Acórdão nº 01084/20.0BEBRG de Tribunal Central Administrativo Norte, 25 de Fevereiro de 2021
Magistrado Responsável | Tiago Miranda |
Data da Resolução | 25 de Fevereiro de 2021 |
Emissor | Tribunal Central Administrativo Norte |
Acordam em conferência os Juízes Desembargadores que compõem a Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Norte:* Relatório M.
, contribuinte (…), NISS (…), residente na Travessa (…), revertido no processo de execução fiscal nº 1601200601056379 do Serviço de Finanças de Viana do Castelo, interpôs o presente recurso de apelação relativamente à de 11/12/2020 do Juiz do Tribunal Administrativo e Fiscal de Braga, que julgou improcedente a sua reclamação contra a não declaração da prescrição das dívidas à Segurança Social ali exequendas, relativas a contribuições dos períodos de 2003/06 a 2007/03, totalizando, a quantia exequenda 17 586,14 €.
Do corpo da alegação transcrevemos os seguintes excertos: «(…) Os factos considerados assentes e provados pelo tribunal a quo, com os quais o recorrente concorda e aceita, são os seguintes: (…) Na esteira e seguimento do que já foi oportunamente alegado, invocado e suscitado, quer junto do órgão de execução fiscal, quer junto do tribunal a quo, e com vista à delimitação do objeto do presente recurso, a questão que se coloca à consideração deste venerando tribunal é a seguinte: Apreciação da inconstitucionalidade da norma prevista no artigo 327.º, nº 1, do Código Civil, por violação dos princípios da segurança e da confiança jurídica, bem como do direito à tutela jurisdicional efectiva e dos princípios constitucionais da justiça, igualdade, proporcionalidade e interesse público, quando interpretado, directa ou indirectamente, por interpretação extensiva, analógica ou por qualquer outro tipo de interpretação, no sentido de que o acto de citação, realizado em processo de execução fiscal para cobrança de contribuições ou cotizações à Segurança Social, constitui um acto interruptivo do prazo de prescrição, que implica que um novo prazo de prescrição não possa começar a correr enquanto não transitar em julgado a decisão que puser termo ao processo de execução fiscal.
Remata a sua alegação com as seguintes conclusões: Assim e em CONCLUSÃO: A) O artigo 327. °, n° 1, do Código Civil não é passível de aplicação, seja a que título for, em matéria tributária, designadamente em matérias substantivas, como é o caso da prescrição; B) Que, além do mais, é matéria sujeita ao regime de conhecimento oficioso; C) A aplicação deste normativo em matéria tributária viola básicos e elementares princípios jurídico-tributários e origina resultados absolutamente disfuncionais e incoerentes; D) Tal como sucede no caso sub judice.
E) Na medida em que, tendo decorrido um prazo muito superior a cinco anos, desde a ocorrência de último facto susceptível de resultar na interrupção do prazo legal de prescrição das dívidas à Segurança Social subjacentes a este processo de execução fiscal (citação, ocorrida no dia 6-10-2011), ainda assim esta não se mostra declarada ou reconhecida nos presentes autos.
F) Aliás, de acordo com a interpretação jurídico-normativa sustentada pelo tribunal a quo, que efectivamente reitera entendimento jurisprudencial maioritário, jamais este processo de execução fiscal poderá ser extinto por efeito da prescrição das correspondentes dívidas tributárias; G) Atento o, artificialmente reconhecido, efeito interruptivo duradouro atribuído ao acto de citação em processo de execução fiscal, com fundamento no disposto no referido artigo 327.º, n° 1, do Código Civil.
H) Atentos os imperativos decorrentes do princípio da legalidade e da indisponibilidade, vigentes em matéria tributária, por via desta orientação jurisprudencial a Administração Tributária ficará absolutamente impedida de decretar a extinção, por efeito da prescrição, de qualquer processo de execução fiscal que envolva a cobrança de contribuições ou cotizações devidas à Segurança Social.
I) Promovendo uma potencial eternização temporal, com esse fundamento, de múltiplos processos de execução fiscal, tal como sucede com o processo de execução fiscal que está subjacente aos presentes autos; J) Esvaziando de todo e qualquer sentido múltiplas normas legais, que regulam o regime legal da prescrição das dívidas à Segurança Social, entre as quais se incluem, designadamente, os artigos 175. ° e 176. °, n° 1, do CPPT; o artigo 63. °, n° 2, da Lei n° 17/2000, de 8/8; o artigo 49.°, da Lei n° 32/2002, de 20/12; o artigo 60.°, da Lei n° 4/2007, de 16/1 e o artigo 187.°, da Lei n° 110/2009, de 16/9; K) Na verdade, o acto de citação em processo de execução fiscal não tem, sequer, o mesmo contexto jurídico-normativo do acto de citação a que se reporta o artigo 327. °, n° 1, do Código Civil; L) Pela sua própria natureza, o processo de execução fiscal assume como objectivo a cobrança coerciva de dívidas tributárias; M) E na esmagadora maioria dos casos, não está sujeito a qualquer acto jurisdicional, susceptível de transitar em julgado, para findar ou colocar um termo ao processo; N) Tal como resulta das causas de extinção do processo de execução fiscal taxativamente previstas no artigo 176. °, n° 1, do CPPT; O) Em face da matéria de facto que se mostra provada nos autos, é imperativa a conclusão no sentido de que já decorreu, há muito, o prazo de prescrição das correspondentes dívidas tributárias, que estão subjacentes ao mencionado processo de execução fiscal; P) Devia, por isso, ter sido decretada a extinção desse processo, com este fundamento, ao contrário do que resultou da douta decisão recorrida; Q) O referido artigo 327. °, n° 1, do Código Civil não é aplicável à matéria em discussão nos presentes autos; R) Este normativo está ferido de inconstitucionalidade, por violação dos princípios da segurança e da confiança jurídica, bem como do direito à tutela jurisdicional efectiva e dos princípios constitucionais da justiça, igualdade, proporcionalidade e interesse público( ), quando interpretado no sentido de atribuir ou reconhecer que o acto de citação, realizado em processo de execução fiscal para cobrança de contribuições ou cotizações à Segurança Social, constitui um acto interruptivo do prazo de prescrição, que implica que um novo prazo de prescrição não possa começar a correr enquanto não transitar em julgado a decisão que puser termo ao processo de execução fiscal;*Notificada, a Fazenda Pública não respondeu à alegação do Recorrente.
*O Digno Magistrado do Ministério Público apresentou douto parecer no sentido da improcedência do recurso, do qual parecer transcrevemos o essencial: «….
A prescrição interrompe-se por qualquer diligência administrativa realizada com conhecimento do responsável pelo pagamento conducente à liquidação ou à cobrança da dívida – art.º 63.º n.º 3 da Lei 17/2000 de 8 de Agosto.
Entre essas diligências temos a notificação para audiência prévia do potencial revertido que determinou, na data em que dela teve conhecimento, em 14 de Março de 2008, a inutilização para a prescrição do tempo anteriormente decorrido e o início da contagem de novo prazo de 5 anos.
Assim, devido a essa interrupção, o prazo de prescrição da dívida mais antiga completar-se-ia em 14 de Março de 2013.
Todavia, em 6 de Outubro de 2011 ocorreu a citação do revertido, ora reclamante, para a execução fiscal.
Logo, essa citação interrompeu o prazo de prescrição nos termos do art.º 323.º n.º 1 do Código Civil, prazo esse que não volta a correr enquanto estiver pendente o processo de execução fiscal por força do teor do art.º 327.º n.º 1 do Código Civil.
Assim, será de acolher a tese da sentença recorrida quando entende não se verificar a prescrição.
Quanto às suscitadas inconstitucionalidades, acompanhamos igualmente a sentença recorrida».
II- Questões a decidir Conforme jurisprudência pacífica, o âmbito do recurso é delimitado pelo objecto das conclusões das alegações, interpretadas, como é lógico, em função daquilo que se pretende sintetizar, isto é, o corpo das alegações.
Assim, as questões colocadas a este Tribunal consistem em apreciar se a interrupção do prazo de prescrição das dividas por contribuições à Segurança Social operada pela citação do revertido para o processo de execução fiscal em 6/10/2011 tem efeito duradouro, por força do o artigo 327º nº 1 do CC, devendo, no caso afirmativo, discutir-se a constitucionalidade material daquela norma, com esta interpretação, por ofensa dos “princípios da segurança e da confiança jurídica, bem como do direito à tutela jurisdicional efectiva e dos princípios constitucionais da justiça, igualdade, proporcionalidade e interesse público”.
III Apreciação do objecto do Recurso Da sentença recorrida: Convém transcrever, para melhor entendimento da discussão que segue, por serem os essenciais quanto à questão sub juditio, os seguintes excertos da sentença recorrida: «Com relevo para a decisão a proferir na presente acção, consideram-se provados os seguintes factos: A) Correm termos na Secção de Processo Executivo de Viana do Castelo do IGFSS, IP (OEF) o processo de execução fiscal (PEF) n.° 1601200601056379 e apensos, por dívidas de contribuições/cotizações, relativas aos períodos de 2003.06 a 2007.03, instaurados contra “I., Lda..” (cfr. informação elaborada pelo OEF, constante de fls. 98/104 do SITAF, cujo teor se dá por integralmente reproduzido para os devidos efeitos legais); B) O PEF e apensos referido no ponto anterior foi instaurado para a cobrança das seguintes dívidas (cfr. informação elaborada pelo OEF, constante de fls. 98/104 do SITAF, cujo teor se dá por integralmente reproduzido para os devidos efeitos legais): (i) processo de execução fiscal n.° 1601200601056379 concernente a cotizações dos períodos de 2003.12 a 2005.04; (ii) processo de execução fiscal n.° 1601200601056387 atinente a contribuições dos períodos de 2003.06 a 2005.11; (iii) processo de execução fiscal n.° 1601200601068539 referente a contribuições relativas aos períodos de 2005.12 a 2006.06; (iv) processo de execução fiscal n.° 1601200701024744 tocante a contribuições relativas aos períodos de 2007.01 a 2007.03; (v) processo de execução fiscal n.° 1601200900093777 respeitante a...
Para continuar a ler
PEÇA SUA AVALIAÇÃO