Acórdão nº 00246/19.8BECBR de Tribunal Central Administrativo Norte, 24 de Setembro de 2021

Magistrado ResponsávelFrederico Macedo Branco
Data da Resolução24 de Setembro de 2021
EmissorTribunal Central Administrativo Norte

Acordam em Conferência na Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Norte:*I Relatório O Município (...) devidamente identificado nos autos, no âmbito de Ação Administrativa intentada pelo STAL – Sindicato Nacional dos Trabalhadores da Administração Local e Regional (Em representação de O.), tendente, em síntese, à impugnação dos atos praticados, em 19/11/2018 e 11/01/2019, pela Chefe de Divisão de Recursos Humanos, em regime de substituição, e pela Vereadora da Câmara Municipal (...), relativamente à sua avaliação nos biénios 2013/2014 e 2015/2016, veio recorrer jurisdicionalmente da decisão proferida em 6 de março de 2021 no TAF de Coimbra, que anulou os referidos atos e condenou o Município a reconhecer que a referida trabalhadora foi avaliada no âmbito dos respetivos procedimentos de avaliação de desempenho.

Formula o aqui Recorrente/Município nas suas alegações de recurso as seguintes conclusões: “I – Atualmente, face àquela que é hoje a Administração Pública e as respetivas relações com os particulares, não devem ser qualificados como atos administrativos todas as manifestações jurídicas unilaterais, com eficácia externa, que a Administração possa proferir, apenas podendo ser qualificadas como tal as manifestações que o ordenamento jurídico qualifique desse modo; II - A relação jurídica de emprego público caracteriza-se, hoje, pela prestação individual de uma atividade, a troco de uma remuneração e outras contrapartidas de valor patrimonial e social durante um certo tempo, por conta e risco e sob a direção de um empregador público, de modo que se trata de uma relação pessoal, sinalagmática, onerosa e que permite a direção ou o controlo da atuação funcional do trabalhador; III - O vínculo regra, em sede de emprego público, assenta hoje num contrato, ou seja, num encontro simultâneo de vontades entre uma entidade empregadora pública e um indivíduo, o qual, mesmo se tido como um contrato administrativo, assenta na vontade das partes, não se limitando o cocontratante, portanto, e ao contrário do que acontece com o ato administrativo, a participar num procedimento conducente a uma decisão unilateral da Administração; IV – O exercício de poderes públicos de autoridade em sede contratual (administrativa) faz-se, via de regra, por meio de atos administrativos, como resulta do artigo 307.º, n.º 2, do Código dos Contratos Públicos, sendo que, porém, como a doutrina e a jurisprudência vêm enfatizando – e hoje, aliás, decorre claramente do CCP - para lá das fronteiras desse espaço de poder público de autoridade em sede de contrato administrativo, as partes manifestam as suas vontades e interesses através de declarações negociais; V - Na visão em que ancora a sentença recorrida, a relação que emerge do contrato de trabalho em funções públicas, pese embora essa natureza contratual, é toda ela, ou quase toda, gerida ou conformada por atos administrativos, o que conduz a que, ainda de acordo com esse entendimento, estejamos aqui, não obstante a fácies contratual, umbilicalmente ligados à visão unilateralista da relação jurídica de emprego público; VI - A mudança de paradigma do ato administrativo para o contrato como título da relação jurídica de emprego público tem o efeito de precludir, em regra a prática de atos administrativos pelo empregador público em sede de execução do contrato, razão pela qual, sendo a posição das partes 'formalmente pari ordenadas', não se pode assumir que o empregador tem, em princípio, em caso de dissenso, autotutela declarativa e executiva; VII - Como acordo de vontades que é, o poder dispositivo sobre o contrato deve, por princípio, consentaneamente, nele assentar e não na imposição unilateral de efeitos jurídicos; VIII - Como se afirma no Ac. do STA de 22.11.2011, proferido no proc. n.º 547/11, está ultrapassado o tempo em que se admitia “...a conformação das relações jurídicas de emprego público através de atos administrativos”; IX - A mera comunicação de pontos a um trabalhador – pontuação essa que, aliás, decorre diretamente da lei e não de qualquer operação ou avaliação empreendida pelo empregador – não pode, à luz daquilo que é hoje a relação jurídica de emprego público, ser tida com um ato administrativo com as consequências daí decorrentes, designadamente em termos de impugnação contenciosa; X - O ato de 19.11.2018 não consubstancia um ato administrativo, pelo que a sentença recorrida, ao assim não considerar, incorre em erro de julgamento, violando XI - O sistema de avaliação do desempenho na Administração Pública, compreende, como bem observa o Tribunal a quo, uma série de fases, no que se inclui a homologação, que cabe ao dirigente máximo do serviço, e que deve tomar em linha de conta os fundamentos apresentados pelo avaliado e pelo avaliador, bem como os relatórios da comissão paritária ou do conselho coordenador da avaliação sobre pedidos de apreciação anteriormente apresentados; XII – A homologação é o ato final do procedimento de avaliação, de que depois se pode reclamar e recorrer hierarquicamente, sendo que sem ela esse procedimento não está concluído e, portanto, o trabalhador não pode ter-se por avaliado.

XIII – Assumindo-se – como assume a sentença recorrida – que o Recorrente não pode ser condenado a praticar os atos de homologação, não se vislumbra como pode, ainda assim, considerar que a associada do Recorrido foi avaliada âmbito de procedimentos avaliativos que, no dizer da Tribunal a quo, ainda estão em curso; XIV - Não tendo os procedimentos de avaliação referentes aos ciclos avaliativos 2013/2014 e 2015/2016 sido concluídos, e não estando o Recorrente condenado a concluí-los, a associada do Recorrido não pode ter-se por avaliada e, nessa medida, tem de se lhe aplicar, para efeitos de alteração do posicionamento remuneratório, o disposto no n.º 2 do artigo 18.º da LOE/2018, como foi feito; XV - Por assim não considerar, incorre a sentença recorrida em erro de julgamento, violando aquele preceito normativo.

Nestes termos, Considerando procedente o presente recurso e revogando, consequentemente, a sentença recorrida, farão V. Exas. JUSTIÇA!” O Recorrido/STAL veio a apresentar as suas contra-alegações de Recurso em 20 de abril de 2021, aí concluindo: “a) Relativamente ao erro de julgamento, violador do artigo 51º, nº 1, do CPTA, assacado ao mui douto aresto sob recurso, por ter considerado o ato de 19/11/2018 impugnável, cumpre reter que pese embora se possa admitir que a relação emergente do contrato de trabalho em funções públicas seja, progressivamente, menos conformada ou gerida por atos administrativos, face à natureza sinalagmática deste contrato e à margem de liberdade reconhecida às partes na respetiva conformação e execução, o escopo daquele ato pouco tem a ver com tal natureza e margem de liberdade; b) Do que se trata é do exercício de poderes vinculados por parte da autarquia, da exteriorização da vontade da autarquia em termos de interpretação e aplicação das normas do artigo 18º, da LOE/2018, em que esta entidade administrativa não tem margem de manobra, nem, diga-se, a trabalhadora poderá esperar mais do que aquilo que tais normas reservam; c) Poderá descortinar-se alguma margem de conformidade, no início da contratação nos termos do disposto no artigo 38º da mesma LTFP, mas, ainda assim, a determinação da posição remuneratória inicial, jamais resultará de uma negociação em que as partes tenham igualdade de armas ou poder; d) O certo é que a remuneração posterior, durante a execução do contrato, está sujeita àquelas normas da LTFP; e) Precisamente por o Recorrente ser uma pessoa coletiva de direito público de âmbito territorial, concretamente uma autarquia local que integra a organização democrática do Estado, todo o dinheiro que administra é dinheiro público o qual, consequentemente, só pode sair dos seus cofres mediante uma habilitação ou fundamento legal rigoroso; f) Daí que a matéria da remuneração do contrato de trabalho em funções públicas, a partir da sua celebração e estabelecimento da remuneração de partida, é subtraída à disposição das partes, não podendo ser matéria contratual ou de instrumento de Regulamentação Coletiva de Trabalho estando sujeita às normas dos artigos 156º a 158º da LTFP; g) Nada tivesse a sócia do Recorrido feito e hoje os seus direitos, em termos retributivos, seriam os ditados por aquela decisão de atribuição dos pontos na interpretação e aplicação das normas do artigo 18º, da Lei nº 114/2017, de 29/12, Lei do Orçamento de Estado de 2018, LOE/2018, que pela inércia daquela se consolidaria na ordem jurídica apesar das ilegalidades como caso decidido ou resolvido por falta de impugnação do ato em causa; h) Tendo em conta o exposto, tenha-se presente que se consideram atos administrativos as decisões que, no exercício de poderes jurídico-administrativos, visem produzir efeitos externos numa situação individual e concreta, conforme a definição de ato administrativo constante do artigo 148º, do Código do Procedimento Administrativo em vigor; i) Acrescendo que, nos termos do artigo 51º, do CPTA, são impugnáveis, todas as decisões que, no exercício de poderes jurídico-administrativos, visem produzir efeitos jurídicos externos numa situação individual e concreta; j) Em suma, o contexto do ato de 19/11/2018 torna-o perfeitamente subsumível à previsão das normas dos artigos 148º do CPA e 51º, nº 1, do CPTA, nada havendo a apontar ao mui douto aresto recorrido; k) Acresce que, não ser possível ocultar-se a evidência de que a sócia do Recorrente, nos ciclos avaliativos de 2013/2014 e 2015/2016 foi inspecionada nos ditos períodos, o seu desempenho foi ponderado e alvo de avaliação de mérito, de tal forma que o Conselho Coordenador da Avaliação cotejou a sua avaliação com a de outros trabalhadores decidindo não validar a menção de “Relevante” atribuindo a avaliação quantitativa de 3,999; l) Neste contexto, a mui douta sentença em causa anulando os atos impugnados condenou o Recorrente a...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT