Acórdão nº 03024/17.5BEPRT de Tribunal Central Administrativo Norte, 24 de Setembro de 2021

Magistrado ResponsávelMaria Fernanda Antunes Aparício Duarte Brandão
Data da Resolução24 de Setembro de 2021
EmissorTribunal Central Administrativo Norte

Acordam, em conferência, na secção de contencioso administrativo do Tribunal Central Administrativo Norte: RELATÓRIO S., na qualidade de representante legal do seu filho menor T., instaurou acção administrativa contra Auto-Estradas (...) S.A., todos melhor identificados nos autos, pedindo a condenação desta a pagar a quantia de EUR 5.655,99, a título de indemnização por danos patrimoniais, acrescida de juros vincendos até efectivo e integral pagamento.

Por sentença proferida pelo TAF do Porto foi julgada improcedente a acção e absolvida a Ré do pedido.

Desta vem interposto recurso.

Alegando, a Autora formulou as seguintes conclusões: 1 - O tribunal, erradamente, deu como provado os seguintes factos: 15) No dia 03-09-2016, o centro de controlo da ré registou a ocorrência por volta da 01h07m de um incidente na A28, km 11 (sentido viana-porto) através do posto SOS instalado na via para assistência ao utente.

17) o vigilante da ré que se encontrava ao serviço passou duas vezes, entre as 00:30horas e as 00:45horas, no local onde ocorreu o embate descrito em 2), não tendo detetado qualquer situação de rebentamento de pneu naquele local.

2 - Da prova produzida resulta claro e inequívoco que quem chegou primeiro ao local do acidente foi o militar da GNR A..

3 - Conclui-se do seu depoimento que não só chegou em primeiro lugar como foi ele que retirou os objetos da via, 4 - Os elementos da concessionaria quando chegaram já nada fizeram.

5 - O que já não seria assim se se entendesse ter sido como foi fixado na sentença a quo.

6 - O testemunho do militar da GNR foi claro e taxativo ao afirmar que foi o primeiro a chegar ao local do acidente e que encontrou uma tela de pneumático de grandes dimensões na via.

7 - O Tribunal a quo não levou sequer em conta o depoimento do polícia.

8 - Nem mesmo o que por ele foi referido no auto de ocorrência, nomeadamente que o acidente ocorreu pelas 1.15h; 9 - A Lei n° 24/2007 veio reforçar a proteção a conceder aos utentes de auto-estradas concessionadas, itinerários principais e itinerários complementares, determinando que, na ausência da prova da culpa do condutor na produção de acidente, recaísse sobre a concessionária o ónus de demonstrar o cumprimento das inerentes obrigações de segurança, sob pena de, não o fazendo, assumir a responsabilidade pelo ressarcimento dos prejuízos assim provocados em pessoas e bens.

10 - Nestas circunstâncias, e desconhecendo-se qualquer explicação para a existência do referido objeto na via, cremos que será a favor do lesado/utente, e não da concessionária, que a dúvida terá de resolver-se, de acordo com o disposto no n° 1 do art. 12 da referida Lei n° 24/2007 e no art. 350 do C.C.

11 - E, estabelecendo a al. a) do art° 12° da Lei n°24/2007 que "nas auto estradas com ou sem obras em curso e em caso de acidente rodoviário, com consequências danosas para pessoas ou bens, o ónus da prova do cumprimento das obrigações de segurança cabe à concessionária, desde que a respectiva causa diga respeito a objectas arremessados para a via...", dúvidas não podem subsistir de que é sobre a concessionária que recai o ónus da prova de haver cumprido as obrigações de segurança a que se acha vinculada e não ao lesado que incumbe provar que aquela as não cumpriu.

12 - Por conseguinte, deve a decisão ser revogada atendendo que não existiram patrulhamentos por parte da ré com frequência e com os cuidados exigíveis; 13 - E que quem retirou o material da faixa de rodagem foi a polícia e não a concessionaria.

14 - Entende-se que estão cumpridos os requisitos da responsabilidade civil por falta do cumprimento do ónus da prova.

TERMOS EM QUE, Deve o presente Recurso ser julgado totalmente procedente, e em consonância ser revogada a decisão recorrida por outra em que a recorrida seja condenada no peticionado.

Só assim se fará justiça.

A Ré juntou contra-alegações e concluiu: 1. A pretensão do Recorrente não tem qualquer fundamento.

  1. Ao contrário do alegado por este, andou bem o Tribunal “a quo” quando julgou improcedente o direito à indemnização reclamado e absolveu a Recorrida do pedido.

  2. Da análise contextualizada do depoimento das testemunhas, foi perfeitamente clara a prova realizada sobre os pontos 15 e 17 dos factos julgados provados.

  3. É falso que o Tribunal “a quo” tivesse julgado por provada a matéria vertida nos pontos 15 e 17 da matéria de facto julgada por provada sem qualquer suporte na prova produzida.

  4. A decisão dos factos em causa decorre da apreciação dos depoimentos prestados pelas testemunhas da Ré, que em nada colidem com as restantes testemunhas ouvidas e ainda, da apreciação e conjugação com a prova documental junta.

  5. Apenas pelo elemento probatório documental já seria possível, à luz das regras da experiência, concluir que a tela/revestimento do pneumático não poderia ter estado imobilizada na via no meio da via sem que qualquer outra viatura, das que passaram naquele local, nela tivesse embatido, principalmente atendendo ao número de viaturas que depois, com ela colidiram.

  6. Da conjugação os elementos probatórios acima referidos, com os tempos de actuação entre todos os intervenientes, é perfeitamente lógico e aceitável concluir que a tela / revestimento na qual embateu o veículo da Autora havia saltado ou sido desprendido do pneumático de um camião apenas momentos antes.

  7. A sentença em crise, justificou com base na prova produzida a razão de ciência da sua decisão quanto à matéria de facto vertida nos pontos 15 e 17 dos factos provados de forma incontestável.

  8. Nos termos do n.º 5 do artigo 607.º do CPC, a prova é apreciada segundo o princípio da livre apreciação da prova por parte do julgador.

  9. Este princípio, vertido no artigo 607.º do CPC, significa que a prova é apreciada pelo julgador, segundo a sua experiência e a sua prudência, sem subordinação a regras ou critérios estabelecidos (Alberto dos Reis, C. Anotado, Volume IV, pg. 544).

  10. A livre apreciação da prova deve traduzir-se em valoração racional e crítica, de acordo com as regras comuns da lógica, da razão, das máximas da experiência que permita ao julgador objectivar a apreciação dos factos por forma a que a sua decisão não seja arbitrária, discricionária ou caprichosa.

  11. A parte ínfima dos depoimentos das testemunhas que o Recorrente refere não é susceptível de alterar o sentido da resposta proferidas pelo Tribunal recorrido à matéria de facto, que não merece qualquer censura.

  12. Da análise do conjunto da matéria dada como provada resulta claramente que a Ré não se limitou, no caso concreto, a provar o cumprimento das obrigações genéricas de segurança.

  13. Ficou demonstrado, como é referido em alguns dos arestos invocados pelo Recorrente, que a Ré provou a proveniência do objecto na estrada e que tal facto não lhe era de todo imputável.

  14. Era impossível prevenir a ocorrência do incidente fossem quais fossem as diligências que a concessionária pudesse ter adoptado.

  15. Uma tela de um pneu, não se solta das viaturas utilizadas pela Ré nas suas funções de vigilância, nem tão pouco das viaturas ligeiras dos utentes da via.

  16. Significa isto que, considerando o tráfego que se provou ter existido na hora que mediou a hora do sinistro e a natureza do objecto que o causou, é inequívoco concluir que a Ré nada poderia fazer que pudesse antecipar o aparecimento do objecto na via e evitar o sinistro.

  17. Com o tráfego que se provou existir na hora em que ocorreu o sinistro, mesmo que a tela de pneu tivesse sido detectada assim que foi largada da via, não seria possível evitar o sinistro à Ré ou qualquer outra entidade, por ser impossível.

  18. Dos procedimentos instituídos, das passagens dos funcionários da Ré e dos restantes elementos recolhidos, resulta claro que na situação em concreto a Ré tudo fez para garantir a permanência da via desobstruída, com as condições necessárias à circulação rápida pela mesma dos veículos, ilidindo a presunção de incumprimento das regras de segurança que sobre si impendiam.

  19. É que mesmo que a Recorrente dispusesse de sistema de vigilância absoluto, permanente e infalível nunca conseguiria evitar ocorrências danosas.

  20. Do acervo probatório constante do processo resulta claro que a Recorrida não se limita ao cumprimento de obrigações genéricas de segurança que, de resto, nunca foram definidas nem se poderá dizer que é genérico tudo o que não evita o acidente.

  21. A conduta da concessionária preenche cabalmente a exigência da obrigação de meios, sendo a matéria de facto provada absolutamente idónea e adequada à prova do cumprimento dessa mesma obrigação de meios, devendo ser mantida integralmente a decisão recorrida.

  22. Como bem consta da fundamentação de direito da sentença recorrida, em função da prova produzida não era exigível à concessionária outro comportamento que impedisse a ocorrência da circunstância geradora do incidente.

  23. É forçoso concluir que andou bem o Tribunal “a quo” ao ter decidido como decidiu, não existindo qualquer violação ou incorrecta aplicação do direito, devendo ser mantida integralmente a decisão recorrida.

Termos em que, nos melhores de Direito, Julgando em conformidade com a sentença do Tribunal “a quo”, deve ser negado provimento ao recurso interposto, mantendo-se a decisão recorrida, fazendo-se JUSTIÇA! O MP, notificado nos termos e para os efeitos do artigo 146º/1 do CPTA, não emitiu parecer.

Cumpre apreciar e decidir.

FUNDAMENTOS DE FACTO Na decisão foi fixada a seguinte factualidade: 1) No dia 03/09/2016, pelas 01h00m, o veículo ligeiro de passageiros, da marca Volkswagen, modelo Golf IV Dieses (1J1) 97-04, cor preta, com a matrícula XX-XX-XX, pertencente a T., nascido no dia 14/04/2003, e conduzido por M., seu pai, seguia na Auto-estrada A28, no sentido Sul/Norte – cf. documento n.ºs 1 e 2 juntos com a petição inicial.

2) Enquanto o condutor conduzia no sentido Sul/Norte (Viana-Porto), subitamente, ao km 11, sem o condutor conseguir observar, o veículo identificado no ponto 1) colidiu com uma tela de pneumático – cf. documento...

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