Acórdão nº 00767/11.9BEPRT de Tribunal Central Administrativo Norte, 13 de Setembro de 2019

Magistrado ResponsávelLuís Migueis Garcia
Data da Resolução13 de Setembro de 2019
EmissorTribunal Central Administrativo Norte

Acordam em conferência os juízes deste Tribunal Central Administrativo Norte, Secção do Contencioso Administrativo: Sindicato dos Inspectores da Educação e do Ensino (…) interpõe recurso jurisdicional de decisão do TAF do Porto, que julgou totalmente improcedente acção intentada contra Ministério das Finanças e Administração Pública, Ministério da Educação, Ministério da Ciência, tecnologia e Ensino Superior, Secretaria Regional da Educação e Cultura da Região Autónoma da Madeira e Secretaria Regional da Educação e Formação da Região Autónoma dos Açores.

O recorrente conclui: 1) Atenta a manifesta inconstitucionalidade da norma nos moldes sobreditos e confirmada pelo acórdão do Tribunal Constitucional invocado e subjacente ao acórdão ora recorrido.

2) Atento o facto de tratando-se de um Acórdão do TC proferido no âmbito da fiscalização preventiva da constitucionalidade e, consequentemente, uma “decisão provisória” e passível de alteração, entendemos que poderia e deveria o Tribunal “a quo” ter julgado procedente a presente acção, tudo com as legais consequências.

3) Pelo que aqui e agora requeremos aos Venerandos Desembargadores seja a presente decisão revogada e substituída por outra que, julgando a inconstitucionalidade da norma, defira a pretensão do ora recorrente nos moldes sobreditos.

O Ministério das Finanças contra-alegou, concluindo: a) As alegações do Recorrente encerram uma inadmissível ampliação do pedido e causa de pedir que não deve ser conhecida e apreciada na presente instância de recurso, posto que se reportam, de forma expressa, não só aos atos de processamento de vencimentos baseados na Lei nº 55-A/2010, como ainda, e agora de forma inovadora, à suspensão do pagamento dos subsídios de férias e de Natal dos trabalhadores do sector público e aposentados, operada, ulterior e sucessivamente, pelas Leis do Orçamento do Estado para 2012 e 2013, mas que não foram visadas na respetiva petição inicial; b) Como se sabe, os tribunais de recurso só podem apreciar as questões suscitadas pelas partes e decididas pelos tribunais inferiores, salvo se importar conhecê-las oficiosamente – tantum devolutum quantum appelatum (Alberto dos Reis “Código do Processo Civil Anotado” vol. V, pág. 310 e Ac. do STJ de 12.12.95, CJ/STJ Ano III, T. III, pág. 156); c) Isto significa que, em regra, o tribunal de recurso não pode ser chamado a pronunciar-se sobre matéria que não foi alegada pelas partes na instância recorrida ou sobre pedidos que nela não foram formulados, estando o âmbito dos poderes cognitivos do tribunal de recurso balizado pela matéria de facto alegada em primeira instância, pelo pedido formulado pelo autor em primeira instância e pelo julgado na decisão proferida em primeira instância; d) A apreciação da alegada inconstitucionalidade material das normas constantes dos artigos 21.º e 25.º, da Lei n.º 64-B/2011, de 30 de dezembro (Orçamento do Estado para 2012) e ainda do artigo 29º da Lei nº 66-B/2012 (Orçamento do Estado para 2013) que decretaram, sucessivamente, medidas de suspensão do pagamento de subsídios de férias e de Natal ou prestações equivalentes - do ponto de vista processual são questões novas que não foram validamente colocadas, segundo o que está processualmente firmado, em primeira instância, perante o tribunal a quo, incidindo sobre diferentes planos normativos que nem sequer aquele logrou identificar com precisão (apenas se referindo à LOE para 2012 e LOE para 2013); e) Devem por isso ser desconsideradas e julgadas não escritas pelo órgão ad quem justamente por obstarem, no segmento assinalado, ao conhecimento do objeto do recurso, o que desde já se requer; f) Ainda assim, o argumentário do Recorrente não pode abalar minimamente a convicção do tribunal de recurso relativamente à inverificação dos vícios de inconstitucionalidade apontados; g) Antes pelo contrário: o Tribunal Constitucional, pelos acórdãos n.ºs 396/11 e 187/13 decidiu, sucessivamente, não declarar a inconstitucionalidade das normas dos artigos 19.º da Lei n.º 55-A/2010, de 31 de dezembro, e 27.º da Lei n.º 66-B/2012, de 31 de dezembro, que estabeleciam para os exercícios orçamentais de 2011 e 2013, respetivamente, a redução remuneratória entre 3,5% e 10% para os trabalhadores do setor público que auferissem remunerações base superiores a €1.500.00, e reafirmou essa jurisprudência, ainda que implicitamente, no acórdão n.º 353/12, em relação à norma de idêntico teor do artigo 20.º da Lei n.º 64-B/2011, de 30 de dezembro; h) A este respeito, pela sua clareza e relevância, dá-se por reproduzida a retrospretiva jurisprudencial realizada pelo Tribunal Constitucional no seu Acórdão nº 413/2014 (publicado no Diário da República 1ª serie, nº121 de 26/06/2014) relativamente à avaliação que realizou sobre as medidas de redução/suspensão de que foram objeto as remunerações e subsídios dos trabalhadores do setor público por via das sucessivas leis orçamentais; i) Do exposto se retira que, ao contrario do que sugere o Recorrente, não ocorreu qualquer inflexão na apreciação valorativa do Tribunal Constitucional relativamente às medidas de redução remuneratória que atingiram os trabalhadores públicos; j) A evolução da jurisprudência daquele Tribunal surge, sim, associada à evolução normativa registada em 2013 e 2014 relativamente ao âmbito de incidência das reduções remuneratórias e das taxas previstas face ao regime constante da Lei nº 55-A/2010; k) Mostrando-se algo descabido que o Recorrente pretenda fundamentar a reavaliação da decisão da primeira instância que recaiu sobre a Lei nº 55-A/2010, com base na apreciação valorativa realizada pelo Tribunal Constitucional relativamente a planos normativos distintos que vigoraram em momentos históricos posteriores e até com configuração diversa, como é o caso concreto das soluções que impuseram a suspensão dos subsídios de férias e de natal aos trabalhadores do setor público previstas das leis orçamentais de 2012 e 2013.

l) Assim sendo, não pode deixar de se concluir pela total inconsistência das alegações do Recorrente, assim como das consequências que no âmbito da inconstitucionalidade pretende o mesmo retirar da aplicação da Lei nº 55-A/2010.

m) Pelo que nada deve ser censurado ao douto acórdão impugnado.

O Ministério da Educação contra-alegou, concluindo: I. A concretização do mecanismo de participação das associações sindicais e demais estruturas representativas dos trabalhadores do setor público decorreu em conformidade com a disciplina do procedimento legislativo, no âmbito da Assembleia da República, constante do Regimento próprio n.° 1/2007, de 20/08, consolidado pelo Regimento n.° 1/2010, de 04/10, e não nos termos da Lei n.° 23/98, de 26 de maio; II.A votação final global do Orçamento do Estado para 2011 apenas ocorreu em 26 de novembro, ou seja, em momento posterior ao decurso do prazo fixado para a sua apreciação pública pelo que nada ocorreu na sequência do procedimento que possa limitar a realização efetiva do direito de participação procedimental; III.Há uma materialização efetiva dos mecanismos participatónos sempre que essa intervenção se realiza ou pode realizar até ao momento em que são definidos os conteúdos jurídicos finais para os quais o procedimento se orienta; IV. O Código do Trabalho (CT), nomadamente o seu artigo 470.º, não se aplica aos trabalhadores contratados que exercem funções públicas ou aos trabalhadores na modalidade de relação jurídica de nomeação; V.O que resulta do artigo 56.º, n.° 2 alínea a), da CRP é que não pode haver discussão e votação de uma proposta de Lei; não que não possa haver discussão sem que haja votação; VI.O Tribunal Constitucional no acórdão n.° 396/2011, de 21 de setembro de 2011, o qual incidiu, entre outras matérias, sobre a conformidade constitucional do processo que conduziu à aprovação das normas impugnadas entendeu não haver qualquer violação à lei fundamental; VII.Nos termos do artigo 19.° da Lei n.° 55-A/2010, de 31 de dezembro, só são afetados pela redução rernuneratória aí contemplada os trabalhadores que aufiram um vencimento de valor superior a € 1500, ou seja, três vezes superior ao salário mínimo nacional, pelo que terá de concluir-se que a norma ora em crise não colide com o direito fundamenta( a uma existência condigna; VIII.Pelo facto de um trabalhador ver a sua remuneração reduzida não se pode daí concluir que a mesma não é conforme à quantidade de trabalho, à natureza do trabalho, à qualidade do trabalho prestado e ao princípio de que a trabalho igual corresponde salário igual, plasmado no artigo 59.º da CRP; IX. A norma do artigo 89.° do RCTFP salvaguarda a eventualidade de haver especiais previsões normativas que atuem como exceção ao principio da irredutibilidade da remuneração; X. Não é absolutamente vedado ao legislador a emissão de normas orçamentais que consagrem uma redução remuneratória, pelo que, entender o contrário coartar a liberdade constitutiva do legislador e o princípio da autorrevisibiljdade das leis que lhe vai subjacente, características que são típicas da função legislativa; XI. A medida do artigo 19.º da Lei n.° 55-A/2010, de 31 de dezembro, visa, em última instância, proteger os próprios interesses dos trabalhadores por ela afetados; XII.Na elaboração do OE para 2011 ocorrem insofismáveis razões de interesse público que justificam, abundantemente, a medida contida no seu artigo 19.º, tal como atestado pelo Tribunal Constitucional no Acórdão n.° 396/2011, de 21 de setembro; XIII. Em situações de crise económica e financeira como a atual, a reserva do possível legítima restrições à efetivação dos direito económico-sociais, com redução dos seus beneficiários ou montantes pecuniários, desde que assegurado um conteúdo mínimo a esses mesmos direitos, como seja o de uma existência condigna; XIV.Atenta a posição que detêm os trabalhadores que exercem funções públicas, a norma do artigo 19.º da Lei do Orçamento do Estado para 2011 não é violadora do princípio da igualdade...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT