Acórdão nº 00565/21.3BEPRT de Tribunal Central Administrativo Norte, 30 de Setembro de 2021

Magistrado ResponsávelCristina Travassos Bento
Data da Resolução30 de Setembro de 2021
EmissorTribunal Central Administrativo Norte

Acordam, em conferência, os Juízes Desembargadores da Secção do Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Norte:*I.

Relatório A Fazenda Pública, melhor identificada nos autos, veio interpor recurso jurisdicional da sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto, que julgou procedente a reclamação deduzida contra o despacho do Chefe de Divisão da Direcção de Finanças do Porto, pela sociedade comercial denominada “A., Lda”, que lhe havia indeferido o pedido de dispensa de prestação de garantia, para suspensão dos processos de execução fiscal 3174201901170554 e aps que correm termos no Serviço de Finanças do Porto 1, tendo-o anulado.

A Recorrente terminou as suas alegações de recurso, formulando conclusões que se reproduzem: “a) O presente recurso vem interposto da douta sentença que julgou “(…) decido julgar a presente reclamação procedente e, em consequência, anulo o acto reclamado, consubstanciado na decisão proferida em 12.11.2020, pela Chefe de Divisão da Direcção de Finanças do Porto, que indeferiu o pedido de dispensa total da prestação de garantia formulado pela Reclamante”.

b) Posto isto, a Representação da Fazenda Pública não se conforma com o decidido, apresentando de seguida as suas alegações.

V.1 – Da impugnação da decisão de Facto da sentença do Tribunal a quo c) Desde já, a RFP considera que, quanto à decisão de facto, deve ser aditado, aos “Factos Provados”, pois são factos notórios, na sentença recorrida, e que tem relevo para a boa decisão da causa, os seguintes factos, “16) Em 2020-03-11, a Organização Mundial de Saúde classificou a emergência de saúde pública ocasionada pela doença COVID-19 como uma pandemia internacional, constituindo uma calamidade pública.” “17) Efetivamente, foi publicada a Lei n.º 1-A/2020, de 19/03, que aprovou as medidas excecionais e temporárias de resposta à situação epidemiológica provocada pelo coronavírus SARS-CoV-2 e da doença COVID-19, quer a Lei nº 4-A/2020, de 06/04, assim como os artigos que regulamentaram a contagem dos prazos.” V.2 – Da impugnação da decisão de Direito da sentença do Tribunal a quo V.2.1 - Da tempestividade/intempestividade do pedido de dispensa total de prestação de garantia formulado pela Reclamante em 25.09.2020 d) No âmbito deste segmento, discordamos com a decisão de direito plasmada na douta sentença, proferida, nos presentes autos, nos seguintes termos e fundamentos.

e) Vejamos, então, se tais factos, em concreto, são de molde a considerar a tempestividade/intempestividade do pedido de dispensa total de prestação de garantia formulado pela Reclamante, em 25-09-2020.

f) Como já aditamos à matéria de facto provada, em 11 de março de 2020 a Organização Mundial de Saúde classificou a emergência de saúde pública ocasionada pela doença COVID-19 como uma pandemia internacional, constituindo uma calamidade pública.

g) Vejamos, agora, as especificidades decorrentes da pandemia COVID-19.

h) Uma vez feita a leitura deste segmento da sentença proferida, nos presentes autos, facilmente se denota que a sentença sobre recurso não levou sequer em consideração os diplomas que versaram sobre os prazos e modo de contagem em tempos de pandemia.

i) A legislação especial, decorrente da situação de pandemia COVID-19, impôs a suspensão dos prazos processuais, nos processos de natureza urgente, entre 09.03.2020 e 06.04.2020, inclusive.

j) Pelo que, sendo necessário praticar um ato em processo de natureza urgente, o referido prazo retomou o seu curso a 07.04.2020.

k) Ora, como facto mundial nos termos sobreditos integra o mesmo o conceito de facto notório e deve ser considerado pelo juiz nas decisões a tomar, nos termos constantes da alínea c), do n.º 2, do artigo 5.º, do CPC.

l) Todavia, ao contrário do defendido pelos serviços da AT, a decisão de direito plasmada na sentença proferida, nos presentes autos, apesar da situação excecional que vivemos, desde pelo menos 9 de março de 2020, apenas considerou o mês de agosto de 2020, como o mês a partir do qual considerou tempestivo o pedido de dispensa de garantia formulado, sem considerar os seguintes factos.

m) Em primeiro lugar, como já acima foi referido, “(a) legislação especial decorrente da situação de pandemia COVID-19, impôs a suspensão dos prazos processuais, nos processos de natureza urgente, entre 09.03.2020 e 06.04.2020, inclusive”.

n) Em segundo lugar os próprios (alegados) valores apresentados, pela Impugnante, quanto à sua atividade económica, conforme a matéria de facto provada, no ponto 12, da sentença proferida, nos presentes autos, estão apresentados, no quadro aí plasmado, os seguintes valores,[imagem que aqui se dá por reproduzida] o) Ora, parece-nos que, analisando o referido quadro, nota-se uma evidente queda, nos meses de março e abril, ambos de 2020, alias coincidentes com a situação de pandemia e a consequente legislação elaborada, como acima foi já referido.

p) Porém, o mesmo argumento já não poderá ser utilizado face aos restantes meses do ano, tanto mais que a diferença entre os totais apresentados, de 2019 para 2020, excluídos que sejam os meses de março e abril, não é assim tão evidente.

q) Mais, os valores apresentados para os meses de janeiro e fevereiro, ambos de 2021, meses anteriores à declaração pública da pandemia, não são muito diferentes dos de julho e agosto, ambos do referido ano de 2021, já posteriores a essa declaração.

r) Ora, a exigibilidade de uma gestão criteriosa e responsável, tal como é imposta, pelo próprio artigo 64.º, do Código das Sociedades Comerciais (CSC), leva-nos a considerar que a referida formulação do pedido de dispensa de garantia foi elaborado tardiamente, designadamente quando o mesmo faz apelo, desde logo, à situação de pandemia COVID-19.

s) Assim sendo, entende-se que o pedido de dispensa da prestação de garantia, apresentado pela aqui Recorrida, com fundamento no agravamento das suas concretas condições económico-financeiras em virtude do surto pandémico que se vivia e vive, é intempestivo.

t) Pelo que o despacho reclamado, ao considerar a intempestividade do pedido, é legal, em conformidade com o disposto no artigo 170.º, n.º 2, do CPPT.

u) Pelo que violou o Tribunal recorrido as seguintes disposições legais: artigos 169°, 170°, n.º 2, do CPPT, e 10° do CPA, ex vi 2°, c), da LGT e 2°, d), do CPPT.

v) Nestes termos e nos melhores de direito, deve a decisão recorrida na parte aqui impugnada ser revogada, substituindo-a por outra que determine a procedência do presente recurso, conforme alegado e concluído, seguindo-se os demais termos legais.

V.2.2 - Da legalidade/ilegalidade do despacho reclamado quanto à apreciação dos pressupostos necessários ao deferimento do pedido de dispensa de prestação de garantia w) Em primeiro lugar, a RFP desde já, em consonância com o próprio teor do Parecer do Digno Magistrado do Ministério Público8, resulta da matéria de facto provada que, em 31-10-2019, a aqui Recorrida, ao abrigo do n.º 2, do artigo 169.º, do CPPT, requereu a suspensão da execução, oferecendo como garantia a penhora do seu estabelecimento comercial pedindo, subsidiariamente, a dispensa de prestação de garantia pelo...

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