Acórdão nº 01019/06.3BECBR de Tribunal Central Administrativo Norte, 07 de Fevereiro de 2019

Magistrado ResponsávelAna Patrocínio
Data da Resolução07 de Fevereiro de 2019
EmissorTribunal Central Administrativo Norte

Acordam, em conferência, os juízes que constituem a Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Norte: I. Relatório FRC, contribuinte fiscal n.º 12xxx30, com domicílio fiscal na Avenida S…, Lousã, interpôs recurso jurisdicional da sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal de Coimbra, proferida em 16/12/2016, que julgou improcedente a impugnação judicial versando acto de liquidação de IRS, relativo ao ano de 2002 e respectivos juros compensatórios, no montante de €81.989,37.

A Recorrente terminou as suas alegações de recurso formulando as seguintes conclusões: “1. A junção de documentos pela Fazenda Publica deveria ter sido notificada à ora recorrente para sobre os mesmos se pronunciar, querendo, e assim ficar assegurado o princípio do contraditório relativamente a essa matéria; 2.

In casu, os documentos juntos pela Fazenda Pública, e nunca notificados à recorrente, foram utilizados para a decisão da causa e da fundamentação da douta decisão; 3. A omissão da notificação da junção dos documentos teve influência na decisão da causa porque tais elementos foram utilizados nessa decisão sem, previamente, se ter assegurado o princípio do contraditório e sem a possibilidade, portanto, de a oponente os poder impugnar, pelo que se verifica, com tal omissão, a nulidade prevista no artigo 201.º do CPC que implica a anulação dos termos subsequentes a essa omissão bem como da própria decisão; 4. Por isso, deverá proceder a arguida nulidade decorrente da falta de notificação à recorrente da junção dos documentos pela Fazenda Pública com a consequente anulação da tramitação processual posterior a essa omissão e determinada a baixa dos autos à 1ª Instância para aí se proceder à notificação da junção dos documentos à recorrente e aos trâmites posteriores ao conhecimento da impugnação; 5. A douta decisão em recurso violou, entre outros, os artigos 115.º e 121.º do CPPT e os artigos 3.º, 517.º, 526.° e 201.º do CPC.

Termos em que e nos mais de direito deve o presente recurso ser julgado procedente e, consequentemente, anular-se a decisão recorrida, ordenando-se a notificação da junção dos documentos à recorrente, assim se fazendo justiça.”*Não houve contra-alegações.

*O Ministério Público junto deste Tribunal emitiu parecer no sentido da improcedência do recurso, por não ter sido com base nesses documentos e em concatenação com o restante probatório que o tribunal a quo concluiu de forma determinante para o sentido da decisão, desfavorável aos interesses da impugnante, aqui Recorrente.

*Colhidos os vistos legais, cumpre decidir.

*II - DELIMITAÇÃO DO OBJECTO DO RECURSO – QUESTÕES A APRECIAR Cumpre apreciar e decidir as questões colocadas pela Recorrente, estando o objecto do recurso delimitado pelas conclusões das respectivas alegações, sendo que importa ponderar se se verifica a invocada nulidade processual, por violação do direito ao contraditório previsto no artigo 3.º, n.º 3 do Código de Processo Civil (CPC).

*III. Fundamentação 1. Matéria de facto Na sentença recorrida foi proferida decisão da matéria de facto com o seguinte teor: “Compulsados os autos e analisada a prova produzida, dão-se como provados, com interesse para a decisão, os seguintes factos: 1. Em cumprimento da ordem de serviço n.º OI200500825 de 21.06.2005, foi a escrita da Impugnante objecto de fiscalização pelos Serviços de Inspecção Tributária da Direcção de Finanças de Coimbra, relativamente ao ano de 2002; Cfr. Ordem de Serviço a fls. 1 do Processo Administrativo Tributário (PAT) em apenso.

  1. Em resultado da qual foi elaborado relatório em que se propuseram correcções técnicas em sede de I.V.A. e correcções com recurso a métodos indirectos em sede de I.R.S., estas no valor de €342.665,23, e que mereceu a concordância do Director de Finanças Adjunto de Coimbra, por despacho de 17.10.2005, no uso de poderes delegados pelo Director de Finanças de Coimbra; Cfr. Relatório Final de Inspecção (RFI), a fls. 82 e ss. do PAT em apenso.

  2. Sendo que em tal relatório consta, além do mais, o seguinte: [consta na sentença recorrida reprodução extensa do relatório inspectivo] Cfr. RFI a fls 82 e ss do PAT em anexo.

  3. Constituindo os anexos 1.1, 1.2 e 1.3 do aludido RFI quadros com o seguinte teor:[imagem que aqui se dá por reproduzida]Cfr. fls. 94-96 do PAT em apenso.

  4. Constituindo os anexos 4.1, 4.2 e 4.3 do aludido RFI, referentes ao cálculo dos valores de venda corrigidos em função da permilagem de cada fracção, quadros com o seguinte teor:[imagem que aqui se dá por reproduzida]Cfr. fls. 101 a 103 do PAT em apenso.

  5. O anexo 10.3 do aludido RFI é constituído por requerimento da ora Impugnante dirigido ao Director Distrital de Finanças de Coimbra, apresentado na sequência da notificação do projecto do Relatório de Inspecção, podendo ler-se em tal requerimento o seguinte: «…notificada nos termos e para os efeitos do art.º 60º da LGT do projecto de relatório de inspecção tributária, vem dizer e requerer a Vª Exª o seguinte: 1) Consta do ponto V ( II ) que: “Após o cálculo do Volume de Negócios, recorreu-se aos rácios ( existentes nestes Serviços Fiscais ) relativos às margens médias do lucro líquido sobre as vendas e prestações de serviços, determinados com base nos elementos declarados ao Estado pelos sujeitos passivos que exercem a mesma actividade, para se determinar o lucro a tributar, utilizando-se o índice da “mediana”. A escolha deste método e do referido índice deve-se ao facto de assim se trabalhar com indicadores médios que abrangem a grande maioria de contribuintes que exercem esta actividade em condições análogas".

    2) Mais se estipulando o rácio de 8,79% que aplicado ao volume de negócios apurado de 4.174.828,11€ resultou no lucro apurado de 366.967,39€.

    3) Nos termos do art.º 59º, n.º 1 da LGT, consagra-se que: “Os órgãos da administração tributária estão sujeitos a um dever de colaboração recíproco”, referindo-se no art.º 55º do mesmo diploma legal que: “A administração tributária exerce as suas atribuições na prossecução do interesse público, de acordo com os princípios da legalidade; da igualdade, da proporcionalidade, da justiça, da imparcialidade e da celeridade, no respeito pelas garantias dos contribuintes e demais obrigados tributários”.

    4) É de acordo com tais princípios que, a ora requerente solicita a Vª Exª que lhe sejam enviados os extractos informáticos de todos os rácios, de índole nacional e distrital, existentes nos Serviços Fiscais para o CAE 70120, com referência aos anos de 2000, 2001 e 2002, por os mesmos se revelarem indispensáveis ao exercício do direito de audição e em geral ao exercício do seu direito de defesa.

    5) Mais se requer a Vª Exª que o prazo para o exercício do direito de audição só comece a correr após o envio daqueles elementos.»; Cfr. fls. 70 do PAT em apenso.

  6. O anexo 10.5 do aludido RFI é constituído pelo ofício de resposta do Director de Finanças de Coimbra ao visado requerimento, possuindo tal ofício o seguinte teor: «Reportando-me à comunicação de V. Exª remetida a estes Serviços em 2610912005, junto envio os rácios nacionais e distritais para o CAE 70120, com referência ao ano de 2002, dado ser este o exercício objecto de inspecção.

    Quanto ao solicitado no ponto 5 da referida comunicação, mais se informa V. Exª não sendo possível satisfazer o pedido, por inexistência de norma legal que o preveja e considerando que os elementos em causa não constituem parte integrante da fundamentação do projecto de decisão.»; Cfr. fls. 72 do PAT em apenso.

  7. No seguimento da recepção do ofício aludido no ponto anterior a ora Impugnante apresentou reclamação que deu entrada na Direcção de Finanças de Coimbra em 11.10.2005, na qual se pode ler, entre o mais, o seguinte: «…notificada do douto despacho de Vª Exª de 3.10.2005 e que apenas procedeu ao envio dos rácios, de índole nacional e distrital, existentes nos Serviços Fiscais para o CAE70120, com referência ao ano de 2002, vem do mesmo reclamar nos termos do art.v 66° da LGT, nos termos e com os seguintes fundamentos: (…) 4) Ora, salvo o devido respeito, não tem qualquer razão aquele despacho que negou o acesso da ora requerente aos rácios, de índole nacional e distrital, existentes nos Serviços Fiscais para o CAE70120, com referência aos anos de 2000 e 2001 e bem assim que não conferiu um novo prazo para o exercício do direito de audição.

    5) Dispõe o art.º 74°, n.º 3 da LGT que: “Em caso de determinação da matéria tributável por métodos indirectos, compete à administração tributária o ónus da prova da verificação dos pressupostos da sua aplicação, cabendo ao sujeito passivo o ónus da prova do excesso na respectiva quantificação”. (…) 7) Ora, alguns dos negócios que foram projectados corrigir, foram efectuados não no exercício de 2002, mas sim em exercícios anteriores, concretamente, em 2000 e 2001.

    8) Não dispondo e não conhecendo a ora requerente dos rácios, de índole nacional e distrital, existentes nos Serviços Fiscais para o CAE 70120, com referência àqueles anos, não pode exercer o seu direito de defesa de forma cabal e plena, atento o critério de quantificação adaptado pela fiscalização.

    9) Por outro lado, também não colhe o segmento do douto despacho que indeferiu a requerida concessão de novo prazo para o exercício do direito de audição.

    10) Nos termos do art.º 59º, n.º 1 da Lei Geral Tributária, “Os órgãos da administração tributária e os contribuintes estão sujeitos a um dever de colaboração recíproco”, sendo que o princípio da colaboração da Administração, em geral, com os particulares está previsto no art.º 7º do Código de Procedimento Administrativo - que se aplica às relações jurídico-tributárias por força do disposto no art.º 2, al. c) da LGT - em que se estabelece o seguinte: (…), donde num procedimento longo, como o presente, deve ser deferido o requerido pela ora requerente, sob pena de violação do princípio do contraditório, pois com o projecto de decisão não foi remetido o elemento com o despacho ora reclamado enviado...

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