Acórdão nº 00207/18.4BEPRT de Tribunal Central Administrativo Norte, 15 de Março de 2019

Magistrado ResponsávelHelena Canelas
Data da Resolução15 de Março de 2019
EmissorTribunal Central Administrativo Norte

Acordam em conferência na Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Norte: I. RELATÓRIO JFPS (devidamente identificada nos autos) instaurou em 26/01/2018 no Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto ação administrativa contra o Município P… na qual, impugnando o ato administrativo proferido pelo Diretor Municipal da Presidência da Câmara Municipal P… e Presidente do Conselho de Administração da “DomusSocial, EM” de 27/07/2017, que determinou a resolução do arrendamento apoiado que a autora beneficiava para o fogo habitacional identificado nos autos, sita no Porto, pugnou dever ser-lhe consequentemente reconhecido o direito a nele habitar.

Em sede de despacho-saneador proferido em 08/06/2018 o Tribunal a quo absolveu o réu da instância com fundamento em verificação da exceção dilatória de intempestividade da prática de ato processual nos termos do artigo 89º nº 2 e nº 4 alínea k) do CPTA.

Inconformada a autora interpôs o pressente recurso de apelação, formulando as seguintes conclusões nos seguintes termos:

  1. O presente Recurso, vem interposto da sentença proferida, em 08.06.2018, nos autos supra referenciados, que julgou procedente a exceção de intempestividade da prática do ato processual, absolvendo o Réu da instância.

  2. A sentença ora em recurso entendeu que a autora, aqui recorrente, imputa ao ato administrativo vícios que importam apenas a anulabilidade do ato, nos termos do art. 163.° do CPA.

  3. E, uma vez que o prazo para a impugnação de atos anuláveis tem lugar no prazo de 3 meses após a notificação ou conhecimento do mesmo, considera que se verifica, nesses termos, a exceção de caducidade do direito de agir, prevista no art.° 89.°, n.° 4, al. k) do Código de Processo nos Tribunais Administrativos.

  4. No entanto, além dos vícios da anulabilidade que expressamente a autora invoca, também o ato administrativo que a autora pretende impugnar padece de vícios que comportam a nulidade.

  5. Vícios esses que foram expressamente invocados e fundamentados pela autora na sua P. 1..

  6. O direito à habitação constitui um direito fundamental constitucionalmente consagrado.

  7. Em abstrato, e sendo o direito à habitação um direito fundamental, a verdade é que a sua violação comporta a nulidade do ato administrativo que o ofende, conforme estabelece o art. 161.° do Código do Procedimento Administrativo.

  8. Nesta senda, tendo a P.I. da ação interposta pela autora invocado expressamente a violação do conteúdo essencial de um direito fundamental, cuja sanção é a nulidade do ato, e tendo fundamentado de forma adequada o referido vício, o direito de interposição da ação não está sujeito a prazo.

  9. Porquanto, quando a autora invoque vícios a que a lei impute a nulidade, beneficiará do prazo para as ações fundadas em nulidade, desde que essa invocação esteja devidamente fundamentada, o que aconteceu.

  10. Nestes termos, como a autora invocou e fundamentou devidamente a nulidade do ato praticado - nulidade essa que pode ser invocada a todo o tempo, nos termos do art.° 162º, n.° 2 do Código de Procedimento Administrativo e art.° 58.° CPTA — não caducou o respetivo direito de ação.

    *Não foram apresentadas contra-alegações.

    *Remetidos os autos a este Tribunal, em recurso, neste notificada, nos termos e para os efeitos do disposto nos artigos 146º e 147º do CPTA, o Digno Magistrado do Ministério Público emitiu Parecer no sentido de o recurso não merecer provimento, nos seguintes termos: «Não vemos motivo para discordar da sentença.

    A recorrente sustenta que não se verifica a caducidade já que o acto impugnado padece de nulidade e não de mera anulabilidade. Não podemos estar de acordo.

    Como é sabido, constitui ilegalidade e, consequentemente, vício do acto administrativo, qualquer ofensa dos princípios ou normas jurídicas aplicáveis, que poderá envolver a anulabilidade ou a nulidade.

    A nulidade constitui o regime de excepção, ao passo que a anulabilidade é o regime regra. É o que se depreende do disposto nos artigos 161º a 163º do CPA, designadamente do nº 1 deste último preceito, segundo o qual são anuláveis os „‟‟actos administrativos praticados com ofensa dos princípios ou normas jurídicas aplicáveis para cuja violação se não preveja outra sanção” (Cfr. neste sentido Mário de Aroso de Almeida e Carlos Alberto Fernandes Cadilha, Comentário ao Código de Processo nos Tribunais Administrativos, vol. 1, pág. 247).

    E no mesmo entendimento Mário Esteves de Oliveira/Pedro Costa Gonçalves/J. Pacheco de Amorim, Código do Procedimento Administrativo Comentado, 2ª ed. p. 656 “ A sanção geral da invalidade do acto ferido de ilegalidade — ou seja, o acto desconforme com o ordenamento jurídico, por ofensa ou dos princípios gerais de direito ou de normas jurídicas escritas constitucionais, internacionais, comunitárias, legais ou regulamentares (omitindo-se referência paralela às normas consuetudinárias, por não serem consideradas generalizadamente fontes formais de direito administrativo) ou, ainda, por ofensa de vinculações derivadas de acto jurídico ou contrato administrativo anterior — é a da anulabilidade”.

    O Código de Procedimento Administrativo, de resto, no seu art.° 161º tem o elenco dos actos que se poderão reputar de nulos.

    A recorrente, pretende enquadrar o acto em crise na alínea d) (acto que ofenda o conteúdo essencial de um direito fundamental), pois, em seu entender, foi violado o princípio constitucional do direito à habitação.

    Todavia não lhe assiste razão.

    Com bem refere a sentença, “na órbita da nulidade não circulam os actos administrativos ofensivos de todos os direitos fundamentais inscritos na CRP, mas apenas aqueles que giram em torno dos direitos, liberdades e garantias previstos no Título II da parte I da CRP, excluindo-se dessa forma de invalidade mais gravosa as decisões sociais culturais, de índole programática, como os aventados direitos à habitação, protecção da infância e juventude, cuja inserção temática a Lei Fundamental já optou por a fazer no Título III, capítulo II, intitulando-a de direitos e deveres sociais (artigos 65.°, 67.°, 69.° e 70.° da CRP)”.

    Deste modo, não estando em causa, portanto, um caso de nulidade, teremos de nos reconduzir à mera anulabilidade, nos termos do disposto no art.° 163, nº 1° do Código do Procedimento Administrativo que estipula: ‘’São anuláveis os actos administrativos praticados com ofensa dos princípios ou normas jurídicas aplicáveis para cuja violação se não preveja outra sanção.” Neste enquadramento, podendo, eventualmente, estar em causa um vício gerador de anulabilidade, a acção administrativa especial deve ser intentada no prazo de três meses após a notificação do acto em crise – cfr. n° 1, al. b) do art. 58° do Código de Processo nos Tribunais...

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