Acórdão nº 02530/05.9BEPRT de Tribunal Central Administrativo Norte, 14 de Outubro de 2021

Magistrado ResponsávelIrene Isabel Gomes das Neves
Data da Resolução14 de Outubro de 2021
EmissorTribunal Central Administrativo Norte

Acordam em conferência, os juízes da Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Norte: 1. RELATÓRIO 1.1. A Recorrente (A.

, S.A.), notificado da decisão do Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto, em que foi julgada improcedente a impugnação judicial das liquidações de IRC dos anos de 2001 e 2002, no montante de € 484.641,28, inconformada vêm dela interpor o presente recurso jurisdicional.

Alega a Recorrente, formulando as seguintes conclusões: «1. A sentença posta em crise fixa como matéria de facto com relevância para a decisão dos autos uma série de factos verdadeiros e que não se contestam, mas não mais do que aqueles que constavam já do relatório de inspecção, desconsiderando para estes efeitos todos os factos trazidos a juízo na impugnação judicial, razão pela qual terá de reavaliar-se a prova produzida em juízo, por forma a ampliar-se a matéria de facto provada com relevância para os autos, de acordo com o invocado na p.i. e com aquela prova, feita nos autos por documento e por depoimento testemunhal com os seguintes: 2. A A. encomendou diversas mercadorias à sociedade S. durante os exercícios de 2001 e de 2002, nomeadamente chapa de alumínio anti-derrapante, a qual foi vendida a clientes da ora Recorrente, nomeadamente à sociedade F..

  1. As encomendas de mercadorias eram efectuadas directamente pela Recorrente à S. que, por sua vez, diligenciava junto do seu agente a entrega dos mesmos.

  2. As mercadorias eram entregues nas instalações da Recorrente pela sociedade A., Lda., a pedido da S., sendo a factura correspondente à compra e venda daquelas mercadorias emitida pela S..

  3. As mercadorias não eram enviadas pelo fornecedor da S. (A., Lda.) para a sede desta na Irlanda, sendo antes directamente entregues nas instalações da Recorrente.

  4. O resultado contabilístico das facturas da S. não implicou o apuramento de qualquer custo, pois se tratou de simples compras, daqui resultando que o resultado contabilístico da A. não estava influenciado por um custo que não deveria ter sido reconhecido para efeitos fiscais.

  5. Para que o acréscimo ao lucro tributável se pudesse justificar, seria indispensável que a contabilização das facturas tivesse provocado um resultado negativo, que, a não ser fiscalmente aceite, implicasse a necessidade de um acréscimo ao lucro tributável que afastasse a influência desse resultado negativo da matéria colectável declarada pelo sujeito passivo.

  6. A prática de um acréscimo ao lucro tributável apenas poderia decorrer da não aceitação para efeitos fiscais de um custo contabilístico. O acréscimo visaria, em tal caso, a desconsideração de um custo que contabilisticamente apareceria vertido no resultado, diminuindo-o. Sucede que, no caso em apreço, nenhum custo existiu em 2001 na contabilidade em relação às facturas da S., pois a Recorrente limitou-se a registar uma compra. E uma compra não é um custo. Ora, se não existe um custo na contabilidade, nunca teria qualquer sentido fazer um acréscimo ao lucro tributável.

  7. A administração tributária., ao concluir que a Recorrente não adquiriu quaisquer bens à S., a beneficio da própria avaliação directa que pretendeu prosseguir deveria ter desconsiderado os proveitos correspondentes à venda daqueles bens. Não o fazendo e pretendendo manter o “reconhecimento” contabilístico e fiscal daqueles proveitos correspondentes à comprovada venda de mercadorias que expressamente afirma não terem sido adquiridas, só lhe restava uma alternativa em beneficio da legalidade da correcção que pretendia promover, qual seja, o recurso aos métodos indirectos por forma, a mediante a margem praticada pela impugnante fixar o valor do custo das mercadorias geradoras dos mencionados proveitos e que, aparentemente, não eram tituladas pelas facturas em questão. O que não é de todo aceitável é que se admita a existência de um proveito gerado pela venda de uma mercadoria (que inquestionavelmente existia e foi vendida), sem que à mesma seja reconhecido, por contraponto, um qualquer custo de aquisição.

  8. Se a administração tributária tivesse adoptado como válido o método de avaliação indirecto, a tributação que recairia sobre o resultado de tal aplicação incidiria fundamentalmente sobre o rendimento da Recorrente, isto é, a administração tributária teria que reconhecer fiscalmente o custo associado ao proveito obtido pela Recorrente com a venda dos bens adquiridos à S..

  9. Efectivamente e em conformidade com o estatuído o método da avaliação directa da matéria colectável permite que a tributação incida “fundamentalmente sobre o rendimento” das empresas, conforme determina o nº 2 do artigo 104º da Constituição da República Portuguesa (CRP). No caso em apreço, a administração tributária viola o nº 2 do artigo 104º da CRP e o artigo 17º do Código do IRC, uma vez que não leva em atenção os custos incorridos pela Recorrente com a aquisição dos bens que estiveram na origem dos proveitos, fazendo com que a aplicação do método de avaliação directa da matéria colectável se afaste, significativamente, do lucro real.

    TERMOS EM QUE deverá o presente recurso ser julgado procedente, reapreciando-se a prova produzida, ampliando-se a matéria de facto provada e procedendo-se à correcta aplicação do Direito aos factos, com a consequente revogação da sentença recorrida, pelos motivos acima expostos, e ordenando-se, a final, a anulação das liquidações impugnadas, com as devidas e legais consequências.» 1.2. A Recorrida (Fazenda Pública), notificada da apresentação do presente recurso, não apresentou contra-alegações.

    1.3. O Ministério Público junto deste Tribunal emitiu parecer no sentido da improcedência do recurso 1.4.

    Com dispensa dos vistos legais dos Exmos. Desembargadores Adjuntos (cfr. art. 657º, n.º 4 do Código de Processo Civil (CPC), submete-se desde já à conferência o julgamento do presente recurso.

    Questões a decidir: As questões sob recurso e que importam decidir, suscitadas e delimitadas pelas alegações de recurso e respectivas conclusões, são as seguintes: Ø Omissão de instrução e julgamento sobre factos alegados e essenciais à discussão da causa, determinante da anulação do julgado por deficit instrutório, justificativo da ampliação do probatório, para que dele conste como provada a factualidade elencada nas conclusões 1 a 5.

    Ø Erro de julgamento relativo ao imputado erro de qualificação e de quantificação da matéria colectável, pois foram desconsiderados os custos incorridos pela Recorrente com a aquisição dos bens que estiveram na origem dos proveitos, fazendo com que a aplicação do método de avaliação directa da matéria colectável se afaste, significativamente, do lucro real, contrariando assim o preceituado no artigo 104.º, n.º 2, da CRP.

  10. FUNDAMENTAÇÃO 2.1. De facto 2.1.1. Matéria de facto dada como provada e não provada na 1ª instância e respectiva fundamentação: «1 – A ora impugnante foi objecto de uma inspecção tributária que incidiu sobre os exercícios económicos dos anos de 2001 e 2002.

    2 – Os fundamentos de facto e de direito para as liquidações adicionais ora em discussão, encontram-se exarados no relatório da inspecção tributária constante do PA de fls. 53 a 82 e que aqui se dão por reproduzidas.

    3 – Do relatório identificado em 2) transcrevem-se os seguintes extractos: “A empresa em análise encontra-se colectada pelo exercício da actividade de “comércio por grosso de Minérios e de Metais”(...) De facto, a actividade exercida consiste na comercialização de inox, alumínio, cobre, ferro e outros metais sob a forma de chapa, tubo, arame, etc, e ainda de acessórios, tais como parafusos, pregos, ferramentas, etc.(...) No tipo de mercadorias transaccionadas, predominam o inox e, de seguida, o alumínio. (...) As mercadorias só esporadicamente sofrem transformação sendo, de pouco significado, os serviços prestados por terceiros. (...) As aquisições das mercadorias são efectuadas no mercado nacional e no intracomunitário. As transmissões destinam-se ao mercado interno. (...) A contabilidade não se apresenta organizada de forma a evidenciar de modo directo os movimentos inerentes a cada estabelecimento, tornando-se, todavia, possível de proceder ao apuramento desses movimentos já que a empresa possui sistema de gestão de stocks no estabelecimento de (...) (o que acarreta a relevação de todos os movimentos de transferência inter-estabelecimento), e os documentos de venda são distintos em cada um deles. (...) Notificado o sujeito passivo para explicitar os motivos que poderiam justificar a margem de lucro negativa relevada pelo sector de grosso (...) veio esclarecer que este facto se deveu, por lapso, a errada separação de documentos, devendo ser adicionado às do compras de “retalho” o valor de 580.438,29, por sua vez deduzido às compras do “grosso”.(...) Analisados na empresa os documentos que suportaram a explicação apresentada pelo sujeito passivo, verificou-se que os mesmos correspondem a facturas do fornecedor S., Ldt. (...) Do total de compras de mercadorias indicado no ponto 3.1 1.155.942,41€ e 52.276,93€, respectivamente em 2001 e 2002, dizem respeito a aquisições à empresa S. , Ltd., com data de início em 08/ 01/ 1998 e cessação em 01/ 1/ 02. (...) estas facturas, foram objecto de liquidação e dedução no mesmo período, do IVA correspondente, nos termos dos artºs 8º do RITI e, 19º do Código do IVA e 20º do RITI. Todas estas facturas foram dadas como pagas, (...) Na contabilidade, todas estas facturas se encontram arquivadas em três vias, contrariamente ao que sucede com os demais fornecedores (intracomunitários ou nacionais), as quais se encontram arquivadas numa ou duas vias, conforme tenham ou não documento de transporte associado; (...) nenhuma destas facturas faz qualquer referência a transporte, seguro, ou outro custo nem foram localizados documentos respeitantes a custos desta natureza com referência a estas aquisições. (...) Questionados os representantes da empresa, informaram que tal se devia a estas mercadorias serem...

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