da freguesia de São Nicolau sob o artigo 52, que apresentara em 23/11/2012.

O Recorrente terminou as suas alegações de recurso com as conclusões que se reproduzem ipsis verbis: 1ª Por via do presente recurso pretende a Recorrente reagir contra a sentença proferida a 2016-05-25 pelo Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto que determinou a anulação dos despachos de indeferimento dos pedidos de isenção de IMI; 2ª A decisão proferida pelo Tribunal a quo padece de: (a) erro de julgamento, atento o facto de não ter apreciado devidamente a prova inclusa nos autos e de não ter interpretado corretamente a lei aplicável ao caso vertente; e de (b) inconstitucionalidade, pelo facto de a interpretação efetuada pelo referido Tribunal ofender os princípios da igualdade tributária, da capacidade contributiva, da justiça e da autonomia local.

3ª Uma das circunstâncias que motivou o erro de julgamento em que incorreu o Tribunal a quo reside no facto deste ter confundido os conceitos de Classificação e de Designação patentes na Lei do Património Cultural de 2001 (Lei 10712001, de 8 de setembro); 4ª Analisada a evolução do conceito de Classificação ao longo das sucessivas leis nacionais do património cultural durante o século XX, verifica-se que: (a) na Monarquia Constitucional previa-se uma única graduação de Classificação (Monumento Nacional); (b) na 1.1 República previam-se duas graduações de Classificação (Monumento Nacional e Imóvel de Interesse Público); (c) no Estado Novo previam-se três graduações de Classificação (Monumento Nacional, Imóvel de Interesse Público e Valor Concelhio); (d) no início da 3ª República foi introduzido o conceito de Categoria e alargadas as graduações de Classificação, sendo nunca foram aplicadas em virtude da Lei 13185 não ter sido regulamentada; e (e) durante a 3ª República e até ao surgimento da Lei do Património Cultural de 2001 continuaram a ser aplicadas as graduações de Classificação criadas pelo Estado Novo; 5.ª A inegável tecnicidade do Direito do Património Cultural levou a que o Tribunal a quo tenha incorrido em várias confusões, designadamente à utilização indiferenciada de conceitos jurídico-patrimoniais completamente distintos entre si, como sejam a Categoria, a Classificação e a Designação, razão pela qual alega que o Centro Histórico do Porto está classificado como Monumento Nacional; 6.ª O artigo 15.º da Lei do Património Cultural veio consagrar três conceitos jurídico-patrimoniais distintos e com um recorte técnico preciso, a saber: (a) a Categoria, (b) a Classificação e (c) a Designação; 7.ª São três as Categorias previstas na Lei do Património Cultural de 2001 (artigo 15.011): Monumento, Conjunto e Sítio, sendo que as suas definições, para o que releva no caso sub judice, constam da Convenção da UNESCO de 1972; 8ª São três as Classificações previstas na Lei do Património Cultural de 2001 (artigo 15.112): Interesse Nacional, Interesse Público e Interesse Municipal, organizadas numa escala de graduação decrescente; 9ª A designação de Monumento Nacional está reservada exclusivamente para os monumentos, conjuntos ou sítios que se encontrem classificados como sendo de Interesse Nacional (artigo 15.1/3), ou seja, ao monumento, conjunto ou sítio (i.e., categorias) que se encontre classificado como sendo de Interesse Nacional (i.e., classificações) é-lhe ainda atribuída a designação de Monumento Nacional; 10.ª Ao afirmar que o Centro Histórico do Porto está classificado como Monumento Nacional o Tribunal a quo incorreu num erro de análise, na medida em que: (a) confundiu os atuais conceitos de Classificação e de Designação; e (b) confundiu o conceito de Designação introduzido pela Lei do Património Cultural de 2001 com o conceito de graduação da Classificação como Monumento Nacional que vigorou entre o início da vigência do Decreto 20.985 de 1932 e a entrada em vigor da Lei do Património Cultural de 2001; 11ª Desde 2001 que não existe uma classificação denominada de Monumento Nacional, mas apenas classificações denominadas de Interesse Nacional, de Interesse Público ou de Interesse Municipal, logo é manifestamente impossível afirmar que o Centro Histórico do Porto está classificado como Monumento Nacional; 12.ª O Centro Histórico do Porto está classificado desde 2010-07-30, com a publicação do Aviso n.° 15173/2010, portanto, seria manifestamente impossível classificar em 2010, como Monumento Nacional, um bem cultural com uma classificação que não existe desde 2001; 13.ª Por outro lado, o conceito de classificação denominada de Monumento Nacional constante do Decreto 20.985 não equivale ao conceito de designação de Monumento Nacional constante da Lei do Património Cultural de 2001, pelo que também é manifestamente impossível afirmar que o Centro Histórico do Porto está classificado como Monumento Nacional; 14ª Outra confusão e imprecisão prende-se com a circunstância de se afirmar que o Centro Histórico do Porto está classificado como sendo Monumento Nacional em decorrência direta daquele ter sido "classificado como Património Mundial da UNESCO", quando, na realidade, não existe qualquer classificação da UNESCO; 15.ª A "Lista do Património Mundial" a que se refere o artigo 11.1/2 da Convenção da UNESCO de 1972 e, portanto, a lista a que se refere o artigo 15.0/7 da Lei do Património Cultural de 2001 é tão só uma lista que está a cargo do Comité do Património Mundial; 16.ª Ao inscrever um bem cultural na "Lista do Património Mundial", o Comité do Património Cultural da UNESCO não está a classificar um bem, pois a classificação de um bem cultural depende sempre de prévio procedimento administrativo de Classificação (cfr. artigo 1.1 do Código do Procedimento Administrativo de 2015 e de 1991; artigo 18.1 da Lei do Património Cultural de 2001 e artigo 1.0 do Decreto-Lei 30912009, de 23 de outubro); 17.ª A inscrição do Centro Histórico do Porto na "Lista do Património Mundial não foi precedida de qualquer procedimento administrativo visando um ato de classificação, uma vez que: (a) o Comité do Património Cultural da UNESCO não integra a Administração Pública portuguesa; (b) o Estado Português não delegou no Comité do Património Cultural da UNESCO a realização de um procedimento administrativo de classificação do Centro Histórico do Porto; (c) o Estado Português jamais procedeu à abertura de qualquer procedimento administrativo de classificação previamente à candidatura do Centro Histórico do Porto à inscrição na "Lista do Património Mundial"; 18ª Ainda que ao arrepio do basilar princípio da legalidade fosse minimamente defensável (por recurso à analogia) que a inscrição de um bem cultural na "Lista do Património Mundial" constitui uma classificação, tal "procedimento da UNESCO" sempre seria inválido, porquanto não houve, por exemplo, lugar a audição prévia por parte dos interessados que in casu reveste a forma de consulta pública; 19ª Mais, ainda que, ao arrepio do basilar princípio da legalidade fosse minimamente defensável (por recurso à analogia) que a inscrição de um bem cultural na "Lista do Património Mundial" constitui uma classificação, tal "classificação como Património Mundial da UNESCO" sempre seria ineficaz, porquanto não houve publicação da decisão do Comité do Património Mundial no jornal oficial português (até, porque, as decisões daquele comité não se inserem nos atos de publicação obrigatória no Diário da República - cfr. artigo 119.0 da Constituição); 20.ª O artigo 72.° do Decreto-Lei 30912009 ao determinar a abertura oficiosa de um procedimento de classificação após a inclusão de um bem na lista da UNESCO, mais não está a dizer ao intérprete da lei que até àquela abertura oficiosa não existia tal classificação, pelo que a inscrição de um bem cultural na "Lista do Património Mundial" não constitui qualquer Classificação , mas, sim, “apenas “na atribuição de um novo estatuto honorífico ao be mem causa , de bem cultural nacional passa a ser ( também) um bem de cultura mundial.

21.ª Da articulação do Aviso n.° 15.17312010, de 30 de julho, da Lei do Património Cultural de 2001 e do Decreto-Lei 309/2009, de 23 de outubro, resulta que: (a) somente com a publicação do Aviso n.° 15.17312010 é que o Centro Histórico do Porto foi classificado; (b) ao inscrever um bem cultural na "Lista do Património Mundial", o Comité do Património Cultural da UNESCO não procedeu a qualquer classificação do Centro Histórico do Porto, apenas inseriu mais um registo numa lista de bens culturais de valor mundial; (c) de entre as três categorias possíveis (i.e., Monumento, Conjunto e Sítio) o Centro Histórico do Porto insere-se na categoria de Conjunto; (d) o Centro Histórico do Porto estará, quanto muito, classificado como de Interesse Nacional, logo é manifestamente impossível afirmar aquele está classificado como Monumento Nacional; 22.ª Além de o Tribunal a quo não ter interpretado corretamente a lei aplicável (nomeadamente o Aviso n.° 15.17312010), ele não apreciou devidamente as certidões emitidas pela Direção Regional de Cultura do Norte, pois as mesmas enfermam e veiculam um grave erro e asseveram uma realidade que não existe; 23.ª Não é minimamente...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT